APELAÇÃO CÍVEL Nº 5002203-93.2014.4.04.7214/SC
RELATOR | : | FERNANDO QUADROS DA SILVA |
APELANTE | : | MARIO JORGE LEITE |
ADVOGADO | : | José Augusto Pedroso Alvarenga |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
EMENTA
ADMINISTRATIVO. AÇÃO ORDINÁRIA. PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR. DEMISSÃO. PEDIDO DE REINTEGRAÇÃO AO SERVIÇO PÚBLICO. DESVIO DE FUNÇÃO. RESPONSABILIDADE. CONDUTAS IRREGULARES. COMPROVAÇÃO. ARTIGO 116 DA LEI Nº 8.112/90. FRAGILIDADE DO SISTEMA. MÁ-FÉ E DOLO. PERSEGUIÇÃO POLÍTICA. IRRELEVÂNCIA.
- Hipótese em que os elementos dos autos dão conta de que houve criteriosa observância do devido processo legal, oportunizando-se ao autor produzir e contraditar provas, bem como manifestar-se sobre a toda a prova documental carreada aos autos. Além disso, o processo administrativo disciplinar foi objeto de revisão, conforme parecer da Advocacia Geral da União que embasou da decisão final do Ministro da Previdência Social.
- A conduta do autor, caracterizada pela falta de zelo habitual, manipulação de dados e omissão quanto a pesquisas em base de dados do INSS para fim de conceder benefícios previdenciários, caracteriza descumprimento de dever legal, conduta incompatível com o desempenho da função pública.
- Se o autor utilizou do cargo para obter vantagem em favor de outrem (concessão de benefício previdenciário), autuou, assim, em detrimento da dignidade da função pública. E a falta cometida pelo autor foi grave, eivada de má-fé, pois na condição de servidor do INSS, sabia não estar caracterizada a qualidade de trabalhadora rural de Julieta para a concessão de aposentadoria, bem como conhecia as fragilidades do sistema da Previdência Social, e inseriu no banco de dados da autarquia informações inverídicas sobre a beneficiária, a fim de que fosse apta à concessão da aposentadoria.
- Não há falar em falta de capacitação para o desempenho da atividade de análise e concessão de benefícios previdenciários, pois demonstrado que o autor mostrava-se empenhado, esforçado e disposto a aprender.
- A demissão do autor não está pautada em sucessivos erros administrativos por concessão indevida de benefícios, mas pela conduta dissociada da dignidade da função pública, consistente em facilitação no exame de provas, manipulação de dados, inserção de dados falsos. A responsabilização não decorre de simples culpa, mas de má-fé em detrimento da dignidade da função pública (art. 117, IX, Lei 8.112/90).
- O eventual desvio de função não afasta a responsabilidade do servidor.
- É irrelevante que o processo administrativo tenho tido origem em perseguição política, pois os fatos foram apurados e restaram comprovados.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 3a. Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 02 de outubro de 2015.
Des. Federal FERNANDO QUADROS DA SILVA
Relator
Documento eletrônico assinado por Des. Federal FERNANDO QUADROS DA SILVA, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 7818668v7 e, se solicitado, do código CRC 8BABC643. | |
Informações adicionais da assinatura: | |
Signatário (a): | FERNANDO QUADROS DA SILVA:53012780963 |
Nº de Série do Certificado: | 581DE44528A71A2D |
Data e Hora: | 02/10/2015 18:58:14 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 5002203-93.2014.4.04.7214/SC
RELATOR | : | FERNANDO QUADROS DA SILVA |
APELANTE | : | MARIO JORGE LEITE |
ADVOGADO | : | José Augusto Pedroso Alvarenga |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
RELATÓRIO
Cuida-se de ação ordinária ajuizada por Mário Jorge Leite em face do Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, objetivando a sua reintegração ao cargo público que ocupava, nos termos do caput do art. 28 da Lei nº 8.112/90, e o pagamento dos valores que deixou de receber a título de remuneração e eventuais indenizações desde a data da sua ilegal e abusiva demissão até a efetiva reintegração.
Instruído o feito, sobreveio sentença julgando improcedente a ação e extinto o processo, com resolução do mérito, na forma do art. 269, I, do Código de Processo Civil. Diante da sucumbência, a parte autora foi condenada ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, estes últimos fixados em R$ 3.000,00 (três mil reais), com fundamento no art. 20, § 4º, do Código de Processo Civil.
Não se conformando, apela o autor, sustentando que não pode subsistir o entendimento do julgado, no sentido de que teria aproveitado-se de fragilidades do sistema para, com desídia, deferir benefícios. Narra que era servidor público federal desde 01/10/1981, vinculado ao INSS, em que ocupava o cargo de Agente de Portaria, porteriormente transformado em Agente de Serviços Diversos, encontrando-se logado na agência da Previdência Social de Mafra. Acrescenta que foi vereador do município de Itaiópolis nas legislaturas de 2000/2004 e 2004/2008, bem como dedicou-se ao movimento sindical, sendo diretor do Sindicato dos Trabalhadores em Saúde e Previdência do Serviço Público Federal no Estado de Santa Catarina - SINDPREVS/SC. Destaca que sofreu perseguição política que ensejou sua demissão. Afirma que a perseguição alegada restou devidamente comprovada nos autos, por meios da prova testemunhal prestada. Discorre acerca de suas atuações nos processos de concessão de benefícios tratados na sentença. Assevera que exercia suas atividades em desvio de função, sem que tenha sido treinado para tanto. Defende a ausência de condições para devida prestação de serviços, bem como a ausência de má-fé e dolo em sua conduta. Por fim, pugna pela reforma integral do julgado.
Com contrarrazões, vieram os autos a este Tribunal.
É o relatório.
VOTO
De acordo com os elementos dos autos, em que pese os argumentos do autor, tenho que a r. sentença apreciou com precisão a lide, merecendo ser mantida por seus próprios fundamentos, os quais adoto como razões de decidir (evento 2 SENT 119), in verbis:
"(...) FUNDAMENTAÇÃO
MÉRITO
Do processo administrativo disciplinar
Por meio da portaria da Corregedoria Regional do Instituto Nacional do Seguro Social - INSS em Porto Alegre/RS - CORREPOA nº 053, de 23.5.2008, publicada em 26.5.2008 (fl. 385, apenso I, vol. I), foi instaurado processo administrativo disciplinar, decorrente do processo administrativo nº 35351.000254/2006-26, tendo como objeto apurar irregularidades de conduta do servidor Mario Jorge Leite, integrante do quadro do INSS, sob matrícula 0899996, ocupante do cargo de Agente de Serviços Diversos, Classe S, Padrão V, lotado na Agência da Previdência Social de Mafra, relativamente à concessão de 16 (dezesseis) benefícios previdenciários, relacionados à fl. 389 do apenso I - vol. I.
O autor foi notificado da instauração do procedimento em 4.6.2008 (fl. 403, apenso I - vol. II). Foi cientificado e participou da produção das provas, acompanhado por advogado constituído (fls. 479 e 516, apenso I - vol. II).
Houve exaustiva instrução probatória, incluindo inquirição de testemunhas.
A comissão de sindicância, após a instrução probatória, concluiu pela existência de elementos para o indiciamento do autor (fls. 1.235-1.245; 1.263, apenso I - vol. V).
O autor foi citado em 17.9.2008 (fls. 1.291 - apenso I - vol. VI) e apresentou defesa escrita, por meio de advogado constituído (fls. 1.314 a 1.346, apenso I - vol. VI).
Ao final, os termos da defesa não foram acatados pela comissão processante e a conduta do autor foi enquadrada nos incisos I e III do artigo 116 e nos incisos IX e XV do art. 117 da Lei 8.112/90 (fls. 1.439 a 1.474; 1.516 a 1525, apenso I - vol. VI).
Ressalte-se que os argumentos da defesa foram pormenorizadamente analisados e refutados (fls. 1.548 a 1.603, apenso I - vol. VI).
Por fim, foi sugerida a penalidade de demissão ao autor (fl. 1.668, apenso I - vol. VI).
Os autos foram encaminhados à consultoria jurídica do Ministério da Previdência Social, tendo em vista a competência indelegável do Ministro da Previdência Social para aplicação da penalidade sugerida (fl. 1.674, apenso I - vol. VI).
A Advocacia Geral da União procedeu à nova análise do processo administrativo, concluindo pela aplicação da demissão (fls. 1.690 a 1.703, apenso I - vol. VI), que foi acolhida pelo Ministro da Previdência Social (fls. 1.724 a 1.726, apenso I - vol. VI), expedindo a respectiva Portaria de fls. 1.727:
PORTARIA N 225, DE 26 DE AGOSTO DE 2009
O MINISTRO DE ESTADO DA PREVIDÊNCIA SOCIAL, no uso da atribuição que lhe foi delegada pelo inciso I do art. 1º do Decreto nº 3.035, de 27 de abril de 1999 e tendo em vista o que consta no Processo nº 35351.000254/2006-26 e no PARECER/CONJUR/MPS/Nº 413/2009, aprovado pelo DESPACHO/CONJUR/MPS/Nº 1287/2009, resolve:
Aplicar a penalidade de DEMISSÃO ao servidor MARIO JORGE LEITE, matrícula SIAPE 0899996, ocupante do cargo de Agente de Serviços Diversos, do quadro de pessoal do Instituto Nacional do Seguro Social - INSS/SC, com fundamento no inciso IX do art. 117, por força do art. 132, inciso XIII, e com os efeitos do art. 137, todos da Lei nº 8.112, de 1990, por ter praticado a seguinte infração administrativa: valer-se do cargo para lograr proveito pessoal ou de outrem, em detrimento da dignidade da função pública.
JOSÉ BARROSO PIMENTEL
Houve, assim, criteriosa observância do devido processo legal, oportunizando-se ao autor produzir e contraditar provas, bem como se manifestar sobre a toda a prova documental carreada aos autos. Além disso, o processo administrativo disciplinar foi objeto de revisão, conforme parecer da Advocacia Geral da União que embasou da decisão final do Ministro da Previdência Social.
Conduta do autor
Conforme relatório final da comissão processante, os fatos imputados ao autor, no concernente à análise e concessão dos benefícios, foram os seguintes (fls. 1.587 - apenso I - vol. VI):
a) reabriu e concedeu indevidamente o benefício a que se refere o apenso 01, sem qualquer motivação e sem novos elementos, sendo que o mesmo havia sido indeferido por insuficiência de provas.
Trata-se do benefício de pensão por morte - NB 21/124.592.945-0, de titularidade de Terezinha Calixto.
O excerto do anexo 01 do processo administrativo encontra-se às fls. 770 a 922 (volume IV).
O benefício foi requerido em 6.8.2002 e indeferido em 30.9.2002, conforme cópia da decisão juntada àqueles autos (fl. 814).
Consta à fl. 814 decisão de indeferimento do benefício datada de 30.9.2002. Mas, segundo formulário MOVCON - movimento de concessão, houve concessão do benefício em 6.11.2002 (fl. 836). Outro formulário detalhado (fl. 839), ainda, indica que o autor (portador da matrícula 0899996) teria lançado a informação de regularização de documentação em 6.8.2002, ou seja, anteriormente à data da decisão por meio da qual se houvera negado a concessão.
O termo de homologação de atividade rural data de 6.11.2002, mas a entrevista rural foi realizada em julho de 2002 (apesar de constar com data riscada). Embora ilegível o carimbo do servidor que firmou o termo de homologação, a assinatura pertence ao autor, conforme comparativo com a procuração de fls. 62.
Ocorre que, no ínterim de 30.9.2002 a 6.11.2002, não foi apresentado nenhum documento novo, tampouco consta a motivação da decisão do autor, enquanto servidor, para embasar a revisão do ato administrativo anterior.
Na inicial, o autor afirma que era comum, na APS de Mafra, reabrir o processo que tinha sido concluído pelo indeferimento de benefício, mesmo que o pedido fosse feito oralmente (fl. 20).
Entretanto, a beneficiária Terezinha Calixto, quando interrogada pela comissão processante, afirmou que compareceu uma única vez na Agência do INSS em Mafra para requerer o benefício (fl. 647 - apenso I - volume III).
Em seu depoimento, conforme registrado à fl. 2008, o autor falou que:
O INSS, na época, tinha um mil e duzentos processos represados. Existiam benefícios que, vamos dizer, ficavam um ano e pouco esperando a concessão do benefício, então a ordem que a gerência nos passava era a de limpar a gaveta, não era nem conceder, era limpar a gaveta, ou seja: ou conceder o benefício ou indeferir. Quando nós trabalhávamos no balcão, que eu disse que havia três setores que nós trabalhávamos, se trabalhava às vezes dois meses direto no balcão atendendo ali, então chegava uma hora que você estava que não agüentava. O nosso descanso era ir para a retaguarda, que era um outro setor que tinha e lá era de concessão. Só que quando você estava lá na retaguarda e você não estava no balcão, mas tinha cobrança da gerência que você tinha que despachar um número "x" de benefícios.
Desse modo, se o benefício já tinha sido analisado e indeferido, não havia qualquer justificativa para sua revisão de ofício, procedida pelo autor, mormente, considerando que, na agência, mais de mil processos aguardavam análise e decisão, conforme o próprio autor informou em seu depoimento, acima transcrito.
Mostra-se irrelevante no contexto da apuração da conduta específica do autor se, no mérito administrativo, o beneficiário possuía ou não direito à prestação previdenciária em questão.
Ressalte-se que a pensão por morte foi restabelecida judicialmente, não tendo sido apurada naquele processo, ajuizado pela beneficiária, fraude na concessão do benefício. Tal decisão não afasta a responsabilidade do autor, porque esta, em especial, não foi objeto daqueles autos.
A conduta do autor, enquanto servidor público, não apresenta respaldo dentro dos padrões esperados para com o trato do serviço público. Repise-se, a reabertura do processo ocorreu sem justificativa e a revisão do ato de indeferimento ocorreu sem qualquer motivação fundamentada.
Configurada, assim, deliberada falta de zelo no desempenho do serviço público.
b) homologou tempo de serviço rural sem comprovação documental e concedeu indevidamente o benefício a que se refere o apenso 02;
Trata-se do benefício de aposentadoria por idade - NB 41/129.027.629-0, de titularidade de Djanira Teclak Rodrigues.
O excerto do anexo 02 do processo administrativo encontra-se às fls. 922 (volume IV) a 1.041 (volume V).
Nesse caso, o autor homologou grande período de atividade rural, como segurada especial, em favor da autora, sem documentação em nome próprio e sem verificação de elementos, aparentemente, contrários à pretensão da beneficiária, baseando-se apenas em declaração sindical.
O período homologado foi de 1991 a 2003 (fl. 929). Os documentos pessoais apresentados foram certidão de casamento celebrado em 1964 (fl. 931) e ficha de filiação sindical datada de 2003 (fl. 926).
A entrevista rural, que havia sido concluída por outra servidora, apresentava informações contraditórias, como forma de exercício de atividade, se proprietária ou diarista rural, referindo à propriedade pequena e ao trabalho para terceiros, bem como apresentava rasuras e riscos sobre informações já preenchidas. A própria data do documento está rasurada (fls. 946 a 948).
A servidora que realizou a entrevista admitiu as rasuras e o aproveitamento de formulário anterior parcialmente preenchido, como otimização do seu trabalho. Disse, ainda, Zulma Tereza Antunes, que não competia a ela, naquela fase de habilitação do benefício, realizar consultas aos sistemas (fl. 1.062).
O autor, porém, não conferiu os dados, apesar de todas as rasuras e contradições da entrevista e, baseando-se apenas naqueles documentos, concedeu o benefício.
Desconsiderou a informação constante da certidão de óbito do marido da autora, que faleceu em 1997, no decorrer do lapso reconhecido (de 1991 a 2003), segundo a qual ele exercia atividade diversa, como pedreiro (fl. 932).
Vê-se que o autor faltou com dever de diligência na análise dos requisitos, a fim de averiguar informações complementares. Não realizou consulta aos sistemas do INSS, como o Cadastro Nacional de Informações Sociais - CNIS.
Em seu depoimento, prestado perante a comissão processante, afirmou, em resposta à pergunta 27:
que não lembra se consultou mas que, se no momento da concessão, o CNIS estava fora do ar, não dava para conceder a consulta e como a cobrança era grande conforme já explicado neste depoimento, concedia o benefício sem proceder à consulta.
Mostra-se evidente, na forma de proceder do autor, que houve o abrandamento da verificação do cumprimento dos requisitos para concessão do benefício. Significa dizer que o autor, na qualidade de servidor do INSS, fez uma análise superficial do cumprimento dos requisitos.
Em se tratando de benefício de caráter excepcional, cuja concessão dispensa o recolhimento de contribuições, mais rigorosa deveria ser a análise do cumprimento de seus requisitos.
Ademais, em sendo o caso de o sistema estar fora do ar, conforme alegado, a conclusão do processo deveria ter sido postergada, além de terem sido apurados mais elementos para a concessão.
Mais uma vez, ressalte-se que o fato de o benefício ter sido restabelecido judicialmente não afasta a conclusão do processo administrativo disciplinar, pois o que se questiona é a conduta do autor, que no caso, não foi diligente como exige o desempenho do serviço público.
c) concedeu indevidamente o benefício a que se refere o apenso 03, registrando como base documental documento inexistente;
Trata-se do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição - NB 42/114.451.815-3, de titularidade de Dorvalino Andzziwski.
O excerto do anexo 03 do processo administrativo encontra-se às fls. 1.044 a 1.249 (volume V).
Nesse caso, o segurado apresentou declaração sindical, segundo a qual, o período laborado na lavoura seria de 8.8.1963 a 1974 (fl. 1.052). A entrevista rural foi realizada pelo autor, em que foi consignado que o requerente teria iniciado o exercício de atividade urbana em 1974, mas foi sugerida a averbação até o final daquele ano (31.12.1974), além do ano de 1962 - fls. 1.084 a 1.086. O período homologado pela Chefe de benefícios foi de 1º.1.1968 a 31.12.1974 como tempo de serviço rural (fl. 1.053).
Os erros na análise da documentação seriam a desconsideração da ocupação de operário constante da certidão de casamento do autor em 1973 e a inexistência de prova material posterior, além da falta de consulta aos sistemas de dados do INSS para averiguação de atividade diversa (fl. 1.243).
De fato, consta da própria contagem de tempo de serviço/contribuição que o autor possuía vínculo empregatício em 1974, cujo período foi, porém, corretamente, subtraído da contagem (fl. 1.047).
Outra irregularidade apontada foi a inclusão do período de 1.1.1962 a 31.12.1966 como tempo de serviço rural, como lançamento na base de dados de que teria feito com base em "INCRAS da mãe". Perguntado sobre isso, em seu depoimento, explicou que colocou errado tal observação, sendo que o documento correto é comprovante de Imposto Territorial Rural - ITR da mãe; que a partir de 1964, o documento passou a ser fornecido pelo INCRA, mas antes, quando sob responsabilidade do IBRA - Instituto Brasileiro de Reforma Agrária, era fornecido pelos Municípios (fl. 1.042 - apenso I - volume V).
Os documentos referidos encontram-se às fls. 1.064 a 1.069 (volume 5). Estão acompanhados de declaração de servidor do Município de Itaiópolis, no sentido de que Michalina Czislinski contribuiu para o Imposto Territorial Rural, referido como imposto sobre exploração agrícola (fl. 1.063 volume 5).
O autor foi questionado ainda porque não exigiu mais diligências, tendo em vista rasura constante no documento de fls. 1.064, ao que respondeu que não teria observado (fl. 1.043 - apenso I - volume V).
Ainda, o autor não soube explicar porque incluiu o ano de 1966 na contagem de tempo de serviço do segurado, tendo em vista os comprovantes de Imposto Territorial Rural - ITR datarem de 1962 a 1965, ao proceder a revisão determinada pela Ação Civil Pública 2000.72.01.001273-0 (fl. 1.118 - volume V).
No caso deste benefício, considerando a vasta documentação rural apresentada pelo segurado, comprovando propriedade rural da mãe a partir de 1959, pagamento de Imposto Territorial Rural - ITR de 1962 a 1965, certidão de reservista do autor datada de 1968, bem como, a homologação anterior, a partir de 1968, entendo que correta a análise do servidor, ainda que o segurado não tenha pedido expressamente a contagem do tempo de serviço a partir dos 14 anos, uma vez que compete à Previdência Social esclarecer aos segurados sobre seus direitos e os meios de exercê-los.
Noutro vértice, a inclusão do período de 28.10.1973 a 31.10.1974, nesse contexto, considerando a documentação do processo de concessão do benefício, e, principalmente, não havendo vínculo formal no período, pode ser considerada erro administrativo.
d) concedeu indevidamente o benefício a que se refere o apenso 04, sem homologação do período rural, desconsiderando informação de aposentadoria urbana constante da entrevista;
Trata-se do benefício de aposentadoria por idade - NB 41/122.187.647-0, de titularidade de Florentina Wielgus Wonzovicz.
O excerto do anexo 04 do processo administrativo encontra-se às fls. 1.251 a 1.423 (volume VI).
Nesse caso, o autor reconheceu grande período de atividade rural, como segurada especial, em favor da autora, sem verificação de elementos, aparentemente, contrários à pretensão da beneficiária.
Por ocasião da entrevista rural, a servidora que a realizou observou pela impossibilidade de conclusão sem levantamento de dados e oitiva de depoimentos, haja vista a informação de que o marido da autora era beneficiário de benefício concedido sob a condição de segurado urbano (fls. 1.275-1.276).
Todavia, o autor, prosseguiu na análise do processo, procedeu à oitiva de testemunhas e, sem fazer qualquer consulta ou pesquisa sobre a atividade do marido nos sistemas do INSS, concedeu o benefício à interessada (fls. 1.278 a 1.286).
Ainda, deixou de considerar que a requerente e o marido possuíam diversos imóveis rurais, o que exigia maior diligência, diante da possibilidade de descaracterizar o regime de economia familiar.
Novamente, o autor faltou com dever de diligência na análise dos requisitos, a fim de averiguar informações complementares. Não realizou consulta aos sistemas do INSS, como o Cadastro Nacional de Informações Sociais - CNIS ou outro para verificação da renda do marido.
Em seu depoimento, prestado perante a comissão processante, perguntado por que deixou de encaminhar a declaração sindical de exercício de atividade rural para autoridade competente, respondeu que não o fez "porque tem provas plenas no processo: Bloco de Notas e ITR" (pergunta 38).
Apesar de toda a certeza afirmada acima, qualificando a prova documental como "plena", ao ser perguntado por que não diligenciou acerca da existência de várias propriedades de titularidade da interessada, contradiz-se, afirmando que "não tem conhecimento suficiente para decifrar as informações constantes do documento, por falta de preparação e treinamento" (fl. 1.043 - apenso I - volume 5).
O documento citado pela comissão é a cópia da declaração de Imposto Territorial Rural - ITR de fls. 1.259 (volume 6). Ou seja, integra a documentação considerada plena pelo autor para concessão do benefício.
Mostra-se evidente, na forma de proceder do autor, que houve o abrandamento da verificação do cumprimento dos requisitos para concessão do benefício. Significa dizer que o autor, na qualidade de servidor do INSS, fez uma análise superficial do cumprimento dos requisitos.
Em se tratando de benefício de caráter excepcional, cuja concessão dispensa o recolhimento de contribuições, mais rigorosa deveria ser a análise do cumprimento de seus requisitos.
e) incluiu tempo de atividade rural no cálculo do tempo de contribuição do benefício a que se refere o apenso 05, sem a devida comprovação documental, ignorando indício de prova e/ou prova documental em contrário existente no processo, deixando de esclarecer indícios de irregularidades;
Trata-se de benefício de aposentadoria por tempo de contribuição - NB 132.162.578-0, de titularidade de Jorge Moacir Bay.
O excerto do anexo 05 do processo administrativo encontra-se às fls. 1.426 (volume VI) a 1.742 (volume VI).
Neste caso, o autor, enquanto servidor do INSS, procedeu a toda análise da concessão do benefício, incluindo tempo de serviço rural indevido.
O benefício foi requerido em 25.3.2004. Na mesma data, o segurado foi entrevistado por estagiária do INSS acerca da atividade rural, cujo período pretendia averbar. Veja-se que a entrevista não foi revisada por nenhum outro servidor, tampouco homologada (fls. 1.500 - volume VI; 1.501 - volume VII).
Entretanto, o servidor Mario Jorge Leite analisou os documentos, incluiu tempo de serviço e realizou a respectiva contagem em dois dias, de 1º a 2 de maio de 2004, finalizando a concessão em 5.5.2004, conforme relatório do sistema (fls. 1.583 a 1.587).
Na análise do tempo de serviço rural, baseou-se apenas na prova de propriedade rural em nome do pai do segurado. Este não apresentou nenhum documento pessoal em nome próprio.
Além disso, consta da certidão de registro de imóvel de propriedade do pai do segurado, que ele era funcionário público estadual em 1959 (fls. 1.486). O próprio beneficiário juntou contrato social de constituição de sociedade empresária industrial em 1975 (fl. 1.447 - volume VI), concomitantemente ao final do período rural averbado, que foi de 1º.1.1967 a 16.1.1976 (fls. 1.431 - volume VI). Elementos evidentes e suficientes para suscitar análise mais rigorosa quanto à caracterização da exploração agrícola sob o regime de economia familiar.
O autor, porém, não efetuou qualquer diligência, não realizou nova entrevista, mais detalhada, não consultou os sistemas de dados para obter informações sobre os rendimentos do pai do segurado, por exemplo.
Questionado em seu interrogatório, prestado perante a comissão processante, porque incluiu tempo de serviço em desacordo com a documentação e com a entrevista, respondeu que se enganou ao contar o período até 1976 porque não se deu conta que tinha tempo urbano comprovado no mesmo período (apenso I - vol. I, fl. 1.044).
Perguntado sobre o contrato social, datado de 1975, em que o interessado constava como sócio de empresa industrial, respondeu apenas que "não observou, não prestou atenção nisso" (apenso I - vol. I, fl. 1.045).
A respeito de não ter exigido prova de outras propriedades da família do interessado, respondeu que não observou e não sabe analisar as informações que constam da declaração de cadastro de imóvel rural. Afirmou, ainda, que não solicitou cadastro do INCRA de todas as propriedades porque não observou que havia mais de uma propriedade (pergunta 51, apenso I - vol. I, fl. 1.045).
Além disso, incluiu informação inverídica na base de dados do PLENUS, ao registrar que o benefício teria sido concedido com base em ação judicial (fl. 1.573 - volume VI). Diligenciado sobre a ação referida, a comissão processante constatou se tratar da ação civil pública 2000.72.01.001273-0, que diz respeito à aceitação de documentos em nome de terceiros como início de prova material (fls. 1.669 a 1.675 - volume VI).
Tal anotação certamente evitaria uma eventual pesquisa de atividade rural ou justificação administrativa por parte do órgão previdenciário.
Ou seja, há indício da existência de manipulação de dados para burlar eventual auditoria e justificar a conduta indevida, que consistiu em averbar tempo de serviço rural, sem a devida análise criteriosa.
O beneficiário Jorge Moacir Bay ajuizou, ainda, ação de restabelecimento do benefício (autos nº 5008349-97.2011.404.7201/SC, que tramitaram nesta subseção judiciária), em que seu pedido foi julgado improcedente. A sentença foi mantida pela 1ª Turma Recursal de Santa Catarina, cuja relatora, em seu voto, acrescentou:
Em cotejo aos documentos apresentados no evento 43, concluo que o pai do autor sempre recebeu remuneração superior ao salário mínimo.
Consta no documento do evento 43, OUT2, que o pai do autor foi admitido como Escrivão D-19, em 12.09.1960, com Vencimento de Cr$ 15.200,00 e Salário Família de Cr$1.200,00, totalizando Cr$ 16.400,00. Saliento que, à época, o salário mínimo era de Cr$ 6.000,00 (Dec 45.106-A, de 24.12.1958).
Ainda, no referido documento, consta uma averbação da seguinte forma:
'Dec. 17/6/71 - D. Of. 8/7/1971 - Conceder aposentadoria no cargo da classe PF-15, da carreira de Exator, do Q.G.P.E., lotado na Coletoria de Itaiópolis, com os segtes proventos: Cr$ 469,00; Adicional de 25% = Cr$117,25 e vantagens incorporadas - Cr$ 1.121,80 ou seja com os proventos mensais de Cr$ 1.708,05.'
Considerando que o salário mínimo em julho de 1971 era de Cr$ 225,60, o pai do autor, ao se aposentar recebia pouco menos de oito vezes o valor do salário mínimo. Ainda que se fosse considerar somente o vencimento básico, Cr$ 469,00, é mais que o dobro do salário mínimo.
Assim, entendo que a parte autora não demonstrou a imprescindibilidade da atividade rural para a sua subsistência e de sua família, razão pela qual deve ser negado provimento ao recurso, mantendo-se a sentença de procedência com relação aos períodos supra. (voto - evento 49 dos autos
5008349-97.2011.404.7201/SC).
Houve interposição de recurso que aguarda análise de admissibilidade.
O exercício de atividade diversa pelo pai do segurado deveria ser objeto de diligências pelo autor, uma vez que dispunha, à época da concessão, de dados documentais.
Tal como já procedido na análise de outro benefício, o autor relativizou a análise dos requisitos, em flagrante abrandamento dos requisitos para concessão do benefício, além da manipulação de dados e informações, omitindo, deliberadamente, elementos contrários à pretensão do interessado.
Aqui, o autor foi além, pois a manipulação e inserção de dados falsos no sistema do INSS revela má-fé e não apenas falta de zelo.
Observe-se que a conduta do autor foi denunciada como ilícito penal, conforme ação penal de autos nº 5000316-79.2011.404.7214, que se encontram conclusos para sentença nesta subseção.
f) concedeu indevidamente o benefício a que se refere o apenso 07, deixando de esclarecer indícios de irregularidades e firmando habilitação do benefício e realização de Entrevista Rural, procedimentos estes não confirmados pela titular do benefício em depoimento prestado neste processo, no qual também afirmou não ter comparecido no INSS de Mafra pra requerer o benefício, afirmando também que entregou toda a documentação no Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Itaiópolis, tendo sido categórica ao afirmar que conhece o servidor do INSS MÁRIO JORGE LEITE, que sabe que ele é vereador em Itaiópolis e que não foi atendida por ele no INSS;
Trata-se do benefício de aposentadoria por idade - NB 41/115.758.113-4, de titularidade de Judite Winiarski Heilmann.
O excerto do anexo 07 do processo administrativo encontra-se às fls. 1.745 (volume VII) a 1.854 (volume VIII).
Nesse caso, o autor reconheceu grande período de atividade rural, como segurada especial, em favor da autora, sem verificação de elementos, aparentemente, contrários à pretensão da beneficiária.
Por ocasião da entrevista rural, realizada pelo próprio autor, a interessada informou que o marido possuía um estabelecimento comercial (fls. 1.766-1.767 - volume VIII).
Todavia, o autor concluiu favoravelmente a entrevista sem fazer qualquer consulta ou pesquisa sobre a atividade do marido nos sistemas do INSS, concedendo o benefício à interessada (fls. 1.767 (ao final) e 1.768 - volume VIII).
Mais uma vez, o autor faltou com dever de diligência na análise dos requisitos, a fim de averiguar informações complementares. Não realizou consulta aos sistemas do INSS, como o Cadastro Nacional de Informações Sociais - CNIS ou outro para verificação da renda do marido.
Em seu depoimento, prestado perante a comissão processante, perguntado por que deixou de encaminhar a declaração sindical de exercício de atividade rural para homologação pela autoridade competente, respondeu que não o fez porque tinha provas plenas (pergunta 55 - fl. 1.046 - apenso I - volume V).
Mostra-se evidente, na forma de proceder do autor, que houve o abrandamento da verificação do cumprimento dos requisitos para concessão do benefício. Significa dizer que o autor, na qualidade de servidor do INSS, fez uma análise superficial do cumprimento dos requisitos.
Em se tratando de benefício de caráter excepcional, cuja concessão dispensa o recolhimento de contribuições, mais rigorosa deveria ser a análise do cumprimento de seus requisitos.
Mais uma vez, ressalta-se que o fato de o benefício ter sido restabelecido judicialmente não afasta a conclusão do processo administrativo disciplinar, pois o que se questiona é a conduta do autor, que no caso, não foi diligente como exige o desempenho do serviço público.
Trata-se de conduta desprovida de análise criteriosa, portanto.
g) concedeu indevidamente o benefício a que se refere o apenso 08, incluindo tempo de atividade rural, Segurado Especial, período 02/07/90 a 04/04/2002, registrando como base documental "Contrato de Arrendamento" documento inexistente no processo e deixando de esclarecer indícios de irregularidades;
Trata-se do benefício de aposentadoria por idade - NB 41/123.322.322-1, de titularidade de Judith Ramilia Worm.
O excerto do anexo 08 do processo administrativo encontra-se às fls. 1.856 a 1969 (volume VIII).
Nesse caso, o autor reconheceu grande período de atividade rural, como segurada especial, em favor da autora, sem verificação de elementos, aparentemente, contrários à pretensão da beneficiária.
A autora é casada e não houve consulta aos sistemas do INSS sobre a atividade do marido e respectiva renda, para fins de caracterização do regime de economia familiar.
A autora instruiu seu pedido com contrato de comodato, elaborado extemporaneamente (fl. 1.863 e verso).
Durante o processo administrativo de apuração das irregularidades, ficou constatado que o contrato foi redigido em computador com data de emissão de 1990, quando sequer existiam impressoras de jato de tinta disponíveis no mercado e o acesso a computadores para fins de edição de texto pessoal em tiragem única era praticamente inexistente (fl. 1.963 - volume VIII).
Vê-se que cabia ao servidor do INSS, por laborar com sistemas informatizados, atentar para a fraude cometida, requisitando maiores esclarecimentos, pesquisas ou informações.
Observa-se que a interessada ajuizou ação almejando ao restabelecimento do benefício, autos nº 2010.72.64.002825-1, cujo processo foi extinto sem apreciação do mérito, porque a pretensão já havia sido discutida em ação ajuizada na Comarca de Itaiópolis - autos nº 032.08.001086-7.
Sobre o mérito da questão, aquele juízo assim decidiu:
Adoto, como razões de decidir, o douto Parecer Ministerial de lavra do douto Promotor de Justiça da Comarca, Dr. Pedro Roberto Decomain:
"O fulcro do pedido está em que os documentos apresentados quando do pedido de concessão do benefício comprovariam adequadamente o exercício da atividade rural em regime de economia familiar pelo tempo necessário para a obtenção do benefício.
De modo mais específico, tudo gravita em torno da eficácia ou não do instrumento de um alegado contrato de comodato havido entre a autora e o Sr. Aristeu Pickcius, datado de 1990, e a partir do qual se poderia inferir que já então se dedicava a requerente ao labor na agricultura.
Cópias do aludido instrumento do contrato de comodato acham-se acostadas a fls. 12 e 65.
No documento se acha consignado, item 2, que o contrato teria tido início em 02 de julho de 1990, não ficando sujeito a prazo determinado.
Verifica-se também da cópia acostada a fls. 12, que do verso constam dois carimbos: um de autenticação de fotocópia, datada de 15 de março de 2002, não relevante para o tema em discussão, e outro de reconhecimento de firma, subscrito pela Srª. Milene Camilo, então escrevente juramentada do Tabelionato local, datado de 02 de julho de 1990, no qual se afirma serem autênticas as assinaturas da autora e do Sr. Aristeu Pickcius, apostas naquele documento.
Os argumentos do INSS, para sustentar a invalidade daquele documento como prova de labor na agricultura por parte da requerente são basicamente dois: emissão com uso de computador e impressão com impressora a jato de tinta. Computadores seriam de uso menos divulgado na época do que hoje e impressoras a jato de tinta não haveria então disponíveis no mercado brasileiro.
O documento original não veio aos autos, Os argumentos apontados, com a devida vênia, são conjecturas, talvez até procedentes, mas para as quais não existe qualquer prova.
Sem embargo, ainda assim se acabou por evidenciar, durante a instrução, que o documento era mesmo inservível para comprovação de atividade rural desde 02 de julho de 1990.
É que no documento em questão o proprietário do imóvel, Aristeu Pickcius, foi qualificado como aposentado. Ocorre, todavia, que, como demonstrado pelo documento de fls. 213, juntado a requerimento do INSS, e também daqueles de fls. 234-236, juntados a requerimento do Ministério Público (fls. 291), se comprova sem sombra de dúvida que a aposentadoria do Sr. Aristeu Pickcius somente foi requerida por ele no dia 17 de dezembro de 1992.
Assim, não haveria como cogitar de ser ele qualificado como aposentado, em documento datado de mais de dois anos antes: julho de 1990. Em decorrência, fica também sob inafastável suspeita a data aposta no carimbo de reconhecimento de firma, no verso daquele documento, 02 de julho de 1990.
Tudo leva a crer, portanto, que o documento foi redigido mesmo em momento posterior, para servir como suporte para o requerimento de aposentadoria da requerente. Todavia, diante da severa restrição de que padece, que leva inclusive à convicção de não ser efetivamente contemporâneo ao período cujo tempo de atividade rural se pretendia com ele comprovar, não pode ser utilizado para essa finalidade.
A conduta do autor revela falta de zelo com o trato da coisa pública, ao deixar de analisar rigorosamente documentação necessária para concessão de benefício.
Ressalte-se que não é necessário nenhum treinamento ou capacitação específica para a análise da autenticidade documental, por exemplo.
Ainda, deixou de considerar que o filho e o marido da requerente possuíam atividade diversa, conforme informado em certidão de casamento do filho, celebrado em 1994 (fl. 1.859 - volume VIII).
Novamente, o autor faltou com dever de diligência na análise dos requisitos, a fim de averiguar informações complementares. Não realizou consulta aos sistemas do INSS, como o Cadastro Nacional de Informações Sociais - CNIS ou outro para verificação da renda do marido.
Somando-se a isso, as notas fiscais juntadas ao processo de concessão referem-se à comercialização de produtos pecuários entre o comodatário e a interessante, divergindo quanto ao objeto do comodato, que dizia respeito exclusivamente ao plantio de cereais.
Em seu depoimento, prestado perante a comissão processante, perguntado sobre os procedimentos adotados neste benefício, limitou-se a dizer que não observou nenhum dos indícios de irregularidades apontados (fl. 1.047 - apenso I - volume 5).
Mostra-se evidente, na forma de proceder do autor, que houve o abrandamento da verificação do cumprimento dos requisitos para concessão do benefício. Significa dizer que o autor, na qualidade de servidor do INSS, fez uma análise superficial do cumprimento dos requisitos.
Em síntese, descumpriu o seu dever legal de analisar cautelosamente o cumprimento dos requisitos legais para concessão de benefícios.
h) concedeu irregularmente o benefício a que se refere o apenso 09, desconsiderando indícios de irregularidades e sem consulta ao Cadastro Nacional de Informações Sociais - CNIS;
Trata-se do benefício de aposentadoria por idade - NB 41/119.965.983-6, de titularidade de Julieta Scodro Breda.
O excerto do anexo 09 do processo administrativo encontra-se às fls. 1.971 (volume VIII) a 2.199 (volume IX).
A conduta do autor, no procedimento deste benefício, caracterizou ilícito penal, conforme apurado nos autos de nº 2009.72.14.000834-0, cujas razões ora transcrevo:
A materialidade delitiva foi inequivocamente demonstrada pelos elementos colhidos na esfera administrativa (fls. 5-175 e apenso I).
A ré Julieta Scodro Breda, ao requerer o benefício de aposentadoria por idade rural, apresentou documentos que não poderiam ter sido aceitos como prova da atividade.
O réu Mario Jorge Leite, servidor do INSS, foi o responsável pela concessão do benefício, desconsiderando as irregularidades na documentação apresentada por Julieta.
São visíveis as irregularidades na concessão do benefício previdenciário para a acusada, bastando analisar os documentos apresentados com o requerimento da aposentadoria (fls. 5-25).
Consta da certidão de casamento que a interessada exercia atividade de doméstica e seu cônjuge era comerciante (fl. 7).
Segundo o relatório individual da Previdência Social (fls. 88-90) não foi apresentada declaração de atividade rural emitida por sindicato rural da região e não há termo de homologação da atividade rural. Não foram juntados documentos comprobatórios de imóveis rurais em nome da acusada ou de seu cônjuge, tampouco foi requerida pesquisa de atividade rural ou justificação administrativa.
Para a habilitação do benefício foi criado um NIT (número de identificação do trabalhador) de segurado especial registrado sob n. 1.164.050.881-8 para a identificação da beneficiária Julieta (fls. 41-42), o que impediu a importação dos períodos de atividade urbana do NIT 1.142.331.292-3, o qual existia em nome da empresária Julieta Scodro Breda (fls. 39-40 e 44-45).
Na entrevista realizada por estagiária (fls. 26-27), a ré Julieta declarou que é proprietária de terreno rural, mas não apresentou documento que comprovasse tal afirmação, fato que não impediu a concessão do benefício pelo servidor Mário Jorge Leite. No relatório final do processo administrativo disciplinar (fl. 147 do apenso I), foi registrado que "os estagiários não têm autorização para formatar a concessão de benefícios, cabendo aos servidores a responsabilidade de examinar a documentação e conferir os dados por eles registrados antes de autorizar a concessão de benefícios, fato sabido por todos os servidores".
O cônjuge da acusada Julieta é inscrito como contribuinte individual desde 1.4.1979, conforme extrato de recolhimentos juntado às fls. 50-52. A ré Julieta apresentou notas fiscais em nome de seu cônjuge Walter Breda (fls. 9-22), a fim de conseguir o benefício de aposentadoria rural em regime de economia familiar, mas tais documentos também apresentam informações inverídicas. A nota fiscal de produtor 285723 foi apresentada de duas maneiras e com diversas irregularidades (fls. 12 e 22). Na nota fiscal de fl. 12 consta como destinatário Marino Lema e transportador Marcos Breda, porém não informa o nome e registro do produtor, foi impressa em 29.5.1995 e tem como data de saída do produto 19.5.1988. Sua suposta data de emissão está rasurada. Por outro lado, a mesma nota fiscal 285723 (fl. 22) apresenta como destinatário e transportador Odilon Herbst, produtor Walter Breda, foi impressa em 29.5.1995 e tem como data de emissão e saída do produto o dia 5.6.1998.
A nota fiscal de produtor 285722 também está em duplicidade e com diferenças no preenchimento (fl. 17 e 21). Na nota fiscal de fl. 17 consta como destinatário Nilo Breda e transportador Marcos Breda, porém não aparece o nome e registro do produtor, foi impressa em 29.5.1995 e tem como suposta data de saída do produto e emissão 8.8.1993. Por outro lado, a mesma nota fiscal 285722 (fl. 21) apresenta como destinatário e transportador Nilo Breda, produtor Walter Breda, foi impressa em 29.5.1995 e tem como data de emissão e saída do produto o dia 7.8.1997.
Além disso, a moeda vigente em 19.5.1988 era o cruzado (Cz$), e não o Real (R$), conforme impresso na nota fiscal de produtor 285723 (fl. 12). Em 8.8.1993, por outro lado, a moeda era o Cruzeiro Real (CR$) e não o Real (R$), conforme impresso na nota fiscal de produtor 285722 (fl. 17). Diante de tais evidências, é possível concluir que as informações lançadas nas notas fiscais 285722 e 285723 (fls. 12 e 17) são falsas.
Desse modo, o réu Mário Jorge Leite inseriu dados falsos no sistema e concedeu o benefício rural de aposentadoria por idade para Julieta Scodro Breda, desrespeitando as normas legais previdenciárias.
Outros detalhes sobre as notas de produtor rural de fls. 7-22 apresentadas pela ré quando requereu a aposentadoria foram destacados pelo Ministério Público Federal nas suas alegações finais (fls. 323-331):
(...) Não obstante, a nota de fl. 13, que consta a venda de 12.600 pintos de 01 (um) dia a Walter Breda, marido da ré Julieta, foi emitida em 03/10/1990 e a data de saída dos produtos consta 27/05/1992. Não é crível, que se tratando de animais, o vendedor tenha esperado quase dois anos para entregar o produto!
Além disso, o CNPJ de Nilo Breda, notas de fls. 14 e 18 e Evandro José Breda, nota de fl. 15, constam como inexistentes no site da Receita Federal do Brasil². Isto para não mencionar as demais irregularidades perceptíveis quando se procede uma investigação mais acurada sobre os documentos.
O órgão previdenciário apresentou farta documentação para demonstrar a situação do benefício de aposentadoria por idade concedido a Julieta Scodro Breda (fls. 5-175), destacando as irregularidades no relatório conclusivo (165-169) e providências adotadas no parecer 20.224/24/2008 (fls. 173-175).
Diante de tantas irregularidades na documentação apresentada, não havia justificativa legítima para a inserção de dados falsos no sistema e a concessão do benefício previdenciário.
As testemunhas Demétrio Niedziewski e Paulo Ostrovski afirmaram que o marido da ré Julieta realizava serviços na lavoura e que tinha uma granja, bem como sabiam que o réu Mário Jorge Leite era vereador e funcionário do INSS, mas não prestaram nenhuma informação em relação ao requerimento do benefício de aposentadoria (fls. 294 e 295).
Alaídes Terezinha Leite prestou depoimento à fl. 316 e disse que: é irmã do réu Mário; trabalha no INSS desde 1977, no cargo de datilógrafa; na época dos fatos havia 1.300 benefícios represados; eram tirados relatórios e a chefia determinava que fossem despachados os mais atrasados; no primeiro atendimento eram feitas cópias e a autenticação dos documentos; tinha dias que, além do atendimento, analisava mais de 20 benefícios; a análise consistia em conferência e despacho dos processos; não lembra se na época o cadastro do NIT era feito no balcão ou quando o processo era analisado na retaguarda; não recebeu treinamento para trabalhar na concessão dos benefícios, apenas o pessoal de Joinville mandou uma cartilha para os funcionários; Mário foi vereador em Itaiópolis com término em 2008, em dois mandados, de modo que o início foi em 2000.
A testemunha Wilba de Fátima Anies Tiburski, inquirida à fl. 317, afirmou que: trabalha no INSS desde 1995 no cargo de agente administrativo; atendia o público e fazia análise dos processos; o réu Mário era agente de portaria e exercia as mesmas atividades; a documentação era recepcionada no balcão; era feita entrevista e depois eram lançadas informações no sistema; passava para uma gaveta para uma análise posterior na retaguarda; no balcão eram conferidos os documentos, mas a homologação do tempo de serviço era feita na retaguarda; os estagiários faziam entrevista, recepcionavam e autenticavam documentos; na retaguarda, os processos eram analisados posteriormente pelos funcionários; deviam, de preferência, ser analisados os processos mais antigos; a demanda de processos era grande; não havia um número determinado de processos a serem analisados pelos funcionários; não havia tempo estipulado para despacho de cada processo; na análise dos processos era averiguada toda a documentação anexada ao requerimento do benefício; a responsabilidade de autenticação dos documentos era do balcão; os funcionários - incluída a depoente - aprendiam a despachar os processos na prática, sendo as dúvidas tiradas com os colegas; os processos deveriam ser analisados por ordem de represamento, ou seja, os mais antigos.
Interrogada em juízo, às fls. 312-313, a ré Julieta afirmou que: não procurou Mário Jorge Leite para requerer a aposentadoria, só conhecia o réu da cidade; foi uma mulher loira que lhe atendeu no INSS, mas não sabe o nome dela; levou os documentos na primeira vez que foi ao INSS, em nome de seu marido; a pessoa que lhe orientou sobre o benefício de aposentadoria "foi alguém lá" que disse que tinha idade e podia ir ao INSS com as notas de produtor, não sabe dizer quem; seu menino Marcos pegou em uma caixa as notas que diziam que precisava levar.
O réu Mário Jorge Leite, interrogado às fls. 314-315, disse que: pegou o processo na última fase; foi a estagiária Elisa Stefens que cadastrou o pedido de aposentadoria no sistema do INSS; a chefia encaminhava os relatórios com os benefícios mais antigos para serem analisados e despachados pelos servidores; na época era vereador em Itaiópolis, tendo sido eleito por dois mandatos; inúmeras pessoas o procuravam pelo motivo de ser funcionário do INSS e trabalhar na Câmara Municipal; o represamento de processos era muito grande; era obrigado a despachar os benefícios e a qualidade não interessava, era o que a gerência de Joinville fazia; hoje iria olhar o que diz a lei; havia benefícios que aguardavam dois anos para serem despachados; foi nomeado para ser auxiliar de portaria e ao longo do tempo passou a trabalhar na concessão de benefícios; nunca fez curso no INSS; é técnico em contabilidade desde 1989 e passou a exercer a função depois de sua exoneração; no processo administrativo não foi imputada pena por falsificação de documentos ou inserção de documento falso.
Há uma grande contradição entre as provas apresentadas nos autos e as alegações dos réus.
A defesa de Mário Jorge Leite alegou que não ficou comprovada a participação do acusado em nenhum crime. A defesa de Julieta Scodro Breda também nega a autoria dos fatos descritos na denúncia.
Após análise da prova documental e testemunhal colhida nos autos, é possível concluir que ocorreram várias irregularidades no processo de aposentadoria da ré Julieta: a ausência de declaração de atividade rural emitida por Sindicato Rural da região e do termo de homologação da atividade rural; não foram juntados documentos comprobatórios de imóveis rurais em nome da acusada ou de seu cônjuge; não foi requerida pesquisa de atividade rural ou justificação administrativa; a criação de um novo NIT de segurado especial, apesar de existir outro em nome da empresária Julieta Scodro Breda; o cônjuge da acusada Julieta é inscrito como contribuinte individual desde 1.4.1979 e a utilização de notas fiscais de produtor falsas.
Mário Jorge Leite era um servidor experiente do INSS e, como tal, tinha ciência inequívoca dos procedimentos e cuidados exigidos pela legislação previdenciária para a concessão de benefícios e inserção dos dados no sistema previdenciário.
Não se justifica a inserção de dados falsos e a concessão indevida em simples desatenção do funcionário, mas sim na sua condescendência ativa e criminosa com a prática da fraude contra a Previdência, tudo com o fim de favorecer o recebimento de aposentadoria indevida pela acusada Julieta e, certamente, para receber vantagem política também indevida.
Outro sinal indicativo da participação criminosa de Mário é que a ré Julieta requereu a sua aposentadoria e no mesmo dia houve a sua concessão, ou seja, a habilitação do benefício e o despacho concessório ocorreram com extraordinária celeridade em 17.5.2001 (fls. 5, 31 e 58) e o primeiro pagamento foi recebido em 8.6.2001 (fl. 62). Observa-se que Mário Jorge Leite (matrícula 0899996) assinou o documento de fl. 31 e no documento de fl. 58 aparece o número de sua matrícula como servidor responsável pela inclusão do benefício previdenciário.
Essa grande agilidade na concessão da aposentadoria de Julieta ocorreu de forma privilegiada, tendo em vista o elevado número de processos acumulados na agência previdenciária de Mafra/SC, os quais demoravam até dois anos para serem despachados, conforme destacado nos depoimentos de Alaídes Terezinha Leite e Wilba de Fátima Anies Tiburski (fls. 316 e 317) e no interrogatório do réu Mário (fls. 314-315), abaixo mencionados:
Alaíde Terezinha Leite - (...) na época dos fatos havia 1300 benefícios represados, eram tirados relatórios e a chefia determinava que fossem despachados os mais atrasados (...) (fl. 316).
Wilba de Fátima Anies Tiburski - (...) na retaguarda, os processos eram analisados posteriormente pelos funcionários, deviam, de preferência, ser analisados os processos mais antigos; a demanda de processos era grande (...) (fl. 317).
Mário Jorge Leite - (...) o represamento de processos era muito grande, era obrigado a despachar os benefícios e a qualidade não interessava, era o que a gerência de Joinville fazia; hoje iria olhar o que diz a lei; havia benefícios que aguardavam dois anos para serem despachados (...) (fls. 314-315).
Mário disse que não sabia se conhecia ou não Julieta, afirmando que não se recordava de ter prestado informações à acusada. Essas afirmações não devem ser levadas em consideração, pois foi ele quem concedeu o benefício no mesmo dia da entrada do requerimento, sem tomar as cautelas que seriam inerentes a sua atuação, apesar das irregularidades visíveis. Dessa forma, resta evidente a participação de Mário na fraude perpetrada.
A denunciada Julieta mencionou, em seu interrogatório, que "foi alguém lá" que disse que tinha idade e podia ir ao INSS com as notas de produtor, não sabe dizer quem. A ré alegou desconhecer o ex-servidor do INSS Mário Jorge Leite, negando ter sido a responsável pela fraude perpetrada e pela confecção dos documentos falsos que instruíram seu pedido de benefício previdenciário. Entretanto, as provas carreadas aos autos demonstram que o benefício era indevido e foi concedido rapidamente pelo réu Mário, apesar das diversas irregularidades anteriormente relatadas.
Ressalte-se que a sentença foi confirmada em exame recursal (AC 0000834-28.2009.404.7214/SC), quanto à materialidade e autoria do delito, tendo sido declarada apenas a prescrição da pretensão punitiva. O acórdão transitou em julgado em 24.5.2013.
No presente caso, restou caracterizada a má-fé do autor e a evidente intenção em fraudar a Previdência Social, mediante manipulação ou inserção de dados falsos nos sistemas do INSS, a fim de obter proveito para outrem (concessão da aposentadoria). Do citado acima destacam-se:
a) para a habilitação do benefício foi criado um NIT (número de identificação do trabalhador) de segurado especial registrado sob n. 1.164.050.881-8 para a identificação da beneficiária Julieta (fls. 41-42), o que impediu a importação dos períodos de atividade urbana do NIT 1.142.331.292-3, o qual existia em nome da empresária Julieta Scodro Breda (fls. 39-40 e 44-45);
b) apresentação de notas fiscais com datas adulteradas, sem registro de produtor, moedas inexistentes nas datas de emissão apontadas, não conferidas pelo servidor Mario Jorge Leite;
c) a habilitação do benefício e o despacho concessório ocorreram com extraordinária celeridade em 17.5.2001 (fls. 5, 31 e 58) e o primeiro pagamento foi recebido em 8.6.2001 (fl. 62). Observa-se que Mário Jorge Leite (matrícula 0899996) assinou o documento de fl. 31 e no documento de fl. 58 aparece o número de sua matrícula como servidor responsável pela inclusão do benefício previdenciário.
Evidente a má-fé do autor, a intenção de conceder o benefício indevido, caracterizando o dolo de causar prejuízo aos cofres previdenciários. Ou seja, sua conduta foi totalmente incompatível com a dignidade da função pública que exercia.
i) concedeu indevidamente o benefício a que se refere o apenso 10, sem homologação de autoridade competente e sem esclarecer indícios de irregularidades;
Trata-se do benefício de aposentadoria por idade - NB 41/120.717.020-5, de titularidade de Leonilda de Lima.
O excerto do anexo 10 do processo administrativo encontra-se às fls. 2.141 a 2.247 (volume IX).
Nesse caso, o autor finalizou processo de concessão do benefício, baseado apenas na conclusão da entrevista rural feita por outra servidora, sem verificação do requisito relativo à apresentação de documentação pela autora.
Veja-se que a interessada não apresentou qualquer documento hábil a constituir início de prova material do labor rural, mas tão somente declaração sindical, ficha de filiação sindical sem registro de pagamento de anuidades e certidão de casamento em que o marido consta como ocupante de profissão diversa da lavoura (fls. 2.145 a 2.147, volume IX).
A declaração sindical não foi homologada.
O autor, porém, não conferiu os dados e, baseando-se apenas na entrevista rural, concedeu o benefício.
Desconsiderou a informação constante da certidão de casamento, segundo a qual o marido já exercera atividade diversa.
O autor faltou com dever de diligência na análise dos requisitos, a fim de averiguar informações complementares. Não realizou consulta aos sistemas do INSS, como o Cadastro Nacional de Informações Sociais - CNIS.
Por ocasião de seu depoimento, prestado perante a comissão processante, em resposta às perguntas 69 e 70 (fl. 1.049 - apenso I, vol. V), deixa evidente sua desídia e desleixo no desempenho do seu cargo:
que não pode afirmar com certeza se conferiu ou não a documentação, mas que, na pressa de conceder na pressão que era exercida pela Gerência, considerava " um filé" quando o processo vinha praticamente pronto e então, só formatava "olhando por cima" os documentos.
que como já tinha o tempo de contribuição extratado por outro servidor, conforme fls. 11 e a conclusão da Entrevista, pressupôs que havia uma homologação por parte da autoridade competente e formatou a concessão do benefício.
Mostra-se evidente, na forma de proceder do autor, que houve o abrandamento da verificação do cumprimento dos requisitos para concessão do benefício. Significa dizer que o autor, na qualidade de servidor do INSS, fez uma análise superficial do cumprimento dos requisitos.
Neste caso, o desleixo do autor é evidente, pois mesmo havendo pouquíssima documentação no processo administrativo, o autor não percebeu a ausência do termo de homologação da declaração sindical e não atentou para a ausência de documentação suficiente.
Em se tratando de benefício de caráter excepcional, cuja concessão dispensa o recolhimento de contribuições, mais rigorosa deveria ser a análise do cumprimento de seus requisitos.
Caracterizada a falta de zelo do autor no desempenho de sua função pública.
j) concedeu irregularmente o benefício a que se refere o apenso 15, incluindo tempo de atividade rural com o pai, sem a devida comprovação documental e sem consulta ao Cadastro Nacional de Informações Sociais - CNIS;
Trata-se de benefício de aposentadoria por tempo de contribuição - NB 132.162.501-1, de titularidade de Valtivio Groskopp.
O excerto do anexo 15 do processo administrativo encontra-se às fls. 2.250 (volume IX) a 2.459 (volume X).
Neste caso, o autor, enquanto servidor do INSS, procedeu a toda análise da concessão do benefício, incluindo tempo de serviço rural indevido.
O benefício foi requerido em 17.3.2004. Na mesma data, o segurado foi entrevistado por estagiário do INSS acerca da atividade rural, cujo período pretendia averbar. Veja-se que a entrevista não foi revisada por nenhum outro servidor, tampouco homologada (fls. 2.268 - volume X).
Entretanto, o servidor Mario Jorge Leite analisou os documentos, incluiu tempo de serviço e realizou a respectiva contagem em dois dias, de 10 a 11 de maio de 2004, finalizando a concessão em 11.5.2004, conforme relatório do sistema (fls. 2.364 a 2.366).
Na análise do tempo de serviço rural, baseou-se apenas na prova de propriedade rural em nome do pai do segurado. Este não apresentou nenhum documento pessoal contemporâneo em nome próprio.
Veja-se que o pai do segurado possuía inscrição como empresário desde 1975 (fl. 2.338 - volume X).
Nada foi diligenciado a esse respeito no curso do processo administrativo conduzido pelo autor, tendo sido averbado o período de 9.3.1968 a 30.9.1968 como tempo de serviço rural "com seu pai" (fl. 2.316 - volume X).
Houve, portanto, o reconhecimento de mais de 10 (dez) anos de tempo de serviço rural, sem qualquer análise criteriosa.
O segurado questionou a decisão administrativa de cancelamento do benefício por meio da ação de autos nº 5001380-90.2012.404.7214. O pedido de restabelecimento da aposentadoria foi julgado improcedente, tendo sido mantida a sentença pela Primeira Turma Recursal de Santa Catarina. O segurado interpôs recurso extraordinário, cuja admissibilidade encontra-se pendente de análise.
A conduta do autor, novamente, não foi diligente como exige o desempenho do serviço público.
k) concedeu indevidamente o benefício a que se refere o apenso 16, incluindo tempo de atividade rural, empregador LEOPOLDO ZIELINSKI, período de 01/01/96 a 31/12/1997, sem qualquer base documental, desconsiderando que do período constante na Declaração de Exercício de Atividade Rural fornecida pelo Sindicato Rural somente foi homologado o período de 01/01/1998 a 25/01/1998, mediante pesquisa solicitada e concluída pelo próprio servidor indiciado, sem o obrigatório visto de sua Chefia e sem que houvesse sequer contatado com o pretenso empregador.
Trata-se do benefício de salário-maternidade - NB 115.279.465-2, de titularidade de Zélia Martins Barabach.
O excerto do anexo 16 do processo administrativo encontra-se às fls. 2.462 (volume X) a 2.555 (volume XI).
O benefício foi requerido em 21.3.2000 (fl. 2.462 - volume X).
Houve homologação do período de 1º.1.1998 a 25.1.1998 como tempo de serviço rural pela chefia da Seção de Benefícios do INSS (fl. 2.466/verso - volume X), tempo este insuficiente para comprovação da carência do benefício.
Entretanto, em 27.3.2000, o autor, então servidor, Mario Jorge Leite solicitou realização de pesquisa externa (fl. 2.473 - volume X), que foi realizada em 8.4.2000 na cidade de Papanduva (fl. 2.473/verso - volume X).
Vê-se que a entrevista foi conclusiva no sentido de que a autora trabalhava como diarista rural em terras de Leopoldo Zielinski. Contudo, o proprietário do imóvel não foi ouvido.
O autor, ainda, concluiu pelo exercício de atividade rural no período de 1º.1.1996 a 31.12.1996, mas não submeteu tal conclusão à nova homologação da chefia. Com base em tal pesquisa, concedeu o benefício à interessada.
Questionado sobre seu procedimento, não soube explicar porque o resultado da pesquisa não foi visado pela Chefia (fl. 1.051 - apenso I, vol. V). Sobre a falta de contato com o proprietário do imóvel, limitou-se a dizer que entendeu suficiente a oitiva das outras pessoas referidas na pesquisa (fl. 1.052 - apenso I, vol. V).
Mais uma vez, o autor demonstrou total desleixo em seu proceder.
Configurada, assim, a atuação irregular (realização de pesquisa e falta de submissão para aprovação da autoridade competente) no desempenho do serviço público.
Demissão
A conduta do autor, caracterizada pela falta de zelo habitual, manipulação de dados e omissão quanto a pesquisas em base de dados do INSS para fim de conceder benefícios previdenciários, caracteriza descumprimento de dever legal, conduta incompatível com o desempenho da função pública.
Dispõe a Lei 8.112, de 11.12.1990:
Art. 116. São deveres do servidor:
I - exercer com zelo e dedicação as atribuições do cargo;
II - ser leal às instituições a que servir;
III - observar as normas legais e regulamentares;
IV - cumprir as ordens superiores, exceto quando manifestamente ilegais;
V - atender com presteza:
a) ao público em geral, prestando as informações requeridas, ressalvadas as protegidas por sigilo;
b) à expedição de certidões requeridas para defesa de direito ou esclarecimento de situações de interesse pessoal;
c) às requisições para a defesa da Fazenda Pública.
VI - levar ao conhecimento da autoridade superior as irregularidades de que tiver ciência em razão do cargo;
VI - levar as irregularidades de que tiver ciência em razão do cargo ao conhecimento da autoridade superior ou, quando houver suspeita de envolvimento desta, ao conhecimento de outra autoridade competente para apuração; (Redação dada pela Lei nº 12.527, de 2011)
VII - zelar pela economia do material e a conservação do patrimônio público;
VIII - guardar sigilo sobre assunto da repartição;
IX - manter conduta compatível com a moralidade administrativa;
X - ser assíduo e pontual ao serviço;
XI - tratar com urbanidade as pessoas;
XII - representar contra ilegalidade, omissão ou abuso de poder. [sem grifos no original].
Segundo lição de Regis Fernandes de Oliveira, o servidor público possui o dever de agir com eficiência e nos ditames da moralidade:
Se não sabe alguma coisa, deve procurar informar-se, seja estudando as atividades que tem de desempenhar, seja procurando os servidores mais antigos para orientar-se.
De outro lado, não é só agir. É agir com eficiência, buscando prestigiar o serviço que desempenha. Esta característica não é apenas recomendação ética, mas jurídica, na medida em que o valor eficiência foi acampado pela norma jurídica (caput do art. 37 da Constituição).
[...]
Outro princípio essencial a tipificar um dever funcional é a moralidade, isto é, o servidor há que ser probo. Deve servir retamente. Jamais se desviar dos princípios da boa administração. Deve cumprir suas obrigações funcionais. Deve ser zeloso. [...] (OLIVEIRA, Régis Fernandes. Servidores Públicos. 2ª Ed. Malheiros Editores. São Paulo: 2008, pp. 140-141).
Cumpre observar aqui que a assertiva de que o autor estava impossibilitado de acessar o sistema de dados do Cadastro Nacional de Informações Sociais - CNIS para realização de consultas e pesquisas não restou por ele demonstrada.
Não obstante, caso estivesse confirmada tal alegação, o fato não afastaria sua responsabilidade. O servidor público, ao agir com eficiência, utilizaria outros meios de pesquisa, tais como solicitação de documentos aos interessados ou expedição de ofícios a outros órgãos ou, ainda, postergaria a conclusão da análise de concessão de benefício para momento em que fosse possível a consulta às bases de dados.
No caso do autor, todavia, ele aproveitou-se da fragilidade do sistema para relativizar a análise criteriosa de concessão dos benefícios.
Vê-se que no caso do benefício concedido a Julieta Scodro Breda, o autor foi além da falta de zelo ou cuidado, agindo com má-fé, pois o autor inseriu dados falsos nos sistemas do INSS, a fim de viabilizar a concessão do benefício.
Por ocasião da sentença prolatada no processo criminal, originado da concessão do benefício em questão, já citado alhures, a conduta dolosa do autor restou configurada:
Como já exposto, a prova oral colhida nos autos, bem como as irregularidades apontadas no processo de aposentadoria da ré Julieta, demonstram que o réu Mário inseriu informações falsas no sistema de dados da autarquia previdenciária e, em decorrência, houve a concessão indevida do benefício à acusada Julieta.
O réu era servidor do INSS autorizado a trabalhar com o sistema de informações e lançou as informações inverídicas no banco de dados da previdência social na mesma data em que a beneficiária requereu a aposentadoria indevida, ou seja, em 17.5.2001, enquanto outros processos aguardavam até dois anos para serem analisados na agência.
Nos documentos de fls. 5, 31 e 58 consta a data 17.5.2001 como dia da habilitação do benefício e do despacho concessório, bem como a identificação do réu Mário Jorge Leite (matrícula 0899996) como responsável pela inclusão do benefício previdenciário (fls. 31 e 58). Presume-se que a senha pessoal é utilizada pela própria pessoa que a detém.
A estagiária Elisa Stefens realizou a entrevista com a ré Julieta, recepcionou a documentação no balcão, fez o resumo de documentos e autenticou as cópias da documentação apresentada (fls. 5-27). No relatório final do processo administrativo disciplinar (fl. 147 do apenso I) foi registrado que "os estagiários não têm autorização para formatar a concessão de benefícios, cabendo aos servidores a responsabilidade de examinar a documentação e conferir os dados por eles registrados antes de autorizar a concessão de benefícios, fato sabido por todos os servidores".
Assim, o trabalho de conferência, análise e concessão da aposentadoria era feito na "retaguarda" pelos servidores do INSS. Cabe ao servidor responsável a apreciação quanto à autenticidade da documentação apresentada quando do requerimento do benefício previdenciário. E, apesar de todas as irregularidades já mencionadas no requerimento de Julieta, isso não impediu a concessão do benefício pelo servidor Mário Jorge Leite (fls. 29-31 e 58).
Fato é que nos documentos de concessão do benefício (fls. 31 e 58) consta o número da matrícula do réu como sendo a pessoa que inseriu os dados falsos no sistema informatizado daquela autarquia federal. Ora, o réu Mário era servidor experiente do INSS e tinha ciência inequívoca dos procedimentos e cuidados exigidos pela legislação previdenciária para a concessão de benefícios.
O réu Mário, como servidor do INSS, sabia não estar caracterizada a qualidade de trabalhadora rural de Julieta para a concessão de aposentadoria, bem como conhecia as fragilidades do sistema da Previdência Social, e inseriu no banco de dados da autarquia informações inverídicas sobre a beneficiária, a fim de que fosse apta à concessão da aposentadoria.
Note-se, também, que não ficou configurado simples equívoco, como o réu chegou a mencionar em seu interrogatório. O réu trabalhava há vários anos no setor de concessão de benefícios e tinha ciência dos procedimentos e cuidados exigidos pela lei previdenciária. Ademais, o benefício foi concedido com celeridade peculiar, sem qualquer justificativa legítima.
Como demonstrado pela prova dos autos, o acusado Mário tinha total ciência da fraude e inseriu os dados sabidamente falsos no sistema da Previdência Social para obter vantagem indevida para a segurada Julieta, em prejuízo da autarquia previdenciária, configurando o dolo e o elemento subjetivo do injusto.
Não restou comprovado que o autor teria obtido proveito eleitoral ou pecuniário próprio em troca de sua conduta.
Entretanto, a atuação em proveito de outrem (concessão de aposentadoria) ficou exaustivamente demonstrada, conforme análise pormenorizada de cada processo concessório, especialmente, no caso da concessão de benefício a Julieta Scodro Breda.
Incorreu o autor, desse modo, em expressa vedação do Estatuto dos Servidores Públicos Federais:
Art. 117. Ao servidor é proibido: (Vide Medida Provisória nº 2.225-45, de 4.9.2001)
I - ausentar-se do serviço durante o expediente, sem prévia autorização do chefe imediato;
II - retirar, sem prévia anuência da autoridade competente, qualquer documento ou objeto da repartição;
III - recusar fé a documentos públicos;
IV - opor resistência injustificada ao andamento de documento e processo ou execução de serviço;
V - promover manifestação de apreço ou desapreço no recinto da repartição;
VI - cometer a pessoa estranha à repartição, fora dos casos previstos em lei, o desempenho de atribuição que seja de sua responsabilidade ou de seu subordinado;
VII - coagir ou aliciar subordinados no sentido de filiarem-se a associação profissional ou sindical, ou a partido político;
VIII - manter sob sua chefia imediata, em cargo ou função de confiança, cônjuge, companheiro ou parente até o segundo grau civil;
IX - valer-se do cargo para lograr proveito pessoal ou de outrem, em detrimento da dignidade da função pública;
X - participar de gerência ou administração de sociedade privada, personificada ou não personificada, exercer o comércio, exceto na qualidade de acionista, cotista ou comanditário; (Redação dada pela Lei nº 11.784, de 2008
XI - atuar, como procurador ou intermediário, junto a repartições públicas, salvo quando se tratar de benefícios previdenciários ou assistenciais de parentes até o segundo grau, e de cônjuge ou companheiro;
XII - receber propina, comissão, presente ou vantagem de qualquer espécie, em razão de suas atribuições;
XIII - aceitar comissão, emprego ou pensão de estado estrangeiro;
XIV - praticar usura sob qualquer de suas formas;
XV - proceder de forma desidiosa;
XVI - utilizar pessoal ou recursos materiais da repartição em serviços ou atividades particulares;
XVII - cometer a outro servidor atribuições estranhas ao cargo que ocupa, exceto em situações de emergência e transitórias;
XVIII - exercer quaisquer atividades que sejam incompatíveis com o exercício do cargo ou função e com o horário de trabalho; [sem grifos no original]
Ressalte-se que não há necessidade de que o servidor público tenha obtido proveito próprio para configuração da ilicitude de sua conduta.
No caso, o autor utilizou do cargo para obter vantagem em favor de outrem (concessão de benefício previdenciário), autuando, assim, em detrimento da dignidade da função pública.
E a falta cometida pelo autor foi grave, eivada de má-fé, pois na condição de servidor do INSS, sabia não estar caracterizada a qualidade de trabalhadora rural de Julieta para a concessão de aposentadoria, bem como conhecia as fragilidades do sistema da Previdência Social, e inseriu no banco de dados da autarquia informações inverídicas sobre a beneficiária, a fim de que fosse apta à concessão da aposentadoria.
A inserção de dados falsos constitui crime contra a Administração Pública.
Ademais, a concessão do benefício trouxe enriquecimento ilícito à interessada.
Assim, considerando a natureza e a gravidade da infração, mostra-se correta e proporcional a aplicação da penalidade de demissão, com base no art. 132, inciso XIII da referida norma, segundo a qual, "a demissão será aplicada nos seguintes casos: [...] XIII - transgressão dos incisos IX a XVI do art. 117".
Não há falar, assim, em ofensa ao disposto no art. 128, da Lei 8.112/1990.
Desvio de função - falta de capacitação
O autor alega ter sido aprovado para o exercício do cargo de Agente de Portaria, posteriormente transformado em Agente de Serviços, mas que desempenhava atividades estranhas ao cargo.
Sustenta, assim, que não estava preparado para conceder benefícios previdenciários, além de não receber treinamento ou capacitação para o desempenho desta função.
Em seu depoimento, o autor afirmou que:
M: Qual era a sua função lá?
A: Eu fui concursado para auxiliar de portaria, aí mais tarde eu passei a ser agente de portaria e, na época dos fatos, eu ainda estava com o cargo de agente de portaria. Em 2007 teve um novo reenquadramento na estrutura do INSS e eu passei a ser auxiliar de serviços diversos.
M: E o senhor trabalhava de fato, então, na análise desses documentos para conceder benefícios?
A: Na verdade sim. Eu fui concursado para uma coisa, meu cargo era uma coisa e a função exercida era outra.
M: O senhor ingressou na década de 80, senhor falou não é?
A: 81.
M: O senhor chegou a exercer a função na portaria mesmo ou senhor foi direto trabalhar na outra...
A: Quando eu trabalhei em Curitiba sim, porque eu fui concursado lá. Não foi bem um concurso porque nós trabalhávamos desde 79 para a previdência social e em 81 teve uma resolução do governo federal de que não existiriam mais firmas contratadas para trabalhar no INSS.
M: Vocês foram incorporados não é?
A: Nós fizemos uma prova interna de todos os funcionários que eram daquela empresa e passamos a ser funcionários lá em 1981, e lá eu exercia a função de agente de portaria.
M: E o senhor chegou em Mafra quando?
A: Em 1995.
M: E aqui já chegou exercendo essa atividade de...
A: Aqui já passei a exercer essa atividade.
M: O senhor é técnico em contabilidade não é? Eu me recordo que o senhor tinha me mostrado uma...
A: Eu era formado em técnico de contabilidade.
M: O senhor se formou em que ano?
A: Em 1988, mas não quis exercer a função.
M: O senhor trabalhava com quem ali? Era o senhor sozinho, era uma equipe, como é que funcionava o serviço? Me explique.
A: Bom, ali haviam várias áreas de trabalho no INSS. Desde, por exemplo, a triagem, que era um setor que existia na portaria do INSS, aí existia o serviço de balcão e também existia o serviço de retaguarda.
M: Mas na sua função, com o é que funcionava?
A: Eu trabalhava em todas elas. Aliás, todos os funcionários trabalhavam em todas elas. (fl. 3.005 e verso).
Observa-se que o autor trabalhava há vários anos no serviço público e, na função de concessão de benefícios, desde 1995, pelo menos. Foram objeto de apuração nos autos do processo disciplinar fatos ocorridos a partir dos anos 2000. Pelo menos, há 5 (cinco) anos o autor desempenhava a atividade de concessão de benefícios.
A testemunha Rosani Hirt, que ocupou a função de Chefe da Seção de Benefícios à época dos fatos apurados, declarou que:
INSS: A senhora trabalhou com o Mário. De que forma o Mário era visto pelos colegas? Ele era um bom servidor, ele trabalhava com tento, ele atendia às expectativas que se esperava de um servidor que concedia benefícios, que apurava um processo administrativo, instruía...?
T: Sim. O Mário veio... eu sou muito ruim de guardar datas. A gente foi para a previdência... eu fui em 95, que eu era do ex INAMPS, e depois disso logo o Mário veio de Curitiba, então ele trabalhava num outro setor, em Curitiba. Pelo que eu lembro ele trabalhava em outro setor e daí ele veio para o benefício, então, no começo, é claro, assim como a gente, tinha dificuldades para conhecer o trabalho, para conceder, mas ele sempre tinha vontade de trabalhar, sempre demonstrava vontade. Ia trabalhar em outras agências para ajudar, ele gostava do que ele fazia. Até o que eu citei no inquérito, assim, eu me lembro que o que me chamou a atenção - eu acho que eu ainda era chefe de benefício, que ele ficou muito feliz quando ele começou a aprender a despachar aposentadorias, porque ele não fazia aposentadorias no começo, ele fazia benefícios mais simples. Então, quando ele começou a analisar aposentadorias ele ficava muito feliz, ele vinha: olha, hoje eu fiz duas, hoje eu consegui fazer tantas. Eu notava que ele estava satisfeito de estar aprendendo aquilo.
INSS: Ele ficava entusiasmado?
T: Entusiasmado.
INSS: Isso mostrava que ele sabia o que estava fazendo... ele tinha conhecimento de como instruir um processo, se era caso de deferir, indeferir, dentro da normalidade da agência?
T: Sim, dentro do aprendizado de cada um. Ele também, quando tinha dificuldades, ia ler, perguntar. Na verdade, a demanda era muito grande, sempre foi muito grande. Então, tinham dificuldades, mas eu notava nele vontade de fazer e de aprender.
INSS: Um dos motivos que ele alega é que houve desvio de função, ele disse que não era um servidor preparado para conceder benefícios e que ele não recebia do INSS, no tempo, preparo, um curso de formação, uma capacitação para conceder esses benefícios. A senhora via essa circunstância acontecendo? Via essa falta de instrução do INSS para com os servidores?
T: Com ele eu não lembro se ele participou de muitos treinamentos ou não. Porque os treinamentos antes eram mais comuns, depois foram ficando menos comuns, tinha supervisão na agência, às vezes tinha numa semana, às vezes não, então eu não me lembro se ele participou de todas as supervisões, de todos os treinamentos, sabe? E foi um aprendizado meio igual para todo mundo, porque como a gente que veio do ex INAMPS, a gente também não tinha. A gente foi adquirindo conhecimento todos meio juntos. E como a demanda era muito grande a gente tinha dificuldades mesmo, sabe? E era aquela cobrança. Tinha que sair aquele monte de processos lá e tinha que sair.
INSS: Mas essa demanda de trabalho era diluída entre todos os servidores. Não tinha nenhum servidor mais sobrecarregado que o outro dentro de um mesmo setor, não é?
T: É. Só que tinham alguns que tinham mais segurança, de repente, numa aposentadoria. Outros tinham mais segurança no auxílio doença, que era mais simples, então, cada um fazia no seu limite, no que se sentia capaz de fazer.
Conforme se extrai das declarações acima, ao contrário do que alega, o autor buscou por própria iniciativa atuar em funções mais complexas, relativas à concessão de benefícios. Houve um aprendizado gradual, iniciando-se pelos benefícios mais simples. Frise-se que "cada um fazia no seu limite, no que se sentia capaz de fazer" (fl. 3.017/verso).
Silvana Maria Menine, que também foi Chefe da Seção de Benefícios, afirmou:
INSS: A respeito da atuação funcional do seu Mário... a senhora poderia dizer se ele era um servidor dedicado, se ele era capacitado, o que ele fazia? Ele atendia às expectativas, a senhora, na posição de chefe da agência?
T: Na época em que eu assumi a chefia, no período em que eu entrei na área do benefício, de muita coisa a gente era cobrado, muita coisa da parte do INSS, a gente trabalhou muito sob pressão. Era aquele desrepresamento, o Mário sempre se dispôs a trabalhar, nunca teve problema nenhum, eu nunca tive atrito nenhum com ele. No meu ponto de vista, ele sempre foi uma pessoa que eu falei, aquela pessoa que sempre tentava aprender, sempre querendo fazer as coisas, dedicado e posso dizer que esforçado.
INSS: Mas esse volume de trabalho era comum a todos os servidores ou era uma...
T: Não... era a todos os servidores, a todos.
INSS: Ele tinha alguma dificuldade para apreciar os processos, para conceder benefícios.
T: Olha, eu como chefe da agência... a gente trabalhava em equipe, então tinha as pessoas chefes do posto, chefes do benefício, tinham os outros cargos, então que essa equipe que trabalhava direto com ele. No meu caso era a chefia geral, eu cobrava dos chefes, então, no caso, a obrigação dele era com o chefe de benefício. Então a pessoa, que seria o chefe de benefício, tinha relação direta com ele.
INSS: Mas essa empolgação, essa boa vontade que ele tinha no trabalho, a senhora conhecia pelo servidor que supervisionava?
T: Não, isso eu conhecia porque a gente fazia reuniões e a gente sabia das pessoas que... ou faziam um mutirão, alguma coisa, a gente sabia das pessoas que se dispunham a fazer. Então, para mim, na época, eu achava que ele estava se dispondo no serviço. (fl. 3002 e verso).
Ou seja, apesar do volume de trabalho expressivo que havia na agência do INSS de Mafra, que era comum a todos os servidores, o autor mostrava-se empenhado, esforçado e disposto a aprender.
Logo, não há falar em falta de capacitação para o desempenho da atividade de análise e concessão de benefícios previdenciários.
Além disso, a demissão do autor não está pautada em sucessivos erros administrativos por concessão indevida de benefícios, mas pela conduta dissociada da dignidade da função pública, consistente em facilitação no exame de provas, manipulação de dados, inserção de dados falsos. A responsabilização não decorre de simples culpa, mas de má-fé em detrimento da dignidade da função pública (art. 117, IX, Lei 8.112/90).
Ainda, o dever descumprido pelo autor é inerente ao exercício do serviço público e não inerente ao desempenho técnico da função de análise e concessão de benefícios previdenciários.
Ademais, eventual desvio de função não afasta a responsabilidade do servidor. Nesse sentido, cita-se o precedente do Superior Tribunal de Justiça:
MANDADO DE SEGURANÇA. SERVIDOR PÚBLICO. DEMISSÃO. LEI DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. REVOGAÇÃO DO REGIME JURÍDICO DOS SERVIDORES FEDERAIS. NÃO-OCORRÊNCIA. DESVIO DE FUNÇÃO. IRRELEVÂNCIA. ATOS ILÍCITOS APURADOS QUE NÃO DEPENDIAM DE CONHECIMENTO TÉCNICO.
CERCEAMENTO DE DEFESA. NÃO-CONFIGURAÇÃO. DEFESA ESCRITA APRESENTADA POR ADVOGADO REGULARMENTE CONSTITUÍDO. PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE. ATOS DE NATUREZA GRAVE. ARGUMENTAÇÃO INSUFICIENTE. SEGURANÇA DENEGADA.
1. A chamada "Lei de Improbidade Administrativa", Lei 8.429/92, não revogou, de forma tácita ou expressa, dispositivos da Lei 8.112/90, que trata do Regime Jurídico dos Servidores Públicos Civis da União, das Autarquias e das Fundações Públicas Federais. Aquele diploma legal tão-somente buscou definir os desvios de conduta que configurariam atos de improbidade administrativa, cominando penas que, segundo seu art. 3º, podem ser aplicadas a agentes públicos ou não. Em conseqüência, nada impede que a Administração exerça seu poder disciplinar com fundamento em dispositivos do próprio Regime Jurídico dos Servidores, tal como se deu no caso vertente.
2. O desvio de função da impetrante, na hipótese, não afasta a possibilidade de aplicação da pena disciplinar, pois os ilícitos administrativos foram praticados independentemente do conhecimento técnico das atividades que exercia e se referem a intermediação e irregularidades na conversão de benefícios de auxílio-doença em aposentadoria por invalidez.
3. O Superior Tribunal de Justiça tem entendido que, em observância ao princípio da ampla defesa, é indispensável a presença de advogado ou de defensor dativo realizando a defesa de acusado em processo administrativo disciplinar, inclusive na fase instrutória.
4. No caso, todavia, a impetrante, que foi notificada a respeito das oitivas das testemunhas, após o indiciamento, constituiu advogado que apresentou defesa escrita, na qual não alegou cerceamento de defesa ou vício na formação das provas. Manifestou-se sobre todo o conjunto probatório, refutou os fatos imputados e requereu diligências, pelo que não houve demonstração de efetivo prejuízo para a defesa.
5. O argumento de bons antecedentes, de desvio de função e de ausência de prejuízos causados ao erário não basta para fins de demonstração da inobservância do princípio da proporcionalidade.
Impõe-se discorrer, em tese, para que a ofensa esteja caracterizada, sobre a desnecessidade da aplicação da pena máxima de demissão, diante da conduta ilícita apurada, o que, todavia, não ocorreu no presente caso.
6. Segurança denegada.
(MS 12.262/DF, Rel. Ministro ARNALDO ESTEVES LIMA, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 27/06/2007, DJ 06/08/2007, p. 461)
Por fim, totalmente irrelevante se a denúncia que originou o processo administrativo disciplinar tenha tido origem em perseguição política, uma vez que os fatos foram apurados e restaram comprovados, conforme analisados inicialmente.
Assim, o autor não faz jus à reintegração ao serviço público, impondo-se a improcedência da demanda.(...)"
Por fim, considerando os mais recentes precedentes dos Tribunais Superiores, que vêm registrando a necessidade do prequestionamento explícito dos dispositivos legais ou constitucionais supostamente violados, e a fim de evitar que, eventualmente, não sejam admitidos os recursos dirigidos às instâncias superiores, por falta de sua expressa remissão na decisão vergastada, quando os tenha examinado implicitamente, dou por prequestionados os dispositivos legais e/ou constitucionais apontados pela parte.
Ante o exposto, voto no sentido de negar provimento à apelação.
Des. Federal FERNANDO QUADROS DA SILVA
Relator
Documento eletrônico assinado por Des. Federal FERNANDO QUADROS DA SILVA, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 7818667v8 e, se solicitado, do código CRC 309B7B98. | |
Informações adicionais da assinatura: | |
Signatário (a): | FERNANDO QUADROS DA SILVA:53012780963 |
Nº de Série do Certificado: | 581DE44528A71A2D |
Data e Hora: | 02/10/2015 18:58:12 |
EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 02/10/2015
APELAÇÃO CÍVEL Nº 5002203-93.2014.4.04.7214/SC
ORIGEM: SC 50022039320144047214
RELATOR | : | Des. Federal FERNANDO QUADROS DA SILVA |
PRESIDENTE | : | Marga Inge Barth Tessler |
PROCURADOR | : | Domingos Sávio Dresch da Silveira |
SUSTENTAÇÃO ORAL | : | Por videoconferência de FLORIANÓPOLIS o Adv. RIVERA DA SILVA RODRIGUEZ VIEIRA pelo apelante MARIO JORGE LEITE. |
APELANTE | : | MARIO JORGE LEITE |
ADVOGADO | : | José Augusto Pedroso Alvarenga |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 02/10/2015, na seqüência 278, disponibilizada no DE de 16/09/2015, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 3ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Des. Federal FERNANDO QUADROS DA SILVA |
VOTANTE(S) | : | Des. Federal FERNANDO QUADROS DA SILVA |
: | Des. Federal MARGA INGE BARTH TESSLER | |
: | Des. Federal RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA |
José Oli Ferraz Oliveira
Secretário de Turma
Documento eletrônico assinado por José Oli Ferraz Oliveira, Secretário de Turma, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 7876482v1 e, se solicitado, do código CRC F256DC2D. | |
Informações adicionais da assinatura: | |
Signatário (a): | José Oli Ferraz Oliveira |
Data e Hora: | 02/10/2015 14:46 |