
D.E. Publicado em 07/12/2017 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, conhecer em parte da apelação do INSS e, na parte conhecida, dar-lhe parcial provimento, para reformar a r. sentença de 1º grau de jurisdição e julgar improcedente o pedido de concessão de aposentadoria por tempo de serviço, deixando de condenar quaisquer das partes nas custas e despesas processuais e, ante a sucumbência recíproca (art. 21, CPC/73), dando a verba honorária por compensada entre os litigantes; mantendo a r. sentença proferida em 1º grau de jurisdição apenas no tocante ao reconhecimento do labor rural no período de 22/03/1975 a 30/08/1981, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0057289-61.2008.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
O EXMO. SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Vistos em Autoinspeção.
Trata-se de apelação interposta pelo INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS em ação ajuizada por JOSÉ ROBERTO DE MARQUI, objetivando a concessão de aposentadoria por tempo de serviço/contribuição, mediante o reconhecimento de labor rural e especial.
A r. sentença de fls. 73/80 julgou procedente o pedido inicial. Reconheceu o labor rural no período de 23/03/1975 a 30/08/1981 (total: 6 anos, 5 meses e 9 dias), e o labor sob condições especiais, na empresa Laticínio Catupiry Ltda, a partir de 01/12/1984 (total após conversão em tempo comum: 32 anos, 8 meses e 14 dias); e condenou o INSS a "conceder ao autor JOSÉ ROBERTO DE MARQUI a aposentadoria por tempo de serviço, em 100% do seu salário-de-benefício, a partir da citação, a ser apurado em liquidação, não podendo ser inferior ao salário mínimo", com parcelas em atraso pagas de uma só vez, atualizadas por juros legais a partir da citação (art. 293 CPC/73) e pela correção monetária. Condenou, ainda, a autarquia no pagamento das custas e honorários advocatícios, fixados em 10% do valor das prestações vencidas, como tal entendidas todas as parcelas que integrarão o precatório, a serem executadas na forma do art. 730 do CPC/73, conforme entendimento da Súmula 111 do STJ, não incidindo, portanto, sobre as parcelas vincendas. Decisão não submetida à remessa necessária.
Em razões recursais de fls. 83/94, o INSS pugna pela reforma da r. sentença ao fundamento de que, no seu entender, o autor não preencheu os requisitos carência e tempo de serviço. Alega, também, que não restou comprovado o labor rural e nem o especial. Subsidiariamente, requer que os honorários advocatícios sejam fixados sobre o valor devido até a sentença, conforme Súmula 111 do STJ.
Devidamente processado o recurso, com contrarrazões, foram os autos remetidos a este Tribunal Regional Federal.
É o relatório.
VOTO
O EXMO. SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Inicialmente, conheço apenas em parte da apelação do INSS, eis que a r. sentença já fixou os honorários advocatícios sobre o valor das parcelas vencidas até a sentença, conforme Súmula 111 do STJ; razão pela qual inexiste interesse recursal neste aspecto.
Verifico que o pedido formulado pela parte autora encontra previsão legal, especificamente na lei de benefícios.
Quanto ao alegado labor rural, cumpre salientar que o art. 55, § 3º, da Lei de Benefícios estabelece que a comprovação do tempo de serviço somente produzirá efeito quando baseada em início de prova material, não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal. Nesse sentido foi editada a Súmula nº 149, do C. Superior Tribunal de Justiça:
No entanto, não há necessidade de documentos comprobatórios do labor rural para todos os anos do período que se pretende reconhecer. Sendo assim, a prova documental deve ser corroborada por prova testemunhal idônea, com potencial para estender a aplicabilidade daquela. Esse o raciocínio que prevalece nesta Eg. 7ª Turma e no Colendo STJ:
Observo, ainda, que tais documentos devem ser contemporâneos ao período que se quer ver comprovado, no sentido de que tenham sido produzidos de forma espontânea, no passado.
Consigne-se, também, que o C. Superior Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento do RESP nº 1.348.633/SP, adotando a sistemática do artigo 543-C do Código de Processo Civil, assentou o entendimento de que é possível o reconhecimento de tempo de serviço rural exercido em momento anterior àquele retratado no documento mais antigo juntado aos autos como início de prova material, desde que tal período esteja evidenciado por prova testemunhal idônea.
Impende registrar que é pacifico o entendimento no sentido de ser dispensável o recolhimento das contribuições para fins de obtenção de benefício previdenciário, desde que a atividade rural tenha se desenvolvido antes da vigência da Lei nº 8.213/91, como se pode observar nos seguintes precedentes:
A respeito da idade mínima para o trabalho rural do menor, registro ser histórica a vedação do trabalho infantil. Com o advento da Constituição de 1967, a proibição passou a alcançar apenas os menores de 12 anos, em nítida evolução histórica quando em cotejo com as Constituições anteriores, as quais preconizavam a proibição em período anterior aos 14 anos.
Já se sinalizava, então, aos legisladores constituintes, como realidade incontestável, o desempenho da atividade desses infantes na faina campesina, via de regra ao lado dos genitores. Corroborando esse entendimento, e em alteração ao que até então vinha adotando, se encontrava a realidade brasileira das duas décadas que antecederam a CF/67, época em que a população era eminentemente rural (64% na década de 1950 e 55% na década de 1960).
Antes dos 12 anos, porém, ainda que acompanhasse os pais na lavoura e eventualmente os auxiliasse em algumas atividades, não se mostra razoável supor que pudesse exercer plenamente a atividade rural, inclusive por não contar com vigor físico suficiente para uma atividade tão desgastante.
A propósito, referido entendimento sempre fora assentado pelo C. Supremo Tribunal Federal, tanto na vigência da Constituição Federal de 1967, como na atual Carta de 1988. Confira-se:
Não é outro o entendimento desta Egrégia Turma, conforme julgados que portam as seguintes ementas:
Para comprovar o labor rural, o autor apresentou os seguintes documentos:
a) Certidões de nascimento de suas irmãs, Elaine Cristina de Marqui, nascida em 02/02/1976, e Marlí Aparecida de Marqui, nascida em 22/12/1967, em que seu genitor é qualificado como "lavrador" (fls. 23/24);
b) Declaração do pai do autor sobre mercadoria café em côco, vendida para a firma Amadeu & Gonçalves Ltda, de 25/04/1979 (fl. 25);
c) Nota fiscal de produtor em nome do genitor do autor, datada de 07/11/1975 (fl. 26); e
d) Documento do cartório de registro de imóveis da comarca de Santa Fé do Sul, em que aparece a aquisição, em 14/07/1977, por parte do genitor do autor, de "parte da chácara nº 176", e venda do referido imóvel em 10/01/1997 (fls. 34/35).
Ressalte-se que viável a extensão da condição de rurícola de seu genitor, mormente porque se deseja a comprovação em juízo de atividade rurícola em regime de economia familiar.
Além da documentação trazida como início de prova material hábil para comprovar o exercício de labor rural, em 17/07/2008, foram ouvidas duas testemunhas, Oswaldo Silvestrini (fl. 70) e José Peres Garbim (fl. 71).
Oswaldo relatou: "eu fui vizinho do autor quando ele vivia com sua família em uma pequena propriedade rural no Córrego da Ponte Pensa e é do meu conhecimento que ele lá trabalhava na lavoura em regime de economia familiar, o que fez até 1977. As lavouras eram de subsistência, com cultivo de café, milho e arroz. Depois disso, ele se mudou para outra propriedade rural no Córrego do Jacu Queimado, mas, como não éramos mais vizinhos, não sei dizer exatamente o período em que ele lá trabalhou".
José afirmou: "eu fui vizinho do autor quando ele vivia com sua família em uma pequena propriedade rural no Córrego da Ponte Pensa e é do meu conhecimento que ele lá trabalhava na lavoura em regime de economia familiar, o que fez até 1977. As lavouras eram de subsistência, com cultivo de café, milho e arroz. Depois disso, ele se mudou para outra propriedade rural no Córrego do Jacu Queimado, onde continuou trabalhando na roça em regime de economia familiar aproximadamente mais cinco anos. Nessa última propriedade tanto ele cuidava de porcos como tinha lavoura de subsistência".
Assim, a prova oral reforça o labor no campo e amplia a eficácia probatória dos documentos carreados aos autos; tornando possível o reconhecimento do labor rural no período de 22/03/1975 (quando o autor completou 12 anos) a 30/08/1981 (pedido inicial), exceto para fins de carência; conforme, aliás, reconhecido em sentença.
Passo à apreciação do trabalho exercido em condições especiais.
Com relação ao reconhecimento da atividade exercida como especial e em obediência ao aforismo tempus regit actum, uma vez prestado o serviço sob a égide de legislação que o ampara, o segurado adquire o direito à contagem como tal, bem como à comprovação das condições de trabalho na forma então exigida, não se aplicando retroativamente lei nova que venha a estabelecer restrições à admissão do tempo de serviço especial (STJ, AgRg no REsp 493.458/RS e REsp 491.338/RS; Súmula nº 13 TR-JEF-3ªR; artigo 70, § 1º, Decreto nº 3.048/1999).
Cumpre salientar que o Decreto nº 53.831/64 foi o primeiro a trazer a lista de atividades especiais para efeitos previdenciários, tendo como base a atividade profissional ou a exposição do segurado a agentes nocivos.
Já o Decreto nº 83.080/79 estabeleceu nova lista de atividades profissionais, agentes físicos, químicos e biológicos presumidamente nocivos à saúde, para fins de aposentadoria especial, sendo que, o Anexo I classificava as atividades de acordo com os agentes nocivos enquanto que o Anexo II trazia a classificação das atividades segundo os grupos profissionais.
Em outras palavras, até 28/04/1995, é possível a qualificação da atividade laboral pela categoria profissional ou pela comprovação da exposição a agente nocivo, por qualquer modalidade de prova.
Saliente-se, por oportuno, que a permanência não pressupõe a exposição contínua ao agente nocivo durante toda a jornada de trabalho, guardando relação com a atividade desempenhada pelo trabalhador.
A propósito do tema:
Pacífica a jurisprudência no sentido de ser dispensável a comprovação dos requisitos de habitualidade e permanência à exposição ao agente nocivo para atividades enquadradas como especiais até a edição da Lei nº 9.032/95, visto que não havia tal exigência na legislação anterior (STJ, AgRg no AREsp 295.495/AL, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA, DJe de 15/04/2013).
Importante ressaltar que o Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), instituído pela Lei nº 9.528/97, emitido com base nos registros ambientais e com referência ao responsável técnico por sua aferição, substitui, para todos os efeitos, o laudo pericial técnico, quanto à comprovação de tempo laborado em condições especiais.
Saliente-se, mais, e na esteira de entendimento deste E. TRF, "a desnecessidade de que o laudo técnico seja contemporâneo ao período em que exercida a atividade insalubre, em face de inexistência de previsão legal para tanto, e desde que não haja mudanças significativas no cenário laboral" (TRF-3, APELREEX 0004079-86.2012.4.03.6109, OITAVA TURMA, Rel. Des. Fed. TANIA MARANGONI, e-DJF3 Judicial 1 DATA: 15/05/2015). No mesmo sentido: TRF 3ª Região, SÉTIMA TURMA, AC - APELAÇÃO CÍVEL - 1423903 - 0002587-92.2008.4.03.6111, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL PAULO DOMINGUES, julgado em 24/10/2016, e-DJF3 Judicial 1 DATA:04/11/2016).
Conforme Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP (fls. 41/42), no período laborado na empresa Laticínios Catupiry Ltda, de 01/12/1984 a 08/11/2005, o autor não ficou exposto a nenhum fator de risco e a atividade por ele exercida de "fabricante de massa" também não se enquadra como especial; assim, impossível o reconhecimento da especialidade do labor.
Quanto à aposentadoria proporcional, seus requisitos etário e contributivo estão estabelecidos na EC nº 20/98, em seu art. 9º:
Dessa forma, com o advento da emenda constitucional em questão, extinguiu-se a aposentadoria proporcional para os segurados que se filiaram ao RGPS a partir de então (16 de dezembro de 1998), assegurada, no entanto, essa modalidade de benefício para aqueles já ingressos no sistema, desde que preencham o tempo de contribuição, idade mínima e tempo adicional nela previstos.
Oportuno registrar que o atendimento às denominadas "regras de transição" deve se dar de forma cumulativa e a qualquer tempo, bastando ao segurado, para tanto, ser filiado ao sistema por ocasião da alteração legislativa em comento.
A esse respeito, confira-se o escólio de Alexandre de Moraes, em sua festejada obra "Direito Constitucional", Ed. Atlas, 31ª ed., pg. 865/866:
Outro não é o entendimento da mais abalizada doutrina sobre o assunto:
Sacramentando a tese de que as exigências contempladas nas regras de transição podem ser cumpridas pelo segurado em momento posterior à edição da EC nº 20/98, destaco excerto, a contrario sensu, contido no voto proferido por ocasião do julgamento do Recurso Especial nº 837.731/SP, in verbis:
Vale lembrar que a intenção do legislador fora a de preservar tanto o direito adquirido dos segurados que tivessem condições para a jubilação, como a expectativa de direito daqueles já participantes do sistema. É o que revela a "Exposição de Motivos" que integrou a proposta enviada ao Congresso Nacional, da Emenda Constitucional nº 20/98, cujo trecho destaco:
Desta forma, somando-se o labor rural reconhecido nesta demanda (22/03/1975 a 30/08/1981) aos períodos em que o autor efetuou recolhimentos (10/1981 a 07/1983 - fls. 43/44) e aos anotados em CTPS (01/09/1983 a 05/11/1984 e 01/12/1984 a 13/05/2008); verifica-se que na data da publicação da EC nº 20/98 (16/12/1998), com 23 anos, 5 meses e 29 dias de tempo total de atividade, o autor não possuía tempo suficiente à concessão do benefício de aposentadoria.
Computando-se os períodos posteriores, na data da citação (13/05/2008 - fl. 67), com 32 anos, 10 meses e 27 dias, observa-se que, apesar de ter cumprido o "pedágio" necessário, com 45 anos de idade, o autor não havia cumprido o requisito etário para fazer jus ao benefício pleiteado.
Ante a sucumbência recíproca, cada parte arcará com os respectivos honorários advocatícios, conforme prescrito no art. 21 do CPC/73. Deixo de condenar qualquer das partes nas custas e despesas processuais, eis que o autor é beneficiário da justiça gratuita e o INSS delas se encontra isento.
Diante do exposto, conheço em parte da apelação do INSS e, na parte conhecida, dou-lhe parcial provimento, para reformar a r. sentença de 1º grau de jurisdição e julgar improcedente o pedido de concessão de aposentadoria por tempo de serviço, deixando de condenar quaisquer das partes nas custas e despesas processuais e, ante a sucumbência recíproca (art. 21, CPC/73), dando a verba honorária por compensada entre os litigantes; mantendo a r. sentença proferida em 1º grau de jurisdição apenas no tocante ao reconhecimento do labor rural no período de 22/03/1975 a 30/08/1981.
É como voto.
CARLOS DELGADO
Desembargador Federal
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