D.E. Publicado em 16/06/2017 |
APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 0018826-76.2015.4.04.9999/RS
RELATORA | : | Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
APELADO | : | HELDINA BRAATZ SPIERING |
ADVOGADO | : | Arlene Fonseca Radmann Duarte |
REMETENTE | : | JUIZO DE DIREITO DA 1A VARA DA COMARCA DE CAMAQUA/RS |
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. REQUISITOS PREENCHIDOS.
1. O tempo de serviço rural, cuja existência é demonstrada por testemunhas que complementam início de prova material, deve ser reconhecido ao segurado em regime de economia familiar ou individual.
2. Uma vez completada a idade mínima (55 anos para a mulher e 60 anos para o homem) e comprovado o exercício da atividade agrícola no período correspondente à carência (art. 142 da Lei nº 8.213/1991), é devido o benefício de aposentadoria por idade rural.
3. A implantação de benefício previdenciário, à conta de tutela específica, deve acontecer no prazo máximo de 45 dias.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação do INSS e determinar o cumprimento imediato do acórdão, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre/RS, 07 de junho de 2017.
Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE
Relatora
Documento eletrônico assinado por Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE, Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8998444v21 e, se solicitado, do código CRC 314030FD. | |
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APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 0018826-76.2015.4.04.9999/RS
RELATORA | : | Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
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ADVOGADO | : | Arlene Fonseca Radmann Duarte |
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RELATÓRIO
Heldina Braatz Spiering ajuizou ação ordinária contra o INSS objetivando a concessão do benefício de aposentadoria por idade rural, a contar do requerimento administrativo, formulado em 31 de agosto de 2009.
Na sentença (04/11/2014) foi julgado procedente o pedido, condenando-se o INSS a conceder à parte autora o benefício de aposentadoria por idade rural a partir de 31/08/2009. Condenou a Autarquia ao pagamento das custas processuais por metade e dos honorários advocatícios fixados em 10% do valor da condenação, excluídas as parcelas com vencimento posterior a data da sentença.
O INSS apelou sustentando, em síntese, não estar comprovado o exercício de atividade rural no período de carência exigido em lei. Alega que ficou prejudicada a homologação quanto ao mérito, em face de indício de engendramento do contrato de parceria e, também, teria contradição no depoimento do pai adotivo da autora.
Não foram apresentadas contrarrazões, vieram os autos para julgamento.
VOTO
Nos termos do artigo 1.046 do Código de Processo Civil (CPC), em vigor desde 18 de março de 2016, com a redação que lhe deu a Lei 13.105, de 16 de março de 2015, suas disposições aplicar-se-ão, desde logo, aos processos pendentes, ficando revogada a Lei nº 5.869, de 11 de janeiro de 1973.
Com as ressalvas feitas nas disposições seguintes a este artigo 1.046 do CPC, compreende-se que não terá aplicação a nova legislação para retroativamente atingir atos processuais já praticados nos processos em curso e as situações jurídicas consolidadas sob a vigência da norma revogada, conforme expressamente estabelece seu artigo 14.
Remessa Oficial
Conheço da remessa oficial, tendo em vista que o valor da condenação ultrapassa sessenta salários mínimos, uma vez que reconhecido o direito ao benefício de aposentadoria por idade rural por período superior a cinco anos.
Mérito
Aos trabalhadores rurais, ao completarem 60 (sessenta) anos de idade, se homem, ou 55 (cinquenta e cinco), se mulher (Constituição Federal, art. 201, §7°, inciso II; Lei nº 8.213/1991, art. 48, §1°), é garantida a concessão de aposentadoria por idade, no valor de um salário mínimo, desde que comprovem o efetivo exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período, imediatamente anterior ao requerimento, igual ao número de meses correspondentes à carência do benefício (artigos 39, inciso I, e 48, §2°, ambos da Lei de Benefícios). A concessão do benefício independe, pois, de recolhimento de contribuições previdenciárias.
Para a verificação do tempo de atividade rural necessário, considera-se a tabela constante do art. 142 da Lei nº 8.213/1991 para os trabalhadores rurais filiados à Previdência à época da edição desta Lei; para os demais casos, aplica-se o período de 180 (cento e oitenta) meses (art. 25, inciso II). Em qualquer das hipóteses, deve ser levado em conta o ano em que o segurado implementou todas as condições necessárias para a obtenção da aposentadoria, ou seja, idade mínima e tempo de trabalho rural.
Na aplicação dos artigos mencionados, deve-se atentar para os seguintes pontos: a) ano-base para a averiguação do tempo rural; b) termo inicial do período de trabalho rural correspondente à carência; c) termo inicial do direito ao benefício.
No mais das vezes, o ano-base para a constatação do tempo de serviço necessário será aquele em que o segurado completou a idade mínima, desde que até então já disponha de tempo rural suficiente para o deferimento do benefício. Em tais casos, o termo inicial do período a ser considerado como de efetivo exercício de atividade rural, a ser contado retroativamente, é justamente a data do implemento do requisito etário, mesmo se o requerimento administrativo ocorrer em anos posteriores, em homenagem ao princípio do direito adquirido (Constituição Federal, art. 5°, XXXVI; Lei de Benefícios da Previdência Social - LBPS, art. 102, §1°).
Nada impede, entretanto, que o segurado, completando a idade necessária, permaneça exercendo atividade agrícola até a ocasião em que implementar o número de meses suficientes para a concessão do benefício, caso em que tanto o ano-base para a verificação do tempo rural quanto o início de tal período de trabalho, sempre contado retroativamente, será justamente a data da implementação do tempo equivalente à carência.
Exemplificando, se o segurado tiver implementado a idade mínima em 1997 e requerido o benefício na esfera administrativa em 2001, deverá provar o exercício de trabalho rural em um dos seguintes períodos: a) 96 (noventa e seis) meses antes de 1997; b) 120 (cento e vinte) meses antes de 2001, c) períodos intermediários - 102 (cento e dois) meses antes de 1998, 108 (cento e oito) meses antes de 1999, 114 (cento e quatorze) meses antes de 2000.
No caso em que o requerimento administrativo e o implemento da idade mínima tenham ocorrido antes de 31 de agosto de 1994 (data da publicação da Medida Provisória nº 598, que introduziu alterações na redação original do art. 143 da Lei de Benefícios, sucessivamente reeditada e posteriormente convertida na Lei nº 9.063/1995), o segurado deve comprovar o exercício de atividade rural, anterior ao requerimento, por um período de 5 (cinco) anos, ou 60 (sessenta) meses, não se aplicando a tabela do art. 142 da Lei nº 8.213/1991.
A disposição contida nos artigos 39, inciso I, 48, §2° e 143, todos da Lei nº 8.213/1991, no sentido de que o exercício da atividade rural deve ser comprovado no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, deve ser interpretada em favor do segurado. Ou seja, tal regra atende àquelas situações em que ao segurado é mais fácil ou conveniente a comprovação do exercício do trabalho rural no período imediatamente anterior ao requerimento administrativo, mas sua aplicação deve ser temperada em função do disposto no art. 102, §1°, da Lei de Benefícios e, principalmente, em atenção ao princípio do direito adquirido, como visto acima.
Em qualquer caso, o benefício de aposentadoria por idade rural será devido a partir da data do requerimento administrativo. Porém, nas ações ajuizadas antes do julgamento do Recurso Extraordinário nº 631.240/MG (03 de setembro de 2014), na hipótese de ausência de prévio requerimento administrativo, em que restar configurada a pretensão resistida por insurgência do Instituto Nacional do Seguro Social na contestação ou na apelação, ou ainda, quando apresentada a negativa administrativa no curso do processo, utiliza-se a data do ajuizamento da ação como data de entrada do requerimento para todos os efeitos legais.
O tempo de serviço rural pode ser comprovado mediante a produção de prova material suficiente, ainda que inicial, complementada por prova testemunhal idônea - quando necessária ao preenchimento de eventuais lacunas - não sendo esta admitida exclusivamente, a teor do art. 55, §3°, da Lei nº 8.213/1991, e Súmula 149 do STJ. Embora o art. 106 da Lei de Benefícios relacione os documentos aptos a essa comprovação, tal rol não é exaustivo, sendo certa a possibilidade de o segurado valer-se de provas diversas das ali elencadas. Não se exige prova plena da atividade rural de todo o período correspondente à carência, de forma a inviabilizar a pretensão, mas um início de documentação que, juntamente com a prova oral, possibilite um juízo de valor seguro acerca dos fatos que se pretende comprovar.
A respeito do trabalhador rurícola boia-fria, o Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do REsp. nº 1.321.493-PR, recebido como recurso representativo da controvérsia, traçou as seguintes diretrizes:
RECURSO ESPECIAL. MATÉRIA REPETITIVA. ART. 543-C DO CPC E RESOLUÇÃO STJ 8/2008. RECURSO REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. SEGURADO ESPECIAL. TRABALHO RURAL. INFORMALIDADE. BOIAS-FRIAS. PROVA EXCLUSIVAMENTE TESTEMUNHAL. ART. 55, § 3º, DA LEI 8.213/1991. SÚMULA 149/STJ. IMPOSSIBILIDADE. PROVA MATERIAL QUE NÃO ABRANGE TODO O PERÍODO PRETENDIDO. IDÔNEA E ROBUSTA PROVA TESTEMUNHAL. EXTENSÃO DA EFICÁCIA PROBATÓRIA. NÃO VIOLAÇÃO DA PRECITADA SÚMULA.
1. Trata-se de Recurso Especial do INSS com o escopo de combater o abrandamento da exigência de produção de prova material, adotado pelo acórdão recorrido, para os denominados trabalhadores rurais boias-frias.
2. A solução integral da controvérsia, com fundamento suficiente, não caracteriza ofensa ao art. 535 do CPC.
3. Aplica-se a Súmula 149/STJ ("A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeitos da obtenção de benefício previdenciário") aos trabalhadores rurais denominados "boias-frias", sendo imprescindível a apresentação de início de prova material.
4. Por outro lado, considerando a inerente dificuldade probatória da condição de trabalhador campesino, o STJ sedimentou o entendimento de que a apresentação de prova material somente sobre parte do lapso temporal pretendido não implica violação da Súmula 149/STJ, cuja aplicação é mitigada se a reduzida prova material for complementada por idônea e robusta prova testemunhal.
5. No caso concreto, o Tribunal a quo, não obstante tenha pressuposto o afastamento da Súmula 149/STJ para os "boias-frias", apontou diminuta prova material e assentou a produção de robusta prova testemunhal para configurar a recorrida como segurada especial, o que está em consonância com os parâmetros aqui fixados.
6. Recurso Especial do INSS não provido. Acórdão submetido ao regime do art. 543-C do CPC e da Resolução 8/2008 do STJ. (grifo nosso)
No referido julgamento, o Superior Tribunal de Justiça manteve decisão proferida pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região que concedeu aposentadoria por idade rural a segurado que, tendo completado a idade necessária à concessão do benefício em 2005 (sendo, portanto, o período equivalente à carência de 1993 a 2005), apresentou, como prova do exercício da atividade agrícola, sua carteira de trabalho (CTPS), constando vínculo rural no intervalo de 01 de junho de 1981 a 24 de outubro de 1981, entendendo que o documento constituía início de prova material.
Ainda no que concerne à comprovação da atividade laborativa do rurícola, é tranquilo o entendimento do Superior Tribunal de Justiça pela possibilidade da extensão da prova material em nome de um cônjuge ao outro. Todavia, também é firme a jurisprudência que estabelece a impossibilidade de estender a prova em nome do consorte que passa a exercer trabalho urbano.
Esse foi o posicionamento adotado pelo Tribunal Superior no julgamento do REsp. nº 1.304.479-SP, apreciado sob o rito dos recursos repetitivos, cujo acórdão transcrevo:
RECURSO ESPECIAL. MATÉRIA REPETITIVA. ART. 543-C DO CPC E RESOLUÇÃO STJ 8/2008. RECURSO REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. TRABALHO RURAL. ARTS. 11, VI, E 143 DA LEI 8.213/1991. SEGURADO ESPECIAL. CONFIGURAÇÃO JURÍDICA. TRABALHO URBANO DE INTEGRANTE DO GRUPO FAMILIAR. REPERCUSSÃO. NECESSIDADE DE PROVA MATERIAL EM NOME DO MESMO MEMBRO. EXTENSIBILIDADE PREJUDICADA.
1. Trata-se de Recurso Especial do INSS com o escopo de desfazer a caracterização da qualidade de segurada especial da recorrida, em razão do trabalho urbano de seu cônjuge, e, com isso, indeferir a aposentadoria prevista no art. 143 da Lei 8.213/1991.
2. A solução integral da controvérsia, com fundamento suficiente, não evidencia ofensa ao art. 535 do CPC.
3. O trabalho urbano de um dos membros do grupo familiar não descaracteriza, por si só, os demais integrantes como segurados especiais, devendo ser averiguada a dispensabilidade do trabalho rural para a subsistência do grupo familiar, incumbência esta das instâncias ordinárias (Súmula 7/STJ).
4. Em exceção à regra geral fixada no item anterior, a extensão de prova material em nome de um integrante do núcleo familiar a outro não é possível quando aquele passa a exercer trabalho incompatível com labor rurícola, como o de natureza urbana.
5. No caso concreto, o Tribunal de origem considerou algumas prova em nome do marido da recorrida, que passou a exercer atividade urbana, mas estabeleceu que fora juntada prova material em nome desta e período imediatamente anterior ao implemento do requisito etário e em lapso suficiente ao cumprimento da carência, o que está e conformidade com os parâmetros estabelecidos na presente decisão.
6. Recurso Especial do INSS não provido. Acórdão submetido ao regime do art. 543-C do CPC e da Resolução 8/2008 do STJ. (Grifo nosso).
Fixados os parâmetros de valoração da prova, passo ao exame da situação específica dos autos.
Caso concreto
A parte autora implementou o requisito etário em 16 de julho de 2008 (fl. 12) e requereu o benefício na via administrativa em 31 de agosto de 2009 (fl. 13). Assim, deve comprovar o efetivo exercício de atividades agrícolas nos 162 (cento e sessenta e dois) meses anteriores ao implemento do requisito etário, ou nos 168 (cento e sessenta e oito) meses que antecedem o requerimento administrativo, mesmo que de forma descontínua.
Para fins de constituição de início de prova material, a ser complementada por prova testemunhal idônea, a parte autora apresentou documentos, dentre os quais se destacam:
a) Certidão de casamento da autora, datada de 25/05/1979, na qual seu cônjuge está qualificado como agricultor (fl. 14);
b) Ficha de inscrição da mãe da autora, junto ao Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Camaquã, datada de 25/03/1974 (fl.19);
c) Ficha de inscrição do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Camaquã, em nome da autora e de seu falecido marido, na qual estão qualificados como agricultores, datada de 30/01/1980 (fl. 20);
d) Contratos de parceria rural firmados pela autora e Sr. Frederico Nickel, dos anos de 1994 e 2004, com prazo de 10 anos (fls. 21-22);
e) Notas fiscais de produtor rural, em nome dos proprietários das terras cultivadas pela autora em regime de parceria, datadas de 1993 a 2013 (83-125);
f) Matrícula de Registro de Imóveis de Camaquã/RS, em nome do proprietário das terras cultivadas pela autora em regime de parceria, datada de 22/04/1982, dando conta de uma área de 4 hectares (fl.82);
g) Documento auxiliar de nota fiscal eletrônica, em nome de Ivone Nickel Wawrzrynik e Fernando Wawrzrynik, datado de 06/03/2013 (fl. 83);
h) Notas fiscais de Produtor Rural, em nome de Ivone Nickel Wawrzrynik e Fernando Wawrzrynik, datadas de 1993 a 2013 (fls. 84 a 125);
Vieram aos autos, também, declarações de exercício de atividade rural pela parte autora, no período de 1989 a 2009, firmadas em 22 de julho de 2009, por Divino Affeld, Fernando Wawrzyniak e Frederico Nickel, dando conta de que a autora exerceu atividade rural, em regime de economia familiar, de 1989 a 2009 (fls. 26-27). Tais declarações, contudo, não consubstanciam início de prova material, uma vez que representam meras manifestações unilaterais, não sujeitas ao crivo do contraditório.
De acordo com as diretrizes traçadas pelo Superior Tribunal de Justiça (REsp. nº 1.304.479-SP, representativo de controvérsia), os documentos juntados aos autos constituem início razoável de prova material.
Na audiência de instrução realizada em 20/06/2013, foi colhido o depoimento pessoal da autora e também, foram ouvidas três testemunhas (fl. 77), as quais confirmaram o trabalho rural da parte autora, em regime de economia familiar, no período correspondente à carência.
A autora HELDINA BRAATZ SPIERING afirmou que nos últimos 20 anos trabalhou plantando fumo na propriedade de Frederico Nickel, em parceria, na qual planta quinze mil pés de fumo, com a ajuda dos dois filhos, sem empregados e sem maquinário agrícola, sendo todo o plantio manual. As notas saem em nome do dono das terras e anteriormente saía em nome do Sr. Frederico Nickel. Afirma que sobrevive da lavoura, plantando fumo para venda e batata doce, entre outros, para consumo, não se afastando da atividade rural.
A testemunha IVONE NICKEL WAWRZRYNIK afirmou que a planta em parceria com a autora nas terras que eram de seu pai, na qual a autora já plantava em parceria há mais ou menos 30 anos. Afirma que a autora sempre viveu da agricultura, e como o trabalho é em parceria, as notas saem em nome do seu marido e anteriormente eram em nome do pai (da testemunha), pois a autora não entendia ou não sabia preencher. Refere que a autora trabalha a maioria do tempo sozinha e às vezes tem a ajuda dos filhos. Planta fumo e batata doce, entre outros para consumo. Não tem conhecimento que a autora tenha trabalhado no urbano.
A testemunha FERNANDO WAWRZRYNIK referiu que conhece a autora há mais ou menos 25-30 anos, e que ela sempre trabalhou com a agricultura, anteriormente em parceria com seu sogro e agora com ele e sua esposa. As notas saem em seu nome e anteriormente eram em nome do sogro. Refere que a autora planta quinze mil pés de fumo com ajuda dos filhos, às vezes. Afirma que a autora não gado, nem maquinário, nem terras próprias e também não tem conhecimento que a autora tenha trabalhado no urbano.
A testemunha DIVINO AFFELD afirmou que conhece a autora há uns 30 anos e que ela sempre trabalhou na agricultura, plantando fumo, feijão e milho, nas terras da Ivone, com ajuda dos filhos, sem empregados. Não soube informar a quantidade de terras e nem o acerto da autora com a Sra. Ivone. Afirmou que via a autora trabalhando, pois é lindeiro das terras onde ela planta.
A prova testemunhal, portanto, é precisa e convincente da atividade rural da parte autora, na condição de segurada especial, em regime de economia familiar, no período de carência legalmente exigido.
Em consulta ao Cadastro Nacional de Informações Sociais - CNIS observa-se que a autora não possui registro de vínculos empregatícios, fortalecendo-se a indicação de que, de fato, sobrevive unicamente das lidas rurais. Assim, o efetivo labor rural da família restou corroborado pelos documentos trazidos aos autos e, também, pelas testemunhas ouvidas na fase administrativa, pois confirmaram que a autora sempre exerceu a atividade agrícola.
A respeito dos pontos controvertidos alegados pelo INSS na apelação, no qual se referem ao contrato de parceria com o Sr. Alfredo Nickel e a informação de que a justificante teria trabalhado com o pai biológico até 1970, e com a morte deste, com a mãe até 1979, quando contraiu matrimônio e foi morar com seu cônjuge (fl.76), tenho que esses argumentos não podem servir para descaracterizar a atividade rural da parte autora, em regime de economia familiar.
No referido contrato, nota-se que se trata de parceria de acordo verbal que existia entre a autora e o Sr. Alfredo Nickel, anteriormente a data em que foi firmado. Contudo, em análise das provas dos autos, este contrato de parceria ficou claro com o início das provas materiais e foi corroborada com a prova testemunhal idônea, na qual relata a divisão da produção de fumo da autora com o depoente, sendo que as notas saíam em nome do mesmo. Em relação à data do firmamento do mesmo, essa não descaracteriza a relação contratual verbal existente anteriormente, pois a prova testemunhal foi precisa quanto à parceria da atividade agrícola realizada pela autora, demonstrando que a mesma sobrevive das lidas campesinas em grande período de tempo, sem ter exercido atividade urbana, não cabendo a alegação de engendrado com a intenção de manipular a concessão de benefício previdenciário.
No depoimento do Sr. Alfredo Nickel (fls.48-49), o mesmo refere que criou a autora desde os nove anos de idade, desde quando seu pai ficou doente (1962), não tendo parentesco sanguíneo com a autora. Percebe-se, pelos relatos das testemunhas, que a autora continuou com o contrato de parceria firmado com o Sr. Alfredo Nickel, mesmo após a sua morte, com seus herdeiros, demonstrando que somente possui vínculo afetivo e não de parentesco, pois a autora continuou a dividir a produção em terras de terceiros.
Sobre a alegação de autora ter trabalhado com o pai biológico até 1970, e com a morte deste, com a mãe até 1979, quando contraiu matrimônio e foi morar com seu cônjuge, pode-se dizer que não foi visualizada, nos autos deste processo, a informação constante no recurso de fl. 40, não podendo ter relevância tais datas e fatos.
O conjunto probatório, portanto, demonstra o exercício da atividade rural desde longa data até, no mínimo, a ocasião em que requerido o benefício perante o INSS.
Assim, havendo a autora completado 55 (cinquenta e cinco) em 16 de julho de 2008 (fl. 12) e demonstrado o efetivo exercício de atividade rural por período superior a 168 (cento e sessenta e oito) meses, contados, retroativamente, de 2009, é devido o benefício de aposentadoria por idade rural a partir da data do requerimento administrativo (31 de agosto de 2009).
Honorários advocatícios
Os honorários advocatícios devem ser fixados em 10% sobre o valor das parcelas vencidas até a data do presente julgamento, a teor das Súmulas 111 do Superior Tribunal de Justiça e 76 do Tribunal Regional Federal da 4ª Região.
Custas
O INSS é isento do pagamento das custas no Foro Federal (art. 4, I, da Lei nº 9.289/96) e na Justiça Estadual do Rio Grande do Sul, devendo, contudo, pagar eventuais despesas processuais, como as relacionadas a correio, publicação de editais e condução de oficiais de justiça (artigo 11 da Lei Estadual nº 8.121/85, com a redação da Lei Estadual nº 13.471/2010, já considerada a inconstitucionalidade formal reconhecida na ADInº 70038755864, julgada pelo Órgão Especial do TJ/RS); para os feitos ajuizados a partir de 2015 é isento o INSS da taxa única de serviços judiciais, na forma do estabelecido na lei estadual nº 14.634/2014 (artigo 5º). Tais isenções não se aplicam quando demandado na Justiça Estadual do Paraná (Súmula 20 do TRF4), devendo ser ressalvado, ainda, que no Estado de Santa Catarina (art. 33, parágrafo único, da Lei Complementar Estadual nº 156/97), a autarquia responde pela metade do valor.
Tutela específica
Considerando a eficácia mandamental dos provimentos fundados no artigo 497 do Código de Processo Civil de 2015, e tendo em vista que a presente decisão não está sujeita, em princípio, a recurso com efeito suspensivo (TRF4, 3ª Seção, Questão de Ordem na AC nº 2002.71.00.050349-7/RS, Relator para o acórdão Des. Federal Celso Kipper, julgado em 9 de agosto de 2007), determino o cumprimento imediato do acórdão quanto à implantação do benefício devido à parte autora (CPF 713279080-34), a ser efetivada em 45 (quarenta e cinco) dias.
Conclusão
Conheço a remessa necessária. Nego provimento ao apelo da autarquia.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação do INSS e determinar o cumprimento imediato do acórdão.
Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE
Relatora
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 07/06/2017
APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 0018826-76.2015.4.04.9999/RS
ORIGEM: RS 00103940620118210007
RELATOR | : | Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE |
PRESIDENTE | : | Desembargadora Federal Vânia Hack de Almeida |
PROCURADOR | : | Procurador Regional da República Alexandre Amaral Gavronski |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
APELADO | : | HELDINA BRAATZ SPIERING |
ADVOGADO | : | Arlene Fonseca Radmann Duarte |
REMETENTE | : | JUIZO DE DIREITO DA 1A VARA DA COMARCA DE CAMAQUA/RS |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 07/06/2017, na seqüência 568, disponibilizada no DE de 23/05/2017, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 6ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DO INSS E DETERMINAR O CUMPRIMENTO IMEDIATO DO ACÓRDÃO.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE |
VOTANTE(S) | : | Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE |
: | Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA | |
: | Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA |
Gilberto Flores do Nascimento
Diretor de Secretaria
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