
D.E. Publicado em 14/06/2016 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Nona Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação do autor e à remessa oficial, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Juiz Federal Convocado
Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
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APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 0003809-59.2012.4.03.6110/SP
RELATÓRIO
O Exmo. Sr. Juiz Federal Convocado Rodrigo Zacharias: Trata-se de ação de conhecimento proposta em face do INSS, na qual a parte autora pleiteia o reconhecimento de tempo de serviços rural e especial, com vistas à concessão da aposentadoria por tempo de contribuição.
A r. sentença julgou parcialmente procedente o pedido para: (i) enquadrar os lapsos especiais de 8/3/1982 a 30/9/1983, de 1º/10/1983 a 28/2/1985, de 1º/3/1985 a 8/10/1987 e de 18/1/1988 a 2/6/1990; (ii) determinar a averbação na contagem; ademais, fixou a sucumbência recíproca.
Decisão submetida ao reexame necessário, à míngua de valor econômico apreciável.
Irresignada, apela a parte autora; exora provimento ao recurso para acolhimento integral do pleito exordial, com o fito de se reconhecer, além dos períodos declarados pelo julgado, os demais lapsos indicados (rural e especial).
Com contrarrazões apresentadas por cota, os autos subiram a esta Egrégia Corte, tendo sido distribuídos a este relator.
É o relatório.
VOTO
O Exmo. Sr. Juiz Federal Convocado Rodrigo Zacharias: Conheço da apelação e da remessa oficial, porquanto presentes os requisitos de admissibilidade.
Passo à análise das questões trazidas a julgamento.
Do tempo de serviço rural
Segundo o artigo 55 e respectivos parágrafos da Lei n. 8.213/91:
Sobre a prova do tempo de exercício da atividade rural, certo é que o legislador, ao garantir a contagem de tempo de serviço sem registro anterior, exigiu o início de prova material, no que foi secundado pelo Colendo Superior Tribunal de Justiça quando da edição da Súmula 149.
Também está assente, na jurisprudência daquela Corte, ser: "(...) prescindível que o início de prova material abranja necessariamente esse período, dês que a prova testemunhal amplie a sua eficácia probatória ao tempo da carência, vale dizer, desde que a prova oral permita a sua vinculação ao tempo de carência." (AgRg no REsp n. 298.272/SP, Relator Ministro Hamilton Carvalhido, in DJ 19/12/2002)
No caso vertente, a parte autora alega ter trabalhado no campo, em regime de economia familiar, entre 1970 e 1981.
À luz do § 1º do artigo 11 da Lei n. 8.213/91, define-se como regime de economia familiar o labor desenvolvido pelos membros da família, indispensável à própria subsistência e exercido em condições de mútua dependência e colaboração, sem a utilização de empregados.
Contudo, não obstante alguns apontamentos indicarem a faina rural (cartão de filiação ao sindicato dos trabalhadores rurais e demonstrativo das contribuições sindicais), o registro de trabalho urbano em CTPS (1977) contradiz as alegações da parte autora.
Outrossim, a parte autora pugnou pelo julgamento antecipado da lide, desistindo da prova testemunhal indispensável para corroborar a ocorrência do mourejo aventado.
Ante o exposto, entendo não demonstrado o labor rural asseverado.
Do enquadramento de período especial
Editado em 3 de setembro de 2003, o Decreto n. 4.827 alterou o artigo 70 do Regulamento da Previdência Social, aprovado pelo Decreto n. 3.048, de 6 de maio de 1999, o qual passou a ter a seguinte redação:
Por conseguinte, o tempo de trabalho sob condições especiais poderá ser convertido em comum, observada a legislação aplicada à época na qual o trabalho foi prestado. Além disso, os trabalhadores assim enquadrados poderão fazer a conversão dos anos trabalhados a "qualquer tempo", independentemente do preenchimento dos requisitos necessários à concessão da aposentadoria.
Ademais, em razão do novo regramento, encontram-se superadas a limitação temporal, prevista no artigo 28 da Lei n. 9.711/98, e qualquer alegação quanto à impossibilidade de enquadramento e conversão dos lapsos anteriores à vigência da Lei n. 6.887/80.
Nesse sentido, reporto-me à jurisprudência firmada pelo Colendo STJ:
Cumpre observar que antes da entrada em vigor do Decreto n. 2.172, de 5 de março de 1997, regulamentador da Lei n. 9.032/95, de 28 de abril de 1995, não se exigia (exceto em algumas hipóteses) a apresentação de laudo técnico para a comprovação do tempo de serviço especial, pois bastava o formulário preenchido pelo empregador (SB-40 ou DSS-8030), para atestar a existência das condições prejudiciais.
Contudo, tem-se que, para a demonstração do exercício de atividade especial cujo agente agressivo seja o ruído, sempre houve necessidade da apresentação de laudo pericial, independentemente da época de prestação do serviço.
Nesse contexto, a exposição superior a 80 decibéis era considerada atividade insalubre até a edição do Decreto n. 2.172/97, que majorou o nível para 90 decibéis. Isso porque os Decretos n. 83.080/79 e n. 53.831/64 vigoraram concomitantemente até o advento do Decreto n. 2.172/97.
Com a edição do Decreto n. 4.882, de 18/11/2003, o limite mínimo de ruído para reconhecimento da atividade especial foi reduzido para 85 decibéis (art. 2º do Decreto n. 4.882/2003, que deu nova redação aos itens 2.0.1, 3.0.1 e 4.0.0 do Anexo IV do Regulamento da Previdência Social, aprovado pelo Decreto n. 3.048/99).
Quanto a esse ponto, à míngua de expressa previsão legal, não há como conferir efeito retroativo à norma regulamentadora que reduziu o limite de exposição para 85 dB(A) a partir de novembro de 2003.
Nesse sentido, o C. STJ, ao julgar o Recurso Especial o n. 1.398.260, sob o regime do artigo 543-C do CPC, consolidou entendimento acerca da inviabilidade da aplicação retroativa do decreto que reduziu o limite de ruído no ambiente de trabalho (de 90 para 85 dB) para configuração do tempo de serviço especial (julgamento realizado em 14/5/2014).
A propósito, ainda, da comprovação do tempo de serviço prestado em condições especiais, sob a égide dos Decretos n. 53.831, de 25 de março de 1964, e 83.080, de 24 de janeiro de 1979, o enquadramento das atividades ocorria dava-se por grupos profissionais e pelo rol dos agentes nocivos. Assim, se a categoria profissional à qual pertencesse o segurado se encontrasse entre aquelas descritas nos anexos dos decretos, a concessão de aposentadoria especial, caso houvesse satisfação de todos os requisitos legais, independeria de comprovação da efetiva exposição aos agentes nocivos, exceto para a exposição a ruídos e calor, que sempre exigiu prova pericial. Nessa diretriz, para comprovação das atividades exercidas pelo segurado, foi criado o formulário "SB 40", no qual constavam as atividades especiais exercidas, bem como suas especificações.
Em relação ao EPI, cumpre tecer algumas considerações.
Com a edição da Medida Provisória n. 1.729/98 (convertida na Lei n. 9.732/98), foi inserida na legislação previdenciária a exigência de informação, no laudo técnico de condições ambientais do trabalho, quanto à utilização do Equipamento de Proteção Individual (EPI).
Desde então, com base na informação sobre a eficácia do EPI, a autarquia deixou de promover o enquadramento especial das atividades desenvolvidas posteriormente a 3/12/1998.
Sobre a questão, entretanto, o C. Supremo Tribunal Federal, ao apreciar o ARE n. 664.335, em regime de repercussão geral, decidiu que: (i) se o EPI for realmente capaz de neutralizar a nocividade, não haverá respaldo ao enquadramento especial; (ii) havendo, no caso concreto, divergência ou dúvida sobre a real eficácia do EPI para descaracterizar completamente a nocividade, deve-se optar pelo reconhecimento da especialidade; (iii) na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites de tolerância, a utilização do EPI não afasta a nocividade do agente.
Quanto a esses aspectos, sublinhe-se o fato de que o campo "EPI Eficaz (S/N)" constante no Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP) é preenchido pelo empregador considerando-se, tão somente, se houve ou não atenuação dos fatores de risco, consoante determinam as respectivas instruções de preenchimento previstas nas normas regulamentares. Vale dizer: essa informação não se refere à real eficácia do EPI para descaracterizar a nocividade do agente.
No caso, em relação aos intervalos pleiteados, de 18/1/1988 a 2/6/1990, de 4/6/1990 a 16/5/2001, de 14/5/2002 a 31/7/2002, de 1º/8/2002 a 28/2/2003, de 1º/6/2004 a 30/5/2005 (data do laudo) e de 16/8/2006 a 13/5/2010, a parte autora logrou demonstrar, via formulário padronizado, PPP e laudo técnico, exposição habitual e permanente a "ruído" e "calor" acima dos limites de tolerância, bem assim aos agentes nocivos "chumbo" e "radiações não ionizantes", situação que autoriza o enquadramento nos códigos 1.1.1, 1.1.6 e 1.2.4 do anexo ao Decreto nº 53.831/64 e 1.0.8, 2.0.1 e 2.0.4 do anexo ao Decreto nº 3.048/99.
No tocante a esses vínculos de trabalho, o PPP apenas informa o fornecimento de EPI à época da prestação do serviço e não detalha acerca da possível neutralização dos elementos degradantes, circunstância que reforça o enquadramento pleiteado.
Contudo, a parte autora demandante não logrou comprovar o exercício de atividade prejudicial à sua saúde nos interregnos de 8/3/1982 a 30/9/1983, de 1º/10/1983 a 28/2/1985, de 1º/3/1985 a 8/10/1987, haja vista que sua profissiografia acostada a f. 157/158 não traz a indicação fundamental do responsável pelos registros ambientais (médico ou engenheiro de segurança do trabalho), mormente diante dos elementos agressivos apontados "ruído" e "calor"; em desacordo, portanto, às normas regulamentares.
Outrossim, incabível se afigura o pleito de enquadramento do lapso posterior a 30/5/2005, à mingua de comprovação na natureza degradante da função.
Ressalto que o autor fruiu benefício de auxílio-doença, entre 12/2/2005 e 10/3/2005 e de 29/3/2006 a 30/6/2006, o qual não integra a contagem diferenciada.
Assim, os interstícios de 18/1/1988 a 2/6/1990, de 4/6/1990 a 16/5/2001, de 14/5/2002 a 31/7/2002, de 1º/8/2002 a 28/2/2003, de 1º/6/2004 a 30/5/2005 (data do laudo) e de 16/8/2006 a 13/5/2010 - com exclusão dos períodos de fruição de benefício por incapacidade (de 12/2/2005 e 10/3/2005 e de 29/3/2006 a 30/6/2006) - devem ser enquadrados como especiais, convertidos em comum sob o fator de 1.40, e somados aos demais incontroversos.
Da aposentadoria por tempo de serviço
Antes da edição da Emenda Constitucional n. 20, de 15 de dezembro de 1998, a aposentadoria por tempo de serviço estava prevista no art. 202 da Constituição Federal, assim redigido:
Já na legislação infraconstitucional, a previsão está contida no artigo 52 da Lei n. 8.213/91:
Assim, para fazer jus ao benefício de aposentadoria por tempo de serviço, o segurado teria de preencher somente dois requisitos, a saber: tempo de serviço e carência.
Com a inovação legislativa trazida pela citada Emenda Constitucional, de 15/12/1998, a aposentadoria por tempo de serviço foi extinta, restando, contudo, a observância do direito adquirido. Isso significa dizer: o segurado que tivesse satisfeito todos os requisitos da aposentadoria integral ou proporcional, sob a égide daquele regramento, poderia, a qualquer tempo, pleitear o benefício.
Àqueles, no entanto, que estavam em atividade e ainda não preenchiam os requisitos à época da Reforma Constitucional, a Emenda em comento, no seu artigo 9º, estabeleceu regras de transição e passou a exigir, para quem pretendesse se aposentar na forma proporcional, requisito de idade mínima (53 anos para os homens e 48 anos para as mulheres), além de um adicional de contribuições no percentual de 40% sobre o valor que faltasse para completar 30 anos (homens) e 25 anos (mulheres), consubstanciando o que se convencionou chamar de "pedágio".
No caso vertente, o requisito da carência restou cumprido em conformidade com o artigo 142 da Lei n. 8.213/91.
Quanto ao tempo de serviço, a parte autora não atende o requisito necessário ao benefício postulado de aposentadoria integral na entrada administrativa, condição satisfeita apenas no ajuizamento da ação, quando perfez mais de 35 anos de tempo de serviço, suficientes ao deferimento da prestação em foco a partir da citação: 3/9/2012 (f. 197v).
Observo, contudo, que o autor já percebe benefício de aposentadoria desde 20/10/2014, devendo fazer a opção pelo provento mais vantajoso.
Dos consectários
O benefício é devido da citação: 3/9/2012 (f. 197v).
Quanto à correção monetária, esta deve ser aplicada nos termos da Lei n. 6.899/81 e da legislação superveniente, bem como do Manual de Orientação de Procedimentos para os cálculos na Justiça Federal, observado o disposto na Lei n. 11.960/2009, consoante Repercussão Geral no RE n. 870.947, em 16/4/2015, Rel. Min. Luiz Fux.
Com relação aos juros moratórios, estes são fixados em 0,5% (meio por cento) ao mês, contados da citação, por força dos artigos 1.062 do antigo CC e 219 do CPC, até a vigência do novo CC (11/1/2003), quando esse percentual foi elevado a 1% (um por cento) ao mês, nos termos dos artigos 406 do novo CC e 161, § 1º, do CTN, devendo, a partir de julho de 2009, ser mantidos no percentual de 0,5% ao mês, observadas as alterações introduzidas no art. 1-F da Lei n. 9.494/97 pelo art. 5º da Lei n. 11.960/09, pela MP n. 567, de 03 de maio de 2012, convertida na Lei n. 12.703, de 07 de agosto de 2012, e por legislação superveniente.
Em relação às parcelas vencidas antes da citação, os juros são devidos desde então de forma global e, para as vencidas depois da citação, a partir dos respectivos vencimentos, de forma decrescente.
Referentemente às custas processuais, no Estado de São Paulo, delas está isenta a Autarquia Previdenciária, a teor do disposto nas Leis Federais n. 6.032/74, 8.620/93 e 9.289/96, bem como nas Leis Estaduais n. 4.952/85 e 11.608/03. Contudo, tal isenção não exime a Autarquia Previdenciária do pagamento das custas e despesas processuais em restituição à parte autora, por força da sucumbência, na hipótese de pagamento prévio.
Diante da sucumbência mínima, os honorários advocatícios são arbitrados em 10% (dez por cento) sobre o valor das parcelas vencidas até a data da prolação da sentença, consoante § 3º do artigo 20 do Código de Processo Civil, orientação desta Turma e nova redação da Súmula n. 111 do Superior Tribunal de Justiça. Considerando que a apelação foi interposta antes da vigência do Novo CPC, não incide ao presente caso a regra de seu artigo 85, que determina a majoração dos honorários de advogado em instância recursal.
Possíveis valores não cumulativos recebidos na esfera administrativa deverão ser compensados por ocasião da liquidação do julgado.
Diante do exposto, DOU PARCIAL PROVIMENTO à apelação do autor e à remessa oficial para, nos termos da fundamentação: (i) restringir o enquadramento, como tempo especial, aos lapsos de 18/1/1988 a 2/6/1990, de 4/6/1990 a 16/5/2001, de 14/5/2002 a 31/7/2002, de 1º/8/2002 a 28/2/2003, de 1º/6/2004 a 11/2/2005, de 11/3/2005 a 30/5/2005 (data do laudo), de 1º/6/2005 a 28/3/2006 e de 16/8/2006 a 13/5/2010; e (ii) reconhecer o direito ao autor à aposentadoria por tempo de contribuição integral, bem como os reflexos financeiros, desde a citação.
É o voto.
Rodrigo Zacharias
Juiz Federal Convocado
Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
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Data e Hora: | 01/06/2016 18:21:58 |