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EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. TEMPO DE SERVIÇO RURAL. INÍCIO DE PROVA MATERIAL. MENOR DE 12 ANOS DE IDADE. REFORMA PARCIAL DA SENTENÇA. REQUISITOS NÃO PREENCHIDOS. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. TRF4. 5012779-65.2020.4.04.7205

Data da publicação: 01/11/2022, 07:01:07

EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. TEMPO DE SERVIÇO RURAL. INÍCIO DE PROVA MATERIAL. MENOR DE 12 ANOS DE IDADE. REFORMA PARCIAL DA SENTENÇA. REQUISITOS NÃO PREENCHIDOS. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. 1. Para o reconhecimento do labor rural iniciado em tenra idade, é necessário que o conjunto probatório (material e testemunhal) seja suficientemente robusto. No caso dos autos, não há prova testemunhal. 2. Em julgado anterior, esta Turma firmou o seguinte entendimento: "o efetivo desempenho de lides rurais em caráter de subsistência pressupõe o uso intensivo de força física pelo trabalhador, sendo razoável concluir-se que, de modo geral e em situações normais - em que não haja a exploração ilícita do trabalho infantil -, tais condições não se encontram presentes em momento prévio aos doze anos de idade." (TRF4, AC 5001312-14.2019.4.04.7209, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DE SC, Relator JORGE ANTONIO MAURIQUE, juntado aos autos em 06/11/2019). 3. No caso do autos, entende-se que o labor rural exercido pelo autor antes dos 12 anos de idade teve um caráter de auxílio, não havendo elementos que permitam concluir a indispensabilidade desse labor. 4. O segurado não faz jus à concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição por não cumprir com os requisitos obrigatórios conforme a Lei de Benefícios. 5. Caracterizada a sucumbência recíproca e a inexistência de condenação ou proveito econômico, os honorários advocatícios são fixados em 10% sobre o valor atualizado da causa, devidos pela metade por cada uma das partes. (TRF4, AC 5012779-65.2020.4.04.7205, NONA TURMA, Relator SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ, juntado aos autos em 25/10/2022)

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5012779-65.2020.4.04.7205/SC

PROCESSO ORIGINÁRIO: Nº 5012779-65.2020.4.04.7205/SC

RELATOR: Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ

APELANTE: EDILSON WALTER WESTPHAL (AUTOR)

ADVOGADO: MARCIA ROSANE WITZKE (OAB SC009021)

ADVOGADO: CARLA LETICIA ERN COELHO (OAB SC024036)

ADVOGADO: CLAUDIA LETICIA GEREMIAS (OAB SC042607)

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)

RELATÓRIO

Trata-se de demanda na qual a parte autora postula o benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, mediante o reconhecimento de labor rural que alega ter exercido em regime de economia familiar no período de 01/01/1971 (3 anos, 5 meses e 12 dias de idade) a 31/10/1986 (19 anos, 3 meses e 11 dias de idade).

O dispositivo da sentença tem o seguinte teor (evento 44):

3. DISPOSITIVO

Em face do exposto, julgo IMPROCEDENTES os pedidos, com fundamento no prescrito pelo artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil/2015, extinguindo o processo com resolução de mérito.

Condeno a parte-autora ao pagamento das custas e dos honorários advocatícios, estes fixados em 10% sobre o valor atualizado da causa [IPCA-e], a teor do art. 85, §§2º e 3º, I, do CPC. Suspensa a exigibilidade, uma vez que a parte-autora litiga ao abrigo da gratuidade de justiça.

Na hipótese de interposição de recurso de apelação, intime-se a parte contrária para apresentar contrarrazões e, após, remetam-se os autos ao Tribunal Regional Federal da 4ª Região, nos termos do art. 1.010 do CPC.

Suscitada em contrarrazões questão resolvida na fase de conhecimento, intime-se o apelante para, em 15 (quinze) dias, querendo, manifestar-se a respeito, a teor do art. 1.009, §2°, do CPC.

Sentença publicada e registrada eletronicamente. Intimem-se.

O autor apela (evento 48) requerendo, em síntese, o reconhecimento do labor rural exercido em todo o período pleiteado.

Com contrarrazões (evento 52), vieram os autos para julgamento.

É o relatório.

VOTO

Da atividade rural

O aproveitamento do tempo de atividade rural exercido até 31 de outubro de 1991, independentemente do recolhimento das respectivas contribuições previdenciárias e exceto para efeito de carência, está expressamente autorizado e previsto pelo art. 55, § 2º, da Lei n.º 8.213/91, e pelo art. 127, inc. V, do Decreto n.º 3.048/99.

Acresce-se que o cômputo do tempo de serviço rural exercido no período anterior à Lei n.º 8.213/91, em regime de economia familiar e sem o recolhimento das contribuições, aproveita tanto ao arrimo de família quanto aos demais membros do grupo familiar que com ele laboram, porquanto a todos estes integrantes foi estendida a condição de segurado, nos termos do art. 11, inc. VII, da lei previdenciária (STJ, REsp 506.959/RS, 5ª Turma, Rel. Min. Laurita Vaz, DJU de 10/11/2003).

O tempo de serviço rural deve ser demonstrado mediante início de prova material contemporâneo ao período a ser comprovado, complementado por prova testemunhal idônea, não sendo esta admitida exclusivamente, em princípio, a teor do art. 55, § 3º, da Lei n. 8.213/91, e Súmula 149 do STJ.

Os documentos apresentados em nome de terceiros, sobretudo quando integrantes do mesmo núcleo familiar, consubstanciam início de prova material do labor rural, consoante inclusive consagrado na Súmula 73 do Tribunal Regional Federal da 4ª Região.

Cumpre salientar que, para caracterizar o início de prova material, não é necessário que os documentos apresentados comprovem, ano a ano, o exercício da atividade rural, seja porque se deve presumir a continuidade nos períodos imediatamente próximos, sobretudo no período anterior à comprovação, à medida que a realidade em nosso país é a migração do meio rural ao urbano, e não o inverso, seja porque é inerente à informalidade do trabalho campesino a escassez documental. O início de prova material deve viabilizar, em conjunto com a prova oral, um juízo de valor seguro acerca da situação fática.

De outra parte, afigura-se possível o reconhecimento de atividade rural para fins previdenciários no período dos 12 a 14 anos de idade. A jurisprudência deste Tribunal, do Superior Tribunal de Justiça e do Supremo Tribunal Federal é pacífica nesse sentido (TRF4ªR - 3ª Seção, EI 2001.04.01.025230-0/RS, Rel. Juiz Federal Ricardo Teixeira do Valle Pereira, j. 12/03/2003; STJ - AgRg no RESP 419601/SC, 6ª T, Rel. Min. Paulo Medina, DJ 18/04/2005, p. 399 e RESP 541103/RS, 5ª T, Rel. Min. Jorge Scartezzini, DJ 01/07/2004, p. 260; STF - AI 529694/RS, Rel. Min. Gilmar Mendes, 2ª T, j. em 15.02.2005).

As certidões da vida civil são hábeis a constituir início probatório da atividade rural da parte autora, nos termos na jurisprudência pacífica do Superior Tribunal de Justiça (REsp n.º 980.065/SP, Quinta Turma, Rel. Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, j. em 20-11-2007, DJU, Seção 1, de 17-12-2007, p. 340, e REsp n.º 637.437/PB, Relatora Ministra Laurita Vaz, Quinta Turma, j. em 17-08-2004, DJU, Seção 1, de 13-09-2004, p. 287, REsp n.º 1.321.493-PR, Primeira Seção, Relator Ministro Herman Benjamim, DJe em 19-12-2012, submetido à sistemática dos recursos repetitivos.).

Enfatize-se que 'a descontinuidade da prova documental não impede o reconhecimento de todo o período de tempo de serviço rural postulado, uma vez que a declaração do tempo de serviço rural envolve, mais do que o reconhecimento do exercício de atividade agrícola, o reconhecimento da condição de lavrador, na qual está intrínseca a idéia de continuidade e não de eventualidade. Não há necessidade de comprovação do trabalho rural mês a mês, ano a ano, bastando que o conjunto probatório permita ao Julgador, formar convicção acerca da efetiva prestação laboral rurícola. A Jurisprudência tem entendido que a qualificação de agricultor em atos do registro civil constitui início razoável de prova material para fins de comprovação da atividade rural' (in TRF 4ª Região, AC 96.04.58708-0/RS, 6ª Turma, Rel. Dês. Fed. Luiz Carlos de Castro Lugon, DJ 24/05/2000).

Ademais, acaso demonstrado que o pai ou mãe da parte autora possuiu um vínculo urbano, ainda que tal emprego tenha sido negado pelo autor e por suas testemunhas, faz-se imperioso analisar se o sustento do demandante já era extraído primordialmente da lavoura enquanto ele ainda residia com seus genitores, ou, caso contrário, se a subsistência do grupo familiar era garantida majoritariamente pelo(s) salário(s) do(s) integrante(s) do grupo familiar que mantinha(m) emprego(s) urbano(s):

PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA RURAL POR IDADE. REQUISITOS. CARÊNCIA. COMERCIALIZAÇÃO. CÔNJUGE. APOSENTADORIA. SUBSISTÊNCIA DA FAMÍLIA. 1. Para fins de concessão da aposentadoria rural em regime especial de economia familiar, deve ser comprovada atividade rural no período equivalente à carência imediatamente anterior à data de implementação da idade ou à DER, ainda que de forma descontínua. 2. Também é necessário demonstrar que a produção agrícola se mostra indispensável à subsistência da família, gerando algum excedente apto à regular comercialização e consequente apoio financeiro ao grupo familiar. 3. Por si só, o mero fato da existência de renda própria por parte de algum integrante da família não tem o condão de descaracterizar, quanto aos demais, a condição de rurícola em regime de economia familiar, desde que a renda auferida não se mostre bastante à subsistência da família. 4. A suficiência da renda adicional deve ser verificada caso a caso, conforme a prova dos autos. 5. Divergência não demonstrada. 6. Recurso não conhecido. (5004366-05.2011.404.7003, Turma Regional de Uniformização da 4ª Região, Relator p/ Acórdão Giovani Bigolin, juntado aos autos em 29/04/2015) (grifou-se)

Outrossim, a jurisprudência deste Regional já afirmou que o afastamento das atividades agrícolas - sempre por um curto período de tempo -não descaracteriza a condição de trabalhador rural. Nesse sentido e "mutatis mutandis":

PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. REEXAME DE RECURSO. ART. 543-C, § 7º, II, DO CPC. TRABALHO URBANO DE INTEGRANTE DO GRUPO FAMILIAR. POSSIBILIDADE DA EXTENSÃO DA PROVA EM NOME DO CÔNJUGE DESDE QUE CONTEMPORÂNEA AO PERÍODO DE CARÊNCIA. 1. In casu, a matéria controvertida diz respeito à impossibilidade da extensão da prova material da atividade rural de um membro do núcleo familiar a outro, quando o titular dos documentos passa a exercer atividade incompatível com a rural, como o trabalho urbano. 2. No julgamento do Recurso Especial representativo de controvérsia (REsp n. 1.304.479-SP), o STJ entendeu restar prejudicada a extensão da prova material de um integrante do grupo familiar a outro, quando o titular passa a desempenhar atividade incompatível com a rural. Todavia, o recurso não foi provido, porquanto, na hipótese, verificou-se que a recorrida havia juntado documentos em nome próprio, atendendo à exigência de início de prova material. 3. No caso concreto, todavia, verifico que o esposo da embargada esteve afastado das atividades agrícolas por um curto período de tempo (aproximadamente 08 meses), não descaracterizando, portanto, este período a sua condição de trabalhador rural. Por esse motivo, entendo que a documentação em nome do cônjuge da embargada, com anotação de sua profissão como lavrador, pode ser estendida à mesma para fins de comprovação da atividade rural no período de carência. 4. Mantida a decisão da Turma, que, por unanimidade, negou provimento aos embargos infringentes interpostos pelo INSS, determinando o retorno dos autos à Vice-Presidência desta Corte para exame de admissibilidade do recurso especial, nos termos do § 8º do art. 543-C do Código de Processo Civil. (TRF4, APELAÇÃO CÍVEL Nº 0001072-92.2013.404.9999, 3ª SEÇÃO, Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA, POR UNANIMIDADE, D.E. 04/05/2015, PUBLICAÇÃO EM 05/05/2015) -grifei.

Por fim, cabe registrar que de acordo com a jurisprudência do STJ, o exercício de atividade urbana pelo rurícola não afasta, por si só, sua condição de segurado especial, só não se considerando segurado especial quando ficar demonstrado que o trabalho urbano constitui a principal atividade laborativa do requerente e/ou sua principal fonte de renda. (REsp 1483172/CE, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 23/10/2014, DJe 27/11/2014). Ademais, o exercício da atividade rural pode ser descontínuo (AgRg no AREsp 327.119/PB, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 02/06/2015, DJe 18/06/2015).

Do exercício da atividade rural em idade inferior aos 12 anos de idade

A Sexta Turma desta Corte Regional firmou entendimento, no julgamento da Ação Civil Pública nº 50172673420134047100, no sentido de que "para fins de reconhecimento de tempo de serviço e de contribuição pelo exercício das atividades descritas no art. 11 da Lei 8.213/91, mostra-se possível ser computado período de trabalho realizado antes dos 12 anos de idade, qual seja, sem a fixação de requisito etário".

Confira-se a ementa do julgado:

DIREITO PREVIDENCIÁRIO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA MOVIDA PELO MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL PARA AFASTAR A IDADE MÍNIMA PREVISTA NO ART. 11 DA LEI 8.213/91 PARA FINS DE RECONHECIMENTO DE TEMPO DE SERVIÇO E DE CONTRIBUIÇÃO. INTERESSE DE AGIR DO MPF. RECONHECIMENTO. EFEITOS JURÍDICOS DA SENTENÇA. ABRANGÊNCIA NACIONAL DA DECISÃO PROLATADA EM AÇÃO CIVIL PÚBLICA. ART. 16 DA LEI. 7.347/85. INTERPRETAÇÃO DO ART. 7º, XXXIII DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. TRABALHO INFANTIL X PROTEÇÃO PREVIDENCIÁRIA. REALIDADE FÁTICA BRASILEIRA. INDISPENSABILIDADE DE PROTEÇÃO PREVIDENCIÁRIA ÀS CRIANÇAS. POSSIBILIDADE DE SER COMPUTADO PERÍODO DE TRABALHO SEM LIMITAÇÃO DE IDADE MÍNIMA. ACP INTEGRALMENTE PROCEDENTE. JULGAMENTO PELO COLEGIADO AMPLIADO. ART. 942 DO CPC. RECURSO DO MPF PROVIDO. APELO DO INSS DESPROVIDO. 1. O interesse processual do MPF diz respeito à alteração de entendimento da autarquia no tocante às implicações previdenciárias decorrentes do exercício laboral anterior àquele limite etário mínimo, consubstanciadas inclusive na Nota 76/2013. Em que pese efetivamente constitua aquela Nota importante avanço no posicionamento do INSS sobre a questão, não torna ela despicienda a tutela jurisdicional pleiteada, já que admite aquela Nota que, uma vez reconhecida na esfera trabalhista a relação de emprego do menor de 16 anos, possa a autarquia considerá-lo segurado e outorgar efeitos de proteção previdenciária em relação ao mesmo, permanecendo - não bastasse a já referida necessidade prévia de reconhecimento trabalhista - a não admitir a proteção para as demais situações de exercício laboral por menor de 16 anos, referidas na contestação como externadas de forma voluntária. Não bastasse isto, restaria ainda a questão referente à documentação e formalidades exigidas para a comprovação de tal labor, o que evidencia a permanência da necessidade de deliberação e, por consequência, a existência do interesse de agir. 2. Não há falar em restrição dos efeitos da decisão em ação civil pública a limites territoriais, pois não se pode confundir estes com a eficácia subjetiva da coisa julgada, que se estende a todos aqueles que participam da relação jurídica. Isso porque, a imposição de limites territoriais, prevista no art. 16 da LACP, não prejudica a obrigatoriedade jurídica da decisão judicial em relação aos participantes da relação processual. 3. Logo, inexiste violação ao art. 16 da Lei nº 7.347/1985, como aventou o INSS, porquanto não é possível restringir a eficácia da decisão proferida nos autos aos limites geográficos da competência territorial do órgão prolator, sob pena de chancelar a aplicação de normas distintas a pessoas detentoras da mesma condição jurídica. 4. Mérito. A limitação etária imposta pelo INSS e que o Ministério Público Federal quer ver superada tem origem na interpretação que se dá ao art. 7º, XXXIII da Constituição Federal, que veda qualquer trabalho para menores 16 anos, salvo na condição de aprendiz. 5. Efetivamente, a aludida norma limitadora traduz-se em garantia constitucional existente em prol da criança e do adolescente, vale dizer, norma protetiva estabelecida não só na Constituição Federal, mas também na legislação trabalhista, no ECA (Lei 8.079/90) em tratados internacionais (OIT) e nas normas previdenciárias. 6. No entanto, aludidas regras, editadas para proteger pessoas com idade inferior a 16 anos, não podem prejudicá-las naqueles casos em que, não obstante a proibição constitucional e legal, efetivamente, trabalharam durante a infância ou a adolescência. 7. Não obstante as normas protetivas às crianças, o trabalho infantil ainda se faz presente no seio da sociedade. São inúmeras as crianças que desde tenra idade são levadas ao trabalho por seus próprios pais para auxiliarem no sustento da família. Elas são colocadas não só em atividades domésticas, mas também, no meio rural em serviços de agricultura, pecuária, silvicutura, pesca e até mesmo em atividades urbanas (vendas de bens de consumos, artesanatos, entre outros). 8. Além disso, há aquelas que laboram em meios artísticos e publicitários (novelas, filmes, propagandas de marketing, teatros, shows). E o exercício dessas atividades, conforme a previsão do art. 11 da Lei nº 8.213/91, enseja o enquadramento como segurado obrigatório da Previdência Social. 9. É sabido que a idade mínima para fins previdenciários é de 14 anos, desde que na condição de aprendiz. Também é certo que a partir de 16 anos o adolescente pode obter a condição de segurado com seu ingresso no mercado de trabalho oficial e ainda pode lográ-lo como contribuinte facultativo. 10. Todavia, não há como deixar de considerar os dados oficiais que informam existir uma gama expressiva de pessoas que, nos termos do art. 11 da LBPS, apesar de se enquadrarem como segurados obrigatórios, possuem idade inferior àquela prevista constitucionalmente e não têm a respectiva proteção previdenciária. 11. Segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio (PNAD) no ano de 2014, o trabalho infantil no Brasil cresceu muito em comparação com os anos anteriores, quando estava em baixa. 12. E, de acordo com o IBGE, no ano de 2014 havia 554 mil crianças de 5 a 13 anos trabalhando. Na atividade agrícola, nesta mesma faixa etária, no ano de 2013 trabalhavam 325 mil crianças, enquanto no ano de 2014 passou a ser de 344 mil, um aumento de 5,8%. Já no ano de 2015, segundo o PNAD (IBGE) houve novamente uma diminuição de 19,8%. No entanto, constatou-se o aumento de 12,3% do 'trabalho infantil na faixa entre 5 a 9 anos'. 13. O Ministério do Trabalho e Previdência Social - MPTS noticia que em mais de sete mil ações fiscais realizadas no ano de 2015, foram encontradas 7.200 crianças em situação de trabalho irregular. Dos 7.200 casos, 32 crianças tinham entre 0 e 4 - todas encontradas no Amazonas. Outras 105 estavam na faixa etária de 5 a 9 anos e foram encontradas, também, no Amazonas (62) e nos estados de Pernambuco (13), Pará (7) Roraima (5), Acre (4) Mato Grosso do Sul e Rio Grande do Sul (3 em cada Estado), Bahia e Sergipe (2 em cada Estado). Na Paraíba, Rio de Janeiro, Rondônia e Tocantins encontrou-se uma criança em cada Estado com essa faixa etária de 5 a 9 anos. 14. Insta anotar que a realidade fática revela a existência de trabalho artístico e publicitário com nítido objetivo econômico e comercial realizados com a autorização dos pais, com a anuência do Poder Judiciário, de crianças recém nascidas, outras com 01, 2, 3, 4 e 5 anos de idade. Aliás, é possível a proteção previdenciária nesses casos? No caso de eventual ocorrência de algum acidente relacionado a esse tipo de trabalho, a criança teria direito a algum benefício previdenciário, tal como o auxílio acidente? 15. No campo da seguridade social extrai-se da norma constitucional (art. 194, parágrafo único) o princípio da universalidade da cobertura e do atendimento que preconiza que a proteção social deve alcançar a todos os trabalhadores do território nacional que dela necessitem. Por corolário lógico, incluem-se nessa proteção social aquelas crianças ou adolescentes que exerceram algum tipo de labor. 16. A despeito de haver previsão legal quanto ao limite etário (art. 13 da Lei 8.213/91, art. 14 da Lei 8.212/91 e arts. 18, § 2º do Decreto 3.048/99) não se pode negar que o trabalho infantil, ainda que prestado à revelia da fiscalização dos órgãos competentes, ou mediante autorização dos pais e autoridades judiciárias (caso do trabalho artístico e publicitário), nos termos dos arts. 2º e 3º da CLT, configura vínculo empregatício e fato gerador do tributo à seguridade, nos termos do inciso I do art. 195 da Constituição Federal. 17. Assim, apesar da limitação constitucional de trabalho do infante (art. 157, IX da CF/46, art. 165, X da CF/67 e art. 7º, XXIII, da CF/88), para fins de proteção previdenciária, não há como fixar também qualquer limite etário, pois a adoção de uma idade mínima ensejaria ao trabalhador dupla punição: a perda da plenitude de sua infância em razão do trabalho realizado e, de outro lado, o não reconhecimento, de parte do INSS, desse trabalho efetivamente ocorrido. 18. Ressalte-se, contudo, que para o reconhecimento do trabalho infantil para fins de cômputo do tempo de serviço é necessário início de prova material, valendo aquelas documentais existentes em nome dos pais, além de prova testemunhal idônea. 19. Desse modo, para fins de reconhecimento de tempo de serviço e de contribuição pelo exercício das atividades descritas no art. 11 da Lei 8.213/91, mostra-se possível ser computado período de trabalho realizado antes dos 12 anos de idade, qual seja sem a fixação de requisito etário. 20. Recurso do INSS desprovido. Apelação do MPF provida. (TRF4, AC 5017267-34.2013.4.04.7100, SEXTA TURMA, Relatora para Acórdão SALISE MONTEIRO SANCHOTENE, juntado aos autos em 12/04/2018)

Igualmente, no sentido de que é possível flexibilizar a idade mínima para reconhecimento do trabalho rural, desde que configurada prova robusta, reproduzo os seguinte julgados, inclusive desta Turma Regional Suplementar de Santa Catarina:

PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. REQUISITOS. TEMPO RURAL. CÔMPUTO. IDADE MÍNIMA. 1. Respeitadas as alterações trazidas pela Emenda Constitucional 20/98, a aposentadoria por tempo de contribuição é devida ao segurado que tenha laborado por 30 anos (proporcional) ou 35 anos (integral), desde que cumprida a carência exigida de 180 contribuições (artigos 25, II, 52, 53 da Lei 8.213/91 e 201, § 7º, I, da Constituição). Quanto à carência observa-se a regra de transição prevista no artigo 142 da Lei de Benefícios, para os filiados ao regime de Previdência Social até 24/07/1991, data da publicação do referido diploma. 2. Nos termos do artigo 55, § 2º, da Lei nº 8.213/91, o cômputo de tempo de serviço de segurado trabalhador rural anterior à data de início de sua vigência, é admitido, para concessão de benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, independentemente do recolhimento das contribuições a ele correspondentes, exceto para efeito de carência. Com relação ao tempo de serviço rural ulterior à Lei de Benefícios (competência de novembro de 1991, conforme disposto no artigo 192 do Regulamento dos Benefícios da Previdência Social aprovado pelo Decreto n° 357/91), o aproveitamento condiciona-se ao recolhimento das contribuições previdenciárias correspondentes, de acordo com o artigo 39, inciso II, da Lei n° 8.213/91 e Súmula 272 do STJ. 3. Para a comprovação do tempo de atividade rural é preciso existir início de prova material, não sendo admitida, em regra, prova exclusivamente testemunhal. 4. Consoante entendimento pacificado do STJ, o reconhecimento de trabalho rural antes dos doze anos exige prova robusta e detalhada acerca da efetiva contribuição do menor para a subsistência da família e especificada quanto à(s) tarefa(s) desenvolvida(s) por ele, além do período de tempo diário despendido no trabalho. 5. Demonstrado o preenchimento dos requisitos, o segurado faz jus à concessão da aposentadoria por tempo de contribuição. (TRF4 5046386-68.2016.4.04.9999, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DO PR, Relator MÁRCIO ANTÔNIO ROCHA, juntado aos autos em 09/12/2019)

PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. ATIVIDADE RURAL EXERCIDA ANTES DOS 12 ANOS DE IDADE. RECONHECIDA. ATIVIDADE URBANA NÃO REGISTRADA NA CTPS. RECONHECIMENTO. CONCESSÃO DO BENEFÍCIO. JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA. 1. A limitação da idade para o reconhecimento de tempo de serviço rural, consoante jurisprudência dos Tribunais Superiores, está diretamente relacionada à proibição constitucional do trabalho pelo menor. Assim, ainda que se trate de norma protetiva, e que, por isso, não poderia vir em prejuízo de reconhecimento de direitos, é possível o reconhecimento do exercício de atividade rural anteriormente aos 12 anos, desde que amparada em início de prova material (em nome dos pais) corroborada por prova testemunhal. 2. Tempo de labor urbano devidamente comprovado através de início de prova documental, corroborado com prova testemunhal. 3.O Plenário do STF concluiu o julgamento do Tema 810, ao examinar o RE 870947, definindo a incidência dos juros moratórios da seguinte forma: O art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, com a redação dada pela Lei nº 11.960/09, na parte em que disciplina os juros moratórios aplicáveis a condenações da Fazenda Pública, é inconstitucional ao incidir sobre débitos oriundos de relação jurídico-tributária, aos quais devem ser aplicados os mesmos juros de mora pelos quais a Fazenda Pública remunera seu crédito tributário, em respeito ao princípio constitucional da isonomia (CRFB, art. 5º, caput); quanto às condenações oriundas de relação jurídica não-tributária, a fixação dos juros moratórios segundo o índice de remuneração da caderneta de poupança é constitucional, permanecendo hígido, nesta extensão, o disposto no art. 1º-F da Lei nº 9.494/97 com a redação dada pela Lei nº 11.960/09. 4. Após o julgamento do RE 870947, o STJ, no julgamento do REsp 1.495.146, submetido à sistemática de recursos repetitivos, definiu que o índice de correção monetária é o INPC, nas condenações impostas à Fazenda Pública de natureza previdenciária, no que se refere ao período posterior à vigência da Lei 11430/2006, que incluiu o art. 41-A na Lei 8.213/91. Cumpre, de ofício, adequar os critérios de correção monetária e juros moratórios da sentença. (TRF4, AC 5023118-77.2019.4.04.9999, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DE SC, Relator JOÃO BATISTA LAZZARI, juntado aos autos em 13/12/2019)

Período de 05/01/1971 a 31/10/1986

Colhe-se da sentença:

No caso concreto, a parte-autora, nascida em 20/07/1967, alega ter laborado na agricultura, em regime de economia familiar, no período de 01.01.1971 a 31.10.1986.

Na audiência de conciliação, instrução e julgamento, a parte-autora relatou ser nascida e criada na localidade de Rio Novo, município de Pouso Redondo/SC. Informa que os pais eram agricultores, sendo o grupo familiar formado por 04 (quatro) irmãos, sendo o autor o primogênito. Disse que o imóvel distava aproximadamente 210.000 metros quadrados, tendo a família residido no terreno. Plantavam principalmente fumo e mandioca, que eram comercializados e demais economias para subsistência. Plantavam em torno de 8.000 a 10.000 pés de fumo. Trabalhava fichando o fumo, colocando para secar e prendendo os fardos. O autor frequentou a escola no período matutino. O autor trabalhou com empregado em uma serraria de propriedade do genitor, a qual era tocada a água. Informou, ainda, que algumas pessoas trabalhavam na madeireira. Segundo o autor, a madeireira teve início em 1978. Acerca do trabalho a partir dos 4 anos de idade, disse que o pai colocava dentro da carroça e levava junto, afirmando que enrolava barbante no fumo. Ao que se recorda, o genitor se aposentou em 1996. Disse que o genitor lhe registrou como empregado, pois a partir dos 18 anos de idade não tinha mais interesse na lavoura.

As testemunhas, por sua vez, confirmaram o trabalho da parte-autora na lavoura, juntamente com sua família. Acerca do trabalho do genitor na madeireira, disseram que era uma pequena empresa artesanal, mas que não tem conhecimento de ser a atividade fonte relevante de renda.

A fim de comprovar suas alegações, a parte-autora anexou aos autos documentos relativos à atividade rural postulada, dos quais destaco:

- certidão de casamento dos genitores, qualificado o pai como agricultor (1965);

- certidão do Registro de Imóveis de Trombudo Central com averbação da escritura públicade de compra e venda de imóvel rural (1969);

- cópia da matrícula do imóvel registrado sob o n. 9710;

- certidão de nascimento própria e dos irmãos (1970, 1971);

- declaração da Afubra de safra de fumo em nome do genitor (79/80, 82/83, 83/84 e 84/85);

- ficha de associado do genitor junto à AFUBRA (1974/1975, 1975/1976, 1976/1977, 1977/1978, 1978/1979, 1979/1980, 1982/1983, 1983/1984, 1984/1985.

Diante das provas apresentadas, concluo que não é possível reconhecer o período rural em regime de economia familiar pleitado pelo requerente. No caso, entendo que não há indício material a demonstrar que o a atividade rural realizada pelo autor seja economicamente preponderante à atividade empresarial do genitor. Veja-se, extrai-se do processo administrativo de concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição do genitor do autor ter sido a época reconhecido para o seu pai o intervalo rural somente com relação ao período de 01/01/1965 a 31/12/1969. Da mesma forma, a mãe do autor obteve a concessão da aposentadoria por idade com reconhecimento do intervalo de 01/01/1990 a 04/11/1999 (eventos 38 e 39).

Ademais, há de se considerar que o pai do requerente sempre esteve vinculado à Previdência Social, efetuando recolhimentos como contribuinte individual, conforme se infere dos documentos apresentados no evento 29, laborando em empresa de sua propriedade do ramo de madeireiro. A empresa em questão foi fundada em 23/05/1969 - evento 01, PROCADM6, p. 37, note-se, ainda, o fato de que o primeiro emprego do requerente foi na madeireira de propriedade do genitor, vínculo esse mantido entre os anos de 1986 a 1992. Ademais, em seu depoimento o autor confirmou que além do pai e o autor, algumas pessoas trabalhavam na madeireira (evento 32, DOC2).

Ora, nos termos dos critérios acima arrolados, o regime de economia familiar, típico do segurado especial, até admite algum membro com atividade secundária fora do meio rural, como complemento de renda; porém, ele fica desfigurado quando ocorre o contrário, isto é, quando a atividade urbana é a principal e a produção rural fica como o complemento.

Isso fica evidente nos casos em que o próprio patriarca ou o arrimo da família, que, pelos costumes do que normalmente ocorre (CPC, art. 335), seria, em tese, o mais apto ao trabalho no campo, mas acaba ele indo desenvolver atividade urbana, passando, então, a ter a sua principal renda neste.

Ademais, a prova material é extremamente frágil, visto que para o período postulado o autor só apresentou documentos que comprovam eventual produção agrícola, mas que não demonstram a preponderância do trabalho rural em relação ao trabalho desenvolvido na madeireira. Tanto que o autor, na condição de primogênito, também foi trabalhar com o seu pai na empresa, isso logo a atingir a idade adulta, quando no auge da sua força física. Assim, embora tais documentos agreguem valor probante às assertivas do requerente, não produzem uma presunção absoluta de veracidade da preponderância do trabalho na lavoura sobre o trabalho realizado na empresa do pai.

Não foi juntada aos autos qualquer nota fiscal que comprovasse a venda do(s) produto(s) cultivado(s), conforme alegado pelo autor em seu depoimento pessoal.

Assim, não há prova documental apta a comprovar a atividade rural, sendo insuficientes as testemunhas (STJ, Súm. 149).

Logo, o autor não venceu o ônus que lhe cabia, não fazendo jus ao reconhecimento do período rural, ficando prejudicadas as demais discussões.

Primeiramente faz-se necessária a análise do período de 01/01/1971 a 19/07/1979, no qual o autor tinha menos do que 12 anos de idade.

Para o reconhecimento do labor rural iniciado em tenra idade (in casu, dos 3 aos 12 anos), é necessário que o conjunto probatório (material e testemunhal) seja suficientemente robusto.

Com relação ao início de prova material, vale mencionar o enunciado da súmula nº 73, deste Tribunal:

Admitem-se como início de prova material do efetivo exercício de atividade rural, em regime de economia familiar, documentos de terceiros, membros do grupo parental.

Serve como mero início de prova material (indireta) a certidão de nascimento do irmão, Geovane, emitida em 17/05/1971, na qual o genitor está qualificado como lavrador (evento 1, PROCADM6, fl. 27) e a ficha de associado do genitor na Associação dos Fumicultores do Brasil "AFUBRA" com anuidades pagas entre 1974 a 1985 (evento 1, PROCADM6, fl. 36).

Da prova oral destacam-se os seguintes trechos:

Edilson Walter Westphal (evento 32, VIDEO2) afirma que os genitores eram agricultores, que tem três irmão, que é o mais velho, que plantavam fumo, mandioca, aipim, milho, que trabalhou com o genitor no terreno, que frequentava a escola pela manhã, que o genitor tinha uma serraria tocada a água, que havia uma firma constituída, que a serraria tinha empregados. Que com 4 anos de idade enrolava barbante, que o pai contribuiu ao INSS como autônomo, que o genitor o registrou como empregado da serraria pois ele não queria mais trabalhar na agricultura.

Nilson Werter (evento 32, VIDEO3) afirma que conhece o autor desde que ele era criança, que viu o autor trabalhando na agricultura, que plantavam mandioca, fumo, que via o autor colhendo fumo, preparando para pôr no galpão, que o autor trabalhava com os genitores, que o terreno era do genitor, que a família vendia mandioca e fumo, que eles não trabalhavam com máquinas, que a família vivia da agricultura, que o genitor tinha uma serraria artesanal, que acha que a serraria não resultava em renda.

Ari da Silva (evento 32, VIDEO4) afirma que viu o autor trabalhando na roça, que o autor desde pequeno estava na roça, que a família plantava fumo, aipim, que vendiam parte da produção, que o genitor do autor trabalhava com madeira, que a família vivia da agricultura.

Edgar de Liz (evento 32, VIDEO5) afirma que viu o autor junto com a família trabalhar na roça, que plantavam fumo, milho, mandioca, feijão, que eles tinham gado, que o genitor tinha uma pequena serraria, que a família vivia da agricultura, que o terreno era da família. Que não recorda de haver empregados na agricultura.

Quando se está diante de labor rural exercido por menor de 12 anos, deve ser apurado se as atividades que lhe competiam estavam diretamente ligadas à subsistência da família, como bem observado pelo juízo de origem.

Isso está atrelado à noção de que a lide rural não é uma atividade simples, pois demanda uma força física que ainda está em formação em uma pessoa menor do que 12 anos. Observe-se o seguinte julgado desta Turma:

PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. ATIVIDADE RURAL EXERCIDA ANTES DOS 12 ANOS DE IDADE. NÃO RECONHECIDA. ATIVIDADE ESPECIAL. AGENTE NOCIVO RUÍDO. RECONHECIMENTO. CONCESSÃO DO BENEFÍCIO. 1. A limitação da idade para o reconhecimento de tempo de serviço rural, consoante jurisprudência dos Tribunais Superiores, está diretamente relacionada à proibição constitucional do trabalho pelo menor. Além disso, ainda que se trate de norma protetiva, e que, por isso, não poderia vir em prejuízo de reconhecimento de direitos, não basta para a comprovação de tempo de serviço na agricultura o fato de se tratar de filho de agricultores. 2. De fato, o efetivo desempenho de lides rurais em caráter de subsistência pressupõe o uso intensivo de força física pelo trabalhador, sendo razoável concluir-se que, de modo geral e em situações normais - em que não haja a exploração ilícita do trabalho infantil -, tais condições não se encontram presentes em momento prévio aos doze anos de idade. 3. Uma vez exercida atividade enquadrável como especial, sob a égide da legislação que a ampara, o segurado adquire o direito ao reconhecimento como tal e ao acréscimo decorrente da sua conversão em tempo de serviço comum no âmbito do Regime Geral de Previdência Social. 4. Até 28/04/1995 é admissível o reconhecimento da especialidade por categoria profissional ou por sujeição a agentes nocivos, aceitando-se qualquer meio de prova (exceto para ruído); a partir de 29/04/1995 não mais é possível o enquadramento por categoria profissional, devendo existir comprovação da sujeição a agentes nocivos por qualquer meio de prova até 05/03/1997 e, a partir de então, por meio de formulário embasado em laudo técnico, ou por meio de perícia técnica. 5. Considera-se especial a atividade desenvolvida com exposição a ruído superior a 80 dB até 05/03/1997, superior a 90 dB entre 06/03/1997 a 18/11/2003 e superior a 85 dB a partir de 19/11/2003. 6. Havendo mais de 35 anos de tempo de serviço/contribuição, na DER, a parte autora tem o direito à aposentadoria por tempo de contribuição. (TRF4, AC 5001312-14.2019.4.04.7209, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DE SC, Relator JORGE ANTONIO MAURIQUE, juntado aos autos em 06/11/2019)

A redação do parágrafo 1º do artigo 11 da Lei nº 8.213/91 diz que a atividade rural será enquadrada como regime de economia familiar quando "o trabalho dos membros da família é indispensável à própria subsistência", sendo "exercido em condições de mútua dependência e colaboração".

Ainda que o autor tenha laborado com os genitores e irmãos na lida rural, entende-se que tal atividade tratou-se de um auxílio, pois o labor rural demanda uma força física não encontrada em uma criança em desenvolvimento. Não há nos autos elementos que apontem em sentido contrário.

O próprio autor afirma que quando atingiu a maioridade não quis continuar trabalhando na agricultura por, entre outros motivos, ser um labor "muito pesado".

Ademais, pelo depoimento pessoal do autor, não é possível entender que a atividade que ele realizava estava relacionada com a sua subsistência e a de seus familiares. Quando questionado sobre quais atividades realizava aos 4 anos de idade, o autor não soube especificar além de dizer que "enrolava barbante". Alias, ele afirma que "muita coisa não fazia".

Dessa forma, a atividade rural exercida pelo autor não teria o caráter de indispensabilidade, não sendo possível o reconhecimento do período de 01/01/1971 a 19/07/1979.

Quanto ao período de 20/07/1979 a 30/10/1986, a ficha de associado do genitor supracitada é contemporânea dos fatos, em obediência a Lei de Benefícios, e a prova testemunhal é uníssona quanto a atividade rurícola da família.

Observa-se que o genitor tinha vínculo com a Previdência Social como contribuinte individual. Esse vínculo corresponde a empresa aberta pelo próprio genitor. Para o INSS, a abertura dessa pessoa jurídica é o evento que cessa o período de labor rural do genitor.

Ocorre que o genitor do autor associou-se a "AFUBRA" e contribuiu quase que de forma ininterrupta em todas as safras de 1974/1975 a 1984/1985. Além disso, as testemunhas deixam evidente que o fumo era um dos principais produtos do labor da família do autor.

Tendo isso em vista, não é possível afirmar que a serraria do genitor, que era "tocada a água" fosse a principal fonte de renda da família. Mais uma vez, recorresse às testemunhas que afirmam que o trabalho realizado na serraria era artesanal.

Assim, entende-se que no período de 20/07/1979 a 30/10/1986 o autor laborou em regime de economia familiar.

Contagem do tempo e concessão do benefício

Administrativamente, em 11/07/2019 (DER), foi reconhecido o tempo de contribuição de 20 anos, 11 meses e 26 dias, e 251 carências consideradas (evento 1, PROCADM6, fl. 42).

Esta Turma reconhece o total de 7 anos, 3 meses e 11 dias de labor rural.

Somando-se os tempos de serviço/contribuição acima, o autor conta com 28 anos, 3 meses e 7 dias, inferior ao mínimo exigido, de tempo de serviço.

Eventual cômputo de contribuição posterior à DER (11/07/2019), até a data deste julgamento, não seria suficiente para reconhecer o direito à aposentadoria.

Honorários sucumbenciais

A parte autora restou vencida no que diz respeito ao objeto da ação (concessão de aposentadoria), mas faz jus à averbação do período de trabalho rural.

Assim, caracterizada a sucumbência recíproca e a inexistência de condenação ou proveito econômico, os honorários advocatícios são fixados em 10% sobre o valor atualizado da causa, devidos pela metade por cada uma das partes, vedada a compensação, a teor do disposto no artigo 85, § 14, do Código de Processo Civil.

Neste sentido: AC 5024023-82.2019.4.04.9999, Turma Regional Suplementar de SC, Relator Celso Kipper, juntado aos autos em 13/10/2020; AC 5015488-04.2018.4.04.9999, Turma Regional Suplementar do PR, Relator Luiz Fernando Wowk Penteado, juntado aos autos em 30/09/2020.

Resta suspensa a exigibilidade do pagamento de honorários advocatícios pela autora, por ter sido reconhecido seu direito à assistência judiciária gratuita.

Custas

Diante da sucumbência recíproca, a autora deve suportar metade das custas, suspensa a exigibilidade da verba em face do reconhecimento do direito à assistência judiciária gratuita.

O Instituto Nacional do Seguro Social - INSS está isento do pagamento de custas (artigo 4º, inciso I, da Lei nº 9.289/96).

Dispositivo

Ante o exposto, voto por dar parcial provimento à apelação.



Documento eletrônico assinado por SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40003512483v15 e do código CRC d074d23d.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ
Data e Hora: 25/10/2022, às 13:1:33


5012779-65.2020.4.04.7205
40003512483.V15


Conferência de autenticidade emitida em 01/11/2022 04:01:07.

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5012779-65.2020.4.04.7205/SC

PROCESSO ORIGINÁRIO: Nº 5012779-65.2020.4.04.7205/SC

RELATOR: Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ

APELANTE: EDILSON WALTER WESTPHAL (AUTOR)

ADVOGADO: MARCIA ROSANE WITZKE (OAB SC009021)

ADVOGADO: CARLA LETICIA ERN COELHO (OAB SC024036)

ADVOGADO: CLAUDIA LETICIA GEREMIAS (OAB SC042607)

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)

EMENTA

PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. TEMPO DE SERVIÇO RURAL. INÍCIO DE PROVA MATERIAL. MENOR DE 12 ANOS DE IDADE. REFORMA PARCIAL DA SENTENÇA. requisitos não preenchidos. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.

1. Para o reconhecimento do labor rural iniciado em tenra idade, é necessário que o conjunto probatório (material e testemunhal) seja suficientemente robusto. No caso dos autos, não há prova testemunhal.

2. Em julgado anterior, esta Turma firmou o seguinte entendimento: "o efetivo desempenho de lides rurais em caráter de subsistência pressupõe o uso intensivo de força física pelo trabalhador, sendo razoável concluir-se que, de modo geral e em situações normais - em que não haja a exploração ilícita do trabalho infantil -, tais condições não se encontram presentes em momento prévio aos doze anos de idade." (TRF4, AC 5001312-14.2019.4.04.7209, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DE SC, Relator JORGE ANTONIO MAURIQUE, juntado aos autos em 06/11/2019).

3. No caso do autos, entende-se que o labor rural exercido pelo autor antes dos 12 anos de idade teve um caráter de auxílio, não havendo elementos que permitam concluir a indispensabilidade desse labor.

4. O segurado não faz jus à concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição por não cumprir com os requisitos obrigatórios conforme a Lei de Benefícios.

5. Caracterizada a sucumbência recíproca e a inexistência de condenação ou proveito econômico, os honorários advocatícios são fixados em 10% sobre o valor atualizado da causa, devidos pela metade por cada uma das partes.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 9ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Florianópolis, 21 de outubro de 2022.



Documento eletrônico assinado por SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40003512484v7 e do código CRC 6cfbb80b.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ
Data e Hora: 25/10/2022, às 13:1:33


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Poder Judiciário
Tribunal Regional Federal da 4ª Região

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 14/10/2022 A 21/10/2022

Apelação Cível Nº 5012779-65.2020.4.04.7205/SC

RELATOR: Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ

PRESIDENTE: Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ

PROCURADOR(A): WALDIR ALVES

APELANTE: EDILSON WALTER WESTPHAL (AUTOR)

ADVOGADO: MARCIA ROSANE WITZKE (OAB SC009021)

ADVOGADO: CARLA LETICIA ERN COELHO (OAB SC024036)

ADVOGADO: CLAUDIA LETICIA GEREMIAS (OAB SC042607)

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)

Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 14/10/2022, às 00:00, a 21/10/2022, às 16:00, na sequência 1202, disponibilizada no DE de 04/10/2022.

Certifico que a 9ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:

A 9ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DAR PARCIAL PROVIMENTO À APELAÇÃO.

RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ

Votante: Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ

Votante: Juiz Federal JOÃO BATISTA LAZZARI

Votante: Juiz Federal JAIRO GILBERTO SCHAFER

ALEXSANDRA FERNANDES DE MACEDO

Secretária



Conferência de autenticidade emitida em 01/11/2022 04:01:07.

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