
Apelação Cível Nº 5018000-52.2021.4.04.9999/RS
RELATORA: Juíza Federal ADRIANE BATTISTI
APELANTE: VALDENIR GNOATTO
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RELATÓRIO
Valdenir Gnoatto interpôs recurso de apelação contra a decisão, proferida em 13/03/2020, que extinguiu a ação, sem resolução de mérito, nos seguintes termos:
Do exame dos autos, verifico que a pretensão da parte autora é obter a revisão do benefício com efeitos financeiros desde a data do primeiro requerimento administrativo de concessão de aposentadoria, ocorrido em 03.02.2012.
Contudo, naquela data (03.02.2012) o autor não postulou a conversão do tempo de labor especial em comum, tampouco juntou documentos (PPP ou laudos) que pudessem indicar que ele tivesse trabalhado em atividades especiais, inviabilizando, deste modo, a correta análise por parte do INSS.
Assim, embora na data de 14.07.2017 (vide PADM2 - EVENTO 9), o autor tenha buscado a revisão do benefício a partir da conversão do tempo de labor nas atividades especiais em tempo comum, a pretensão ajuizada não se reporta a tal processo administrativo, mas sim ao primeiro referente a 03.02.2012, no qual não houve pedido de reconhecimento da especialidade das funções.
Neste ponto, assume relevo as afirmações do INSS no sentido de que “a função indicada em CTPS - "servente" e "serviços gerais" (fls. 12 do PA) - NÃO permite o enquadramento por categoria profissional, demandando requerimento expresso do requerente para que seja reconhecida sua especialidade, com a apresentação dos documentos comprobatórios respectivos.”
Portanto, não havia possibilidade de o INSS “adivinhar” que o autor poderia ter laborado em atividades especiais, sem que tivesse ele postulado ou dado indícios mínimos de que assim o fizera.
Diante disso, mister o reconhecimento de que não há pretensão resistida, até porque o INSS não contestou o mérito da presente demanda, razão pela qual extingo o presente com fulcro no art. 485, inciso VI, do Código de Processo Civil.
Custas pela parte autora, cuja exigibilidade resta suspensa em razão da AJG que foi concedida.
Transitada em julgado, arquive-se com baixa.
Em sua apelação, a parte autora insurgiu-se contra a extinção da ação sem resolução de mérito, sob o argumento de que é dever da autarquia orientar o segurado no sentido de obter a documentação necessária ao correto cômputo dos períodos trabalhados, inclusive em relação ao tempo especial. Requereu a desconstituição da sentença, bem como o prosseguimento do feito para exame de mérito.
Apresentadas contrarrazões pela parte ré.
VOTO
Interesse de agir
O interesse de agir afigura-se como uma das condições da ação e a sua ausência enseja o indeferimento da inicial com a consequente extinção do feito sem resolução do mérito, a teor do que dispõem os artigos 17, 330, inciso III, e 485, inciso IV, todos do Código de Processo Civil.
O Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE nº 631.240/MG, em sede de repercussão geral, firmou a seguinte tese quanto ao Tema nº 350 (prévio requerimento administrativo como condição para o acesso ao Judiciário):
I - A concessão de benefícios previdenciários depende de requerimento do interessado, não se caracterizando ameaça ou lesão a direito antes de sua apreciação e indeferimento pelo INSS, ou se excedido o prazo legal para sua análise. É bem de ver, no entanto, que a exigência de prévio requerimento não se confunde com o exaurimento das vias administrativas;
II – A exigência de prévio requerimento administrativo não deve prevalecer quando o entendimento da Administração for notória e reiteradamente contrário à postulação do segurado;
III – Na hipótese de pretensão de revisão, restabelecimento ou manutenção de benefício anteriormente concedido, considerando que o INSS tem o dever legal de conceder a prestação mais vantajosa possível, o pedido poderá ser formulado diretamente em juízo – salvo se depender da análise de matéria de fato ainda não levada ao conhecimento da Administração –, uma vez que, nesses casos, a conduta do INSS já configura o não acolhimento ao menos tácito da pretensão;
IV – Nas ações ajuizadas antes da conclusão do julgamento do RE 631.240/MG (03/09/2014) que não tenham sido instruídas por prova do prévio requerimento administrativo, nas hipóteses em que exigível, será observado o seguinte: (a) caso a ação tenha sido ajuizada no âmbito de Juizado Itinerante, a ausência de anterior pedido administrativo não deverá implicar a extinção do feito; (b) caso o INSS já tenha apresentado contestação de mérito, está caracterizado o interesse em agir pela resistência à pretensão; e (c) as demais ações que não se enquadrem nos itens (a) e (b) serão sobrestadas e baixadas ao juiz de primeiro grau, que deverá intimar o autor a dar entrada no pedido administrativo em até 30 dias, sob pena de extinção do processo por falta de interesse em agir. Comprovada a postulação administrativa, o juiz intimará o INSS para se manifestar acerca do pedido em até 90 dias. Se o pedido for acolhido administrativamente ou não puder ter o seu mérito analisado devido a razões imputáveis ao próprio requerente, extingue-se a ação. Do contrário, estará caracterizado o interesse em agir e o feito deverá prosseguir;
V – Em todos os casos acima – itens (a), (b) e (c) –, tanto a análise administrativa quanto a judicial deverão levar em conta a data do início da ação como data de entrada do requerimento, para todos os efeitos legais.
(RE 631240, Relator(a): Min. ROBERTO BARROSO, Tribunal Pleno, julgado em 03/09/2014, ACÓRDÃO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-220 DIVULG 07-11-2014 PUBLIC 10-11-2014) - grifado
Assim, está assentado o entendimento da indispensabilidade do prévio requerimento administrativo de benefício previdenciário como pressuposto jurídico para que se possa acionar legitimamente o Poder Judiciário, o que não se confunde com o exaurimento daquela esfera.
Também em relação aos pedidos de revisão que necessitem de análise de matéria de fato ainda não levada ao conhecimento da Administração foi firmada posição no sentido da imprescindibilidade de prévio requerimento junto à autarquia previdenciária.
Desse modo, ainda que os pedidos de revisão em geral não necessitem de prévia provocação da autarquia previdenciária, já que o INSS tem o dever legal de conceder a prestação mais vantajosa possível, atente-se que, quando se trata de pretensão revisional baseada em documento ausente no processo administrativo referente à matéria de fato que não fora levada ao conhecimento da Administração, faz-se necessário o prévio requerimento para que se configure o interesse de agir.
Passa-se, pois, a análise do interesse de agir em relação aos períodos que foram objeto da extinção sem resolução do mérito nos autos.
O processo administrativo referente ao primeiro pedido de concessão do benefício (DER em 03/02/2012), não fora instruído com os documentos hábeis à comprovação do exercício de atividade em condições especiais.
Contudo, posteriormente, em pedido administrativo de revisão do benefício, realizado em 14/07/2017 (evento 9, PADM2), conforme referido na decisão do evento 12, o autor efetuou a juntada dos PPPs.
A regra geral para a data de início dos benefícios de aposentadoria por idade, tempo de serviço/contribuição e especial é a data da entrada do requerimento (DER), segundo dispõe o art. 49, inciso II, combinado com o art. 54 da Lei nº 8.213.
A formulação de pedido administrativo de revisão de aposentadoria, por óbvio, não acarreta a concessão de novo benefício, nem exige a renúncia ao benefício anterior. Tampouco o surgimento do direito ao benefício decorre da comprovação cabal da sua existência, sendo irrelevante que as provas tenham sido apresentadas somente por ocasião do pedido de revisão. Ora, se o segurado já havia cumprido todos os requisitos exigidos pela legislação para a concessão do benefício, o direito já estava aperfeiçoado e incorporado ao seu patrimônio jurídico no momento do primeiro pedido administrativo. Aliás, a prova do direito ao benefício não consiste em condição para o seu exercício, tanto que a apresentação de documentação incompleta não constitui motivo para a recusa do requerimento do benefício, consoante o art. 105 da Lei nº 8.213.
A propósito, cite-se julgado do Superior Tribunal de Justiça:
PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-DOENÇA ACIDENTÁRIO. REVISÃO DE BENEFÍCIO. RENDA MENSAL INICIAL. SALÁRIOS DE CONTRIBUIÇÃO. COMPROVAÇÃO POSTERIOR PELO EMPREGADO. EFEITOS FINANCEIROS DA REVISÃO. DATA DA CONCESSÃO DO BENEFÍCIO. 1. É assente no STJ o entendimento de que o termo inicial dos efeitos financeiros da revisão deve retroagir à data da concessão do benefício, uma vez que o deferimento da ação revisional representa o reconhecimento tardio de um direito já incorporado ao patrimônio jurídico do segurado, não obstante a comprovação posterior do salário de contribuição. Para o pagamento dos atrasados, impõe-se a observância da prescrição quinquenal. 2. Agravo Regimental não provido. (AgRg no AREsp 156.926/SP, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 29/05/2012, DJe 14/06/2012)
Desse modo, deve ser reconhecida a existência de interesse de agir em relação à pretensão de reconhecimento de atividade especial quanto aos períodos de 05/11/1985 a 01/09/1986 e 16/09/1991 a 03/02/2012.
Dispositivo
Em face do que foi dito, voto no sentido de dar provimento à apelação da parte autora para anular a sentença, bem como determinar a reabertura da fase instrutória.
Documento eletrônico assinado por ADRIANE BATTISTI, Juíza Federal Convocada, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40003462532v6 e do código CRC c6aa8dea.Informações adicionais da assinatura:
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Apelação Cível Nº 5018000-52.2021.4.04.9999/RS
RELATORA: Juíza Federal ADRIANE BATTISTI
APELANTE: VALDENIR GNOATTO
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSO CIVIL. INTERESSE DE AGIR. EFEITOS FINANCEIROS DA REVISÃO DO BENEFÍCIO.
1. Em 3 de setembro de 2019, o Supremo Tribunal Federal concluiu o julgamento do RE 631.240/MG e, em sede de repercussão geral, assentou entendimento no sentido da indispensabilidade do prévio requerimento administrativo como pressuposto para que se possa ingressar com ação judicial para o fim de obter a concessão de benefício previdenciário.
2. Nos casos em que se pretende prestação ou vantagem inteiramente nova ao patrimônio jurídico do autor, como regra, exige-se a demonstração de que o interessado já deduziu sua pretensão ao conhecimento da autarquia previdenciária e não obteve a resposta desejada. A falta de prévio requerimento administrativo de concessão deve implicar a extinção do processo judicial sem resolução de mérito, por ausência de interesse de agir.
3. Preenchidos os requisitos legais para a concessão do benefício na data do requerimento administrativo, desde então retroagem os efeitos da condenação em favor do segurado, ainda que a comprovação do direito tenha acontecido em momento distinto.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, dar provimento à apelação da parte autora para anular a sentença, bem como determinar a reabertura da fase instrutória, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 21 de setembro de 2022.
Documento eletrônico assinado por ADRIANE BATTISTI, Juíza Federal Convocada, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40003462533v5 e do código CRC 0fbc8c4e.Informações adicionais da assinatura:
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 13/09/2022 A 21/09/2022
Apelação Cível Nº 5018000-52.2021.4.04.9999/RS
RELATORA: Juíza Federal ADRIANE BATTISTI
PRESIDENTE: Desembargador Federal ROGER RAUPP RIOS
PROCURADOR(A): CÍCERO AUGUSTO PUJOL CORRÊA
APELANTE: VALDENIR GNOATTO
ADVOGADO: DARLEI ANTONIO FORNARI (OAB RS029656)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 13/09/2022, às 00:00, a 21/09/2022, às 16:00, na sequência 298, disponibilizada no DE de 01/09/2022.
Certifico que a 5ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 5ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DA PARTE AUTORA PARA ANULAR A SENTENÇA, BEM COMO DETERMINAR A REABERTURA DA FASE INSTRUTÓRIA.
RELATORA DO ACÓRDÃO: Juíza Federal ADRIANE BATTISTI
Votante: Juíza Federal ADRIANE BATTISTI
Votante: Juiz Federal ALEXANDRE GONÇALVES LIPPEL
Votante: Desembargador Federal ROGER RAUPP RIOS
LIDICE PEÑA THOMAZ
Secretária
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