Remessa Necessária Cível Nº 5022062-78.2021.4.04.7205/SC
RELATOR: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
PARTE AUTORA: LORECI RODRIGUES FERREIRA PEREIRA (IMPETRANTE)
PARTE RÉ: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (INTERESSADO)
RELATÓRIO
Trata-se de reexame necessário interposto contra sentença proferida, nos autos de mandado de segurança, nas seguintes letras (
):Ante o exposto, CONCEDO A SEGURANÇA.
Determino à autoridade impetrada que, no prazo de 30 dias, a contar de sua intimação, profira sua decisão no processo administrativo relativo ao benefício de aposentadoria - Protocolo 1188131554, de 10/08/2021.
Em caso de descumprimento do prazo acima referido, incidirá multa no valor de R$ 50,00 (cinquenta reais) por dia de atraso, nos termos do disposto no art. 536, § 1º, do CPC.
Demanda isenta de custas (art. 4º da Lei nº 9.289/96).
Sem condenação em honorários, a teor das Súmulas nºs 105-STJ e 512-STF e do art. 25 da Lei nº 12.030/2009.
Sobreveio notícia de que o requerimento nº 1188131554 teve sua análise concluída em 01/03/2022, com o indeferimento do benefício (
).Oportunizada a manifestação da Procuradoria Regional da República da 4ª Região, vieram os autos para julgamento (
).É o relatório.
VOTO
Preliminarmente, cumpre anotar que o pedido administrativo somente foi analisado no curso da impetração, de modo que não há falar em perda de objeto.
Nesta toada, colaciono precedentes:
PREVIDENCIÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. ENCAMINHAMENTO DE RECURSO ADMINISTRATIVO RELATIVO A BENEFÍCIO À INSTÂNCIA RECURSAL. PERDA SUPERVENIENTE DO OBJETO. NÃO CARACTERIZADA. 1. O mandado de segurança foi efetivo e determinante para que o recurso administrativo fosse encaminhado à instância recursal. 2. Presente a pretensão resistida na data da impetração, mesmo que eventualmente atendido seu objeto no curso da ação mandamental, não se configura perda de objeto, mas, sim, reconhecimento do pedido no curso do processo. (TRF4, AC 5010320-90.2020.4.04.7108, SEXTA TURMA, Relator para Acórdão JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA, juntado aos autos em 23/06/2021)
PREVIDENCIÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. ANÁLISE DO PEDIDO ADMINISTRATIVO. Havendo resistência para a análise do pedido administrativo de concessão do benefício, o qual somente restou atendido após a intervenção judicial, com a notificação da autoridade impetrada, não há falar em perda de objeto do mandamus. (TRF4 5017560-16.2018.4.04.7201, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DE SC, Relator PAULO AFONSO BRUM VAZ, juntado aos autos em 01/08/2019)
Feita a digressão, no que se refere ao mérito do presente writ, a fim de evitar tautologia, transcrevo a sentença que bem decidiu a questão, adotando os seus fundamentos como razões de decidir:
A legislação processual administrativa, em especial a Lei 9.784/99, assegura ao administrado a prestação de um serviço eficiente e célere, com a observância das garantias legais e constitucionais. CELSO ANTÔNIO BANDEIRA DE MELLO disciplina que o princípio da eficiência é uma faceta de um princípio mais amplo, o da "boa administração":
A Constituição se refere, no art. 37, ao princípio da eficiência. Advirta-se que tal princípio não pode ser concebido (entre nós nunca é demais fazer ressalvas óbvias) senão na intimidade do princípio da legalidade, pois jamais uma suposta busca de eficiência justificaria postergação daquele que é o dever administrativo por excelência. O fato é que o princípio da eficiência não parece ser mais do que uma faceta de um princípio mais amplo já superiormente tratado, de há muito, no Direito italiano: o princípio da 'boa administração'. Este último significa, como resulta das lições de Guido Falzone, em desenvolver a atividade administrativa 'do modo mais congruente, mais oportuno e mais adequado aos fins a serem alcançados, graças à escolha dos meios e da ocasião de utilizá-los, concebíveis como os mais idôneos para tanto'. Tal dever, como assinala Falzone, 'não se põe simplesmente como um dever ético ou como mera aspiração deontológica, senão como um dever atual e estritamente jurídico'. Em obra monográfica, invocando lições do citado autor, assinalamos este caráter e averbamos que, nas hipóteses em que há discrição administrativa, 'a norma só quer a solução excelente'. Juarez Freitas, em oportuno e atraente estudo - no qual pela primeira vez entre nós é dedicada toda uma monografia ao exame da discricionariedade em face do direito à boa administração -, com precisão irretocável, afirmou o caráter vinculante do direito fundamental à boa administração. (Bandeira de Mello, Celso Antonio. Curso de Direito Administrativo, 26ª edição, Ed. Malheiros, 2009, págs. 122-123)
Além disso, a teor do art. 5º, inciso LXXVIII, da Constituição Federal "a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação".
O processo administrativo disciplinar, por sua vez, é regulado pela Lei nº 9.784/99, que na parte atinente ao prazo para a decisão, assim dispõe:
"Art. 48. A Administração tem o dever de explicitamente emitir decisão nos processos administrativos e sobre solicitações ou reclamações, em matéria de sua competência.
Art. 49. Concluída a instrução de processo administrativo, a Administração tem o prazo de até trinta dias para decidir, salvo prorrogação por igual período expressamente motivada".
E, ainda, art. 41-A, §5º, da Lei 8.213/91 (incluído pela Lei n.º 11.665/2008), estabelece: "O primeiro pagamento do benefício será efetuado até quarenta e cinco dias após a data da apresentação, pelo segurado, da documentação necessária à sua concessão".
A par disso, ressalva-se que "os prazos acima, embora não se refiram exatamente ao agendamento inicial para a entrega de documentos com vistas à concessão ou revisão de benefício, traduzem um norte para a análise da demora no atendimento aos segurados. De nada adiantaria a lei estipular determinados prazos para a decisão e para o pagamento se eles pudessem ser contornados com subterfúgios, como, por exemplo, o de postergar o atendimento inicial, o exame de documentos ou a realização de perícias para data longínqua". (TRF4 5001598-29.2018.4.04.7208, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DE SC, Relator CELSO KIPPER, juntado aos autos em 19/12/2018)
No caso que ora se examina, verifica-se no evento 1, PADM9, que o benefício da parte-autora foi requerido em 10/08/2021. Passados mais de 90 dias, o impetrante ainda não havia obtido qualquer resposta acerca do seu requerimento administrativo, evidenciando, pois, a ilegalidade e negligência da autoridade.
É dizer, quando da impetração do mandado de segurança, o processo administrativo, já se arrastava por tempo superior ao previsto em lei, não sendo aceitável, portanto, diante da proteção constitucional que se dá ao direito de petição do cidadão, bem como ao direito à razoável duração do processo (art. 5º, inciso LXXVIII, CF) e o estabelecido nas Leis 9.784/99 e 8.213/91, a demora demasiada da administração em analisar o pedido formulado pelo impetrante, sem qualquer justificativa para tal, ainda que seja de conhecimento notório o elevado número do processos administrativos a serem analisados.
Nesse passo, registra-se que "independentemente dos motivos, o exercício dos direitos relativos à saúde, à previdência e à assistência social não pode sofrer prejuízo decorrente de demora excessiva na prestação do serviço público, devendo a questão ser analisada com base nos princípios da proporcionalidade e razoabilidade" (TRF4, 6ª Turma, Remessa Necessária n. 5023894-74.2015.4.04.7200, Relatora Desembargadora Federal Salise Monteiro Sanchotene, juntado aos autos em 09.06.2017).
Neste sentido:
PREVIDENCIÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. DEMORA NA ANÁLISE DO PROCESSO ADMINISTRATIVO. PRINCÍPIOS DA EFICIÊNCIA E DA RAZOABILIDADE. DIREITO FUNDAMENTAL À RAZOÁVEL DURAÇÃO DO PROCESSO E À CELERIDADE DE SUA TRAMITAÇÃO. ORDEM CONCEDIDA. 1. Não se desconhece o acúmulo de serviço a que são submetidos os servidores do INSS, impossibilitando, muitas vezes, o atendimento dos prazos determinados pelas Leis 9.784/99 e 8.213/91. Não obstante, a demora excessiva no atendimento do segurado da Previdência Social ao passo que ofende os princípios da razoabilidade e da eficiência da Administração Pública, bem como o direito fundamental à razoável duração do processo e à celeridade de sua tramitação, atenta, ainda, contra a concretização de direitos relativos à seguridade social. 2. A Lei n. 9.784/99, que regula o processo administrativo no âmbito federal, dispôs, em seu art. 49, um prazo de 30 (trinta) dias para a decisão dos requerimentos veiculados pelos administrados (prorrogável por igual período mediante motivação expressa). A Lei de Benefícios (Lei nº 8.213/91), por sua vez, em seu art. 41-A, §5º (incluído pela Lei n.º 11.665/2008), dispõe expressamente que o primeiro pagamento do benefício será efetuado até 45 (quarenta e cinco) dias após a data da apresentação, pelo segurado, da documentação necessária a sua concessão, disposição que claramente tem o escopo de imprimir celeridade ao procedimento administrativo, em observância à busca de maior eficiência dos serviços prestados pelo Instituto Previdenciário. Ademais, deve ser assegurado o direito fundamental à razoável duração do processo e à celeridade de sua tramitação (art. 5º, LXXVIII, da CF). 3. Mantida a sentença que estipulou o prazo de 10 dias para que a autoridade impetrada profira decisão quanto ao requerimento administrativo formulado pelo impetrante. (TRF4 5001598-29.2018.4.04.7208, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DE SC, Relator CELSO KIPPER, juntado aos autos em 19/12/2018).
Note-se, não infirma a presente conclusão a adoção de medidas pelo INSS, como a criação das CEABs (Resolução n. 691/PRES/INSS, de 25 de julho de 2019), da inserção da análise dos processos administrativos de requerimento inicial e de revisão de benefícios administrados pela autarquia no âmbito do Programa Especial instituído pela Lei n. 13.846/19 (Medida Provisória n. 891, de 05 de agosto de 2019), dentre outras, uma vez que, conquanto extremamente relevantes do ponto de vista da eficiência (art. 37, caput, da CF) e da economicidade (art. 70, caput, da CF) que se exige e se espera da Administração Pública, não possuem o condão de afastar a incidência das regras supracitadas.
Da mesma forma, o acordo homologado no RE 1171152 (STF, TRIBUNAL PLENO, Relator Ministro ALEXANDRE DE MORAES, julgado em 08/02/2021), como bem observado pela e. Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ na r. decisão proferida no AG 5013477-21.2021.4.04.0000, em 07/04/2021, "não obsta decisões judiciais em casos particularizados que envolvam direito individual, em que fique demonstrada a lesão a direito subjetivo líquido e certo, tendo em vista que ficou determinado o efeito vinculante somente sobre as ações coletivas já ajuizadas que tratem do mesmo objeto (cláusula 12.3), e sobre mandados de segurança coletivos (cláusula 12.4) (...)" (sem destaques no original). Nesse mesmo sentido: TRF4, AG 5012380-83.2021.4.04.0000, QUINTA TURMA, Relator ALTAIR ANTONIO GREGÓRIO, juntado aos autos em 29/03/2021; TRF4, QUINTA TURMA, AG 5013476-36.2021.4.04.0000, Relator Juiz Federal JOSÉ LUIS LUVIZETTO TERRA, juntado aos autos em 13/04/2021.
Por outro lado, quanto às alegações suscitadas pela Procuradoria Federal, da mesma forma, não assiste razão à autarquia quando invoca ofensa aos princípios da reserva do possível, da isonomia e da impessoalidade.
Quanto ao primeiro - princípio da reserva do possível -, reitere-se que o Supremo Tribunal Federal levou em consideração o "volume de casos acumulados", tendo dobrado o prazo inicialmente previsto de 45 (quarenta e cinco) dias (art. 41-A, § 5º, da Lei n. 8.213/91) para instrução e julgamento dos requerimentos de concessão/revisão de benefícios previdenciários. Tem-se, pois, como absolutamente razoável a fixação do prazo nonagesimal, tendo presente, de um lado, o direito do segurado ao benefício previdenciário e, de outro, a reserva do possível diante das limitações materiais da Administração.
Quanto aos princípios da isonomia e da impessoalidade, da mesma forma, compreendo que o presente provimento não revela ofensa, antes, preserva inegavelmente o respectivo núcleo essencial. Com efeito, a busca pelo acesso à justiça no legítimo exercício do direito fundamental à tutela jurisdicional adequada, eficaz e tempestiva (art. 5º, XXXV, da CF), impõe ao Poder Judiciário, como visto acima, importante papel concretizador, principalmente quando se tem em jogo a busca pelo cidadão da fruição de direito social destinado a assegurar meios indispensáveis à sua manutenção (art. 3º, caput, da Lei n. 8.212/91).
Tudo considerado, conclui-se que houve excesso de prazo pela autoridade impetrada quanto ao exame do requerimento administrativo formulado, razão pela qual deve ser concedida a segurança pleiteada.
Não há, de fato, qualquer reparo a ser feito no decisum, pois é ilegal e abusiva a conduta omissiva do órgão previdenciário que, sem apontar motivação relevante, impõe ao segurado a espera indefinida pela análise de seu procedimento administrativo.
Ante o exposto, voto por negar provimento à remessa oficial.
Documento eletrônico assinado por PAULO AFONSO BRUM VAZ, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40003204062v2 e do código CRC e246076a.Informações adicionais da assinatura:
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Remessa Necessária Cível Nº 5022062-78.2021.4.04.7205/SC
RELATOR: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
PARTE AUTORA: LORECI RODRIGUES FERREIRA PEREIRA (IMPETRANTE)
PARTE RÉ: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (INTERESSADO)
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. PEDIDO ADMINISTRATIVO. PRAZO RAZOÁVEL.
O processamento do pedido administrativo deve ser realizado em prazo razoável, independentemente dos eventuais percalços administrativos do INSS, que não podem vir em prejuízo do segurado, em virtude da necessidade de prestação do serviço público de modo adequado e eficiente.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia Turma Regional Suplementar de Santa Catarina do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, negar provimento à remessa oficial, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Florianópolis, 17 de maio de 2022.
Documento eletrônico assinado por PAULO AFONSO BRUM VAZ, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40003204063v2 e do código CRC 0a73c1c2.Informações adicionais da assinatura:
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 10/05/2022 A 17/05/2022
Remessa Necessária Cível Nº 5022062-78.2021.4.04.7205/SC
RELATOR: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
PRESIDENTE: Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ
PROCURADOR(A): WALDIR ALVES
PARTE AUTORA: LORECI RODRIGUES FERREIRA PEREIRA (IMPETRANTE)
ADVOGADO: CRISTINA GUTZ (OAB SC036062)
PARTE RÉ: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (INTERESSADO)
MPF: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL (MPF)
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 10/05/2022, às 00:00, a 17/05/2022, às 16:00, na sequência 241, disponibilizada no DE de 29/04/2022.
Certifico que a Turma Regional suplementar de Santa Catarina, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DE SANTA CATARINA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NEGAR PROVIMENTO À REMESSA OFICIAL.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
Votante: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
Votante: Desembargador Federal CELSO KIPPER
Votante: Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ
ALEXSANDRA FERNANDES DE MACEDO
Secretária
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