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. TRF3. 0001354-11.2013.4.03.6006

Data da publicação: 11/07/2020 22:16:46

PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE. RURÍCOLA. REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. ARTS. 39, I, 48, § 1º e 143 DA LEI 8.213/91. PROVAS MATERIAL E TESTEMUNHAL. CONJUNTO PROBATÓRIO INSUFICIENTE. FAMÍLIA COM OUTRAS FONTES DE SUBSISTÊNCIA. REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR NÃO-CARACTERIZADO. BENEFÍCIO INDEFERIDO. I - Preceitua a Lei 8.213/91, em seus arts. 39, I, 48, §1º e 143, que o benefício da aposentadoria por idade dos trabalhadores rurais em regime de economia familiar é devido ao segurado especial, assim considerado pelo art. 11, VII, do diploma legal citado, que completar 60 anos de idade, se homem, ou 55 anos, se mulher, e comprovar o exercício da atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período equivalente à carência exigida, nos termos dos arts. 26, III, e 142, do referido texto legal. II - A percepção de rendas provenientes dos salários do marido e do filho solteiro da autora, bem como do aluguel de um imóvel residencial, descaracteriza o regime de economia familiar, nos termos do art. 11, VII, § 1º da Lei 8.213/91, uma vez que a alegada atividade exercida no meio rural pela demandante e um de seus filhos não seria sua única fonte de subsistência. III - Insuficiência do conjunto probatório (documentos e testemunhas). IV - Benefício indeferido. Apelação autárquica provida. (TRF 3ª Região, OITAVA TURMA, Ap - APELAÇÃO CÍVEL - 2129449 - 0001354-11.2013.4.03.6006, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL DAVID DANTAS, julgado em 27/06/2016, e-DJF3 Judicial 1 DATA:11/07/2016 )


Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

D.E.

Publicado em 12/07/2016
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0001354-11.2013.4.03.6006/MS
2013.60.06.001354-5/MS
RELATOR:Desembargador Federal DAVID DANTAS
APELANTE:Instituto Nacional do Seguro Social - INSS
PROCURADOR:LEANDRO KONJEDIC e outro(a)
ADVOGADO:SP000030 HERMES ARRAIS ALENCAR
APELADO(A):ROZIMEIRE APARECIDA BARBOSA SOARES
ADVOGADO:MS016851 ANGELICA DE CARVALHO CIONI e outro(a)
No. ORIG.:00013541120134036006 1 Vr NAVIRAI/MS

EMENTA

PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE. RURÍCOLA. REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. ARTS. 39, I, 48, § 1º e 143 DA LEI 8.213/91. PROVAS MATERIAL E TESTEMUNHAL. CONJUNTO PROBATÓRIO INSUFICIENTE. FAMÍLIA COM OUTRAS FONTES DE SUBSISTÊNCIA. REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR NÃO-CARACTERIZADO. BENEFÍCIO INDEFERIDO.
I - Preceitua a Lei 8.213/91, em seus arts. 39, I, 48, §1º e 143, que o benefício da aposentadoria por idade dos trabalhadores rurais em regime de economia familiar é devido ao segurado especial, assim considerado pelo art. 11, VII, do diploma legal citado, que completar 60 anos de idade, se homem, ou 55 anos, se mulher, e comprovar o exercício da atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período equivalente à carência exigida, nos termos dos arts. 26, III, e 142, do referido texto legal.
II - A percepção de rendas provenientes dos salários do marido e do filho solteiro da autora, bem como do aluguel de um imóvel residencial, descaracteriza o regime de economia familiar, nos termos do art. 11, VII, § 1º da Lei 8.213/91, uma vez que a alegada atividade exercida no meio rural pela demandante e um de seus filhos não seria sua única fonte de subsistência.
III - Insuficiência do conjunto probatório (documentos e testemunhas).
IV - Benefício indeferido. Apelação autárquica provida.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Oitava Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar provimento à apelação autárquica, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.


São Paulo, 27 de junho de 2016.
DAVID DANTAS
Desembargador Federal


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Data e Hora: 27/06/2016 18:43:11



APELAÇÃO CÍVEL Nº 0001354-11.2013.4.03.6006/MS
2013.60.06.001354-5/MS
RELATOR:Desembargador Federal DAVID DANTAS
APELANTE:Instituto Nacional do Seguro Social - INSS
PROCURADOR:LEANDRO KONJEDIC e outro(a)
ADVOGADO:SP000030 HERMES ARRAIS ALENCAR
APELADO(A):ROZIMEIRE APARECIDA BARBOSA SOARES
ADVOGADO:MS016851 ANGELICA DE CARVALHO CIONI e outro(a)
No. ORIG.:00013541120134036006 1 Vr NAVIRAI/MS

RELATÓRIO

O SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL DAVID DANTAS:


Cuida-se de ação previdenciária proposta em 14/10/2013 com vistas à concessão de aposentadoria por idade a trabalhadora rural.


Documentos (fls. 22-83).


Deferidos à parte autora os benefícios da assistência judiciária gratuita (fl. 86).


Citação, em 14/11/2013 (fls. 88).


Prova testemunhal (fls. 106-111).


A r. sentença, prolatada em 24/04/2015, julgou procedente o pedido. Deferida a concessão do benefício sub judice, no valor de um salário-mínimo mensal, desde a data do pedido administrativo, 24/04/2013 (fls. 129-132).

O réu interpôs recurso de apelação. No mérito, pleiteia a reforma da sentença em virtude da ausência de comprovação do labor rural pelo tempo exigido. Para o caso de manutenção do decisum, requer seja o termo inicial do benefício fixado na data da audiência de conciliação e julgamento; a redução da verba honorária para 5% (cinco por cento), incidente somente sobre o valor das parcelas vencidas até a data da sentença, e incidência de correção monetária e juros de mora de acordo com o art. 1º-F da Lei 9.494/97, com a redação dada pela Lei 11.960/09 (fls. 135-142).


Com contrarrazões da parte autora (fls. 149-161), subiram os autos a este Egrégio Tribunal.


É o relatório.



DAVID DANTAS
Desembargador Federal


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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0001354-11.2013.4.03.6006/MS
2013.60.06.001354-5/MS
RELATOR:Desembargador Federal DAVID DANTAS
APELANTE:Instituto Nacional do Seguro Social - INSS
PROCURADOR:LEANDRO KONJEDIC e outro(a)
ADVOGADO:SP000030 HERMES ARRAIS ALENCAR
APELADO(A):ROZIMEIRE APARECIDA BARBOSA SOARES
ADVOGADO:MS016851 ANGELICA DE CARVALHO CIONI e outro(a)
No. ORIG.:00013541120134036006 1 Vr NAVIRAI/MS

VOTO

O SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL DAVID DANTAS:

Do benefício de aposentadoria por idade ai trabalhador rural


A Lei Complementar nº 11, de 25 de maio de 1971, que instituiu o Fundo de Assistência ao Trabalhador rural - FUNRURAL, em seu art. 4º, dispunha ser a aposentadoria por velhice devida ao trabalhador rural que completasse 65 (sessenta e cinco) anos. Em 30 de outubro de 1973, foi publicada a Lei Complementar nº 16, que alterou dispositivos da supracitada lei e fixou, no seu art. 5º, que a qualidade de trabalhador rural dependeria da comprovação de sua atividade pelo menos nos últimos três anos anteriores à data do pedido do benefício, ainda que de forma descontínua.

Também o Decreto nº 83.080, de 24 de janeiro de 1979, que aprovou o Regulamento dos Benefícios da Previdência Social dispunha, litteris:

"Art. 297. A aposentadoria por velhice é devida, a contar da data da entrada do requerimento, ao trabalhador rural que completa 65 (sessenta e cinco) anos de idade e é o chefe ou arrimo de unidade familiar, em valor igual ao da aposentadoria por invalidez (artigo 294)".

A Constituição Federal de 1988 trouxe, em sua redação original, o art. 202, I, in verbis:

"Art. 202. É assegurada aposentadoria, nos termos da lei, calculando-se o benefício sobre a média dos trinta e seis últimos salários de contribuição, corrigidos monetariamente mês a mês, e comprovada a regularidade dos reajustes dos salários de contribuição de modo a preservar seus valores reais e obedecidas as seguintes condições:
I - aos sessenta e cinco anos de idade, para o homem, e aos sessenta, para a mulher, reduzido em cinco anos o limite de idade para os trabalhadores rurais de ambos os sexos e para os que exerçam suas atividades em regime de economia familiar, neste incluídos o produtor rural, o garimpeiro e o pescador artesanal." (grifei).
A partir da edição da Lei 8.213/91, tal dispositivo constitucional foi definitivamente regulamentado e, portanto, a idade para a concessão da aposentadoria do trabalhador rural diminuída para 60 (sessenta anos), se homem, e 55 (cinquenta e cinco), se mulher.

Enquanto a Lei Complementar nº 16/73 exigia que o beneficiário comprovasse o exercício da atividade rural por pelo menos 3 (três) anos, o período de carência estabelecido pela Lei 8.213, de 24 de julho de 1991, é aquele a que remete a tabela progressiva constante do seu art. 142.

Também neste sentido preceitua a Lei 8.213/91, ao prescrever em seus arts. 39, I, 48, §1º e 143 que o benefício da aposentadoria por idade dos trabalhadores rurais em regime de economia familiar é devido ao segurado especial, assim considerado pelo art. 11, VII, do diploma legal citado, que completar 60 (sessenta) anos de idade, se homem, ou 55 (cinquenta e cinco) anos, se mulher, e comprovar o exercício da atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período equivalente à carência exigida, nos termos dos arts. 26, III, e 142, do referido texto legal.

A lei deu tratamento diferenciado ao rurícola e ao produtor rural em regime de economia familiar, dispensando-os do período de carência, que é o número mínimo de contribuições mensais necessárias para a concessão do benefício, a teor do que preceitua o art. 26, III, c.c. o art. 39, I, ambos da Lei 8.213/91, bastando comprovar, tão-somente, o exercício da atividade rural nos termos da tabela progressiva, de caráter transitório, prevista no art. 142 da Lei Previdenciária, que varia de acordo com o ano de implementação das condições legais.
O benefício de aposentadoria por idade, ao trabalhador rural, encontra-se disciplinado nos artigos 39, inciso I, 48 e 143, da Lei 8.213/91.

Além do requisito etário, o trabalhador rural deve comprovar o exercício de atividade rural, mesmo que descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, em número de meses idêntico à carência do benefício.

O dispositivo legal citado deve ser analisado em consonância com o artigo 142, que assim dispõe:

"Art. 142. Para o segurado inscrito na Previdência Social urbana até 24 de julho de 1991, bem como para o trabalhador e empregador rural cobertos pela Previdência Social rural, a carência das aposentadorias por idade, por tempo de serviço e especial obedecerá a seguinte tabela, levando-se em conta o ano em que o segurado implementou todas as condições necessárias à obtenção do benefício. (...)".
Não se exige do trabalhador rural o cumprimento de carência, como dever de verter contribuição por determinado número de meses, senão a comprovação do exercício laboral durante o período respectivo.

Pois bem.

No que se refere à comprovação do labor campesino, algumas considerações se fazem necessárias, uma vez que balizam o entendimento deste Relator no que diz com a valoração das provas comumente apresentadas.

Declarações de Sindicato de Trabalhadores Rurais fazem prova do quanto nelas alegado, desde que devidamente homologadas pelo Ministério Público ou pelo INSS, órgãos competentes para tanto, nos exatos termos do que dispõe o art. 106, III, da Lei 8.213/91, seja em sua redação original, seja com a alteração levada a efeito pela Lei 9.063/95.


Na mesma seara, declarações firmadas por supostos ex-empregadores ou subscritas por testemunhas, noticiando a prestação do trabalho na roça, não se prestam ao reconhecimento então pretendido, tendo em conta que equivalem a meros depoimentos reduzidos a termo, sem o crivo do contraditório, conforme entendimento já pacificado no âmbito desta Corte.


Igualmente não alcançam os fins pretendidos, a apresentação de documentos comprobatórios da posse da terra pelos mesmos ex-empregadores, visto que não trazem elementos indicativos da atividade exercida pela parte requerente.

Já a mera demonstração, por parte do autor, de propriedade rural, só se constituirá em elemento probatório válido desde que traga a respectiva qualificação como lavrador ou agricultor. No mesmo sentido, a simples filiação a sindicato rural só será considerada mediante a juntada dos respectivos comprovantes de pagamento das mensalidades.


Tem-se, por definição, como início razoável de prova material, documentos que tragam a qualificação da parte autora como lavrador, v.g., assentamentos civis ou documentos expedidos por órgãos públicos. Nesse sentido: STJ, 5ª Turma, REsp nº 346067, Rel. Min. Jorge Scartezzini, v.u., DJ de 15.04.2002, p. 248.


Da mesma forma, a qualificação de um dos cônjuges como lavrador se estende ao outro, a partir da celebração do matrimônio, consoante remansosa jurisprudência já consagrada pelos Tribunais.


Na atividade desempenhada em regime de economia familiar, toda a documentação comprobatória, como talonários fiscais e títulos de propriedade, é expedida, em regra, em nome daquele que faz frente aos negócios do grupo familiar. Ressalte-se, contudo, que nem sempre é possível comprovar o exercício da atividade em regime de economia familiar através de documentos. Muitas vezes o pequeno produtor cultiva apenas o suficiente para o consumo da família e, caso revenda o pouco do excedente, não emite a correspondente nota fiscal, cuja eventual responsabilidade não está sob análise nesta esfera. O homem simples, oriundo do meio rural, comumente efetua a simples troca de parte da sua colheita por outros produtos de sua necessidade que um sitiante vizinho eventualmente tenha colhido ou a entrega como forma de pagamento pela parceria na utilização do espaço de terra cedido para plantar.


De qualquer forma, é entendimento já consagrado pelo C. Superior Tribunal de Justiça (AG nº 463855, Ministro Paulo Gallotti, Sexta Turma, j. 09/09/03) que documentos apresentados em nome dos pais, ou outros membros da família, que os qualifiquem como lavradores, constituem início de prova do trabalho de natureza rurícola dos filhos.


O trabalho urbano de membro da família não descaracteriza, por si só, o exercício de trabalho rural em regime de economia familiar de outro. Para ocorrer essa descaracterização, é necessária a comprovação de que a renda obtida com a atividade urbana é suficiente à subsistência da família.


O art. 106 da Lei 8.213/91 apresenta um rol de documentos que não configura numerus clausus, já que o "sistema processual brasileiro adotou o princípio do livre convencimento motivado" (AC nº 94.03.025723-7/SP, TRF 3ª Região, Rel. Juiz Souza Pires, 2º Turma, DJ 23/11/1994, p. 67691), cabendo ao Juízo, portanto, a prerrogativa de decidir sobre a sua validade e a sua aceitação.


Aprecio também a questão, insistentemente trazida à discussão pelo Ente Previdenciário, de que a comprovação do exercício da atividade rural deva se referir ao período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, tal como estabelecido no art. 143 da Lei 8.213/91, com redação alterada pela Lei 9.063/95.

Adoto o entendimento que inexiste a exigência de que o tempo de trabalho rural deva ser exercido no período imediatamente anterior ao requerimento. Com efeito, a Lei 10.666/2003 dispõe:


"Art. 3º. A perda da qualidade de segurado não será considerada para a concessão das aposentadorias por tempo de contribuição e especial.
§1º. Na hipótese de aposentadoria por idade, a perda da qualidade de segurado não será considerada para a concessão desse benefício, desde que o segurado conte com, no mínimo, o tempo de contribuição correspondente ao exigido para efeito de carência na data do requerimento do benefício."

Ora, vê-se que a lei não distinguiu entre trabalhadores urbanos e rurais, ao introduzir o preceito de que a perda da qualidade de segurado não infirma o direito à aposentadoria por tempo de contribuição ou por idade, se os requisitos do tempo de contribuição e da carência foram adimplidos em momento anterior.

A circunstância, ainda, de o citado artigo mencionar "tempo de contribuição" não exclui o rurícola, pois o legislador contentou-se aqui em explicitar o requisito geral, que é o da contribuição, nem por isso tencionando afastar de sua abrangência o trabalhador rural que, em alguns casos, por norma especial, é dispensado dos recolhimentos; ademais, o raciocínio albergado pela lei é aplicável do ponto de vista fático tanto aos urbanos como aos rurais, sendo de invocar-se o brocardo Ubi eadem ratio ibi idem jus.


A equiparação dos trabalhadores urbanos e rurais, para fins previdenciários, é garantia da Carta de 1988 e não pode ser olvidada, sem justificativa plausível, sob pena de ofensa ao princípio da isonomia e à previsão contida no seu art. 194, parágrafo único, II.


No entanto, penso que se as lides campesinas foram abandonadas pela parte autora muitos anos antes do implemento do requisito etário, já não há porque se aplicar a redução de 5 (cinco) anos mencionada no art. 48, §1º, da Lei 8.213/1991, uma vez que tal determinação visou proteger o idoso que, submetido às penosas condições do trabalho no campo, teria o direito de aposentar-se mais cedo. Esse, a meu ver, o raciocínio adotado pelo legislador no art. 48, §3º, da Lei de Benefícios, ao prever o afastamento da redução etária se, para completar o tempo de carência, houver contagem de períodos sob outras categorias.


No que se refere ao recolhimento das contribuições previdenciárias, destaco que o dever legal de promover seu recolhimento junto ao INSS e descontar da remuneração do empregado a seu serviço compete exclusivamente ao empregador, por ser este o responsável pelo seu repasse aos cofres da Previdência, a quem cabe a sua fiscalização, possuindo, inclusive, ação própria para haver o seu crédito, podendo exigir do devedor o cumprimento da legislação.

No caso da prestação de trabalho em regime de economia familiar, é certo que o segurado é dispensado do período de carência, nos termos do disposto no art. 26, III, da Lei de Benefícios e, na condição de segurado especial, assim enquadrado pelo art. 11, VII, da legislação em comento, caberia o dever de recolher as contribuições tão-somente se houvesse comercializado a produção no exterior, no varejo, isto é, para o consumidor final, a empregador rural pessoa física ou a outro segurado especial (art. 30, X, da Lei de Custeio).


Por fim, outra questão que suscita debates é a referente ao trabalho urbano eventualmente exercido pelo segurado ou por seu cônjuge, cuja qualificação como lavrador lhe é extensiva. Perfilho do entendimento no sentido de que o desempenho de atividade urbana, de per si, não constitui óbice ao reconhecimento do direito aqui pleiteado, desde que o mesmo tenha sido exercido por curtos períodos, especialmente em época de entressafra, quando o humilde campesino se vale de trabalhos esporádicos em busca da sobrevivência.


Da mesma forma, o ingresso no mercado de trabalho urbano não impede a concessão da aposentadoria rural, na hipótese de já restar ultimada, em tempo anterior, a carência exigida legalmente, considerando não só as datas do início de prova mais remoto e da existência do vínculo empregatício fora da área rural, como também que a prova testemunhal, segura e coerente, enseje a formação da convicção deste julgador acerca do trabalho campesino exercido no período.

Ao caso dos autos.


A parte autora, nascida em 08/03/1958 (fl. 26), implementou o requisito etário (cinquenta e cinco anos de idade) no ano de 2013, devendo, portanto, comprovar o exercício de atividade rural por 180 meses (15 anos).


De início, cumpre esclarecer que, do entendimento combinado dos artigos 2º e 3º da Lei 11.718/08, o que se infere é que não há estabelecimento de prazo decadencial para a hipótese de "aposentadoria rural por idade" após 31/12/2010, mas tão somente o estabelecimento de regras específicas a serem aplicadas para a comprovação de atividade rural após este prazo. Nesse sentido, já decidiu a C. Décima Turma desta Corte:

"DIREITO PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO LEGAL. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. EMPREGADOS E AUTÔNOMOS. REGRA TRANSITÓRIA. DECADÊNCIA. AFASTAMENTO. PROSSEGUIMENTO DA AÇÃO.
...
2. As Leis 11.363/06 e 11.718/08 somente trataram de estender a vigência da regra de transição para os empregados rurais e autônomos, porque, para esses segurados, o Art. 48 da Lei 8.213/91, ao contrário do citado Art. 39, refere-se ao cumprimento da carência, devendo a renda mensal ser não de um salário mínimo, mas calculada de acordo com os salários-de-contribuição.
3. Ainda assim, não previu o legislador a decadência para a hipótese de pedido de aposentadoria por idade formulado por empregados e autônomos, após 31/12/10. O que a Lei 11.718/08 trouxe a esses segurados foi mais uma regra transitória.
...
5. Apelação provida para afastar a prejudicial de mérito (decadência) e determinar o prosseguimento da ação em seus ulteriores termos."
(TRF3. Décima Turma. AC 0019725-43.2011.4.03.9999. Rel. Des. Fed. Baptista Pereira. J. 04.10.2011. DJE 13.10.2011, p. 2079).
Por sua vez, de acordo com o estabelecido no art. 3º da Lei 11.718/08, a partir de 01/01/2011 há necessidade de recolhimento das contribuições previdenciárias, uma vez que o período de 15 anos a que se refere o artigo 143 da Lei 8.213/91 exauriu-se em 31/12/2010, conforme disposto no artigo 2º da Lei 11.718/08, que assim dispõe:

"Art. 2º Para o trabalhador rural empregado, o prazo previsto no art. 143 da Lei nº 8.213, de 24 de julho de 1991, fica prorrogado até o dia 31 de dezembro de 2010."
Entretanto, cabe destacar que, em face do caráter protetivo-social de que se reveste a Previdência Social, não se pode exigir do trabalhador campesino o recolhimento de contribuições previdenciárias, quando é de notório conhecimento a informalidade em que suas atividades são desenvolvidas, cumprindo aqui dizer que, dentro dessa informalidade, verifica-se uma pseudo-subordinação, uma vez que a contratação acontece, ou diretamente pelo produtor rural ou pelos chamados "gatos", seria retirar desta qualquer possibilidade de auferir o benefício conferido em razão do implemento do requisito etário e do cumprimento da carência. Ademais disso, o trabalhador designado "boia-fria" deve ser equiparado ao empregado rural, uma vez que enquadrá-lo na condição de contribuinte individual seria imputar-lhe a responsabilidade contributiva conferida aos empregadores, os quais são responsáveis pelo recolhimento das contribuições daqueles que lhe prestam serviços.

A propósito, colaciono o seguinte aresto:

"PREVIDENCIÁRIO - SALÁRIO- MATERNIDADE - TRABALHADORA RURAL - EMPREGADA - REEXAME NECESSÁRIO - VALOR DA CONDENAÇÃO INFERIOR A 60 SALÁRIOS MÍNIMOS - DISPENSA - INÉPCIA DA INICIAL - LEGITIMIDADE - HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.
1. Sentença que não se submete ao reexame necessário por ter sido proferida após a vigência da Lei nº 10.352/01 e cujo valor da condenação foi inferior a 60 salários-mínimos.
2. Rejeitada a preliminar de inépcia, vez que a inicial bem especifica o pedido e seus fundamentos.
3. Tratando-se de matéria previdenciária, a competência para sua apreciação é da Justiça Federal, bem como das Varas Estaduais nas localidades onde esta não tenha sede, de acordo com o art. 109, § 3º da CF.
4. A responsabilidade pelo pagamento do benefício é do INSS, pois, de acordo com a redação dos Arts. 71 e 72 da Lei 8.213/91, anteriormente à edição da Lei 9876/99, o empregador pagava as prestações do salário-maternidade e compensava o valor em suas contribuições junto ao INSS, que por este motivo, era o responsável final pela prestação. Rejeitada, assim, a preliminar de ilegitimidade passiva.
5. As características do labor desenvolvido pela bóia-fria, demonstram que é empregada rural.
6. Não cabe atribuir à trabalhadora a desídia de empregadores que não providenciam o recolhimento da contribuição decorrente das atividades desenvolvidas por aqueles que lhes prestam serviços, sendo do Instituto Nacional do Seguro Social - INSS a responsabilidade pela fiscalização.
7. Esta Corte tem entendido que, em se tratando de trabalhador rural, havendo início de prova material corroborado por depoimento testemunhal, é de se conceder o benefício.
8. O direito ao salário-maternidade é assegurado pelo art. 7º, XVIII da CF/88.
9. Honorários advocatícios mantidos, eis que fixados de acordo com o labor desenvolvido pelo patrono da autora e nos termos do § 4° do art. 20 CPC.
10. Preliminares rejeitadas. Remessa oficial não conhecida e apelação improvida."
(TRF 3ª Região; AC 837138/SP; 9ª Turma; Rel. Es. Fed. Marisa Santos; j. DJ 02.10.2003, p. 235).

Nos termos da Súmula de nº 149 do Superior Tribunal de Justiça, é necessário que a prova testemunhal venha acompanhada de início razoável de prova documental, in verbis:


"A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeito de obtenção do benefício previdenciário".

No intuito de reforçar sua tese inicial, de exercício laborativo rural, a autora coligiu aos autos cópias dos seguintes documentos:

a) certidão expedida em 09/04/2013 pelo Juízo da 2ª Zona Eleitoral de Naviraí - MS, no sentido de que consta da inscrição da requerente, cuja data não foi informada, a seguinte ocupação: "trabalhador rural" (fl. 31);


b) comprovantes de aquisição de vacina em nome do marido da autora e de Marcos Roberto Soares, datados de 01/11/1999 (Chácara São Paulo), 11/12/2000 (Sítio São Pedro), 27/04/2000, 09/10/2001, 04/03/2002, 27/02/2002, 08/10/2002, 25/02/2003, e 16/02/2005 (Sítio do Doca) (fls. 32-39, 41, e 43);

c) nota fiscal de entrada, datada em 10/03/2004, relativa a venda de leite in natura, em que Marcos Roberto Soares figura como remetente (fl. 48);

d) carnê de mensalidades da Associação dos Pequenos Produtores de Leite In Natura de Naviraí/MS, em nome do cônjuge da demandante, com pagamentos realizados entre novembro de 1999 e abril de 2003 (fls. 62-80)


Quanto à certidão de casamento e à carteira de trabalho da demandante (fls. 27 e 28-30) não se prestam ao fim a que se destina nestes autos, ou seja, comprovar o exercício de atividade laboral no período informado na exordial. Explico.


Na carteira de trabalho em questão consta vínculo laboral no período de 21/05/1983 a 11/12/1985. No período retromencionado a autora exerceu a profissão de zeladora, a atividade de notória natureza urbana.

Na certidão de casamento da parte autora com Joel Soares, ocorrido em 08/02/1975 consta que na ocasião o cônjuge varão era "comerciário" (fl. 27).
Outrossim, o documento de fls. 24-25 encontra-se totalmente ilegível, além disso, é possível verificar-se que se trata de contrato particular, elaborado unilateralmente, portanto, imprestável como prova em juízo.

De outro lado, os depoimentos, pessoal e testemunhais, prestados na audiência realizada em 11/03/2014 (fls. 106-110) foram uníssonos no sentido de que a alegada atividade exercida no meio rural pela autora e sua família não seria sua única fonte de subsistência.

Inicialmente, a autora informou que não reside na propriedade rural, a qual teria sido arrendada do Sr. Hipólito há cinco anos. Confessou que seu cônjuge labora como empregado numa usina "já tem uns dez anos que ele voltou pra usina", assim como um de seus filhos, trabalha como motorista. Além de tais rendas, a família também aufere outra, proveniente do aluguel mensal de uma residência na cidade, no valor de R$ 300,00 por mês.


MARIA SEBASTIANA LENIA afirmou conhecer a parte autora há mais de 14 anos. Afirmou, a autora trabalha num sítio com um filho, mexendo com leite, e que outro filho da autora, solteiro, nome Renato, reside com os genitores e, assim como o pai, também trabalha empregado numa usina, como tratorista.

MARIA MIRANDA DO AMARAL disse conhecer a autora por ser vizinha da sua casa na cidade. Afirmou nunca ter ido ao sítio arrendado pela demandante. Informou que o marido da autora trabalha na usina.


Outrossim, da pesquisa realizada no CNIS - Cadastro Nacional de Informações Social (fl. 53) se extrai que o cônjuge da requerente laborou como empregado durante quase toda a sua vida profissional - de 1976 a 2013, à exceção do período de 2001 a 2006, em que verteu contribuições como contribuinte individual.


A percepção das rendas supramencionadas, provenientes dos salários do marido e do filho solteiro da autora, bem como do aluguel de um imóvel residencial, descaracteriza o regime de economia familiar, nos termos do art. 11, VII, § 1º da Lei 8.213/91, uma vez que a alegada atividade exercida no meio rural pela demandante e um de seus filhos não seria sua única fonte de subsistência.

In casu, portanto, a parte autora logrou êxito em demonstrar o preenchimento da condição etária, porém não o fez quanto à comprovação do labor como rurícola pelo período exigido pela Lei 8.213/91.


Dessa forma, não preenchidos os requisitos legais, é indevido o benefício de aposentadoria por idade pleiteado, devendo ser reformada a r. sentença, na íntegra.


Consoante entendimento firmado pela Terceira Seção desta Corte, deixo de condenar a parte autora ao pagamento de custas, despesas processuais e honorários advocatícios, porquanto beneficiária da assistência judiciária gratuita (TRF - 3ª Seção, AR n.º 2002.03.00.014510-0/SP, Rel. Des. Fed. Marisa Santos, j. 10.05.2006, v.u., DJU 23.06.06, p. 460).


Isso posto, dou provimento à apelação autárquica.

É COMO VOTO.


DAVID DANTAS
Desembargador Federal


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