
Apelação Cível Nº 5004193-62.2021.4.04.9999/PR
RELATOR: Juiz Federal ARTUR CÉSAR DE SOUZA
APELANTE: CICERO APARECIDO GONCALVES
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RELATÓRIO
Trata-se de ação interposta por Cicero Aparecido Gonçalves requerendo a concessão de pensão por morte de sua companheira, Valdira dos Santos, ocorrida em 27/07/2019, sob a alegação de que comprovada a qualidade de trabalhadora rural ao tempo do óbito.
A sentença proferida em 17/12/2020, nos termos do art. 485, IV, do CPC, extinguiu o processo sem resolução de mérito, ante a ausência de prova material da qualidade de segurada da finada. Em razão da sucumbência, condenou a parte autora ao pagamento das despesas processuais e honorários advocatícios arbitrados em 10% do valor atualizado da causa, observada, entretanto, a gratuidade da justiça, a regra do art. 98, § 3°, do CPC.
Em suas razões de apelação, o autor sustentou a manutenção da qualidade de segurada especial da falecida até a data do seu óbito, devendo ser julgada procedente a ação, a contar desde então. Em caso contrário, requer a anulação da sentença, com a devolução dos autos a comarca de origem para, prosseguimento do feito e a instrução processual.
Oportunizada as contrarrazões, vieram os autos a esta Corte para julgamento.
É o relatório.
VOTO
DA PENSÃO POR MORTE
A concessão do benefício de pensão depende do preenchimento dos seguintes requisitos: 1º) a ocorrência do evento morte; 2º) a demonstração da qualidade de segurado do de cujus; 3º) a condição de dependente de quem objetiva a pensão.
Além disso, conforme o disposto no art. 26, I, da Lei nº 8.213/1991, referido benefício independe de carência, regendo-se pela legislação vigente à época do falecimento.
O reconhecimento da qualidade de segurado especial do finado depende, in casu, da comprovação do exercício de atividade de rural no período imediatamente anterior ao seu falecimento.
O segurado especial, condição prevista no art. 11, VII, da Lei n° 8.213/91, inclui-se entre os segurados obrigatórios da Previdência Social, sendo-lhe dispensado o recolhimento das contribuições para fazer jus ao benefício previdenciário.
Saliente-se que, embora o trabalhador rural denominado bóia-fria, volante ou diarista não esteja enquadrado no rol de segurados especiais referidos no inc. VII do art. 11 da Lei de Benefícios, a estes se equipara para fins de concessão de aposentadoria rural por idade ou instituição de pensão, consoante pacífica jurisprudência. Neste sentido:
PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. REDUÇÃO DA SENTENÇA AOS LIMITES DO PEDIDO. SALÁRIO-MATERNIDADE. SEGURADA ESPECIAL. BOIA-FRIA. CONTRIBUIÇÕES. 1. A sentença deve ser reduzida aos limites da exordial, tendo em vista não constar dela pedido de condenação da Autarquia ao pagamento de abono anual, nem decorrer este, por força de lei, do benefício postulado, tendo em vista que, em que pese o art. 120 do Dec. n. 3.048/99, em sua redação atual, preveja o abono no caso em tela, o Regulamento extrapolou a Lei de Benefícios, que não contém dita previsão (vide art. 40, que lista expressamente os casos em que há abono anual). 2. O trabalhador rural boia-fria deve ser equiparado ao segurado especial de que trata o art. 11, VII, da Lei de Benefícios, sendo-lhe dispensado, portanto, o recolhimento das contribuições para fins de obtenção de benefício previdenciário. (TRF4, AC 0016869-16.2010.404.9999, Sexta Turma, Relatora Eliana Paggiarin Marinho, D.E. 03/02/2011)
CASO CONCRETO
O óbito de Valdira dos Santos ocorreu em 27/07/2019.
A controvérsia está limitada à discussão acerca da qualidade de companheiro do autor, e da qualidade de segurada da de cujus por ocasião de seu falecimento.
No presente feito, entendo existir início de prova material no sentido de comprovar a qualidade de segurada da finada, bem como no tocante a união estável.
Consta nos autos os seguintes documentos:
- Certidão de óbito da "de cujus", onde o autor/companheiro foi o declarante do óbito, em 27/07/2019 (ev. 1.4);
- Declaração de óbito, onde a instituidora consta como trabalhadora rural (ev. 1.5);
- CTPS da falecida contendo vínculos rurais nos anos de 1990/1991 e 2006 (ev. 1.6)
- CTPS do autor com vínculo rural em 2014 e 2018 (ev. 1.6);
- Compovante de residência em comum do autor e da falecida (ev. 1.7);
- CNIS com concessão de auxílio doença acidente de trabalho em nome da "de cujus" de 11/09/2006 a 23/05/2017 (ev. 10.3).
- Resumo de tempo de cálculo da falecida, em atividade rural, constando 11 anos, 8 meses e 4 dias (ev. 12.2).
A comprovação do exercício de atividade rural se dá mediante o início de prova material, corroborada por prova oral (art. 55, § 3º, da Lei 8.213/91).
Da mesmo forma, a união estável também se comprova através de início de prova material, corroborada pela prova oral.
Observo que a parte autora, na petição inicial, pugnou pela produção de prova testemunhal. O juízo a quo, porém, considerou desnecessária a oitiva de testemunhas, por entender não haver início de prova material.
É pacífica a jurisprudência no sentido de que, em se tratando de segurado especial (art. 11, inciso VII, da Lei nº 8.213/91), é exigível início de prova material complementado por prova testemunhal idônea a fim de ser verificado o efetivo exercício da atividade rurícola, individualmente ou em regime de economia familiar.
A insuficiência da prova testemunhal, em face da sua fragilidade e precariedade, ficou consagrada na Súmula 149 do Superior Tribunal de Justiça e também no art. 55, § 3º, da Lei de Benefícios, a qual é flexibilizada apenas para os trabalhadores rurais bóias-frias.
Não obstante o art. 106 da Lei de Benefícios relacione os documentos aptos a essa comprovação, tal rol não é exaustivo, sendo certa a possibilidade de alternância das provas ali referidas. Desse modo, importa a apresentação de documentos que caracterizem o efetivo exercício da atividade rural, os quais não necessitam figurar em nome da parte autora para serem tidos como início de prova do trabalho rural, pois não há essa exigência na lei e, via de regra, nesse tipo de entidade familiar, os atos negociais são efetivados em nome do chefe do grupo familiar, geralmente o genitor.
Ademais, não se exige prova material plena da atividade rural em todo o período requerido, mas prova documental suficiente, ainda que inicial, o que vai ao encontro da realidade social no sentido de não inviabilizar a concessão desse tipo de benefício.
Verifica-se, no caso concreto, que a parte autora juntou início de prova material para comprovar a união estável, bem como a qualidade de segurada da falecida.
Desta forma, a fim de esclarecer os fatos do processo, entendo pela necessidade de anulação da sentença, a fim de que sejam os autos remetidos à origem e reaberta a instrução processual para fins de complementação da prova com a oitiva de testemunhas, quanto à união estável havida entre o apelante e a "de cujus", bem como o tempo de duração deste relacionamento até o advento do óbito da instituidora, além da comprovação da qualidade de segurada ao tempo do óbito, como trabalhadora rural, ou na eventualidade, da situação de desemprego, após a cessação do auxílio-doença, dentre outros esclarecimentos que se fizerem necessários.
CONCLUSÃO
Dar parcial provimento ao recurso da parte autora, para anular a sentença e remeter o processo ao primeiro grau para que seja reaberta a instrução e oportunizada a produção de prova testemunhal, para fins de comprovação da condição de companheiro do autoro e da qualidade de segurada da falecida.
DISPOSITIVO
Ante o exposto, voto por dar parcial provimento ao recurso da parte autora, para anular a sentença e determinar o retorno dos autos à origem, a fim de que seja reaberta a instrução probatória.
Documento eletrônico assinado por ARTUR CÉSAR DE SOUZA, Juiz Federal Convocado, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40002499187v21 e do código CRC 30538d6a.Informações adicionais da assinatura:
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Apelação Cível Nº 5004193-62.2021.4.04.9999/PR
RELATOR: Juiz Federal ARTUR CÉSAR DE SOUZA
APELANTE: CICERO APARECIDO GONCALVES
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. QUALIDADE DE SEGURADO ESPECIAL. UNIÃO ESTÁVEL. NECESSIDADE DE COMPROVAÇÃO. CERCEAMENTO DE DEFESA. ANULAÇÃO DA SENTENÇA.
1. A concessão do benefício de pensão depende do preenchimento dos seguintes requisitos: a) a ocorrência do evento morte, b) a demonstração da qualidade de segurado do de cujus e c) a condição de dependente de quem objetiva a pensão.
2. No caso, não foi oportunizada à parte autora a produção de provas da qualidade de segurado especial do instituidor, bem como quanto à união estável havida com o falecido.
3. Deve ser anulada a sentença, a fim de seja reaberta a fase instrutória, com a produção de prova testemunhal.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia Turma Regional Suplementar do Paraná do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, dar parcial provimento ao recurso da parte autora, para anular a sentença e determinar o retorno dos autos à origem, a fim de que seja reaberta a instrução probatória, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Curitiba, 04 de maio de 2021.
Documento eletrônico assinado por ARTUR CÉSAR DE SOUZA, Juiz Federal Convocado, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40002499188v7 e do código CRC e970e693.Informações adicionais da assinatura:
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO Virtual DE 27/04/2021 A 04/05/2021
Apelação Cível Nº 5004193-62.2021.4.04.9999/PR
RELATOR: Juiz Federal ARTUR CÉSAR DE SOUZA
PRESIDENTE: Desembargador Federal FERNANDO QUADROS DA SILVA
APELANTE: CICERO APARECIDO GONCALVES
ADVOGADO: DARIO SERGIO RODRIGUES DA SILVA (OAB PR056437)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 27/04/2021, às 00:00, a 04/05/2021, às 16:00, na sequência 191, disponibilizada no DE de 15/04/2021.
Certifico que a Turma Regional suplementar do Paraná, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DO PARANÁ DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DAR PARCIAL PROVIMENTO AO RECURSO DA PARTE AUTORA, PARA ANULAR A SENTENÇA E DETERMINAR O RETORNO DOS AUTOS À ORIGEM, A FIM DE QUE SEJA REABERTA A INSTRUÇÃO PROBATÓRIA.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Juiz Federal ARTUR CÉSAR DE SOUZA
Votante: Juiz Federal ARTUR CÉSAR DE SOUZA
Votante: Desembargador Federal FERNANDO QUADROS DA SILVA
Votante: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA
SUZANA ROESSING
Secretária
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