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PREVIDENCIÁRIO. AMPARO SOCIAL. ART. 203, V, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. NÃO CONHECIMENTO DA REMESSA OFICIAL. IDOSO. IMPLEMENTO DO REQUISITO ETÁRIO. HIPOSSUFICIÊNCIA NÃO COMPROVADA. REQUISITO NÃO PREENCHIDO. BENEFÍCIO INDEVIDO. TRF3. 0010002-92.2014.4.03.9999

Data da publicação: 16/07/2020, 08:36:01

PREVIDENCIÁRIO. AMPARO SOCIAL. ART. 203, V, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. NÃO CONHECIMENTO DA REMESSA OFICIAL. IDOSO. IMPLEMENTO DO REQUISITO ETÁRIO. HIPOSSUFICIÊNCIA NÃO COMPROVADA. REQUISITO NÃO PREENCHIDO. BENEFÍCIO INDEVIDO. I - O Novo CPC modificou o valor de alçada para causas que devem obrigatoriamente ser submetidas ao segundo grau de jurisdição, dizendo que não necessitam ser confirmadas pelo Tribunal condenações da União em valores inferior a 1.000 salários mínimos; esse preceito tem incidência imediata aos feitos em tramitação nesta Corte, não-obstante remetidos pelo juízo a quo na vigência do anterior Diploma Processual. II - O benefício de assistência social (artigo 203, V, da Constituição Federal) foi instituído com o escopo de prestar amparo aos idosos e deficientes que, em razão da hipossuficiência em que se acham, não tenham meios de prover a própria subsistência ou de tê-la provida por suas respectivas famílias. III - O implemento etário restou demonstrado pela documentação pessoal da parte autora. IV - Estudo social realizado demonstra que a família da parte autora deteria recursos para cobrir os gastos ordinários e os cuidados especiais que lhe são imprescindíveis, não estando configurada, assim, situação de miserabilidade. V - A concessão de benefício assistencial não tem caráter de complementação de renda familiar, o que, por certo, traria distorção ao propósito da instituição do benefício no universo da assistência social. VI - Benefício indeferido. Remessa necessária não conhecida. Apelação da autárquica provida. (TRF 3ª Região, OITAVA TURMA, ApReeNec - APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA - 1958119 - 0010002-92.2014.4.03.9999, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL DAVID DANTAS, julgado em 05/06/2017, e-DJF3 Judicial 1 DATA:21/06/2017 )


Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

D.E.

Publicado em 22/06/2017
APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 0010002-92.2014.4.03.9999/SP
2014.03.99.010002-6/SP
RELATOR:Desembargador Federal DAVID DANTAS
APELANTE:Instituto Nacional do Seguro Social - INSS
APELADO(A):JAIR FIGUEIRA BONELLI
ADVOGADO:SP322504 MARIA ADRIANA DE OLIVEIRA
REMETENTE:JUIZO DE DIREITO DA 1 VARA DE ARARAS SP
No. ORIG.:10.00.00217-1 1 Vr ARARAS/SP

EMENTA

PREVIDENCIÁRIO. AMPARO SOCIAL. ART. 203, V, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. NÃO CONHECIMENTO DA REMESSA OFICIAL. IDOSO. IMPLEMENTO DO REQUISITO ETÁRIO. HIPOSSUFICIÊNCIA NÃO COMPROVADA. REQUISITO NÃO PREENCHIDO. BENEFÍCIO INDEVIDO.
I - O Novo CPC modificou o valor de alçada para causas que devem obrigatoriamente ser submetidas ao segundo grau de jurisdição, dizendo que não necessitam ser confirmadas pelo Tribunal condenações da União em valores inferior a 1.000 salários mínimos; esse preceito tem incidência imediata aos feitos em tramitação nesta Corte, não-obstante remetidos pelo juízo a quo na vigência do anterior Diploma Processual.
II - O benefício de assistência social (artigo 203, V, da Constituição Federal) foi instituído com o escopo de prestar amparo aos idosos e deficientes que, em razão da hipossuficiência em que se acham, não tenham meios de prover a própria subsistência ou de tê-la provida por suas respectivas famílias.
III - O implemento etário restou demonstrado pela documentação pessoal da parte autora.
IV - Estudo social realizado demonstra que a família da parte autora deteria recursos para cobrir os gastos ordinários e os cuidados especiais que lhe são imprescindíveis, não estando configurada, assim, situação de miserabilidade.
V - A concessão de benefício assistencial não tem caráter de complementação de renda familiar, o que, por certo, traria distorção ao propósito da instituição do benefício no universo da assistência social.
VI - Benefício indeferido. Remessa necessária não conhecida. Apelação da autárquica provida.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Oitava Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, não conhecer da remessa necessária, e dar provimento à apelação autárquica, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.


São Paulo, 05 de junho de 2017.
DAVID DANTAS
Desembargador Federal


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APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 0010002-92.2014.4.03.9999/SP
2014.03.99.010002-6/SP
RELATOR:Desembargador Federal DAVID DANTAS
APELANTE:Instituto Nacional do Seguro Social - INSS
APELADO(A):JAIR FIGUEIRA BONELLI
ADVOGADO:SP322504 MARIA ADRIANA DE OLIVEIRA
REMETENTE:JUIZO DE DIREITO DA 1 VARA DE ARARAS SP
No. ORIG.:10.00.00217-1 1 Vr ARARAS/SP

RELATÓRIO

O EXMO. SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL DAVID DANTAS:


Cuida-se de ação proposta em 22/04/2010 com vistas à concessão de benefício assistencial, previsto no artigo 203, inciso V, da Constituição Federal.

Documentos acostados à exordial (fls. 12-17).


Parecer do Ministério Público do Estado de São Paulo (fl. 19).


Deferidos à parte autora os benefícios da assistência judiciária gratuita (fl. 20).


Citação em 22/10/2010 (fl. 28).


Estudo socioeconômico (fls. 102-104).


Parecer do Ministério Público do Estado de São Paulo (fls. 121-126).

Sentença prolatada em 05/11/2013. Julgado procedente o pedido (fls. 121-126).


Apelação do INSS e contrarrazões (fls. 133-135 e fls. 139-142).


Decisão proferida por esta E. Corte, anulando a r. sentença prolatada, e determinando a devolução dos autos ao Juízo de origem, para realização de nova perícia socioeconômica (fls. 158-159 v.).


Baixa dos autos a Instância inferior, em 17/11/2014 (fls. 163).


Estudo socioeconômico (fls. 120-140).


A r. sentença, prolatada em 09/09/2015, julgou procedente o pedido e antecipou os efeitos jurídicos da tutela. Determinado o pagamento do benefício, no valor de um salário mínimo mensal, desde a data da citação. Sentença submetida ao reexame oficial (fls. 195-200).


Apelação do INSS. No mérito, pugnou, em suma, pela reforma integral do julgado (fls. 213-218).


Com contrarrazões (fls. 221-225) subiram os autos a este Egrégio Tribunal.


É o relatório.



DAVID DANTAS
Desembargador Federal


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APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 0010002-92.2014.4.03.9999/SP
2014.03.99.010002-6/SP
RELATOR:Desembargador Federal DAVID DANTAS
APELANTE:Instituto Nacional do Seguro Social - INSS
APELADO(A):JAIR FIGUEIRA BONELLI
ADVOGADO:SP322504 MARIA ADRIANA DE OLIVEIRA
REMETENTE:JUIZO DE DIREITO DA 1 VARA DE ARARAS SP
No. ORIG.:10.00.00217-1 1 Vr ARARAS/SP

VOTO

O EXMO. SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL DAVID DANTAS:

Ab initio, insta salientar que em virtude da alteração legislativa decorrente da entrada em vigor do novo Código de Processo Civil (Lei 13.105/2015), a remessa oficial a qual foi submetida a r. sentença pelo douto Juiz a quo, não há de ser conhecida, consoante as seguintes considerações.


DA REMESSA NECESSÁRIA


O novo Estatuto processual trouxe inovações no tema da remessa ex officio, mais especificamente, estreitou o funil de demandas cujo transito em julgado é condicionado ao reexame pelo segundo grau de jurisdição, para tanto elevou o valor de alçada, verbis:

"Art. 496. Está sujeita ao duplo grau de jurisdição, não produzindo efeito senão depois de confirmada pelo tribunal, a sentença:
I - proferida contra a União, os Estados, o Distrito Federal, os Municípios e suas respectivas autarquias e fundações de direito público;
II - que julgar procedentes, no todo ou em parte, os embargos à execução fiscal.
§ 1o Nos casos previstos neste artigo, não interposta a apelação no prazo legal, o juiz ordenará a remessa dos autos ao tribunal, e, se não o fizer, o presidente do respectivo tribunal avocá-los-á.
§ 2o Em qualquer dos casos referidos no § 1o, o tribunal julgará a remessa necessária.
§ 3o Não se aplica o disposto neste artigo quando a condenação ou o proveito econômico obtido na causa for de valor certo e líquido inferior a:
I - 1.000 (mil) salários-mínimos para a União e as respectivas autarquias e fundações de direito público;
...
§ 4o Também não se aplica o disposto neste artigo quando a sentença estiver fundada em:
I - súmula de tribunal superior;
II - acórdão proferido pelo Supremo Tribunal Federal ou pelo Superior Tribunal de Justiça em julgamento de recursos repetitivos;
III - entendimento firmado em incidente de resolução de demandas repetitivas ou de assunção de competência;
IV - entendimento coincidente com orientação vinculante firmada no âmbito administrativo do próprio ente público, consolidada em manifestação, parecer ou súmula administrativa."

Convém recordar que no antigo CPC, dispensava do reexame obrigatório a sentença proferida nos casos CPC, art. 475, I e II sempre que a condenação, o direito controvertido, ou a procedência dos embargos em execução da dívida ativa não excedesse a 60 (sessenta) salários mínimos. Contrario sensu, aquelas com condenação superior a essa alçada deveriam ser enviadas à Corte de segundo grau para que pudesse receber, após sua cognição, o manto da coisa julgada.


Pois bem. A questão que se apresenta, no tema Direito Intertemporal, é de se saber se as demandas remetidas ao Tribunal antes da vigência do Novo Diploma Processual - e, consequentemente, sob a égide do antigo CPC -, vale dizer, demandas com condenações da União e autarquias federais em valor superior a 60 salários mínimos, mas inferior a 1000 salários mínimos, se a essas demandas aplicar-se-ia o novel Estatuto e com isso essas remessas não seriam conhecidas (por serem inferiores a 1000 SM), e não haveria impedimento - salvo recursos voluntários das partes - ao seu trânsito em julgado; ou se, pelo contrário, incidiria o antigo CPC (então vigente ao momento em que o juízo de primeiro grau determinou envio ao Tribunal) e persistiria, dessa forma, o dever de cognição pela Corte Regional para que, então, preenchida fosse a condição de eficácia da sentença.


Para respondermos, insta ser fixada a natureza jurídica da remessa oficial.

Natureza Jurídica Da Remessa Oficial


Cuida-se de condição de eficácia da sentença, que só produzirá seus efeitos jurídicos após ser ratificada pelo Tribunal.


Portanto, não se trata o reexame necessário de recurso, vez que a legislação não a tipificou com essa natureza processual.


Apenas com o reexame da sentença pelo Tribunal haverá a formação de coisa julgada e a eficácia do teor decisório.


Ao reexame necessário aplica-se o principio inquisitório (e não o principio dispositivo, próprio aos recursos), podendo a Corte de segundo grau conhecer plenamente da sentença e seu mérito, inclusive para modificá-la total ou parcialmente. Isso ocorre por não ser recurso, e por a remessa oficial implicar efeito translativo pleno, o que, eventualmente, pode agravar a situação da União em segundo grau.


Finalidades e estrutura diversas afastam o reexame necessário do capítulo recursos no processo civil.


Em suma, constitui o instituto em "condição de eficácia da sentença", e seu regramento será feito por normas de direito processual.


Direito Intertemporal


Como vimos, não possuindo a remessa oficial a natureza de recurso, na produz direito subjetivo processual para as partes, ou para a União. Esta, enquanto pessoa jurídica de Direito Público, possui direito de recorrer voluntariamente. Aqui temos direitos subjetivos processuais. Mas não os temos no reexame necessário, condição de eficácia da sentença que é.


A propósito oportuna lição de Nelson Nery Jr.:


"A remessa necessária não é recurso, mas condição de eficácia da sentença. Sendo figura processual distinta da do recurso, a ela não se aplicavam as regras do direito intertemporal processual vigente para os eles: a) cabimento do recurso rege-se pela lei vigente à época da prolação da decisão; b) o procedimento do recurso rege-se pela lei vigente à época em que foi efetivamente interposto o recurso - Nery. Recursos, n. 37, pp. 492/500. Assim, a L 10352/01, que modificou as causas em que devem ser obrigatoriamente submetidas ao reexame do tribunal , após a sua entrada em vigor , teve aplicação imediata aos processos em curso. Consequentemente, havendo processo pendente no tribunal, enviado mediante a remessa necessária do regime antigo, o tribunal não poderá conhecer da remessa se a causa do envio não mais existe no rol do CPC 475. É o caso por exemplo, da sentença que anulou o casamento, que era submetida antigamente ao reexame necessário (ex- CPC 475 I), circunstância que foi abolida pela nova redação do CPC 475, dada pela L 10352/01. Logo, se os autos estão no tribunal apenas para o reexame de sentença que anulou o casamento, o tribunal não pode conhecer da remessa ." (in Código de Processo Civil Comentado e Legislação Extravagante, 11ª edição, pág. 744.)

Por consequência, como o Novo CPC modificou o valor de alçada para causas que devem obrigatoriamente ser submetidas ao segundo grau de jurisdição, dizendo que não necessitam ser confirmadas pelo Tribunal condenações da União em valores inferiores a 1000 salários mínimos, esse preceito tem incidência imediata aos feitos em tramitação nesta Corte, inobstante remetidos pelo juízo a quo na vigência do anterior Diploma Processual.


Consequentemente, in casu se não legitima o reexame necessário, uma vez que, notoriamente, o valor da condenação não excede o limite de 1.000 salários mínimos, consoante fundamentação supra. Assim, não conheço da remessa necessária.

Passo ao mérito.

Trata-se de recurso de apelação interposto pelo INSS contra sentença que julgou procedente pedido de benefício assistencial a pessoa idosa e hipossuficiente.


O benefício de assistência social foi instituído com o escopo de prestar amparo aos idosos e deficientes que, em razão da hipossuficiência em que se acham, não tenham meios de prover a própria subsistência ou de tê-la provida por suas respectivas famílias. Neste aspecto está o lastro social do dispositivo inserido no artigo 203, V, da Constituição Federal, que concretiza princípios fundamentais, tais como o de respeito à cidadania e à dignidade humana, ao preceituar o seguinte:


"Art. 203. A assistência social será prestada a quem dela necessitar, independentemente de contribuição à seguridade social e tem por objetivos:
(...)
V - a garantia de um salário mínimo de benefício mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria subsistência ou de tê-la provida por sua família, conforme dispuser a lei".

De outro giro, os artigos 20, § 3º, da Lei nº 8.742/93, com redação dada pela Lei nº 12.435, de 06 de julho de 2011, e o art. 34, da Lei nº 10.741 (Estatuto do Idoso), de 1º de outubro de 2003 rezam, in verbis:


"Art. 20. O Benefício de prestação continuada é a garantia de um salário mínimo mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais e que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção e nem de tê-la provida por sua família.
§ 3º - Considera-se incapaz de prover a manutenção da pessoa portadora de deficiência ou idosa a família cuja renda "per capita" seja inferior a ¼ do salário mínimo".
"Art. 34. Aos idosos, a partir de 65 (sessenta e cinco) anos, que não possuam meios para prover sua subsistência, nem de tê-la provida por sua família, é assegurado o benefício mensal de 1(um) salário-mínimo, nos termos da Lei da Assistência Social - Loas.
Parágrafo único. O benefício já concedido a qualquer membro da família nos termos do caput não será computado para os fins do cálculo da renda familiar per capita a que se refere a Loas."

O apontado dispositivo legal, aplicável ao idoso, procedeu a uma forma de limitação do mandamento constitucional, eis que conceituou como pessoa necessitada, apenas, aquela cuja família tenha renda inferior à 1/4 (um quarto) do salário-mínimo, levando em consideração, para tal desiderato, cada um dos elementos participantes do núcleo familiar, exceto aquele que já recebe o benefício de prestação continuada, de acordo com o parágrafo único, do art. 34, da Lei nº 10.741/03.


De mais a mais, a interpretação deste dispositivo legal na jurisprudência tem sido extensiva, admitindo-se que a percepção de benefício assistencial, ou mesmo previdenciário com renda mensal equivalente ao salário mínimo, seja desconsiderada para fins de concessão do benefício assistencial previsto na Lei nº 8.742/93.


Ressalte-se, por oportuno, que os diplomas legais acima citados foram regulamentados pelo Decreto nº 6.214/07, o qual em nada alterou a interpretação das referidas normas, merecendo destacamento o art. 4º, inc. VI e o art. 19, caput e parágrafo único do referido decreto, in verbis:


"Art. 4º Para fins do reconhecimento do direito ao benefício, considera-se:
(...)
VI - renda mensal bruta familiar: a soma dos rendimentos brutos, auferidos mensalmente pelos membros da família composta por salários, proventos, pensões, pensões alimentícias, benefícios da previdência pública ou privada, comissões, pró-labore, outros rendimentos do trabalho não assalariado, rendimentos do mercado informal ou autônomo, rendimentos auferidos do patrimônio, Renda Mensal Vitalícia e Benefício de Prestação Continuada, ressalvado o disposto no parágrafo único do art. 19".
"Art. 19. O Benefício de Prestação Continuada será devido a mais de um membro da mesma família enquanto atendidos os requisitos exigidos neste Regulamento.
Parágrafo único. O valor do Benefício de Prestação Continuada concedido a idoso não será computado no cálculo da renda mensal bruta familiar a que se refere o inciso VI do art. 4º, para fins de concessão do Benefício de Prestação Continuada a outro idoso da mesma família".

A inconstitucionalidade do parágrafo 3º do artigo 20 da mencionada Lei nº 8.742/93 foi arguida na ADIN nº 1.232-1/DF que, pela maioria de votos do Plenário do Supremo Tribunal Federal, foi julgada im procedente. Para além disso, nos autos do agravo regimental interposto na reclamação n.º 2303-6, do Rio Grande do Sul, interposta pelo INSS, publicada no DJ de 01.04.2005, p. 5-6, Rel. Min. Ellen Gracie, o acórdão do STF restou assim ementado:


"RECLAMAÇÃO. SALÁRIO MÍNIMO. PORTADOR DE DEFICIÊNCIA E IDOSO. ART. 203. CF.
- A sentença impugnada ao adotar a fundamentação defendida no voto vencido afronta o voto vencedor e assim a própria decisão final da ADI 1232.
- Reclamação procedente ".

Evidencia-se que o critério fixado pelo parágrafo 3º do artigo 20 da LOAS é o único apto a caracterizar o estado de necessidade indispensável à concessão da benesse em tela. Em outro falar, aludida situação de fato configuraria prova inconteste de necessidade do benefício constitucionalmente previsto, de modo a tornar dispensáveis elementos probatórios outros.


Assim, deflui dessa exegese o estabelecimento de presunção objetiva absoluta de estado de penúria ao idoso ou deficiente cuja partilha da renda familiar resulte para si montante inferior a 1/4 do salário mínimo.


Não se desconhece notícia constante do Portal do Supremo Tribunal Federal, de que aquela Corte, em recente deliberação, declarou a inconstitucionalidade dos dispositivos legais em voga (Plenário, na Reclamação 4374, e Recursos Extraordinários - REs 567985 e 580963, estes com repercussão geral, em 17 e 18 de abril de 2013, reconhecendo-se superado o decidido na ADI 1.232-DF), do que não mais se poderá aplicar o critério de renda per capita de ¼ do salário mínimo para fins de aferição da miserabilidade.


Em outras palavras: deverá sobrevir análise da situação de hipossuficiência porventura existente, consoante a renda informada, caso a caso.


In casu, a parte autora, nascida em 15/06/1940 (fl. 12), logrou comprovar o cumprimento do requisito etário já à época do aforamento da demanda (fl. 12).

Por sua vez, laudo social elaborado em 15/04/2015 (fls. 177-188), revela que o núcleo familiar era constituído pela própria parte autora, 75 anos de idade, e por seu cônjuge, Jair Bonelli, 78 anos de idade, aposentado.


O núcleo familiar residia em casa própria, construída em alvenaria, constituída por uma sala, dois dormitórios, cozinha e um banheiro, com garagem coberta, quintal cimentado e área de serviço em forma de edícula nos fundos. O estado de conservação do imóvel foi classificado como "bom"; possuía laje em todos os cômodos, "com piso em todos os cômodos", e revestimento no banheiro e cozinha.

A residência encontrava-se guarnecida com os móveis básicos, com dois aparelhos de televisão, sendo um novo na sala, e um mais antigo no dormitório. Além disso, a residência também possuía linha telefônica fixa instalada.

A renda familiar era constituída pelos proventos de aposentadoria do cônjuge da autora, em valor (líquido) superior a um salário-mínimo mensal (R$ 929,60), à época estabelecido em R$ 788,00.


A despesa mensal do núcleo familiar compreendia gastos com, energia elétrica (R$ 60,00), água (R$ 55,00). Segundo a autora, a conta telefônica, no valor de R$ 42,54, era paga pelas filhas, assim como seu convênio médico, no valor de R$ 552,20 por mês.


Ressalto que não procede a justificativa da demandante de que tem que comprar todos os medicamentos que utiliza em razão deles não fazerem parte da lista de distribuição gratuita, e de que não são aceitos no SUS os receituários fornecidos pelos profissionais dos planos de saúde. Primeiro, a maioria dos medicamentos elencados no estudo social consta da Relação Nacional de Medicamentos Essenciais - RENAME. Segundo, a Portaria 2928/2011, que regulamenta a dispensação de medicamentos no SUS, dispõe que documentos provenientes do serviço privado de saúde também são aceitos.


Restou demonstrado que a parte autora tem todas suas necessidades básicas supridas; considerando que ela percebe auxílio financeiro contínuo das filhas, no qual se inclui convênio médico particular de valor equivalente a 70% do salário-mínimo vigente à época, medicamentos que totalizavam R$ 334,00 por mês adquiridos em farmácias particulares, e toda sua alimentação, pois a autora sequer soube declinar o valor de tal despesa, ainda que de forma aproximada.


Assim, in casu, a renda per capita do núcleo familiar, no valor aproximado de R$ 463,00 por mês, ultrapassa sobremaneira o limite legal, e não se verificam outros elementos subjetivos bastantes para se afirmar que se trata de família que viveria em estado de miserabilidade.


De tudo, conclui-se que os recursos obtidos pela família da parte requerente encontram-se, pois, suficientes para cobrir os gastos ordinários e os cuidados especiais que lhes sejam imprescindíveis, não estando configurada situação de miserabilidade.


Cabe ressaltar, por oportuno, que a concessão de benefício assistencial não tem caráter de complementação de renda familiar, o que, por certo, traria distorção ao propósito da instituição do benefício no universo da assistência social. Ademais, a assistência social estatal é subsidiária àquela que deve ser prestada pelos familiares, notadamente pelos filhos aos pais idosos.

Neste diapasão, não comprovados pela parte autora todos os requisitos necessários, não faz ela jus à concessão do benefício assistencial, devendo ser reformada a r. sentença.


Por conseguinte, impõe-se a cassação da tutela jurisdicional deferida pelo r. Juízo de Primeira Instância. Determino seja remetida esta decisão por via eletrônica à autoridade administrativa, a fim de que seja cessado o pagamento do benefício ora pleiteado, após o trânsito em julgado.


Consoante entendimento firmado pela Terceira Seção desta Corte, deixo de condenar a parte autora ao pagamento de custas, despesas processuais e honorários advocatícios, porquanto beneficiária da assistência judiciária gratuita (TRF - 3ª Seção, AR n.º 2002.03.00.014510-0/SP, Rel. Des. Fed. Marisa Santos, j. 10.05.2006, v.u., DJU 23.06.06, p. 460).


Isso posto, não conheço da remessa necessária, e dou provimento à apelação autárquica.

É COMO VOTO.

DAVID DANTAS
Desembargador Federal


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Data e Hora: 05/06/2017 17:55:26



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