
Apelação Cível Nº 5019934-89.2019.4.04.7000/PR
RELATOR: Juiz Federal ARTUR CÉSAR DE SOUZA
APELANTE: VALNEI LUIZ DA SILVA ANDRADE (AUTOR)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
RELATÓRIO
Trata-se de ação de rito ordinário proposta contra o Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, na qual a parte autora objetiva a revisão de benefício previdenciário, para que sejam computados como especiais os períodos de 26/03/2009 a 10/03/2011 e de 01/06/2011 a 08/05/2017.
Em sentença de 17/10/2019, o processo foi julgado extinto sem resolução de mérito, sob o fundamento de ausência de interesse de agir.
Inconformada, a parte autora interpôs recurso de apelação, alegando, em síntese, a configuração do interesse de agir e, no mérito, a exposição a agentes nocivos à saúde.
Oportunizadas contrarrazões, os autos vieram a este Tribunal.
É o relatório.
VOTO
PRELIMINAR DE EXTINÇÃO DO PROCESSO SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO - FALTA DE INTERESSE DE AGIR
O juízo a quo extinguiu o processo sem resolução de mérito, nos termos do art. 485, IV, do CPC, por entender que não foi requerido administrativamente o reconhecimento da especialidade dos períodos de 26/03/2009 a 10/03/2011 e 01/06/2011 a 08/05/2017, configurando ausência de interesse de agir.
Da análise dos procedimentos administrativos colacionados aos autos (Evento 1, PROCADM22 e Evento 14, PROCADM1), constata-se, efetivamente, que, tanto no pedido de concessão de aposentadoria (DER 21/08/2015), quanto no pedido de revisão (DER 28/09/2018), os períodos de labor especial pleiteados nesta ação não foram objeto de pedido explícito pelo segurado.
A 3ª Seção desta Corte, por ocasião do julgamento dos Embargos Infringentes na Apelação Cível n° 1999.72.05.007962-3/SC, em 09/10/2002 (DJU de 26/02/2003), deixou assentada, no que tange aos pedidos de concessão de benefício previdenciário, a necessidade do prévio requerimento na esfera administrativa, consoante se verifica do voto condutor do acórdão e das notas taquigráficas respectivas, sob pena de se configurar a falta de interesse de agir da parte autora em postular a proteção jurisdicional nas hipóteses em que não há resistência da autarquia ré manifestada em contestação por meio do combate ao mérito da pretensão vestibular. Ficou definido, ainda, naquela oportunidade, que somente seria possível dispensar o prévio ingresso na via administrativa nas situações em que, sistematicamente, o INSS se nega a apreciar ou indefere de pronto a pretensão da parte, pois a recusa da Administração, em casos tais, seria evidente.
Nesse mesmo sentido de que com a apresentação de contestação de mérito está caracterizado o interesse de agir, posicionou-se o STF no julgamento do Tema 350 em sede de repercussão geral (RE 631.240/MG), bem como o STJ, posteriormente, em recurso especial repetitivo, Tema 660 (REsp 1369834/SP).
Considerada a necessidade de implementação do interesse de agir, a participação do segurado inicia-se na esfera administrativa, oportunidade que exerce os direitos subjetivos normativamente estabelecidos, reivindicando direitos ou denunciando abusos ou ilegalidades, garantindo-se, ainda, o pleno acesso ao Poder Judiciário no devido processo legal, com exercício do contraditório e da ampla defesa, possibilitando-lhe comprovar o alegado direito mediante a utilização dos meios de prova admitidos processualmente.
No caso, identifica-se que o INSS, nos momentos em que fora instado a manifestar-se (contestação), não fizera quaisquer manifestações sobre o mérito da controvérsia, limitado-se a defender a falta de interesse de agir, na medida em que ausente pretensão resistida (o segurado não postulou o reconhecimento dos períodos especiais nesta demanda pleiteados).
Em relação ao tempo especial referente ao período de 26/03/2009 a 10/03/2011, não há no procedimento administrativo, quaisquer referências, quaisquer evidências de que as atividades desenvolvidas no referido período estão relacionadas a possível exposição a agentes nocivos (apenas há menção na CTPS de que trabalhava como servente em empresa de limpeza), razão pela qual, ausente pedido na esfera administrativa, não há outra conclusão, no caso, senão reconhecer a falta de interesse de agir e a extinção do processo sem resolução do mérito, forte no art. 485, VI, CPC/2015.
Já em relação ao tempo especial referente ao período de 01/07/2012 a 08/05/2017, todavia, percebe-se que, consoante os documentos que instruíram o procedimento administrativo, cabia à autarquia ter exigido documentos relacionados à atividade especial no referido período, notadamente no caso, haja vista a indicação na CTPS (Evento 1, PROCADM22, p. 10), que as atividades desenvolvidas nos períodos estão relacionadas a possível exposição a agentes nocivos (coletor domiciliar em empresa de serviços de saneamento).
Consideradas as atividades exercidas nos períodos, aliada ao fato de não ter o patrocínio técnico de procurador habilitado quando da instauração do procedimento administrativo, há motivação suficiente a que a autarquia, assumindo conduta positiva, com aplicação, interesse, empenho e zelo, conduzisse o procedimento administrativo de modo a garantir a maior satisfação de direito possível à parte.
Portanto, a conclusão a que se chega é que se evidencia o descumprimento - por parte da autarquia - dos deveres decorrentes da boa-fé objetiva (dever de informação e orientação do segurado), que não apenas deixou de informar adequadamente o segurado, mas também não se atentou para verificar que se tratavam de atividades profissionais que, em tese, seria factível a exposição a agente nocivo.
O STF, ao julgar o referido Tema 350, fundamentou o decisum no sentido de que "o serviço social do INSS deve ´esclarecer junto aos beneficiários seus direitos sociais e os meios de exercê-los e estabelecer conjuntamente com eles o processo de solução dos problemas que emergirem da sua relação com a Previdência Social, tanto no âmbito interno da instituição como na dinâmica da sociedade´. Daí decorre a obrigação de a Previdência conceder a prestação mais vantajosa a que o beneficiário faça jus, como prevê o Enunciado nº 5 do Conselho de Recursos da Previdência Social ("A Previdência Social deve conceder o melhor benefício a que o segurado fizer jus, cabendo ao servidor orientá-lo nesse sentido").
Portanto, reconhecendo em parte a prejudicial de falta de interesse de agir, deve ser extinto o processo, sem resolução do mérito, em relação ao pedido de reconhecimento da especialidade do período de 26/03/2009 a 10/03/2011, na forma da fundamentação supra, razão pela qual nego provimento do recurso no ponto.
Com relação ao pedido de reconhecimento da especialidade do período de 01/06/2011 a 08/05/2017, deve ser reconhecido o interesse de agir, anulando-se a sentença, no ponto.
FALTA DE CONDIÇÕES DE ANÁLISE DO MÉRITO PELO TRIBUNAL E REABERTURA DA INSTRUÇÃO PROCESSUAL - CAUSA NÃO MADURA
Na forma de como prevê o disposto no art. 1.013, § 3º, I, do CPC/2015, a qual prevê a possibilidade, em hipóteses como a presente (reforma da sentença fundada no art. 485 do CPC), de garantir a devolutividade ao tribunal para o conhecimento da matéria impugnada, podendo a instância ad quem decidir de logo o mérito, se o processo estiver em condições dessa respectiva análise, a verdade é que, no caso, o processo não se encontra em condições de julgamento, razão pela qual, reconhecida aqui a nulidade do decisum, os autos deverão baixar à origem a fim de que seja reaberta a instrução.
Com o objetivo de garantir transparência ao rejulgamento, atento, ademais, à efetividade da jurisdição, entendo conveniente tecer considerações acerca da prova produzida, justificando suas condições e fundamentando acerca dos motivos que me convencem de não estar a ação madura ao julgamento.
Não foi juntado PPP indicando a exposição a agente nocivo para o período no qual se reconheceu o interesse de agir. Ademais, deve ser garantido o contraditório.
Não sendo possível a juntada de novos elementos materiais de prova, o juízo a quo deverá oportunizar à parte autora a coleta de prova oral - sendo adequado, aqui, reconhecer que os documentos apresentados e que comprovam a atividade do autor constituem início de prova material - a fim de comprovar as atividades realizadas, a indicação dos respectivos setores de trabalho, nomeando-se, após, perito para a efetivação da prova técnica, ressaltando que, sendo o caso de os locais de trabalho estarem desativados, a perícia deverá ser efetivada de modo indireto, por similaridade, na forma como vem decidindo o tribunal a respeito e, inclusive, o Superior Tribunal de Justiça (REsp 1397415/RS, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA, julgado em 12/11/2013, DJe 20/11/2013), cabendo ao expert, justificada e fundamentadamente - a partir das informações colhidas por eventual prova testemunhal e à luz da prova documental juntada nos autos - a escolha do local de trabalho para a prova indireta, se for o caso, podendo, a critério do juiz, as partes serem ouvidas previamente a respeito.
CONCLUSÃO
Parcialmente provida a apelação da parte autora para afastar a extinção do processo, sem resolução do mérito, por falta de interesse de agir, no que tange à análise da especialidade do período de 01/06/2011 a 08/05/2017.
Não estando a causa em condições de imediato julgamento pelo tribunal, deve ser reaberta a instrução, considerado os balizamentos constantes das razões de decidir; prejudicada, pois, a análise de mérito.
DISPOSITIVO
Ante o exposto, voto por dar parcial provimento à apelação da parte autora, reconhecendo a nulidade de parte da sentença.
Documento eletrônico assinado por ARTUR CÉSAR DE SOUZA, Juiz Federal Convocado, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40002479718v8 e do código CRC 27ceecdf.Informações adicionais da assinatura:
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Apelação Cível Nº 5019934-89.2019.4.04.7000/PR
RELATOR: Juiz Federal ARTUR CÉSAR DE SOUZA
APELANTE: VALNEI LUIZ DA SILVA ANDRADE (AUTOR)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL: EXTINÇÃO DO PROCESSO SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO. FALTA DE INTERESSE DE AGIR. TEMA 350/STF. INDICAÇÃO DE ATIVIDADE EM CTPS: POSSÍVEL EXPOSIÇÃO A AGENTE NOCIVO. PRINCÍPIO DA BOA-FÉ OBJETIVA: DEVER DE INFORMAÇÃO E DE ORIENTAÇÃO AO SEGURADO. NULIDADE DO DECISUM. FALTA DE CONDIÇÕES DE ANÁLISE DO MÉRITO E REABERTURA DA INSTRUÇÃO.
1. O Supremo Tribunal Federal, em sede de repercussão geral, assentou entendimento, nos autos do RE 631.240/MG (Tema 350), no sentido da indispensabilidade do prévio requerimento administrativo de benefício previdenciário como pressuposto para que se possa acionar legitimamente o Poder Judiciário, ressaltando ser prescindível o exaurimento daquela esfera.
2. Consoante os documentos constantes do procedimento administrativo, cabia à autarquia ter exigido documentos relacionados à atividade especial do labor, notadamente no caso, haja vista a indicação na CTPS que as atividades desenvolvidas nos períodos estão relacionadas a possível exposição a agentes nocivos.
3. A conclusão a que se chega é que se evidencia o descumprimento - por parte da autarquia - dos deveres decorrentes da boa-fé objetiva (dever de informação e orientação do segurado), que não apenas deixou de informar adequadamente o segurado, mas também não se atentou para verificar que se tratavam de atividades profissionais que, em tese, seria factível a exposição a agente nocivo.
4. No caso, apreciada a prova produzida em relação aos períodos de labor, decidiu a Turma que a presente ação não está em condições de julgamento, razão pela qual, reconhecida a nulidade do decisum, determinada a baixa dos autos à origem a fim de que seja reaberta a instrução.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia Turma Regional Suplementar do Paraná do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação da parte autora, reconhecendo a nulidade de parte da sentença, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Curitiba, 04 de maio de 2021.
Documento eletrônico assinado por ARTUR CÉSAR DE SOUZA, Juiz Federal Convocado, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40002479719v6 e do código CRC 23c00bb0.Informações adicionais da assinatura:
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO Virtual DE 27/04/2021 A 04/05/2021
Apelação Cível Nº 5019934-89.2019.4.04.7000/PR
RELATOR: Juiz Federal ARTUR CÉSAR DE SOUZA
PRESIDENTE: Desembargador Federal FERNANDO QUADROS DA SILVA
APELANTE: VALNEI LUIZ DA SILVA ANDRADE (AUTOR)
ADVOGADO: ERALDO LACERDA JUNIOR (OAB PR030437)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 27/04/2021, às 00:00, a 04/05/2021, às 16:00, na sequência 1, disponibilizada no DE de 15/04/2021.
Certifico que a Turma Regional suplementar do Paraná, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DO PARANÁ DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DAR PARCIAL PROVIMENTO À APELAÇÃO DA PARTE AUTORA, RECONHECENDO A NULIDADE DE PARTE DA SENTENÇA.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Juiz Federal ARTUR CÉSAR DE SOUZA
Votante: Juiz Federal ARTUR CÉSAR DE SOUZA
Votante: Desembargador Federal FERNANDO QUADROS DA SILVA
Votante: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA
SUZANA ROESSING
Secretária
Conferência de autenticidade emitida em 14/05/2021 04:02:17.