
D.E. Publicado em 12/07/2016 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Oitava Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento ao agravo, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargadora Federal
Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
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Nº de Série do Certificado: | 291AD132845C77AA |
Data e Hora: | 29/06/2016 14:25:23 |
AGRAVO LEGAL EM APELAÇÃO CÍVEL Nº 0003320-53.2016.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL TÂNIA MARANGONI: Trata-se de agravo, interposto pela parte autora com fulcro no artigo 557 do CPC, hoje previsto no artigo 1.021 do CPC, em face da decisão monocrática de fls. 186/187 que, deu provimento ao recurso da Autarquia para reformar a sentença e julgar improcedente o pedido, cassando a tutela anteriormente concedida.
Sustenta a parte autora, em síntese, que preencheu os requisitos necessários para a concessão do benefício. Afirma que o auxílio financeiro do filho é insuficiente para arcar com todas as suas despesas e que está incapacitada para o labor, por ter seu estado de saúde debilitado. Requer, caso a r. decisão seja mantida, a não devolução dos valores recebidos em razão de antecipação de tutela, uma vez que recebeu de boa-fé e com caráter alimentar.
Pede pela retratação da r. decisão, ora atacada e, caso não seja este o entendimento, que o recurso seja apresentado em mesa para julgamento colegiado. Prequestiona a matéria suscitada, a fim de interpor, eventualmente, Recursos às Cortes Superiores.
É o relatório.
VOTO
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL TÂNIA MARANGONI: Não procede a insurgência do agravante.
Neste caso, a decisão monocrática deu provimento ao recurso da Autarquia, nos termos do art. 557, §1º-A, do CPC, para reformar a sentença e julgar improcedente o pedido, cassando a tutela anteriormente concedida. Isentou de custas e honorária, por ser beneficiária da assistência gratuita.
A questão em debate consiste em saber se a parte autora faz jus ao benefício que pretende receber, à luz do inciso V do art. 203 da Constituição Federal, c.c. art. 139 da Lei nº 8.213/91 e art. 20 da Lei nº 8.742 de 07.12.1993. Para tanto, é necessário o preenchimento de dois requisitos estabelecidos pelo artigo 20, da Lei Orgânica da Assistência Social: I) ser pessoa portadora de deficiência que incapacite para o trabalho ou idoso com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais, conforme o artigo 34, do Estatuto do Idoso (Lei nº 10.741/2003) e II) não possuir meios de subsistência próprios ou de familiares.
Importante ressaltar que a Lei 12.435/11 alterou o conceito de família, dando nova redação ao art. 20, § 1º, da Lei nº 8.742/93, não mais remetendo ao art. 16 da Lei nº 8.213/91 para identificação dos componentes do grupo familiar.
Destaco acerca do parâmetro da renda, que por decisão do Plenário do C. STF, em 18.04.2013, por ocasião do julgamento do RE 567985 RG/MT, submetido à Repercussão Geral, de relatoria do e. Ministro Marco Aurélio e relator para o acórdão o e. Min. Gilmar Mendes, foi declarada a inconstitucionalidade por omissão parcial, sem pronúncia de nulidade, do art. 20, § 3º, da Lei nº 8.742/93, que considera hipossuficiente o idoso ou portador de deficiência cuja renda mensal per capita não atinge ¼ do salário mínimo, nos seguintes termos:
"Benefício assistencial de prestação continuada ao idoso e ao deficiente. Art. 203, V, da Constituição. A Lei de Organização da Assistência Social (LOAS), ao regulamentar o art. 203, V, da Constituição da República, estabeleceu os critérios para que o benefício mensal de um salário mínimo seja concedido aos portadores de deficiência e aos idosos que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família. 2. Art. 20, § 3º, da Lei 8.742/1993 e a declaração de constitucionalidade da norma pelo Supremo Tribunal Federal na ADI 1.232. Dispõe o art. 20, § 3º, da Lei 8.742/93 que "considera-se incapaz de prover a manutenção da pessoa portadora de deficiência ou idosa a família cuja renda mensal per capita seja inferior a 1/4 (um quarto) do salário mínimo". O requisito financeiro estabelecido pela lei teve sua constitucionalidade contestada, ao fundamento de que permitiria que situações de patente miserabilidade social fossem consideradas fora do alcance do benefício assistencial previsto constitucionalmente. Ao apreciar a Ação Direta de Inconstitucionalidade 1.232-1/DF, o Supremo Tribunal Federal declarou a constitucionalidade do art. 20, § 3º, da LOAS. 3. Decisões judiciais contrárias aos critérios objetivos preestabelecidos e Processo de inconstitucionalização dos critérios definidos pela Lei 8.742/1993. A decisão do Supremo Tribunal Federal, entretanto, não pôs termo à controvérsia quanto à aplicação em concreto do critério da renda familiar per capita estabelecido pela LOAS. Como a lei permaneceu inalterada, elaboraram-se maneiras de se contornar o critério objetivo e único estipulado pela LOAS e de se avaliar o real estado de miserabilidade social das famílias com entes idosos ou deficientes. Paralelamente, foram editadas leis que estabeleceram critérios mais elásticos para a concessão de outros benefícios assistenciais, tais como: a Lei 10.836/2004, que criou o Bolsa Família; a Lei 10.689/2003, que instituiu o Programa Nacional de Acesso à Alimentação; a Lei 10.219/01, que criou o Bolsa Escola; a Lei 9.533/97, que autoriza o Poder Executivo a conceder apoio financeiro a Municípios que instituírem programas de garantia de renda mínima associados a ações socioeducativas. O Supremo Tribunal Federal, em decisões monocráticas, passou a rever anteriores posicionamentos acerca da intransponibilidade do critérios objetivos. Verificou-se a ocorrência do processo de inconstitucionalização decorrente de notórias mudanças fáticas (políticas, econômicas e sociais) e jurídicas (sucessivas modificações legislativas dos patamares econômicos utilizados como critérios de concessão de outros benefícios assistenciais por parte do Estado brasileiro). 4. Declaração de inconstitucionalidade parcial, sem pronúncia de nulidade, do art. 20, § 3º, da Lei 8.742/1993. 5. Recurso extraordinário a que se nega provimento."
Na demanda ajuizada em 08/08/2013, a autora, nascida em 12/06/1962, instrui a inicial com documentos.
O estudo social, produzido em 24/10/2013, informa que a autora reside sozinha, em casa cedida pelo filho, composta por cinco cômodos, com piso e sem forro. Os móveis e eletrodomésticos são simples e estão em bom estado, destacando-se uma máquina de lavar roupas marca Eletrolux e duas máquinas de costura, sendo uma comum e uma industrial (fotos). A requerente afirma que trabalhava como costureira de lingerie e que as máquinas foram cedidas pela Prefeitura. As despesas giram em torno de R$ 270,00 com água, gás, energia elétrica e alimentação. A autora declara que possui telefone celular, mas não coloca crédito. O filho, caminhoneiro é solteiro e não possui filhos, sendo o responsável pelas despesas da autora. A demandante possui também uma filha casada, que tem um filho de 7 anos.
O laudo médico pericial, realizado em 15/01/2015, atesta que a autora, com 52 anos, é portadora de depressão, hipertensão arterial, hipercolesterolemia, hipertrigliceridemia, lombalgia e labirintite. Conclui pela incapacidade laborativa definitiva ao labor.
Com efeito, ao contrário do entendimento espelhado na decisão recorrida, não há no conjunto probatório elementos que possam induzir à convicção de que a parte autora está no rol dos beneficiários descritos na legislação.
A requerente não logrou comprovar a miserabilidade, requisito essencial à concessão do benefício assistencial, já que nos termos do estudo social realizado não ostenta características de hipossuficiência, considerando, sobretudo, que reside em casa cedida pelo filho, que também arca com suas despesas.
Embora esteja demonstrado que a autora não possui renda, possibilitou concluir na r. decisão que é auxiliada pelo filho, recebendo a assistência material necessária à sua subsistência. Assim, concluiu não fazer jus à garantia constitucional, que prevê o direito ao benefício no valor de um salário mínimo ao deficiente ou ao idoso que não puder prover o próprio sustento ou tê-lo provido por seus familiares (CF, art. 203, inc. V).
Logo, o benefício pleiteado foi indeferido.
Acerca dos valores recebidos em razão de tutela antecipada, cumpre observar que o C. STJ firmou entendimento de que, demonstrado o recebimento de boa-fé, não são passíveis de devolução os valores recebidos a título de benefício previdenciário ou assistencial, posto que se destinam à sua própria sobrevivência, circunstância que o reveste de nítido caráter alimentar.
Nesse sentido, confira-se:
Conquanto haja previsão legal de reembolso dos valores indevidamente pagos pelo INSS, conforme disposto no art. 115, da Lei n.º 8.213/91, há que se considerar, no caso dos autos, o caráter alimentar da prestação e a boa-fé do ora recorrido, que recebeu o benefício em decorrência de decisão judicial, não havendo que se falar em restituição.
Tem-se que a decisão monocrática que confere poderes ao relator para decidir recurso manifestamente improcedente, prejudicado, deserto, intempestivo ou contrário a jurisprudência dominante do respectivo Tribunal, do Supremo Tribunal Federal ou de Tribunal Superior, sem submetê-lo ao órgão colegiado, não importa em infringência ao Código de Processo Civil ou aos princípios do direito.
A norma em questão consolida a importância do precedente jurisprudencial ao tempo em que desafoga as pautas de julgamento.
Por fim, é assente a orientação pretoriana, reiteradamente expressa nos julgados desta C. Corte, no sentido de que o órgão colegiado não deve modificar a decisão do Relator, salvo na hipótese em que a decisão impugnada não estiver devidamente fundamentada, ou padecer dos vícios da ilegalidade e abuso de poder, e for passível de resultar lesão irreparável ou de difícil reparação à parte.
Assim, não merece reparos a decisão recorrida, que deve ser mantida, porque calcada em precedentes desta E. Corte e do C. Superior Tribunal de Justiça.
Ante o exposto, dou parcial provimento ao agravo legal para determinar não ser devida a devolução dos valores recebidos de boa-fé a título da tutela antecipada.
É o voto.
TÂNIA MARANGONI
Desembargadora Federal
Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
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Data e Hora: | 29/06/2016 14:25:26 |