APELAÇÃO CÍVEL/REEXAME NECESSÁRIO Nº 5026695-05.2015.4.04.9999/PR
RELATOR | : | PAULO AFONSO BRUM VAZ |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | MARIA ALZIRA DOS SANTOS MIRANDA |
ADVOGADO | : | GEONIR EDVARD FONSECA VINCENSI |
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA RURAL POR IDADE. TRABALHADOR RURAL. REQUISITOS LEGAIS. COMPROVAÇÃO. INÍCIO DE PROVA MATERIAL, COMPLEMENTADA POR PROVA TESTEMUNHAL.
1. É devido o benefício de aposentadoria rural por idade, nos termos dos artigos 11, VII, 48, § 1º e 142, da Lei nº 8.213/1991, independentemente do recolhimento de contribuições quando comprovado o implemento da idade mínima (sessenta anos para o homem e cinquenta e cinco anos para a mulher) e o exercício de atividade rural por tempo igual ao número de meses correspondentes à carência exigida, mediante início de prova material complementada por prova testemunhal idônea.
2. Hipótese em que a parte autora preencheu os requisitos necessários à concessão do benefício.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 5a. Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, negar provimento ao apelo do INSS e não conhecer da remessa oficial, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 05 de julho de 2016.
Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
Relator
Documento eletrônico assinado por Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8364208v2 e, se solicitado, do código CRC 3C78A7ED. | |
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APELAÇÃO CÍVEL/REEXAME NECESSÁRIO Nº 5026695-05.2015.4.04.9999/PR
RELATOR | : | PAULO AFONSO BRUM VAZ |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | MARIA ALZIRA DOS SANTOS MIRANDA |
ADVOGADO | : | GEONIR EDVARD FONSECA VINCENSI |
RELATÓRIO
Cuida-se de apelação interposta pelo INSS em face da sentença que julgou procedente o pedido de concessão de aposentadoria por idade rural.
Sustenta, em síntese, que a parte autora não preenche os requisitos necessários à prestação previdenciária.
Com as contrarrazões, e por força do reexame necessário, subiram os autos a esta Corte para julgamento.
É o relatório.
VOTO
Trata-se de demanda previdenciária objetivando a concessão de APOSENTADORIA POR IDADE RURAL, prevista no artigo 48, § 1º e seguintes, da Lei 8.213/91.
Reexame necessário
Não se desconhece o entendimento do Superior Tribunal de Justiça no sentido de que a sentença ilíquida está sujeita a reexame necessário (Súmula 490).
Contudo, tratando-se de remessa necessária de sentença que concedeu benefício previdenciário a segurado especial, o qual, como é cediço, corresponde ao valor de um salário mínimo, e a apenas 14 prestações mensais, devidas entre 03/02/2014 (DER/DCB) e a data da publicação da sentença (30/04/2015), é certo que a condenação, ainda que acrescida de correção monetária e juros, jamais excederá 60 (sessenta) salários-mínimos, montante exigível para a admissibilidade do § 2° do art. 475 do CPC.
Logo, a sentença prescinde de liquidação e não deve ser submetida ao reexame necessário, nos termos do disposto no art. 475, § 2º, do Código de Processo Civil, o qual é aplicável ao caso em tela porquanto a r. sentença foi proferida antes de 18/03/2016 (data da vigência do NCPC definida pelo Pleno do STJ em 02/04/2016), conforme prevê expressamente o artigo 14 do NCPC [A norma processual não retroagirá e será aplicável imediatamente aos processos em curso, respeitados os atos processuais praticados e as situações jurídicas consolidadas sob a vigência da norma revogada].
Portanto, não conheço da remessa oficial.
Premissas
Quanto ao reconhecimento do tempo de serviço rural, as premissas são as seguintes:
a) a possibilidade de extensão da prova material para período anterior ao documento mais antigo (REsp 1.348.633, Rel. Min. Arnaldo Esteves, j. 28/08/2013);
b) A presunção de continuidade do tempo de serviço rural no período compreendido entre os documentos indicativos do trabalho rural. Neste sentido, Moacyr Amaral Santos faz referência à teoria de Fitting, segundo a qual presume-se a permanência de um estado preexistente, se não for alegada a sua alteração, ou, se alegada, não tiver sido feita a devida prova desta. Amaral Santos, citando Soares de Faria na síntese dos resultados obtidos por Fitting, pontifica que "só a afirmação de uma mudança de um estado anterior necessita de prova, que não a permanência do mesmo: affirmanti non neganti incumbit probatio" (SANTOS, Moacyr Amaral. Prova Judiciária no Cível e Comercial. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 1983. v. 1, p. 102);
c) A ampliação da abrangência do início de prova material pertinente ao período de carência a períodos anteriores ou posteriores à sua datação, desde que complementado por robusta prova testemunhal, uma vez que "não há exigência de que o início de prova material se refira a todo o período de carência, para fins de aposentadoria por idade do trabalhador rural" (AgRg no AREsp 194.962/MT), bem como que "basta o início de prova material ser contemporâneo aos fatos alegados e referir-se, pelo menos, a uma fração daquele período, corroborado com prova testemunhal, a qual amplie sua eficácia probatória" (AgRg no AREsp 286.515/MG), entendimentos esses citados com destaque no voto condutor do acórdão do REsp nº 1349633 - representativo de controvérsia que consagrou a possibilidade da retroação dos efeitos do documento tomado como início de prova material, desde que embasado em prova testemunhal. Vide recentes julgados da Terceira Seção do STJ: AR 4.507/SP, AR 3.567/SP, EREsp 1171565/SP, AR 3.990/SP e AR 4.094/SP;
d) a inviabilidade de comprovação do labor rural através de prova exclusivamente testemunhal (REsp 1133863/RN, Rel. Ministro CELSO LIMONGI, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 13/12/2010, DJe 15/04/2011);
e) segundo a jurisprudência da 3ª Seção deste Regional, a utilização de maquinário e eventual de diaristas não afasta, por si só, a qualidade de segurado especial porquanto ausente qualquer exigência legal no sentido de que o trabalhador rural exerça a atividade agrícola manualmente. (TRF4, EINF 5023877-32.2010.404.7000, Terceira Seção, Relator p/ Acórdão Rogerio Favreto, juntado aos autos em 18/08/2015);
f) a admissão, como início de prova material e nos termos da Súmula 73 deste Tribunal, de documentos de terceiros, membros do grupo parental;
g) o fato de que o tamanho da propriedade rural não é, sozinho, elemento que possa descaracterizar o regime de economia familiar desde que preenchidos os demais requisitos (REsp 1403506/MG, Rel. Ministra ELIANA CALMON, SEGUNDA TURMA, julgado em 03/12/2013, DJe 16/12/2013);
h) segundo a Lei nº 12.873/2013, que alterou, entre outros, o art. 11 da LB, "o grupo familiar poderá utilizar-se de empregados contratados por prazo determinado ou de trabalhador de que trata a alínea g do inciso V do caput, à razão de no máximo 120 (cento e vinte) pessoas por dia no ano civil, em períodos corridos ou intercalados ou, ainda, por tempo equivalente em horas de trabalho, não sendo computado nesse prazo o período de afastamento em decorrência da percepção de auxílio-doença". Deixou-se de exigir, assim, que a contratação ocorresse apenas em épocas de safra (ROCHA, Daniel Machado da; BALTAZAR JR., José Paulo. Comentários à Lei de Benefícios da Previdência Social. São Paulo: Altas, 2015, p. 63);
i) de acordo com a jurisprudência do STJ, o exercício de atividade urbana pelo rurícola não afasta, por si só, sua condição de segurado especial. No entanto, não se considera segurado especial quando ficar demonstrado que o trabalho urbano constitui a principal atividade laborativa do requerente e/ou sua principal fonte de renda. (REsp 1483172/CE, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 23/10/2014, DJe 27/11/2014);
j) o exercício da atividade rural pode ser descontínuo (AgRg no AREsp 327.119/PB, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 02/06/2015, DJe 18/06/2015);
l) no que tange ao trabalho do boia-fria, o STJ, por meio, entre outros, do REsp 1.321.493, Rel. Min. Herman Benjamin, abrandou as exigências quanto ao início de prova material da atividade rural, desde que complementada através de idônea prova testemunhal;
m) o segurado especial tem de estar trabalhando no campo quando completar a idade mínima para obter a aposentadoria rural por idade, momento em que poderá requerer seu benefício, ressalvada a hipótese do direito adquirido, em que o segurado especial, embora não tenha requerido sua aposentadoria por idade rural, já preencheu de forma concomitante, no passado, ambos os requisitos - carência e idade. (STJ, REsp 1354908, 1ª Seção, Tema 642/recurso repetitivo).
Exame da aposentadoria rural no caso concreto:
No caso em tela, a parte autora atingiu o requisito etário em 21/09/2012 e formulou o requerimento de aposentadoria por idade rural em 03/02/2014. Assim, deve comprovar o efetivo exercício de atividade rural nos 180 meses imediatamente anteriores ao implemento da idade mínima (de 21/09/1997 a 21/09/2012) ou à entrada do requerimento administrativo (de 03/02/1999 a 03/02/2014) ou, ainda, em períodos intermediários, mesmo que de forma descontínua.
Como forma de comprovar o trabalho rural, a título de início de prova material foram apresentados inúmeros documentos, dentre os quais se destacam os seguintes:
a) Histórico escolar de filho da autora em escola rural da Prefeitura Municipal de Barracão/PR, constando registro do ano de 1995 (evento 1 - OUT6);
b) Contratos de permissão de uso e de posterior aquisição, nos anos de 2000 e 2006, pela autora e seu marido, de pequeno lote de terras junto à COHAPAR, em Clevelândia/PR (evento 1 - OUT7 a OUT9);
c) Inscrição do marido da autora no Cadastro de Produtor Rural do Estado do Paraná, no ano de 2010 (evento 1 - OUT11);
d) Notas de produtor e notas fiscais de compra do produto por estabelecimentos comerciais, em nome da autora e de seu marido, nas quais consta a comercialização de produtos agrícolas entre os anos de 2006 e 2014 (evento1 - OUT12 a OUT15);
e) Certidão de casamento da autora (evento 1 - OUT5), datado de 02/02/1980, na qual consta a profissão do marido da autora como sendo a de agricultor;
f) Registros do CNIS nos quais consta que, entre 1996 e 2006, o marido da autora trabalhou na Granja Paumar Ltda., como empregado (evento 16 - OUT5);
g) Informações de benefícios concedidos ao marido da autora (INFBEN), nas quais consta que entre 2000 e 2006 seu ramo de atividade seria o de "comerciário" (evento 16 - OUT7).
Para comprovar o labor rurícola, foram ouvidas três testemunhas (mídia no evento 73), todas informando que sabem que a autora trabalha há pelo menos quinze ou vinte anos na agricultura, inicialmente como diarista rural, na Granja Paumar, e que, há mais de dez anos, adquiriu uma pequena quantidade de terras na Vila Rural e passou a trabalhar predominantemente por conta própria, com culturas de subsistência, em regime de economia familiar (com seu marido), como segurada especial, sem utilização de maquinários ou empregados, vendendo o excedente da produção. Os testemunhos esclareceram muito satisfatoriamente que o marido da autora, antes de trabalhar em seu sítio, vinha laborando como empregado na Granja Paumar, em atividades estritamente agrícolas.
Constata-se claramente um equívoco no registro de informações de benefício pelo INSS, que cadastrou o marido da autora como comerciário na época em que este trabalhava na Granja Paumar Ltda. Pela própria natureza do estabelecimento (Granja), associada às referências testemunhais e à ausência de qualquer outra prova do INSS em sentido diverso, entende-se ter havido erro no lançamento da informação quanto à natureza do labor do marido da autora pela autarquia previdenciária.
Ademais, por força da retórica, consigno que os valores recebidos pelo marido da autora a título de remuneração ou auxílio-doença, entre 1999 e 2006, próximos ao salário mínimo, não tornariam menos importante o labor da autora como diarista rural ou como contribuinte individual, restando caracterizada a indispensabilidade de sua atividade agrícola.
Como se pode observar, o acervo probatório indica que a parte autora efetivamente exerceu atividade rural no período correspondente à carência, fazendo jus ao benefício desde a data do requerimento administrativo (03/02/2014).
Conclusão sobre o direito da parte autora à aposentadoria por idade rural
Dessarte, a parte autora faz jus ao benefício de aposentadoria por idade rural desde 03/02/2014 (data do requerimento), razão pela qual não há falar em prescrição quinquenal, haja vista que a presente demanda foi ajuizada em 08/07/2014, impondo-se a ratificação da sentença.
Prequestionamento
Para fins de possibilitar o acesso das partes às Instâncias Superiores, dou por prequestionadas as matérias constitucionais e legais alegadas em recurso, nos termos das razões de decidir já externadas no voto, deixando de aplicar dispositivos constitucionais ou legais não expressamente mencionados e/ou tidos como aptos a fundamentar pronunciamento judicial em sentido diverso do declinado.
Conclusão
Confirma-se a sentença no mérito; benefício já implantado na origem; recurso recebido apenas no efeito devolutivo; não conhecida a remessa oficial.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por negar provimento ao apelo do INSS e não conhecer da remessa oficial.
Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
Relator
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 05/07/2016
APELAÇÃO CÍVEL/REEXAME NECESSÁRIO Nº 5026695-05.2015.4.04.9999/PR
ORIGEM: PR 00011984720148160071
RELATOR | : | Des. Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ |
PRESIDENTE | : | Paulo Afonso Brum Vaz |
PROCURADOR | : | Dr. Carlos Eduardo Copetti Leite |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | MARIA ALZIRA DOS SANTOS MIRANDA |
ADVOGADO | : | GEONIR EDVARD FONSECA VINCENSI |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 05/07/2016, na seqüência 259, disponibilizada no DE de 14/06/2016, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 5ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU NEGAR PROVIMENTO AO APELO DO INSS E NÃO CONHECER DA REMESSA OFICIAL.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Des. Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ |
VOTANTE(S) | : | Des. Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ |
: | Des. Federal ROGERIO FAVRETO | |
: | Des. Federal ROGER RAUPP RIOS |
Lídice Peña Thomaz
Secretária de Turma
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