Apelação Cível Nº 5005509-76.2022.4.04.9999/SC
PROCESSO ORIGINÁRIO: Nº 5000031-63.2019.8.24.0053/SC
RELATOR: Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ
APELANTE: NELSO LUIZ BARP
ADVOGADO: ELOA FATIMA DANELUZ (OAB SC008495)
ADVOGADO: DELAZIR MEIRA SAGAS BAZZI (OAB SC042276)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RELATÓRIO
Trata-se de demanda na qual a parte autora postula o benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, mediante o reconhecimento de labor rural que alega ter exercido em regime de economia familiar no período de 07/03/1976 a 05/11/1989, bem como a especialidade do serviço por exposição a agentes nocivos em diversos períodos, o que ensejaria um acréscimo ao tempo de contribuição total.
O dispositivo da sentença (evento 79) tem o seguinte teor:
DISPOSITIVO
Ante o exposto, resolvo o mérito e JULGO PROCEDENTE EM PARTE (CPC, art. 487, I) o pedido formulado pelo autor Nelso Luiz Barp em face do Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, para os fins de:
a) RECONHECER o período de trabalho rural, em regime de economia familiar, compreendido entre 07/03/1976 e 30/10/1988;
b) RECONHECER como especial os períodos trabalhados entre 06/11/1989 a 31/07/1991, 08/01/1992 a 01/03/1993, 01/07/1993 a 01/11/1995, 15/04/1997 a 24/01/2004, 01/10/2004 a 22/04/2005, 16/02/2015 a 03/03/2016 por exposição aos agentes nocivos químicos, conforme exposto na fundamentação;
c) DETERMINAR que o réu conceda, em favor da parte autora, benefício da aposentadoria por tempo de contribuição desde a DER em 03/03/2016.
Tratando-se de relação jurídica não-tributária, o índice de correção monetária a ser utilizado é o Índice de Preços ao Consumidor Amplo Especial (IPCA-E), e os juros de mora incidentes devem ser calculados com base no índice de remuneração da poupança, na forma do art. 1º-F da Lei nº 9.494/97 com a redação dada pela Lei nº 11.960/09.
Condeno o INSS, ainda, ao pagamento de honorários periciais, e honorários advocatícios que fixo em 10% sobre o valor da condenação, excluídas as parcelas vincendas (Súmula 111 do STJ e 76 do TRF4).
Sem custas processuais, já que isenta das mesmas a autarquia ré, conforme estatui o art. 33 da LC nº 156/1997, com redação dada pela LC nº 729/2018.
Sentença não sujeita à remessa necessária.
Publique-se. Registre-se. Intimem-se.
Oportunamente, arquive-se.
O INSS propôs embargos de declaração (evento 83) requerendo que o índice de correção monetária seja o INPC.
O autor apresentou contrarrazões aos embargos de declaração (evento 91) requerendo a manutenção do IPCA-E.
O juízo a quo assim deliberou (evento 93):
No caso dos autos, no entanto, vê-se que a insurgência do embargante não merece acolhimento, já que a pretensão visa a rediscussão do mérito da decisão, o que é vedado em sede de embargos de declaração.
Conforme colhe-se dos autos, a decisão objurgada foi clara ao dispor que "o índice de correção monetária a ser utilizado é o Índice de Preços ao Consumidor Amplo Especial (IPCA-E), e os juros de mora incidentes devem ser calculados com base no índice de remuneração da poupança, na forma do art. 1º-F da Lei nº 9.494/97 com a redação dada pela Lei nº 11.960/09".
Retira-se da decisão atacada:
"Dos juros e correção monetária
O Plenário do Supremo Tribunal Federal, em julgamento do Recurso Extraordinário n. 870.947/SE (Tema n. 810), publicado em 20.11.2017, em que se discutem os índices de correção monetária e os juros de mora a serem aplicados nos casos de condenações impostas contra a Fazenda Pública, definiu duas teses sobre a matéria. In verbis:
1) O art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, com a redação dada pela Lei nº 11.960/09, na parte em que disciplina os juros moratórios aplicáveis a condenações da Fazenda Pública, é inconstitucional ao incidir sobre débitos oriundos de relação jurídico-tributária, aos quais devem ser aplicados os mesmos juros de mora pelos quais a Fazenda Pública remunera seu crédito tributário, em respeito ao princípio constitucional da isonomia (CRFB, art. 5º, caput); quanto às condenações oriundas de relação jurídica não-tributária, a fixação dos juros moratórios segundo o índice de remuneração da caderneta de poupança é constitucional, permanecendo hígido, nesta extensão, o disposto no art. 1º-F da Lei nº 9.494/97 com a redação dada pela Lei nº 11.960/09;
2) O art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, com a redação dada pela Lei nº 11.960/09, na parte em que disciplina a atualização monetária das condenações impostas à Fazenda Pública segundo a remuneração oficial da caderneta de poupança, revela-se inconstitucional ao impor restrição desproporcional ao direito de propriedade (CRFB, art. 5º, XXII), uma vez que não se qualifica como medida adequada a capturar a variação de preços da economia, sendo inidônea a promover os fins a que se destina. Grifou-se.
De acordo com o entendimento sufragado, afastou-se o uso da Taxa Referencial (TR) como índice de correção monetária dos débitos judiciais da Fazenda Pública, mesmo no período da dívida anterior à expedição do precatório. O entendimento acompanha o já definido pelo STF quanto à correção no período posterior à expedição do precatório. Em seu lugar, o índice de correção monetária adotado foi o Índice de Preços ao Consumidor Amplo Especial (IPCA-E), considerado mais adequado para recompor a perda de poder de compra.
Quanto aos juros de mora incidentes sobre esses débitos, o julgamento manteve o uso do índice de remuneração da poupança, previsto na legislação questionada, apenas para débitos de natureza não tributária. Na hipótese de causas de natureza tributária, restou definido que deverá ser usado o mesmo índice adotado pelo Fisco para corrigir os débitos dos contribuintes, a fim de se preservar o princípio da isonomia, que atualmente é a taxa Selic.
Da referida decisão foram opostos embargos de declaração, sendo que em decisão monocrática publicada em 25.09.2018, da lavra do Ministro Luiz Fux, relator do RE n. 870.947, representativo do tema 810 da repercussão geral, havia sido conferido efeito suspensivo aos embargos de declaração opostos ao decisum, sobrestando a sua imediata aplicabilidade até a respectiva modulação dos efeitos.
Em 03/10/2019 o STF, "por maioria, rejeitou todos os embargos de declaração e não modulou os efeitos da decisão anteriormente proferida, nos termos do voto do Ministro Alexandre de Moraes, Redator para o acórdão, vencidos os Ministros Luiz Fux (Relator), Roberto Barroso, Gilmar Mendes e Dias Toffoli (Presidente)."
Assim, o índice de correção monetária a ser utilizado é o Índice de Preços ao Consumidor Amplo Especial (IPCA-E), e os juros de mora incidentes devem ser calculados com base no índice de remuneração da poupança, na forma do art. 1º-F da Lei nº 9.494/97 com a redação dada pela Lei nº 11.960/09."
Evidencia-se, portanto, que a decisão analisou os pedidos, sem incorrer em omissão, contradição, obscuridade ou erro material.
Do exposto, REJEITO os presentes embargos declaratórios, mantendo-se intacta a decisão proferida no evento 80.
Publique-se. Registre-se.
Renove-se a intimação das partes, marco a partir do qual reiniciará, por inteiro, o prazo recursal.
O autor apela (evento 84) requerendo a reforma da sentença no tocante ao reconhecimento da atividade rural também no período de 31/10/1988 a 05/11/1989.
Com contrarrazões (evento 73), vieram os autos para julgamento.
É o relatório.
VOTO
Da atividade rural
O aproveitamento do tempo de atividade rural exercido até 31 de outubro de 1991, independentemente do recolhimento das respectivas contribuições previdenciárias e exceto para efeito de carência, está expressamente autorizado e previsto pelo art. 55, § 2º, da Lei n.º 8.213/91, e pelo art. 127, inc. V, do Decreto n.º 3.048/99.
Acresce-se que o cômputo do tempo de serviço rural exercido no período anterior à Lei n.º 8.213/91, em regime de economia familiar e sem o recolhimento das contribuições, aproveita tanto ao arrimo de família quanto aos demais membros do grupo familiar que com ele laboram, porquanto a todos estes integrantes foi estendida a condição de segurado, nos termos do art. 11, inc. VII, da lei previdenciária (STJ, REsp 506.959/RS, 5ª Turma, Rel. Min. Laurita Vaz, DJU de 10/11/2003).
O tempo de serviço rural deve ser demonstrado mediante início de prova material contemporâneo ao período a ser comprovado, complementado por prova testemunhal idônea, não sendo esta admitida exclusivamente, em princípio, a teor do art. 55, § 3º, da Lei n. 8.213/91, e Súmula 149 do STJ.
Os documentos apresentados em nome de terceiros, sobretudo quando integrantes do mesmo núcleo familiar, consubstanciam início de prova material do labor rural, consoante inclusive consagrado na Súmula 73 do Tribunal Regional Federal da 4ª Região.
Cumpre salientar que, para caracterizar o início de prova material, não é necessário que os documentos apresentados comprovem, ano a ano, o exercício da atividade rural, seja porque se deve presumir a continuidade nos períodos imediatamente próximos, sobretudo no período anterior à comprovação, à medida que a realidade em nosso país é a migração do meio rural ao urbano, e não o inverso, seja porque é inerente à informalidade do trabalho campesino a escassez documental. O início de prova material deve viabilizar, em conjunto com a prova oral, um juízo de valor seguro acerca da situação fática.
De outra parte, afigura-se possível o reconhecimento de atividade rural para fins previdenciários no período dos 12 a 14 anos de idade. A jurisprudência deste Tribunal, do Superior Tribunal de Justiça e do Supremo Tribunal Federal é pacífica nesse sentido (TRF4ªR - 3ª Seção, EI 2001.04.01.025230-0/RS, Rel. Juiz Federal Ricardo Teixeira do Valle Pereira, j. 12/03/2003; STJ - AgRg no RESP 419601/SC, 6ª T, Rel. Min. Paulo Medina, DJ 18/04/2005, p. 399 e RESP 541103/RS, 5ª T, Rel. Min. Jorge Scartezzini, DJ 01/07/2004, p. 260; STF - AI 529694/RS, Rel. Min. Gilmar Mendes, 2ª T, j. em 15.02.2005).
As certidões da vida civil são hábeis a constituir início probatório da atividade rural da parte autora, nos termos na jurisprudência pacífica do Superior Tribunal de Justiça (REsp n.º 980.065/SP, Quinta Turma, Rel. Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, j. em 20-11-2007, DJU, Seção 1, de 17-12-2007, p. 340, e REsp n.º 637.437/PB, Relatora Ministra Laurita Vaz, Quinta Turma, j. em 17-08-2004, DJU, Seção 1, de 13-09-2004, p. 287, REsp n.º 1.321.493-PR, Primeira Seção, Relator Ministro Herman Benjamim, DJe em 19-12-2012, submetido à sistemática dos recursos repetitivos.).
Enfatize-se que 'a descontinuidade da prova documental não impede o reconhecimento de todo o período de tempo de serviço rural postulado, uma vez que a declaração do tempo de serviço rural envolve, mais do que o reconhecimento do exercício de atividade agrícola, o reconhecimento da condição de lavrador, na qual está intrínseca a idéia de continuidade e não de eventualidade. Não há necessidade de comprovação do trabalho rural mês a mês, ano a ano, bastando que o conjunto probatório permita ao Julgador, formar convicção acerca da efetiva prestação laboral rurícola. A Jurisprudência tem entendido que a qualificação de agricultor em atos do registro civil constitui início razoável de prova material para fins de comprovação da atividade rural' (in TRF 4ª Região, AC 96.04.58708-0/RS, 6ª Turma, Rel. Dês. Fed. Luiz Carlos de Castro Lugon, DJ 24/05/2000).
Ademais, acaso demonstrado que o pai ou mãe da parte autora possuiu um vínculo urbano, ainda que tal emprego tenha sido negado pelo autor e por suas testemunhas, faz-se imperioso analisar se o sustento do demandante já era extraído primordialmente da lavoura enquanto ele ainda residia com seus genitores, ou, caso contrário, se a subsistência do grupo familiar era garantida majoritariamente pelo(s) salário(s) do(s) integrante(s) do grupo familiar que mantinha(m) emprego(s) urbano(s):
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA RURAL POR IDADE. REQUISITOS. CARÊNCIA. COMERCIALIZAÇÃO. CÔNJUGE. APOSENTADORIA. SUBSISTÊNCIA DA FAMÍLIA. 1. Para fins de concessão da aposentadoria rural em regime especial de economia familiar, deve ser comprovada atividade rural no período equivalente à carência imediatamente anterior à data de implementação da idade ou à DER, ainda que de forma descontínua. 2. Também é necessário demonstrar que a produção agrícola se mostra indispensável à subsistência da família, gerando algum excedente apto à regular comercialização e consequente apoio financeiro ao grupo familiar. 3. Por si só, o mero fato da existência de renda própria por parte de algum integrante da família não tem o condão de descaracterizar, quanto aos demais, a condição de rurícola em regime de economia familiar, desde que a renda auferida não se mostre bastante à subsistência da família. 4. A suficiência da renda adicional deve ser verificada caso a caso, conforme a prova dos autos. 5. Divergência não demonstrada. 6. Recurso não conhecido. (5004366-05.2011.404.7003, Turma Regional de Uniformização da 4ª Região, Relator p/ Acórdão Giovani Bigolin, juntado aos autos em 29/04/2015) (grifou-se)
Outrossim, a jurisprudência deste Regional já afirmou que o afastamento das atividades agrícolas - sempre por um curto período de tempo -não descaracteriza a condição de trabalhador rural. Nesse sentido e "mutatis mutandis":
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. REEXAME DE RECURSO. ART. 543-C, § 7º, II, DO CPC. TRABALHO URBANO DE INTEGRANTE DO GRUPO FAMILIAR. POSSIBILIDADE DA EXTENSÃO DA PROVA EM NOME DO CÔNJUGE DESDE QUE CONTEMPORÂNEA AO PERÍODO DE CARÊNCIA. 1. In casu, a matéria controvertida diz respeito à impossibilidade da extensão da prova material da atividade rural de um membro do núcleo familiar a outro, quando o titular dos documentos passa a exercer atividade incompatível com a rural, como o trabalho urbano. 2. No julgamento do Recurso Especial representativo de controvérsia (REsp n. 1.304.479-SP), o STJ entendeu restar prejudicada a extensão da prova material de um integrante do grupo familiar a outro, quando o titular passa a desempenhar atividade incompatível com a rural. Todavia, o recurso não foi provido, porquanto, na hipótese, verificou-se que a recorrida havia juntado documentos em nome próprio, atendendo à exigência de início de prova material. 3. No caso concreto, todavia, verifico que o esposo da embargada esteve afastado das atividades agrícolas por um curto período de tempo (aproximadamente 08 meses), não descaracterizando, portanto, este período a sua condição de trabalhador rural. Por esse motivo, entendo que a documentação em nome do cônjuge da embargada, com anotação de sua profissão como lavrador, pode ser estendida à mesma para fins de comprovação da atividade rural no período de carência. 4. Mantida a decisão da Turma, que, por unanimidade, negou provimento aos embargos infringentes interpostos pelo INSS, determinando o retorno dos autos à Vice-Presidência desta Corte para exame de admissibilidade do recurso especial, nos termos do § 8º do art. 543-C do Código de Processo Civil. (TRF4, APELAÇÃO CÍVEL Nº 0001072-92.2013.404.9999, 3ª SEÇÃO, Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA, POR UNANIMIDADE, D.E. 04/05/2015, PUBLICAÇÃO EM 05/05/2015) -grifei.
Por fim, cabe registrar que de acordo com a jurisprudência do STJ, o exercício de atividade urbana pelo rurícola não afasta, por si só, sua condição de segurado especial, só não se considerando segurado especial quando ficar demonstrado que o trabalho urbano constitui a principal atividade laborativa do requerente e/ou sua principal fonte de renda. (REsp 1483172/CE, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 23/10/2014, DJe 27/11/2014). Ademais, o exercício da atividade rural pode ser descontínuo (AgRg no AREsp 327.119/PB, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 02/06/2015, DJe 18/06/2015).
Período de 07/03/1976 a 05/11/1989
Colhe-se da sentença:
Feitas tais considerações e voltando-me ao caso em apreço, infiro que o requerente busca o reconhecimento do período de 07/03/1976 a 05/11/1989, em que desenvolveu a atividade rural, com esteio nas seguintes provas documentais:
- Certidão de transcrição de imóvel comprovando que seu pai adquiriu imóvel rural m 08/09/1959;
- Certidão de nascimento do autor, nascido em 07/03/1964 e em que há informação de que os genitores eram agricultores;
- Certidões de nascimento dos irmãos do autor, nascidos em 06/05/1965, 05/10/1968 e 24/09/1971, e em todas consta a informação de que os genitores eram agricultores;
- Registro de associado do genitor do requerente junto a Cooperativa Alfa, com data de admissão em 10/12/1968 e demissão em 16/01/1995;
- Certidões da Justiça Eleitoral em que o autor e seu irmão estão qualificados como agricultores, referente ao ano de 1986.
Além disso, a fim de complementar o início de prova material apresentado, o autor requereu o aproveitamento dos depoimentos prestados na esfera administrativa, e que estão colacionados nos autos no evento 1, anexo 6, fls. 51-55.
Nesse cenário, pela verificação da prova documental (material) e testemunhal, tenho que a pretensão do autor merece prosperar parcialmente.
Isso porque, as provas colacionadas aos autos demonstram que o autor viveu no meio rural desde a infância, na localidade em que a família possuía área de terras e desenvolvia a atividade agrícola em regime de economia familiar como fonte de renda exclusiva. As testemunhas ouvidas afirmaram de forma uníssona que a família do autor vivia exclusivamente da agricultura, inexistindo qualquer elemento nos autos capaz de derruir tal informação.
Saliento que versando o presente feito sobre atividade rurícola, é indispensável que o julgador seja sensível à realidade na qual estava inserido o trabalhador rural, onde a informalidade na comprovação dos fatos é predominante, casos em que a exigência de prova material deve ser abrandada. É precedente do Tribunal Regional Federal da 4ª Região:
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA RURAL POR IDADE. BOIA-FRIA. REQUISITOS LEGAIS. INÍCIO DE PROVA MATERIAL. COMPLEMENTAÇÃO POR PROVA TESTEMUNHAL. CONSECTÁRIOS LEGAIS. (STF, RE 870.947 / STJ, RESP 1.492.221). TUTELA ESPECÍFICA. 1. O trabalhador rural que implemente a idade mínima (sessenta anos para o homem e de cinquenta e cinco anos para a mulher) e comprove o exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, por tempo igual ao número de meses correspondentes à carência exigida para o benefício, faz jus à concessão do benefício da aposentadoria rural por idade (artigos 11, VII, 48, § 1º, e 142, da Lei n. 8.213/91). 2. Considera-se demonstrado o exercício de atividade rural havendo início de prova material complementada por prova testemunhal idônea, sendo dispensável o recolhimento de contribuições para fins de concessão do benefício. 3. A exigência de início de prova material deve ser abrandada, tendo em vista a informalidade da atividade exercida pelos trabalhadores rurais. Assim, é prescindível que a comprovação documental seja contemporânea aos anos integrantes do período de carência, desde que complementada por prova testemunhal idônea. 4. Critérios de correção monetária e juros de mora consoante precedentes dos Tribunais Superiores (STF, RE 870.947 e STJ REsp 1.492.221). 5. Determinada a imediata implantação do benefício, valendo-se da tutela específica da obrigação de fazer prevista no artigo 461 do CPC (1973), bem como nos artigos 497, 536 e parágrafos e 537, do CPC (2015), independentemente de requerimento expresso por parte do segurado ou beneficiário. (TRF4 5037851-53.2016.4.04.9999, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DO PR, Relator OSCAR VALENTE CARDOSO, juntado aos autos em 21/06/2018)
No entanto, temos que resta comprovado o exercício de atividade rural, em regime de economia familiar, até ao casamento do autor, já que as testemunhas declararam que após o casamento o autor passou a desenvolver a atividade urbana.
Assim, reconheço o período de 07/03/1976 a 30/10/1988 como laborados na agricultura, em regime de economia familiar, o que perfaz o tempo rural de 12 anos e 07 meses e 24 dias, o que deverá ser averbado pela autarquia ré.
Dentre os documentos juntados pelo autor, destacam-se aqueles que são contemporâneos ao período pleiteado: registro de associado do genitor do requerente junto a Cooperativa Alfa, com data de admissão em 10/12/1968 e demissão em 16/01/1995 (evento 1, PROCADM6, fl. 42) e certidões da Justiça Eleitoral em que o autor e seu irmão estão qualificados como agricultores, referente ao ano de 1986 (evento 1, PROCADM6, fls. 47-48).
Há, portanto, obediência ao que prescreve a Lei de Benefícios.
Alega o autor que mesmo após o casamento continuou morando com os pais e trabalhando na agricultura, em regime de economia familiar.
Retiram-se os seguintes trechos da prova testemunhal (evento 1, PROCADM6, fls. 51-55):
Luiz Graciano Bordigon afirma que o requerente trabalhava na agricultura até o casamento em 1988/1989; que viu o requerente capinando, lavrando e plantando; que até o casamento não houve afastamentos.
Sergio Antonio Forlin afirma que o requerente trabalhava na agricultura até o casamento em 1987/1988; que viu o requerente capinando, lavrando e plantando; que até 1987/1988 não houve afastamentos.
Dinarte Dorival Bee afirma que o requerente trabalhou na agricultura até 1989; que na época o requerente casou, porém não se recorda o nome da esposa; que viu o requerente capinando, lavrando e plantando. Que até 1989 não houve afastamentos.
Ora, não merece prosperar o pedido do autor para o reconhecimento do labor rural até 05/11/1989, pois as testemunhas confirmam o labor rural até seu casamento, não havendo convicção de que este tenha se estendido para momento posterior.
Ainda que não haja consonância entre os depoentes quanto ao ano de realização do casamento, é perceptível que eles têm esse evento como um marco limitador.
Desse modo, a sentença que reconheceu o período de 07/03/1976 a 30/10/1988 como de trabalho rural em regime de economia familiar deve ser mantida.
Contagem do tempo e concessão do benefício.
Extrai-se da sentença:
3. Da aposentadoria por tempo de contribuição
Considerando o tempo rural e a especialidade das atividades reconhecidas e tendo em vista que o requerimento administrativo do benefício foi protocolado em 03/03/2016, resta analisar o preenchimento dos requisitos para a concessão da aposentadoria pleiteada frente às regras dispostas pela Emenda Constitucional n. 20, em vigor desde 16/12/1998.
A aposentadoria por tempo de serviço, que já existia sob a égide da Lei n. 3.807/60, foi mantida pela Lei n. 8.213/91, até o advento da Emenda Constitucional n. 20/98, que a substituiu pela aposentadoria por tempo de contribuição. Diante dessa mudança, o tempo de serviço realizado até 16/12/1998 foi transformado em tempo de contribuição, para fins de concessão da aposentadoria por tempo de contribuição.
Um segurado pode, em tese, preencher, no máximo até 16/12/98, todos os requisitos necessários para obter sua aposentadoria por tempo de serviço, proporcional ou integral. Preenchendo-os ou não, ele pode também vir a preencher todos os requisitos necessários para obter sua aposentadoria por tempo de contribuição, proporcional ou integral.
Em preenchendo todos os requisitos necessários para obter, em momentos diversos, mais de uma modalidade de aposentadoria, por tempo de serviço ou de contribuição, proporcional ou integral, uma excludente da outra, o segurado terá direito à implantação da aposentadoria que lhe for mais vantajosa.
Com vistas à aferição do direito do segurado à aposentadoria por tempo de serviço ou de contribuição, deve ser verificado se ele preenche os requisitos necessários para tanto, em determinadas datas-base.
As datas-base a serem consideradas são as seguintes: a) a data do requerimento administrativo do benefício, em todos os casos; b) o dia 16/12/1998, se o requerimento administrativo for posterior a essa data; c) o dia 28/11/1999, se o requerimento administrativo for posterior a essa data.
As razões da escolha dessas datas-base são as seguintes: a) a data do requerimento administrativo do benefício constitui, em qualquer caso, a última data-base que pode ser considerada; b) como a aposentadoria por tempo de serviço só existiu até 16/12/1998, esta data constituirá a primeira data-base a ser considerada, caso o requerimento administrativo seja posterior a ela; c) como, após 28/11/1999, entrou em vigor a Lei n. 9.876/99, que criou o fator previdenciário e alterou as regras atinentes aos salários-de-contribuição a serem considerados no cálculo do salário-de-benefício, a referida data-base também deverá ser considerada, caso o protocolo do requerimento administrativo seja posterior a ela.
No tocante à soma, verifica-se que o autor computa:
Até 16/12/1998: 22 anos e 03 meses e 18 dias;
Até 28/11/1999: 23 anos e 07 meses e 18 dias;
Até 03/03/2016: 36 anos e 08 meses e 22 dias.
Logo, merece acolhimento o pleito autoral.
4. Da aposentadoria por pontos
Considerando que o requerimento administrativo foi realizado em 03/03/2016, necessário analisar se a parte autora preenche os requisitos para concessão da aposentadoria por Tempo de Contribuição sem a incidência do fator previdenciário, modalidade instituída pela Medida Provisória 676/2015, publicada em 17/07/2015, posteriormente convertida na Lei n. 123.183/2015, que acrescentou o art. 29-C à Lei n. 8.213/91.
Também conhecida como aposentadoria por pontos, ou fórmula 85/95, o novo dispositivo passou a prever a possibilidade de concessão da Aposentadoria por Tempo de Contribuição sem a incidência do fator previdenciário quando o somatório da idade do segurado com seu tempo de contribuição atingir o total de 85 pontos, em se tratando de seguradas do sexo feminino e 95 pontos para o caso de segurados do sexo masculino.
No caso dos autos verifico que, na DER, o autor possuía 51 anos, 11 meses e 23 dias de idade, o que somado ao tempo de contribuição total de 36 anos, 08 meses e 22 dias, totaliza 88 anos, 08 meses e 15 dias, não possuindo ou total exigido para aplicação do previsto no art. 29-C da Lei n. 8.213/91.
Dessa forma, não tendo havido alteração no período rural reconhecido na sentença, faz jus o autor à aposentadoria por tempo de contribuição, a contar da DER (03/03/2016), observada a prescrição quinquenal, estando prescritas as prestações correspondentes ao lustro que antecedeu o ajuizamento desta demanda, aforada em 24/04/2019.
Consectários
A atualização monetária (que fluirá desde a data de vencimento de cada prestação) e os juros de mora (que fluirão desde a data da citação) seguirão:
a) até 08/12/2021, os parâmetros estabelecidos pelo Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do tema repetitivo nº 905, para as condenações judiciais de natureza previdenciária, os quais estão assim enunciados na tese então firmada:
3. Índices aplicáveis a depender da natureza da condenação.
(...)
3.2 Condenações judiciais de natureza previdenciária.
As condenações impostas à Fazenda Pública de natureza previdenciária sujeitam-se à incidência do INPC, para fins de correção monetária, no que se refere ao período posterior à vigência da Lei 11.430/2006, que incluiu o art. 41-A na Lei 8.213/91. Quanto aos juros de mora, incidem segundo a remuneração oficial da caderneta de poupança (art. 1º-F da Lei 9.494/97, com redação dada pela Lei n. 11.960/2009).
b) a partir de 09/12/2021, para fins de atualização monetária, de remuneração do capital e de compensação da mora, o índice da taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e Custódia (Selic), acumulado mensalmente (artigo 3º da Emenda Constitucional nº 113/2021, publicada em 09/12/2021, que entrou em vigor na data de sua publicação).
De tal sorte, quanto ao período a partir de 09/12/2021, ajusto a sentença aos parâmetros fixados no artigo 3º da EC nº 113/2021.
Tutela específica
A 3ª Seção deste Tribunal firmou o entendimento no sentido de que, esgotadas as instâncias ordinárias, faz-se possível determinar o cumprimento da parcela do julgado relativa à obrigação de fazer, que consiste na implantação do benefício concedido ou restabelecido, para tal fim não havendo necessidade de requerimento do segurado ou dependente ao qual a medida aproveita (TRF4, 3ª Seção, Questão de Ordem na AC n. 2002.71.00.050349-7/RS, Relator para o acórdão Desembargador Federal Celso Kipper, julgado em 09-08-2007).
Louvando-me no referido precedente e nas disposições do artigo 497 do CPC, determino a implantação do benefício, no prazo de 45 (quarenta e cinco) dias.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação, ajustar o fator de atualização monetária e determinar a implantação do benefício.
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Apelação Cível Nº 5005509-76.2022.4.04.9999/SC
PROCESSO ORIGINÁRIO: Nº 5000031-63.2019.8.24.0053/SC
RELATOR: Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ
APELANTE: NELSO LUIZ BARP
ADVOGADO: ELOA FATIMA DANELUZ (OAB SC008495)
ADVOGADO: DELAZIR MEIRA SAGAS BAZZI (OAB SC042276)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. TEMPO DE SERVIÇO RURAL. PROVA MATERIAL. PROVA TESTEMUNHAL. PEDIDO NÃO CONCEDIDO. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA.
1. A comprovação do exercício de atividade rural deve-se realizar na forma do artigo 55, § 3º, da Lei 8.213/91, mediante início de prova material complementado por prova testemunhal idônea.
2. No caso dos autos, as testemunhas afirmam que o autor laborou na agricultura até o casamento. Dessa forma, não merece prosperar o pedido do autor para o reconhecimento do labor rural até 05/11/1989.
3. Comprovado o labor rural em regime de economia familiar, mediante a produção de início de prova material, o segurado faz jus ao cômputo do respectivo tempo de serviço e a concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, porquanto preenchidos os demais requisitos.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 9ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, negar provimento à apelação, ajustar o fator de atualização monetária e determinar a implantação do benefício, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Florianópolis, 31 de agosto de 2022.
Documento eletrônico assinado por SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40003428476v7 e do código CRC f5a52f02.Informações adicionais da assinatura:
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO TELEPRESENCIAL DE 31/08/2022
Apelação Cível Nº 5005509-76.2022.4.04.9999/SC
RELATOR: Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ
PRESIDENTE: Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ
PROCURADOR(A): WALDIR ALVES
APELANTE: NELSO LUIZ BARP
ADVOGADO: ELOA FATIMA DANELUZ (OAB SC008495)
ADVOGADO: DELAZIR MEIRA SAGAS BAZZI (OAB SC042276)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Telepresencial do dia 31/08/2022, na sequência 139, disponibilizada no DE de 09/08/2022.
Certifico que a 9ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 9ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO, AJUSTAR O FATOR DE ATUALIZAÇÃO MONETÁRIA E DETERMINAR A IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ
Votante: Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ
Votante: Juiz Federal JAIRO GILBERTO SCHAFER
Votante: Desembargador Federal CELSO KIPPER
ALEXSANDRA FERNANDES DE MACEDO
Secretária
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