D.E. Publicado em 30/09/2016 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Oitava Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, em sede de juízo de retratação, dar parcial provimento ao agravo da parte autora, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal Relator
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AGRAVO LEGAL EM APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 0013440-86.2005.4.03.6105/SP
RELATÓRIO
O SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL NEWTON DE LUCCA (RELATOR: Os autos retornaram da E. Vice-Presidência desta Corte, com fundamento no art. 543-C, § 7º, inc. II, do CPC/73, a fim de que fosse reexaminada a questão referente ao reconhecimento do tempo de serviço rural exercido em momento anterior ao início de prova material mais remoto acostado aos autos, desde que amparado por idônea prova testemunhal.
Trata-se de ação ajuizada em 18/11/05 em face do INSS - Instituto Nacional do Seguro Social visando à concessão de aposentadoria por tempo de serviço, a partir da data da citação (12/12/05), mediante o reconhecimento do tempo de serviço rural exercido no período de 20/10/66 a 19/3/78 e dos períodos especiais e comuns declinados na exordial.
Foram deferidos os benefícios da assistência judiciária gratuita (fls. 36).
O Juízo a quo julgou parcialmente procedente o pedido para reconhecer a atividade rural exercida pela parte autora no período de 1º/1/75 a 19/3/78, "bem como declarar tal período como atividade especial" (fls. 162), e reconhecer os períodos de 20/3/78 a 24/1/79 e 26/1/86 a 29/1/91 como "tempo de serviço urbano especial, bem como a conversão destes em comum" (fls. 162). Fixou a sucumbência recíproca, devendo cada parte arcar com os honorários de seus patronos. Sem custas.
Inconformada, apelou a autarquia, requerendo preliminarmente, o reconhecimento da incompetência absoluta, bem como a remessa dos autos ao Juízo competente, e ainda, a extinção do feito sem julgamento do mérito, por ausência de interesse de agir. No mérito, pleiteou a reforma da R. sentença.
A parte autora também apelou, pleiteando a reforma da sentença, a fim de que o benefício seja concedido nos termos da exordial.
Com contrarrazões, e submetida a sentença ao duplo grau obrigatório, subiram os autos a esta E. Corte.
Em decisão proferida nos termos do art. 557 do CPC/73, a Exma. Desembargadora Federal Vera Jucovsky, então Relatora do feito, deu parcial provimento à remessa oficial e à apelação do INSS, para reconhecer o labor rural o labor rural, sem registro em CTPS, apenas no período de 1º/1/75 a 31/12/75, como tempo comum, exceto para efeitos de carência, e deu parcial provimento à apelação da parte autora para reconhecer o labor especial exercido no período de 25/1/79 a 25/1/86, além daqueles já reconhecidos pela R. sentença.
A parte autora interpôs agravo, requerendo a reforma da decisão.
A Oitava Turma, por unanimidade, negou provimento ao agravo interposto pela parte autora.
A parte autora interpôs Recurso Especial contra o V. acórdão (fls. 233/247).
A E. Vice-Presidência desta Corte, com fundamento no art. 543-C, §7º, inc. II, do CPC/73, determinou a devolução dos autos a esta Oitava Turma para realização do juízo de retratação ou manutenção do acórdão recorrido, tendo em vista o julgamento proferido no Recurso Especial Repetitivo Representativo de Controvérsia nº 1.348.633/SP.
É o breve relatório.
VOTO
O SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL NEWTON DE LUCCA (RELATOR): O C. Superior Tribunal de Justiça, ao apreciar o Recurso Especial Representativo de Controvérsia nº 1.348.633-SP, firmou posicionamento no sentido de ser possível o reconhecimento do "tempo de serviço rural mediante apresentação de um início de prova material sem delimitar o documento mais remoto como termo inicial do período a ser computado, contanto que corroborado por testemunhos idôneos a elastecer sua eficácia" (Primeira Seção, Relator Ministro Arnaldo Esteves Lima, por maioria, j. 28/08/2013, DJe 05/12/14). O E. Relator, em seu voto, deixou consignada a regra que se deve adotar ao afirmar: "Nessa linha de compreensão, mostra-se possível o reconhecimento de tempo de serviço rural anterior ao documento mais antigo, desde que amparado por convincente prova testemunhal, colhida sob o contraditório."
Ressalto, adicionalmente, que o C. STJ possui diversos julgados no sentido de que o Recurso Especial Representativo de Controvérsia acima mencionado autorizou o reconhecimento do tempo de serviço rural não apenas relativamente ao período anterior ao documento mais antigo, mas também posterior à prova material mais recente, desde que amparado por prova testemunhal robusta, conforme ementas a seguir transcritas:
Anoto que o convencimento da verdade de um fato ou de uma determinada situação jurídica raramente decorre de circunstância isoladamente considerada.
Os indícios de prova material, singularmente analisados, talvez não fossem, por si sós, suficientes para formar a convicção do magistrado. Nem tampouco as testemunhas provavelmente o seriam. Mas a conjugação de ambos os meios probatórios - todos juridicamente idôneos para formar a convicção do juiz - torna inquestionável a comprovação da atividade laborativa rural.
Com relação às contribuições previdenciárias, dispõe o §2º do art. 55 da Lei nº 8.213/91 que o tempo de serviço do segurado trabalhador rural, "anterior à data de início de vigência desta Lei, será computado independentemente do recolhimento das contribuições a ele correspondentes, exceto para efeito de carência, conforme dispuser o Regulamento." Havendo período posterior ao advento da Lei de Benefícios, sem o recolhimento das contribuições, o mesmo somente poderá ser utilizado para os fins específicos previstos no art. 39, inc. I, da Lei de Benefícios. Quadra mencionar que o C. Superior Tribunal de Justiça, ao apreciar o Recurso Especial Representativo de Controvérsia nº 1.352.791/SP, adotou o entendimento de que o período de atividade rural registrado em carteira profissional deve ser computado como carência.
Quanto à aposentadoria por tempo de contribuição, para os segurados que cumpriram os requisitos anteriormente à vigência da Emenda Constitucional nº 20/98, devem ser observadas as disposições dos artigos 52 e 53, da Lei nº 8.213/91, em atenção ao princípio tempus regit actum:
Havendo a necessidade de utilização do período posterior à referida Emenda, deverão ser observadas as alterações realizadas pela referida Emenda aos artigos 201 e 202 da Constituição Federal de 1988, que extinguiu a aposentadoria proporcional por tempo de serviço no âmbito do regime geral de previdência social.
Transcrevo o §7º do art. 201 da Carta Magna com a nova redação:
Por sua vez, o art. 9º de referida Emenda criou uma regra de transição, ao estabelecer:
Contudo, no que tange à aposentadoria integral, cumpre ressaltar que, na redação do Projeto de Emenda à Constituição, o inciso I do §7º do art. 201, da Constituição Federal, associava tempo mínimo de contribuição (35 anos, para homem e 30 anos, para mulher) à idade mínima de 60 anos e 55 anos, respectivamente. Não sendo aprovada a exigência da idade mínima quando da promulgação da Emenda nº 20, a regra de transição para a aposentadoria integral restou inócua, uma vez que, no texto permanente (art. 201, §7º, inc. I), a aposentadoria integral será concedida levando-se em conta somente o tempo de contribuição.
Quadra mencionar que, havendo o cômputo do tempo de serviço posterior a 28/11/99, devem ser observados os dispositivos constantes da Lei nº 9.876/99 no que se refere ao cálculo do valor do benefício, consoante o julgamento realizado, em 10/9/08, pelo Tribunal Pleno do C. Supremo Tribunal Federal, na Repercussão Geral reconhecida no Recurso Extraordinário nº 575.089, de Relatoria do Exmo. Ministro Ricardo Lewandowski.
Tratando-se de segurado inscrito na Previdência Social Urbana em momento anterior à Lei nº 8.213/91, o período de carência é o previsto na tabela do art. 142 de referido diploma legal.
Passo à análise do caso concreto.
Inicialmente, observo que o V. acórdão recorrido reconheceu o labor rural do autor, nascido em 20/10/56, no período de 1º/1/75 a 31/12/75, considerando como início de prova material certificado de dispensa de incorporação, datado de 1º/11/75.
Cumpre ressaltar que não se discute, neste julgamento, a validade ou não dos documentos apresentados como início de prova material, sob pena de extrapolar os limites da controvérsia a ser analisada em sede de juízo de retratação.
Dessa forma, passo à apreciação da prova testemunhal:
1) A primeira testemunha (fls. 134) afirmou que conhece o autor "porque arrendou junto com ele terras na Fazenda pertencente a Pedro Barreto, no Município de Turama, em Minas Gerais" (fls. 134). Aduziu que parte da colheita ficava para o arrendante e parte para o arrendatário, sendo que a parte autora se encarregava de colher arroz, algodão e milho, ao passo que o depoente laborava em outro setor da lavoura. Afirmou que o demandante laborou na lavoura no período de 1966 a 1978, aproximadamente.
2) A segunda testemunha (fls. 135) aduziu que conhece o requerente "porque morava também na fazenda em que ele morava, na cidade de Turama, em Minas Gerais" (fls. 135), tendo com ele laborado na lavoura, (milho, algodão e arroz), sendo que também lidavam com animais. Afirmou que o demandante permaneceu na fazenda no período de 1966 a 1978.
3) A terceira testemunha (fls. 145) aduziu que conhece o requerente desde 1966, de Turama-MG, tendo o autor laborado na roça, com a família, no período de 1966 a 1978, dedicando-se ao cultivo de milho, arroz e algodão.
Os documentos considerados como início de prova material no V. acórdão recorrido, somados aos depoimentos testemunhais, formam um conjunto harmônico apto a demonstrar que a parte autora exerceu atividades no campo, no período de 20/10/68 (12 anos) a 19/3/78. Ressalvo que o mencionado tempo não poderá ser utilizado para fins de carência.
No que tange ao reconhecimento do trabalho exercido a partir dos 12 (doze) anos de idade, cumpre transcrever os dispositivos da Constituição Federal de 1967 (art. 158, inc. X) e da Emenda Constitucional n.º 1 de 1969 (art. 165, inc. X), que tratam da matéria, in verbis:
"Art 158 - A Constituição assegura aos trabalhadores os seguintes direitos, além de outros que, nos termos da lei, visem à melhoria, de sua condição social:
(...)
X - proibição de trabalho a menores de doze anos e de trabalho noturno a menores de dezoito anos, em indústrias insalubres a estes e às mulheres;"
"Art. 165. A Constituição assegura aos trabalhadores os seguintes direitos, além de outros que, nos termos da lei, visem à melhoria de sua condição social:
X - proibição de trabalho, em indústrias insalubres, a mulheres e menores de dezoito anos, de trabalho noturno a menores de dezoito anos e de qualquer trabalho a menores de doze anos;"
Da leitura dos dispositivos acima transcritos, verifica-se que surgiu a previsão constitucional da atividade laborativa para os maiores de 12 (doze) anos de idade, motivo pelo qual, havendo prova do trabalho exercido, deve ser reconhecido o tempo de serviço efetivamente realizado.
O C. Superior Tribunal de Justiça, em 23/6/08, no julgamento da Ação Rescisória nº 3.629-RS, no qual se discutia o direito de a autora averbar o trabalho rural a partir da data em que completou 12 anos de idade (2/5/1965 a 31/1/77), julgou procedente o pedido formulado "para desconstituir o acórdão proferido no REsp 600.666/RS, mantendo aquele proferido pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região, no julgamento da Apelação Cível 2000.04.01.113950-0/RS, e confirmando o direito ao cômputo do trabalho rural, a partir de 02/05/65, sem recolhimento de contribuições previdenciárias." Asseverou a E. Relatora, em seu voto: "(...) é preciso salientar que já é pacífico nas Turmas integrantes da Terceira Seção do STJ o entendimento de que, comprovada a atividade rural do trabalhador menor, a partir dos seus 12 anos, em regime de economia familiar, esse tempo deve ser computado para fins previdenciários. A justificar tal medida, amparando-se no princípio da universalidade da cobertura da Seguridade Social, deve-se partir da ideia de que a proibição do trabalho ao menor de 14 anos foi estabelecida em benefício do menor e não em seu prejuízo." Nesse sentido: AREsp. nº 315.764, Relator Ministro Benedito Gonçalves, decisão monocrática proferida em 26/6/15, DJe 4/8/15 e REsp. nº 1.397.928, Relator Mauro Campbell Marques, decisão monocrática proferida em 28/8/13, DJe 3/9/13.
Dessa forma, somando-se o período de atividade rural (20/10/68 a 19/3/78) aos períodos comuns e especiais constantes da CTPS (fls. 18/24) e já considerados pela decisão agravada, perfaz o requerente o total de:
Assim, não obstante o autor não faça jus ao benefício nos termos das regras de transição ("pedágio"), uma vez que o mesmo, nascido em 20/10/56 (fls. 14), não cumpriu o requisito etário na data do ajuizamento, a parte autora cumpriu os requisitos necessários da aposentadoria por tempo de serviço prevista na legislação anterior ao advento da Emenda Constitucional nº 20/98 e também da aposentadoria por tempo de contribuição com base no texto permanente (art. 201, §7º, inc. I, da CF/88).
Dessa forma, sendo possível a concessão do benefício em mais de uma hipótese, deve ser assegurada à parte autora o direito à opção pela aposentadoria mais benéfica, de acordo com a legislação mencionada na fundamentação acima.
Tratando-se de segurado inscrito na Previdência Social Urbana em momento anterior à Lei nº 8.213/91, o período de carência é o previsto na tabela do art. 142 de referido diploma, o qual, no presente caso, foi em muito superado.
O termo inicial do benefício deve ser fixado na data da citação (12/12/05 - fls. 70 vº), nos termos do art. 240, do CPC/15.
A correção monetária deve incidir desde a data do vencimento de cada prestação e os juros moratórios a partir da citação, momento da constituição do réu em mora.
Com relação aos índices de atualização monetária e taxa de juros --- não obstante o meu posicionamento de que a referida matéria deveria ser discutida na fase da execução do julgado, tendo em vista a existência da Repercussão Geral no Recurso Extraordinário nº 870.947 a ser apreciada pelo C. Supremo Tribunal Federal ---, passei a adotar o entendimento da 8ª Turma desta Corte, a fim de que seja observado o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal que estiver em vigor no momento da execução do julgado.
Com relação aos honorários advocatícios, nos exatos termos do art. 20 do CPC/73:
Assim raciocinando, a verba honorária fixada, no presente caso, à razão de 10% sobre o valor da condenação remunera condignamente o serviço profissional prestado.
No que se refere à sua base de cálculo, devem ser levadas em conta apenas as parcelas vencidas até a data da prolação da sentença, nos termos da Súmula nº 111, do C. STJ.
Considerando que o recurso foi interposto, ainda, sob a égide do CPC/73, entendo não ser possível a aplicação do art. 85 do novo Estatuto Processual Civil, pois o recorrente não pode ser surpreendido com a imposição de condenação não prevista no momento em que optou por recorrer, sob pena de afronta ao princípio da segurança jurídica, consoante autorizada doutrina a respeito da matéria.
Outrossim, na hipótese de a parte autora estar recebendo aposentadoria, auxílio-doença ou abono de permanência em serviço, deve ser facultado ao demandante a percepção do benefício mais vantajoso, sendo vedado o recebimento conjunto, nos termos do art. 124 da Lei nº 8.213/91.
Ante o exposto, em sede de juízo de retratação, dou parcial provimento ao agravo para dar parcial provimento à apelação da parte autora para reconhecer o período rural de 20/10/68 a 19/3/78, o qual não poderá ser considerado para efeito de carência, bem como condenar a autarquia ao pagamento da aposentadoria mais vantajosa à parte autora, nos termos da fundamentação apresentada, a partir da data da citação, acrescida de correção monetária, juros e honorários advocatícios na forma acima indicada, mantendo-se, no mais a decisão agravada.
É meu voto.
Newton De Lucca
Desembargador Federal Relator
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Data e Hora: | 19/09/2016 17:16:07 |