VoltarHome/Jurisprudência Previdenciária

EMENTA: PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL: INTERESSE DE AGIR. TEMA 350/STF. PRINCÍPIO DA BOA-FÉ OBJETIVA: DEVER DE INFORMAÇÃO E DE ORIENTAÇÃO AO SEGURADO. NÃO MANIFESTAÇÃO QUANTO A PERÍODO ESPECIAL. TEMPO DE SERVIÇO RURAL. REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO/CONTRIBUIÇÃO. CONCESSÃO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS RECURSAIS. TUTELA ESPECÍFICA. TRF4. 5003674-24.2020.4.04.9999

Data da publicação: 14/05/2021 07:01:22

EMENTA: PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL: INTERESSE DE AGIR. TEMA 350/STF. PRINCÍPIO DA BOA-FÉ OBJETIVA: DEVER DE INFORMAÇÃO E DE ORIENTAÇÃO AO SEGURADO. NÃO MANIFESTAÇÃO QUANTO A PERÍODO ESPECIAL. TEMPO DE SERVIÇO RURAL. REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO/CONTRIBUIÇÃO. CONCESSÃO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS RECURSAIS. TUTELA ESPECÍFICA. 1. O Supremo Tribunal Federal, em sede de repercussão geral, assentou entendimento, nos autos do RE 631.240/MG (Tema 350), no sentido da indispensabilidade do prévio requerimento administrativo de benefício previdenciário como pressuposto para que se possa acionar legitimamente o Poder Judiciário, ressaltando ser prescindível o exaurimento daquela esfera. 2. O Tribunal vem apreciando tal questão, ainda, no sentido de considerar as atividades exercidas nos períodos controvertidos (quando apresentada a respectiva CTPS, ao menos), aliado ao fato de ter - ou não - o patrocínio técnico de procurador habilitado quando da instauração do procedimento administrativo, oportunidade em que aprecia a hipótese de configurar - ou não - motivações suficientes no sentido de que a Autarquia (assumindo conduta positiva, com aplicação, interesse, empenho e zelo), teria conduzido - ou não - o procedimento administrativo de modo a garantir a maior satisfação de direito possível à parte. 3. Aprecia-se o eventual descumprimento - por parte da Autarquia - dos deveres decorrentes da boa-fé objetiva (dever de informação e orientação do segurado), os quais obrigam a Administração Pública, à luz das atividades exercidas, informar adequadamente o segurado acerca da eventual possibilidade de ter sido (ou estar sendo) submetido a agente nocivo nas atividades laborais. 4. Consoante os documentos constantes do procedimento administrativo, a parte autora não requereu o reconhecimento de atividade especial, nem arrolou nenhum documento do qual se pudesse inferir a exposição à agente nocivo. Resta identificada a falta de interesse de agir, diante da ausência de pretensão resistida. 5. Comprovado o labor rural em regime de economia familiar, mediante a produção de início de prova material, corroborada por prova testemunhal idônea, o segurado faz jus ao cômputo do respectivo tempo de serviço. 6. Tem direito à aposentadoria por tempo de serviço/contribuição o segurado que, mediante a soma do tempo judicialmente reconhecido com o tempo computado na via administrativa, possuir tempo suficiente e implementar os demais requisitos para a concessão do benefício. 7. Verba honorária majorada em razão do comando inserto no § 11 do art. 85 do CPC/2015, cuja exigibilidade fica suspensa em relação à parte autora, em face da concessão de gratuidade da justiça. 8. Reconhecido o direito da parte, impõe-se a determinação para a imediata implantação do benefício, nos termos do art. 497 do CPC. (TRF4, AC 5003674-24.2020.4.04.9999, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DO PR, Relator ARTUR CÉSAR DE SOUZA, juntado aos autos em 06/05/2021)

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5003674-24.2020.4.04.9999/PR

RELATOR: Juiz Federal ARTUR CÉSAR DE SOUZA

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

APELANTE: JOAO ALVES MARTINS NETO

APELADO: OS MESMOS

RELATÓRIO

Trata-se de ação ajuizada contra o Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, na qual a parte autora objetiva a concessão de aposentadoria por tempo de serviço/contribuição, mediante o reconhecimento de tempo de serviço rural no(s) período(s) de 10/10/1971 a 30/09/1987, bem como da natureza especial, prejudicial à saúde ou à integridade física, de atividades laborais exercidas no(s) período(s) de 01/07/2013 a 28/02/2015 e 01/03/2015 a 09/10/2017, com a conversão do respectivo tempo de serviço especial em tempo de serviço comum.

Sentenciando, em 21/01/2020, o juízo a quo julgou parcialmente procedente o pedido, nos seguintes termos:

3. DISPOSITIVO

Diante do exposto:

,JULGO EXTINTO sem resolução do mérito, nos termos do artigo 485, inciso VI, do CPC o pedido da parte autora, quanto ao reconhecimento da atividade especial e;

JULGO PROCEDENTE, com resolução do mérito, nos termos do artigo 487, inciso I, do CPC o pedido da parte autora, para o fim de determinar ao INSS que reconheça o período laborado no âmbito rural durante 10/10/1971 a 30/09/1987 e a conceder ao autor o benefício de aposentadoria por tempo de contribuição integral, considerando-se os períodos ora reconhecidos, desde o requerimento administrativo (DER 09/10/2017 – mov. 1.12), observando-se, quanto ao salário-de-benefício, as balizas da legislação previdenciária

As partes opuseram embargos declaratórios, os quais foram acolhidos para o fim de suprir as omissões apontadas. Eis o teor do dispositivo sentencial alterado por força dos embargos:

4.Ante o exposto, conheço dos embargos pela sua tempestividade, e no mérito ACOLHO-OS.

5.Considerando o acolhimento dos embargos de ambas as partes, determino que a sentença embargada passe a viger com o seguinte texto:

JULGO EXTINTO, sem resolução do mérito, nos termos do artigo 485, inciso VI, do CPC o pedido da parte autora, quanto ao reconhecimento da atividade especial e;

JULGO PROCEDENTE, com resolução do mérito, nos termos do artigo 487, inciso I, do CPC o pedido da parte autora, para o fim de determinar ao INSS que reconheça o período laborado no âmbito rural durante 01/01/1972 a 30/09/1987 e a conceder ao autor o benefício de aposentadoria por tempo de contribuição integral, considerando-se os períodos ora reconhecidos, desde o requerimento administrativo (DER 09/10/2017 – mov. 1.12), observando-se, quanto ao salário-de-benefício, as balizas da legislação previdenciária.

No que diz respeito ao juros moratórios e correção monetária, as condenações impostas à Fazenda Pública de natureza previdenciária sujeitam-se à incidência do INPC, para fins de correção monetária, no que se refere ao período posterior à vigência da Lei nº 11.430/2006, que incluiu o art. 41-A na Lei nº 8.213/91. Quanto aos juros de mora, no período posterior à vigência da Lei nº 11.960/2009, incidem segundo a remuneração oficial da caderneta de poupança. STJ. 1ª Seção. REsp 1.495.146-MG, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 22/02/2018 (recurso repetitivo).

Considerando a sucumbência recíproca, condeno o INSS, ao pagamento de 50% das custas judiciais e honorários advocatícios, os quais fixo em 50% do valor da causa, nos termos do art. 85, §3º do CPC, observada a Súmula nº 111 do STJ.

Lado outro, observada a gratuidade de justiça, condeno a parte autora ao pagamento de honorários advocatícios no valor de 50% do valor da causa e, ainda, a 50% das despesas processuais.

Deixo de submeter a presente sentença ao duplo grau obrigatório, em face do disposto no § 3º, I, do artigo 496, do Código de Processo Civil, visto que apesar de ilíquido o valor, é certo que não ultrapassará 1.000 (um mil) salários mínimos, em conformidade com o julgamento do Recurso Especial n° 1.735.097 – RS (2018/0084148-0).

Inconformadas, as partes apelaram.

O INSS alega, em síntese, que não há início de prova material em relação ao alegado labor rural, não sendo admitida a prova exclusivamente testemunhal para comprovação de tempo de serviço. Ainda, requer sejam invertidos os ônus sucumbenciais, afastando-se a condenação do INSS ao pagamento de honorários advocatícios de sucumbência.

A parte autora, por sua vez, defende que o exaurimento da via administrativa não é condição para a propositura da ação, devendo ser reconhecido o período especial pleiteado.

Oportunizadas contrarrazões, vieram os autos a esta Corte.

É o relatório.

VOTO

PRELIMINAR DE EXTINÇÃO DE PARTE DO PROCESSO SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO - FALTA DE INTERESSE DE AGIR

O juízo a quo extinguiu, sem resolução de mérito, nos termos do art. 485, IV, do CPC, parte do processo, por entender que não foi requerido administrativamente o reconhecimento da especialidade dos períodos de 01/07/2013 a 28/02/2015 e 01/03/2015 a 09/10/2017, configurando ausência de interesse de agir.

Da análise do procedimento administrativo colacionado aos autos (Evento 10.2 - 10.6), constata-se, efetivamente, que no pedido de concessão de aposentadoria (DER 09/10/2017), os tempos de labor especiais pleiteados nesta ação não foram objeto de pedido explícito pelo segurado.

A 3ª Seção desta Corte, por ocasião do julgamento dos Embargos Infringentes na Apelação Cível n° 1999.72.05.007962-3/SC, em 09/10/2002 (DJU de 26/02/2003), deixou assentada, no que tange aos pedidos de concessão de benefício previdenciário, a necessidade do prévio requerimento na esfera administrativa, consoante se verifica do voto condutor do acórdão e das notas taquigráficas respectivas, sob pena de se configurar a falta de interesse de agir da parte autora em postular a proteção jurisdicional nas hipóteses em que não há resistência da autarquia ré manifestada em contestação por meio do combate ao mérito da pretensão vestibular. Ficou definido, ainda, naquela oportunidade, que somente seria possível dispensar o prévio ingresso na via administrativa nas situações em que, sistematicamente, o INSS se nega a apreciar ou indefere de pronto a pretensão da parte, pois a recusa da Administração, em casos tais, seria evidente.

Nesse mesmo sentido de que com a apresentação de contestação de mérito está caracterizado o interesse de agir, posicionou-se o STF no julgamento do Tema 350 em sede de repercussão geral (RE 631.240/MG), bem como o STJ, posteriormente, em recurso especial repetitivo, Tema 660 (REsp 1369834/SP).

Considerada a necessidade de implementação do interesse de agir, a participação do segurado inicia-se na esfera administrativa, oportunidade que exerce os direitos subjetivos normativamente estabelecidos, reivindicando direitos ou denunciando abusos ou ilegalidades, garantindo-se, ainda, o pleno acesso ao Poder Judiciário no devido processo legal, com exercício do contraditório e da ampla defesa, possibilitando-lhe comprovar o alegado direito mediante a utilização dos meios de prova admitidos processualmente.

No caso, identifica-se que o INSS, nos momentos em que fora instado a manifestar-se (contestação, etc.), não fizera quaisquer manifestações sobre o mérito da controvérsia, limitado-se a defender a falta de interesse de agir, na medida em que ausente pretensão resistida (o segurado não teria juntado elementos de prova acerca do alegado labor especial defendido em sede judicial).

Não há no procedimento administrativo, quaisquer referências, quaisquer evidências de que as atividades desenvolvidas nos referidos períodos estão relacionadas a possível exposição a agentes nocivos, razão pela qual, ausente pedido na esfera administrativa, não há outra conclusão, no caso, senão reconhecer a falta de interesse de agir.

Sobre o tema, oportuno mencionar a jurisprudência do TRF4 no sentido da necessidade de observância da condição de proponibilidade da ação previdenciária:

APELAÇÃO. PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO RETIDO. CERCEAMENTO DE DEFESA. INOCORRÊNCIA. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. ATIVIDADE RURAL COMO SEGURADO ESPECIAL. INÍCIO DE PROVA MATERIAL. TEMPO ESPECIAL. ÔNUS DA PROVA. INTERESSE DE AGIR. AUSÊNCIA. EXTINÇÃO SEM EXAME DO MÉRITO. 1. Agravo retido conhecido, porquanto requerida expressamente a sua apreciação nas razões de apelação, em conformidade com o disposto no artigo 523, § 1º, do Código de Processo Civil de 1973, aplicável na espécie. 2. Não há cerceamento de defesa pelo indeferimento de prova pericial quando a parte autora não se desincumbiu de apresentar os fatos constitutivos de seu direito. 3. Não houve prévio requerimento administrativo quanto ao período de atividade especial. Conforme consta do processo administrativo apresentado nos autos, não há um único documento, seja PPP ou laudo pericial que demonstre atividade insalubre, de modo que resta mantida a extinção do feito sem exame de mérito. 4. Hipótese em que, considerados os princípios que devem nortear as ações previdenciárias, extinto o feito, sem exame do mérito, com fulcro no artigo 485, incisos III e IV, do CPC, o que não obsta o ingresso de novo pedido administrativo e o ajuizamento de nova ação para renovação do pleito. (TRF4, AC 5035668-46.2015.4.04.9999, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DO PR, Relator FERNANDO QUADROS DA SILVA, juntado aos autos em 27/02/2019)

Assim, não tendo sido oportunizado ao INSS a possibilidade de manifestar-se acerca de todo o conjunto probatório e o pleno exercício do contraditório, resta impedido o prosseguimento desta demanda em relação ao labor nocivo nos perídos referidos.

Não havendo interesse de agir, impõe-se a extinção do feito, sem exame de mérito, com fundamento no art. 485, inciso VI do CPC, com relação ao pedido de reconhecimento do labor especial, cabendo à parte autora ingressar administrativamente com o pedido, que deverá ser adequadamente instruído, para, sobrevindo negativa, ajuizar nova ação.

Por consequência, restam prejudicados os demais pedidos deduzidos pela parte autora.

Nego, pois, provimento à apelação da parte autora.

MÉRITO

A controvérsia no plano recursal restringe-se:

- ao reconhecimento da atividade rural desempenhada sob o regime de economia familiar no(s) período(s) de 01/01/1972 a 30/09/1987;

- à consequente concessão de aposentadoria por tempo de serviço/contribuição.

TEMPO DE SERVIÇO RURAL

O aproveitamento do tempo de atividade rural exercido até 31/10/1991, independentemente do recolhimento das respectivas contribuições previdenciárias e exceto para efeito de carência, está expressamente autorizado e previsto pelo art. 55, §2º, da Lei n.º 8.213/91, e pelo art. 127, inc. V, do Decreto n.º 3.048/99.

Outrossim, o cômputo do tempo de serviço rural exercido no período anterior à Lei n.º 8.213/91, em regime de economia familiar e sem o recolhimento das contribuições, aproveita tanto ao arrimo de família quanto aos demais membros do grupo familiar que com ele laboram, porquanto a todos estes integrantes foi estendida a condição de segurado, nos termos do art. 11, inc. VII, da Lei Previdenciária (STJ, REsp 506.959/RS, 5ª Turma, Rel. Min. Laurita Vaz, DJU de 10/11/2003).

A comprovação do exercício do trabalho rural pode ser feita mediante a apresentação de início de prova material, complementada por prova testemunhal idônea, quando necessária ao preenchimento de lacunas - não sendo esta admitida, exclusivamente, nos termos do art. 55, §3º, da Lei nº 8.213/91, bem como da Súmula nº 149 do STJ e dos Temas 297 e 554/STJ (recursos representativos da controvérsia).

Importa, ainda, salientar os seguintes aspectos: (a) o rol de documentos constantes no art. 106 da Lei de Benefícios, os quais seriam aptos à comprovação do exercício da atividade rural, é apenas exemplificativo; (b) não se exige prova documental plena da atividade rural em relação a todos os anos integrantes do período correspondente à carência, sendo suficientes documentos que, juntamente com a prova oral, possibilitem juízo conclusivo quanto ao período de labor rural exercido (AREsp 327.119/PB, j. em 02/06/2015, DJe 18/06/2015); (c) certidões da vida civil são hábeis a constituir início probatório da atividade rural da parte autora (REsp n.º 1.321.493-PR, DJe em 19/12/2012, submetido à sistemática dos recursos repetitivos); (d) é possível reconhecer o tempo de serviço rural anterior ao documento mais antigo apresentado, desde que amparado em convincente prova testemunhal colhida sob o contraditório (Súmula 577/STJ, DJe 27/06/2016); e (e) é admitido, como início de prova material, nos termos da Súmula 73 deste Tribunal, documentos de terceiros, membros do grupo parental.

EXAME DO TEMPO RURAL NO CASO CONCRETO

A título de prova documental do exercício da atividade rural, a parte autora, nascida em 10/10/1959, junta aos autos:

- Declaração por Instrumento Particular do Espólio de Yassunori Hara, representado pelo herdeiro Jorge Hideo Hara, onde o mesmo declara que o autor laborou como PARCEIRO AGRICOLA na propriedade rural denominada Fazenda Paraíso, localizada no Município de Loanda no período de 01/10/1972 a 30/09/1987 na lavoura cafeeira em regime de economia familiar (Evento 1.9 p. 5);

- Certidão de Nascimento de sua irmã SUELI ALVES lavrada em 10 de maio de 1963 qualificando o genitor do autor como LAVRADOR (Evento 1.9 p. 8);

- Certidão de Casamento lavrada em 01 de setembro de 1984 qualificando o autor como LAVRADOR (Evento 1.9 p. 9);

- Carteira de Filiação do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Nova Londrina (Matricula n º 1.761) constando seu genitor como sócio desde 13/09/1972 (Evento 1.9 p. 10);

- Carteira de Filiação do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Nova Londrina (Matricula n º 4.341) constando o autor como sócio desde 30/09/1986 (Evento 1.9 p. 10/11).

Tais documentos constituem início de prova material do alegado labor rural.

A prova testemunhal produzida, por sua vez, é robusta e uníssona no sentido de confirmar o exercício da atividade rural no período indicado. Destaco trecho da sentença:

A testemunha Elias João da Silva relatou que conhece o autor desde o ano de 1970. Nessa época o autor trabalhava juntamente com seus pais, em lavoura cafeeira na Fazenda Paraíso. Essa propriedade fica localizada no Município de Loanda e pertence a Jorge Hara. Que trabalhavam como parceiros na lavoura de café. O depoente morava em uma propriedade denominada Fazenda Água Limpa, que ficava vizinha da propriedade em que o autor trabalhava com seus pais. Dessa forma o depoente consegue afirmar que via o autor trabalhando na lavoura de café, realizando carpa, colheita. No ano de 1975 houve uma forte geada que resultou no corte dos pés de café. Depois disso, o autor e sua família plantaram novamente lavoura cafeeira, mas para ser novamente formada a lavoura demora cerca de 4 a 5 anos. Enquanto a lavoura de café era formada, o autor e sua família passaram a trabalhar com lavoura branca (arroz, feijão e milho). Após ter acabado a parceria do autor e sua família nessa propriedade, o autor passou a trabalhar nessa mesma fazenda com registro em carteira, no ano de 1987. O depoente afirma, que em todo o período que o autor trabalhou nessa propriedade sempre foi trabalhador rural, não contando com mão de obra de terceiros nem com maquinários.

Por sua vez, a testemunha Valdenir Batista dos Santos relatou que conheceu o autor no ano de 1970 e que tocavam roça na Fazenda Paraíso. O depoente e seus pais tocavam uma lavoura com aproximadamente 7 mil pés de café, e o autor juntamente com seus pais e seus cinco irmãos, tocavam também lavoura cafeeira com a mesma proporção, nessa propriedade. Tocavam o café em parceria. O depoente trabalhou nessa propriedade durante aproximadamente 20 anos, e conta que quando foi embora dessa fazenda o autor permaneceu morando e trabalhando nela. Que o autor trabalhou por um tempo registrado. Antes de trabalhar com registro em carteira o autor trabalhava nessa propriedade na lavoura de café, sem a utilização de maquinários. Para o cultivo da lavoura cafeeira, é necessário carpir, passar veneno, derrubar, rastelar e colher. No ano de 1975, houve uma geada muito forte acabando com a lavoura de café, sendo necessário o corte da plantação para que brotasse novamente. Esse processo, demorou aproximadamente 2 anos até que a lavoura estivesse formada novamente, sendo necessário o plantio e cultivo de lavoura branca para a sobrevivência do autor e sua família. Desde o ano de 1970 até o ano de 1990, ele afirma que o autor morava e trabalhava nessa propriedade, podendo ser considerado como trabalhador rural.

Concluindo o tópico, julgo comprovado o exercício da atividade rural no período de 01/01/1972 a 30/09/1987, merecendo confirmação a sentença no ponto.

REQUISITOS PARA CONCESSÃO DE APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO/CONTRIBUIÇÃO

Até 16 de dezembro de 1998, quando do advento da EC n.º 20/98, a aposentadoria por tempo de serviço disciplinada pelos arts. 52 e 53 da Lei n.º 8.213/91, pressupunha o preenchimento, pelo segurado, do prazo de carência (previsto no art. 142 da referida Lei para os inscritos até 24 de julho de 1991 e previsto no art. 25, II, da referida Lei, para os inscritos posteriormente à referida data) e a comprovação de 25 anos de tempo de serviço para a mulher e de 30 anos para o homem, a fim de ser garantido o direito à aposentadoria proporcional no valor de 70% do salário-de-benefício, acrescido de 6% por ano adicional de tempo de serviço, até o limite de 100% (aposentadoria integral), o que se dá aos 30 anos de serviço para as mulheres e aos 35 para os homens.

Com as alterações introduzidas pela EC nº 20/98, o benefício passou a denominar-se aposentadoria por tempo de contribuição, disciplinado pelo art. 201, § 7º, I, da Constituição Federal. A nova regra, entretanto, muito embora tenha extinto a aposentadoria proporcional, manteve os mesmos requisitos anteriormente exigidos à aposentadoria integral, quais sejam, o cumprimento do prazo de carência, naquelas mesmas condições, e a comprovação do tempo de contribuição de 30 anos para mulher e de 35 anos para homem.

Em caráter excepcional, para os segurados filiados até a data da publicação da Emenda, foi estabelecida regra de transição no art. 9º, §1º, possibilitando a concessão de aposentadoria proporcional quando, o segurado I) contando com 53 anos de idade, se homem, e 48 anos, se mulher e, atendido o requisito da carência, II) atingir tempo de contribuição igual, no mínimo, à soma de: a) 30 anos, se homem, e 25, se mulher; e b) um período adicional de contribuição (pedágio) equivalente a 40% do tempo que, na data da publicação da Emenda, faltaria para atingir o mínimo de tempo para a aposentadoria proporcional. O valor da aposentadoria proporcional será equivalente a 70% do salário-de-benefício, acrescido de 5% por ano de contribuição que supere a soma a que se referem os itens a e b supra, até o limite de 100%).

De qualquer modo, o disposto no art. 56 do Decreto n.º 3.048/99 (§§3º e 4º) expressamente ressalvou, independentemente da data do requerimento do benefício, o direito à aposentadoria pelas condições legalmente previstas à época do cumprimento de todos os requisitos, assegurando sua concessão pela forma mais benéfica, desde a entrada do requerimento.

CÁLCULO DA RENDA MENSAL INICIAL (RMI)

A renda mensal inicial do benefício será calculada de acordo com as regras da legislação infraconstitucional vigente na data em que o segurado completar todos os requisitos do benefício.

DIREITO À APOSENTADORIA COMUM NO CASO CONCRETO

No caso, mantido o reconhecimento do tempo rural controvertido, a parte autora faz jus à concessão da aposentadoria comum, na forma dos fundamentos da sentença.

HONORÁRIOS RECURSAIS

O CPC de 2015 inovou de forma significativa com relação aos honorários advocatícios, buscando valorizar a atuação profissional dos advogados, especialmente pela caracterização como verba de natureza alimentar (§ 14, art. 85, CPC) e do caráter remuneratório aos profissionais da advocacia.

Cabe ainda destacar, que o atual diploma processual estabeleceu critérios objetivos para fixar a verba honorária nas causas em que a Fazenda Pública for parte, conforme se extrai da leitura do § 3º, incisos I a V, do art. 85. Referidos critérios buscam valorizar a advocacia, evitando o arbitramento de honorários em percentual ou valor aviltante que, ao final, poderia acarretar verdadeiro desrespeito à profissão. Ao mesmo tempo, objetiva desestimular os recursos protelatórios pela incidência de majoração da verba em cada instância recursal.

No caso dos autos, contudo, o juízo a quo postergou a fixação dos honorários advocatícios para a fase de liquidação, por considerar a sentença ilíquida (art. 85, § 4º, II).

A partir dessas considerações, mantida a sentença de procedência, impõe-se a majoração da verba honorária em favor do advogado da parte autora.

Por outro lado, em atenção ao § 4º do art. 85 e art. 1.046, tratando-se de sentença ilíquida e sendo parte a Fazenda Pública, a definição do percentual fica postergada para a fase de liquidação do julgado, restando garantida, de qualquer modo, a observância dos critérios definidos no § 3º, incisos I a V, conjugado com § 5º, todos do mesmo dispositivo.

Outrossim, em face do desprovimento dos recursos interpostos pelas partes, e com fulcro no § 11 do art. 85 do CPC, atribuo o acréscimo de mais 50% incidente sobre o valor a ser apurado em sede de liquidação a título de honorários.

TUTELA ESPECÍFICA

Na vigência do Código de Processo Civil de 1973, a 3ª Seção deste Tribunal, buscando dar efetividade ao disposto no art. 461, que dispunha acerca da tutela específica, firmou o entendimento de que, confirmada a sentença de procedência ou reformada para julgar procedente, o acórdão que concedesse benefício previdenciário e sujeito apenas a recurso especial e/ou extraordinário, portanto sem efeito suspensivo, ensejava o cumprimento imediato da determinação de implantar o benefício, independentemente do trânsito em julgado ou de requerimento específico da parte (TRF4, Questão de Ordem na AC nº 2002.71.00.050349-7, 3ª Seção, Des. Federal Celso Kipper, por maioria, D.E. 01/10/2007, publicação em 02/10/2007). Nesses termos, entendeu o Órgão Julgador que a parte correspondente ao cumprimento de obrigação de fazer ensejava o cumprimento desde logo, enquanto a obrigação de pagar ficaria postergada para a fase executória.

O art. 497 do novo CPC, buscando dar efetividade ao processo dispôs de forma similar à prevista no Código/1973, razão pela qual o entendimento firmado pela 3ª Seção deste Tribunal, no julgamento da Questão de Ordem acima referida, mantém-se íntegro e atual.

Nesses termos, com fulcro no art. 497 do CPC, determino o cumprimento imediato do acórdão no tocante à implantação do benefício da parte autora a ser efetivada em 45 dias, mormente pelo seu caráter alimentar e necessidade de efetivação imediata dos direitos sociais fundamentais, bem como por se tratar de prazo razoável para que a autarquia previdenciária adote as providências necessárias tendentes a efetivar a medida. Saliento, contudo, que o referido prazo inicia-se a contar da intimação desta decisão, independentemente de interposição de embargos de declaração, face à ausência de efeito suspensivo (art. 1.026 CPC).

PREQUESTIONAMENTO

Restam prequestionados, para fins de acesso às instâncias recursais superiores, os dispositivos legais e constitucionais elencados pelas partes.

CONCLUSÃO

Negado provimento às apelações da parte autora e do INSS.

Consectários de sucumbência, com majoração dos honorários, na forma da fundamentação supra.

Determinada a implantação do benefício.

DISPOSITIVO

Ante o exposto, voto por negar provimento às apelações das partes e determinar a implantação do benefício.



Documento eletrônico assinado por ARTUR CÉSAR DE SOUZA, Juiz Federal Convocado, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40002487234v17 e do código CRC 05af22e3.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): ARTUR CÉSAR DE SOUZA
Data e Hora: 6/5/2021, às 14:50:31


5003674-24.2020.4.04.9999
40002487234.V17


Conferência de autenticidade emitida em 14/05/2021 04:01:21.

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5003674-24.2020.4.04.9999/PR

RELATOR: Juiz Federal ARTUR CÉSAR DE SOUZA

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

APELANTE: JOAO ALVES MARTINS NETO

APELADO: OS MESMOS

EMENTA

PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL: INTERESSE DE AGIR. TEMA 350/STF. PRINCÍPIO DA BOA-FÉ OBJETIVA: DEVER DE INFORMAÇÃO E DE ORIENTAÇÃO AO SEGURADO. NÃO MANIFESTAÇÃO QUANTO A PERÍODO ESPECIAL. TEMPO DE SERVIÇO RURAL. REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO/CONTRIBUIÇÃO. CONCESSÃO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS recursais. TUTELA ESPECÍFICA.

1. O Supremo Tribunal Federal, em sede de repercussão geral, assentou entendimento, nos autos do RE 631.240/MG (Tema 350), no sentido da indispensabilidade do prévio requerimento administrativo de benefício previdenciário como pressuposto para que se possa acionar legitimamente o Poder Judiciário, ressaltando ser prescindível o exaurimento daquela esfera.

2. O Tribunal vem apreciando tal questão, ainda, no sentido de considerar as atividades exercidas nos períodos controvertidos (quando apresentada a respectiva CTPS, ao menos), aliado ao fato de ter - ou não - o patrocínio técnico de procurador habilitado quando da instauração do procedimento administrativo, oportunidade em que aprecia a hipótese de configurar - ou não - motivações suficientes no sentido de que a Autarquia (assumindo conduta positiva, com aplicação, interesse, empenho e zelo), teria conduzido - ou não - o procedimento administrativo de modo a garantir a maior satisfação de direito possível à parte.

3. Aprecia-se o eventual descumprimento - por parte da Autarquia - dos deveres decorrentes da boa-fé objetiva (dever de informação e orientação do segurado), os quais obrigam a Administração Pública, à luz das atividades exercidas, informar adequadamente o segurado acerca da eventual possibilidade de ter sido (ou estar sendo) submetido a agente nocivo nas atividades laborais.

4. Consoante os documentos constantes do procedimento administrativo, a parte autora não requereu o reconhecimento de atividade especial, nem arrolou nenhum documento do qual se pudesse inferir a exposição à agente nocivo. Resta identificada a falta de interesse de agir, diante da ausência de pretensão resistida.

5. Comprovado o labor rural em regime de economia familiar, mediante a produção de início de prova material, corroborada por prova testemunhal idônea, o segurado faz jus ao cômputo do respectivo tempo de serviço.

6. Tem direito à aposentadoria por tempo de serviço/contribuição o segurado que, mediante a soma do tempo judicialmente reconhecido com o tempo computado na via administrativa, possuir tempo suficiente e implementar os demais requisitos para a concessão do benefício.

7. Verba honorária majorada em razão do comando inserto no § 11 do art. 85 do CPC/2015, cuja exigibilidade fica suspensa em relação à parte autora, em face da concessão de gratuidade da justiça.

8. Reconhecido o direito da parte, impõe-se a determinação para a imediata implantação do benefício, nos termos do art. 497 do CPC.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia Turma Regional Suplementar do Paraná do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, negar provimento às apelações das partes e determinar a implantação do benefício, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Curitiba, 04 de maio de 2021.



Documento eletrônico assinado por ARTUR CÉSAR DE SOUZA, Juiz Federal Convocado, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40002487235v5 e do código CRC 5ed3bd6e.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): ARTUR CÉSAR DE SOUZA
Data e Hora: 6/5/2021, às 14:50:31


5003674-24.2020.4.04.9999
40002487235 .V5


Conferência de autenticidade emitida em 14/05/2021 04:01:21.

Poder Judiciário
Tribunal Regional Federal da 4ª Região

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO Virtual DE 27/04/2021 A 04/05/2021

Apelação Cível Nº 5003674-24.2020.4.04.9999/PR

RELATOR: Juiz Federal ARTUR CÉSAR DE SOUZA

PRESIDENTE: Desembargador Federal FERNANDO QUADROS DA SILVA

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

APELANTE: JOAO ALVES MARTINS NETO

ADVOGADO: LIANA REGINA BERTA (OAB PR020115)

APELADO: OS MESMOS

Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 27/04/2021, às 00:00, a 04/05/2021, às 16:00, na sequência 129, disponibilizada no DE de 15/04/2021.

Certifico que a Turma Regional suplementar do Paraná, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:

A TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DO PARANÁ DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NEGAR PROVIMENTO ÀS APELAÇÕES DAS PARTES E DETERMINAR A IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO.

RELATOR DO ACÓRDÃO: Juiz Federal ARTUR CÉSAR DE SOUZA

Votante: Juiz Federal ARTUR CÉSAR DE SOUZA

Votante: Desembargador Federal FERNANDO QUADROS DA SILVA

Votante: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA

SUZANA ROESSING

Secretária



Conferência de autenticidade emitida em 14/05/2021 04:01:21.

O Prev já ajudou mais de 90 mil advogados em todo o Brasil.Acesse quantas petições e faça quantos cálculos quiser!

Teste grátis por 15 dias