
Apelação Cível Nº 5012744-02.2019.4.04.9999/RS
RELATOR: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: JUDITE PESSUTTO OMIZZOLO
RELATÓRIO
O Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) interpôs apelação contra sentença publicada em 20.11.2018 (evento 4, SENT16), na qual o magistrado de origem julgou procedente o pedido nos seguintes termos:
"8.- Dispositivo.
Isso posto, afasto a prejudicial de mérito e JULGO procedente o pedido formulado, para o efeito de (a) declarar o exercício de atividade rural, segurado especial, no período de 22/07/1981 a 03/04/1988; e (b) condenar o INSS a conceder à parte autora o benefício da aposentadoria por tempo de contribuição, nos termos da fundamentação e a contar de 22/07/2015.
As parcelas vencidas serão corrigidas/atualizadas pelos índices oficiais de remuneração básica e juros (a contar da citação) aplicados à caderneta de poupança (art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, com a redação que lhe foi dada pela Lei nº 11.960/2009) até 25/03/2015, momento em que o Supremo Tribunal Federal modulou os efeitos do julgamento da ADI nº 4357-DF, cujos créditos a partir desta data deverão sofrer juros pelo índice da poupança e corrigidos pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo Especial (IPCA-E).
O INSS arcará com o pagamento de 50% das custas processuais (é responsável pela totalidade delas, mas isento em metade, tendo em vista o julgamento da ADIN nº 70041334053, por órgão especial do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, que declarou inconstitucional a Lei 13.471/2010), mais honorários advocatícios ao patrono da parte adversa, em percentual que será definido por ocasião da liquidação da sentença, conforme disposto no art. 85, § 4º, inciso II, do NCPC, nos termos previstos nos incisos I a V, § 3º, do mesmo dispositivo legal.
Hipótese não sujeita a remessa necessária, ex vi do art. 496, § 3º, inciso I, do NCPC.
Publique-se. Registre-se. Intimem-se.
Interposta(s) apelação(ões), intime(m)-se o(s) apelado(s) para contrarrazões, querendo, no prazo legal. Havendo preliminares nas contrarrazões, intime(m)-se o(s) apelante(s) para manifestação, no prazo legal. Caso interposta apelação adesiva pelo apelado, intime-se o apelante para contrarrazões, querendo, no prazo legal.
Tudo cumprido, remetam-se os autos ao Tribunal Regional Federal da 4ª Região, na forma do artigo 1.010 do NCPC."
O INSS, em suas razões de apelação, defende não ser possível o reconhecimento da atividade rural em regime de economia familiar. Aponta que não há início de prova material. Alega que o período anterior a 11/1991 não pode ser computado como carência. Insurge-se em relação aos consectários legais, defendendo a aplicação da Lei n. 11.960/09. Sustenta ser hipótese de reexame necessário. Expende que possui isenção em relação às custas processuais (evento 4, APELAÇÃO17).
Presentes as contrarrazões (evento 4, CONTRAZ18), vieram os autos a este tribunal.
VOTO
Inexistência de hipótese de remessa oficial
De início, cabe salientar que as disposições do artigo 475 do antigo Código de Processo Civil não se aplicam às sentença proferidas após 18 de março de 2016, quando entrou em vigor o novo CPC (Lei nº 13.105/2015).
Conforme o artigo 29, §2º, da Lei nº 8.213/1991, o valor do salário de benefício não será inferior ao de um salário mínimo, nem superior ao do limite máximo do salário de contribuição na data de início do benefício.
De acordo com a Portaria Interministerial MTPS/MF nº 1, de 08 de janeiro de 2016, o valor máximo do salário de benefício e do salário de contribuição, a partir de 1º de janeiro de 2016, é de R$ 5.189,82 (cinco mil cento e oitenta e nove reais e oitenta e dois centavos).
No âmbito do Superior Tribunal de Justiça há entendimento sedimentado no sentido de que a sentença ilíquida está sujeita a reexame necessário (Súmula 490). Importa atentar, no entanto, que é excluída da ordem do duplo grau de jurisdição a sentença contra a União e respectivas autarquias e fundações de direito público que esteja a contemplar condenação ou proveito econômico na causa por valor certo e líquido inferior a 1.000 (mil) salários mínimos, por força do artigo 496, §3º, inciso I, do Código de Processo Civil.
Em ações de natureza previdenciária, o valor da condenação ou do proveito econômico à parte, com correção monetária e juros de mora, em nenhuma situação alcançará o valor de 1.000 (um mil) salários mínimos. É o que se dá mesmo na hipótese em que a renda mensal inicial (RMI) do benefício previdenciário deferido seja fixada no valor máximo (teto) e bem assim seja reconhecido o direito do beneficiário à percepção de parcelas em atraso, a partir daquelas correspondentes a 5 (cinco) anos que antecedem a propositura da ação (art. 103, parágrafo único da Lei nº 8.213/91).
Assim, no presente caso, não se pode fazer projeção alguma de montante exigível que legalmente releve a decisão proferida a reexame necessário.
Tempo de serviço rural anterior a 1991
Segundo o art. 55, § 2º, da Lei nº 8.213/1991, o tempo de serviço do segurado trabalhador rural, anterior à data de início de vigência da Lei, será computado independentemente do recolhimento das contribuições, exceto para efeito de carência. Não obstante o marco final estabelecido seja a entrada em vigor da Lei nº 8.213/1991, o Decreto nº 3.048/1999, no art. 127, inciso V, estendeu a possibilidade de aproveitamento do tempo rural até 31/10/1991.
O legislador ordinário não concedeu uma benesse aos trabalhadores rurais, ao permitir o cômputo de serviço anterior à Lei nº 8.213/1991, mesmo sem o recolhimento de contribuições previdenciárias; apenas concretizou a norma do inciso II do parágrafo único do art. 194 da Constituição de 1988, que assegurou a uniformidade e a equivalência dos benefícios e serviços aos trabalhadores urbanos e rurais. No regime anterior à Lei nº 8.213/1991, os trabalhadores rurais contavam somente com o Programa de Assistência ao Trabalhador Rural (PRORURAL) instituído pela Lei Complementar nº 11/1971. Os beneficiários do PRORURAL, além do trabalhador rural que exercia a atividade individualmente ou em regime de economia familiar, eram o empregado rural (contratado por produtor rural pessoa física ou jurídica), o avulso rural (contratado mediante a intermediação de sindicato ou órgão gestor de mão de obra) e o trabalhador rural eventual (volante, diarista ou boia-fria). Os benefícios oferecidos pelo PRORURAL não requeriam o pagamento de contribuições, porém eram limitados e tipicamente assistenciais, não prevendo a aposentadoria por tempo de serviço. A regra do § 2º do art. 55 da Lei nº 8.213/1991, assim, objetiva conciliar a substancial diferença entre o velho e o novo regime previdenciário, no tocante à contagem de tempo de serviço.
Além de todos os beneficiários do antigo PRORURAL, o § 2º do art. 55 da Lei nº 8.213/1991 abarca os membros do grupo familiar, visto que o art. 11, inciso VII, da Lei de Benefícios, define como segurado especial não só o produtor rural que exerce suas atividades individualmente ou em regime de economia familiar, mas também o cônjuge ou companheiro e filhos maiores de dezesseis anos ou a ele equiparados, desde que trabalhem, comprovadamente, com o grupo familiar respectivo.
No que concerne à comprovação do tempo de serviço rural, exige-se a apresentação de início de prova material contemporânea ao período a ser comprovado, complementada por prova testemunhal idônea, não sendo esta admitida, exclusivamente, a teor do art. 55, § 3º, da Lei nº 8.213/1991, REsp nº 1.321.493/PR, Rel. Ministro Herman Benjamin, Primeira Seção, julgado em 10/10/2012, DJe 19/12/2012 (recurso representativo da controvérsia) e Súmula nº 149 do STJ:
A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeito da obtenção de benefício previdenciário.
Cabe salientar, outrossim, que embora o art. 106 da Lei de Benefícios relacione os documentos aptos a essa comprovação, tal rol não é exaustivo.
Por outro lado, não se exige prova documental plena da atividade rural em relação a todos os anos integrantes do período correspondente à carência, mas início de prova material (como notas fiscais, talonário de produtor, comprovantes de pagamento do ITR ou prova de titularidade de imóvel rural, certidões de casamento, de nascimento, de óbito, certificado de dispensa de serviço militar, etc.) que, juntamente com a prova oral, possibilite um juízo de valor seguro acerca dos fatos que se pretende comprovar. Quanto aos meios de comprovação do tempo de atividade rural, o Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do REsp 1348633 SP, Rel. Ministro Arnaldo Esteves Lima, Primeira Seção, julgado em 28/08/2013, DJe 05/12/2014, firmou a seguinte tese (Tema 638):
Mostra-se possível o reconhecimento de tempo de serviço rural anterior ao documento mais antigo, desde que amparado por convincente prova testemunhal, colhida sob contraditório.
Ademais, tal entendimento restou sedimentado pelo Superior Tribunal de Justiça, na Súmula 577 (DJe 27/06/2016):
É possível reconhecer o tempo de serviço rural anterior ao documento mais antigo apresentado, desde que amparado em convincente prova testemunhal colhida sob o contraditório.
Aquela Egrégia Corte também consolidou entendimento no sentido de atribuir efeitos prospectivos ao início de prova material, reconhecendo-lhe '(...) eficácia probatória tanto para o período anterior quanto para o posterior à data do documento, desde que corroborado por robusta prova testemunhal' (AgInt no REsp 1606371/PR, Rel. Ministro Sérgio Kukina, Primeira Turma, julgado em 20/04/2017, DJe 08/05/2017).
No que tange aos documentos apresentados em nome de terceiros, sobretudo quando dos pais ou cônjuge, saliento que consubstanciam início de prova material do labor rural. Com efeito, o §1º do art. 11 da Lei de Benefícios define como sendo regime de economia familiar aquele em que os membros da família exercem 'em condições de mútua dependência e colaboração'. Via de regra, os atos negociais da entidade respectiva serão formalizados não individualmente, mas em nome do pater familiae, que é quem representa o grupo familiar perante terceiros, função esta, exercida, normalmente, no caso dos trabalhadores rurais, pelo genitor ou cônjuge masculino. Nesse sentido, a propósito, preceitua a Súmula nº 73 do Tribunal Regional Federal da 4ª Região:
Admitem-se como início de prova material do efetivo exercício de atividade rural, em regime de economia familiar, documentos de terceiros, membros do grupo parental.
Importante, ainda, destacar que não descaracteriza automaticamente a condição de segurado especial de quem postula o benefício o fato de o cônjuge exercer atividade outra que não a rural, pois, o inciso VII do art. 11 da Lei nº 8.213/1991 estipula que é segurado especial o produtor, o parceiro, o meeiro e o arrendatário rurais, o pescador artesanal e o assemelhado, que exerçam suas atividades, individualmente ou em regime de economia familiar, ainda que com o auxílio eventual de terceiros, bem como seus respectivos cônjuges ou companheiros e filhos maiores de 14 anos ou a eles equiparados, desde que trabalhem, comprovadamente, com o grupo familiar respectivo. Ou seja, somente será descaracterizado o regime de economia familiar caso reste comprovado que a remuneração proveniente do labor urbano do cônjuge importe em montante tal que dispense a renda do labor rural para a subsistência do grupo familiar.
Seguidamente, a autarquia previdenciária alega que os depoimentos e informações tomados na via administrativa apontam para a ausência de atividade agrícola no período de carência. Deve-se considerar as conclusões a que chegou o INSS, em âmbito administrativo, de modo a serem corroboradas pelo conjunto probatório produzido no feito judicial. Na existência de conflito entre as provas colhidas na via administrativa e aquelas produzidas em juízo, devem preponderar as últimas, uma vez que produzidas com todas as cautelas legais, diante da garantia do contraditório. Trata-se de situação na qual se deve prestigiar a imparcialidade que caracteriza a prova produzida no curso do processo jurisdicional. Dispondo de elementos que possam obstaculizar a pretensão da parte autora, cabe ao INSS judicializar a prova administrativa, a fim de que seja examinada no conjunto do acervo probatório constante dos autos.
Caso presente
No caso sob exame, foram apresentados, como início de prova material, dentre outros, os seguintes documentos:
1. Certidão do INCRA, em que consta que o pai da autora possui imóvel rural no período de 1965 a 2009 (evento 4, ANEXOSPET4, p. 15)
2. Certidão do registro de imóveis em que consta que o pai da autora havia adquirido meio lote rural do avô da autora (evento 4, ANEXOSPET4, p. 17)
3. Histórico escolar da autora relativa ao período de 1977 a 1983, emitido por escola municipal situada na localidade de Vila Flores (evento 4, ANEXOSPET4, p. 18-19)
4. Documento emitido pelo INSS em que consta que o pai da autora obteve aposentadoria rural por idade em 2001, tendo sido reconhecido como segurado especial pelo INSS (evento 4, ANEXOSPET4, p. 47)
5. Documento emitido pelo INSS em que consta que a mãe da autora obteve aposentadoria rural por idade em 2004, tendo sido reconhecida como segurada especial pelo INSS (evento 4, ANEXOSPET4, p. 48)
Desse modo, foi apresentado início de prova material contemporâneo ao período discutido (22.07.1981 a 03.04.1988). Os documentos juntados aos autos são hábeis à comprovação do exercício da atividade rural e evidenciam o desempenho da atividade rurícola como meio de subsistência do grupo familiar. Por outro lado, a prova documental em nome do pai da autora pode ser utilizada como início de prova material, já que a categoria de segurado especial caracteriza-se pelo trabalho dos membros da família em condições de mútua dependência e colaboração.
Por outra banda, os depoimentos colhidos em audiência de instrução (evento 8, VIDEO1, VIDEO2 e VIDEO3) confirmaram o relato da autora, destacando que ela trabalhou no campo, juntamente com sua família.
A testemunha Julcimar Antônio Detoni informa que conhece a autora desde uns 7/8 anos. Era vizinho da autora. Disse que a família da autora tinha umas terras, uma colônia. Disse que a autora trabalhava na terra com sua família. produziam milho, arroz, feijão, aipim. Vendiam quando sobrava. Disse que a autora estudava no colégio e também ajudava a família na lavoura. Plantava e cuidava dos bichos.
A testemunha Neusa Rita Cristianetti Pessutto esclarece que conheceu a autora desde criança. Disse que a família da autora tem terra, equivalente a uma colônia. Via a autora trabalhando na terra desde criança. Plantavam milho e um pouco de tudo. Tinham criação de porcos. Não tinham empregados nem maquinário. O grupo familiar dependia da agricultura. Disse que o pai, em um período curto, transportava leite produzido pela família. Vendia talvez para a Santa Clara. Disse que, depois, a autora foi trabalhar na Alpargatas, com talvez 20 anos de idade.
A testemunha Vilmar Cristianetti diz que conhece a autora desde criança. Eram vizinhos. Diz que a família da autora tinha uma colônia de terras. A autora trabalhava na agricultura juntamente com sua família. Plantavam tudo, tomate, feijão, milho. Tinham uns suínos. Vendiam o excedente. Via a autora trabalhando na terra, carpindo, dando comida para os animais, etc. De manhã, estudava, e, de tarde, trabalhava na terra. Lembra que a autora deve ter saído de lá com uns 18/20 anos. Foi trabalhar na Alpargatas. Durante um curto tempo, o pai da autora vendeu leite para a Santa Clara. Viviam da agricultura.
Não se exige que o início de prova material demonstre exaustivamente os fatos por todo o período requerido, firmando-se a presunção de continuidade do trabalho rurícola, desde que não exista período urbano intercalado com rural. A eficácia probatória do prova documental pode ser ampliada pela prova testemunhal, contanto que forneça subsídios relevantes quanto a datas, as tarefas desempenhadas pelo trabalhador, a forma e o local de prestação dos serviços.
Dessa maneira, deve ser reconhecido que a parte autora trabalhou na atividade rural, em regime de economia familiar, no período de 22.07.1981 a 03.04.1988.
Aposentadoria por tempo de serviço/contribuição
Examina-se a possibilidade de concessão da aposentadoria por tempo de contribuição.
Conversão do tempo especial em comum
É possível a conversão do tempo especial em comum, sendo irrelevante, nesse particular, o advento da MP nº 1.663, convertida na Lei nº 9.711/1998. Isso porque, após a última reedição dessa medida provisória, a norma se tornou definitiva sem a parte do texto que revogava o referido § 5º do art. 57 da Lei n. 8.213/91 - o qual autoriza a referida conversão.
Nessa linha, a Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do recurso especial repetitivo nº 1151363, em 23/03/2011, do qual foi Relator o Ministro Jorge Mussi, pacificou o entendimento de que é possível a conversão mesmo após 28/05/1998, nos seguintes termos:
PREVIDENCIÁRIO. RECONHECIMENTO DE ATIVIDADE ESPECIAL APÓS 1998. MP N. 1.663-14, CONVERTIDA NA LEI N. 9.711/1998 SEM REVOGAÇÃO DA REGRA DE CONVERSÃO.
1. Permanece a possibilidade de conversão do tempo de serviço exercido em atividades especiais para comum após 1998, pois a partir da última reedição da MP n. 1.663, parcialmente convertida na Lei 9.711/1998, a norma tornou-se definitiva sem a parte do texto que revogava o referido § 5º do art. 57 da Lei n. 8.213/91.
2. Precedentes do STF e do STJ.
Destarte, considerando que o §5º do art. 57 da Lei nº 8.213/91 não foi revogado expressa ou tacitamente pela Lei nº 9.711/98 e que, por disposição constitucional (art. 15 da Emenda Constitucional nº 20, de 15/12/1998), permanecem em vigor os artigos 57 e 58 da Lei de Benefícios até que a lei complementar a que se refere o art. 201, § 1º, da Constituição Federal, seja publicada, é possível a conversão de tempo de serviço especial em comum inclusive após 28/05/1998.
Por outro lado, o fator de conversão do tempo especial em comum a ser utilizado é aquele previsto na legislação vigente na data concessão do benefício - e não o contido na legislação vigente quando o serviço foi prestado. A propósito, a questão já foi pacificada pelo Superior Tribunal de Justiça em sede de Recurso Especial Repetitivo (REsp 1310034/PR, Rel. Ministro Herman Benjamin, Primeira Seção, julgado em 24/10/2012, DJe 19/12/2012), vindo-se a editar a seguinte tese:
A lei vigente por ocasião da aposentadoria é a aplicável ao direito à conversão entre tempos de serviço especial e comum, independentemente do regime jurídico à época da prestação do serviço.
Desse modo, cumpre observar as normas atualmente vigentes. Frise-se, nessa linha, que, desde o advento do Decreto nº 357/91 (art. 64) -- sucedido por diversos atos infralegais que não modificaram a regra --, o fator de conversão a ser observado é de 1,4 para o homem e de 1,2 para a mulher (considerando, em ambos os casos, o exercício de atividade que ensejaria a aposentadoria especial em 25 anos).
Requisitos para concessão de aposentadoria por tempo de serviço/contribuição
Por força da promulgação da Emenda Constitucional nº 20/98, em 16/12/1998, foram alteradas as regras inicialmente consagradas na Constituição Federal e na Lei nº 8.213/91 para a concessão de aposentadoria por tempo de serviço. Assim, a aposentadoria por tempo de serviço foi extinta, sendo instituídas novas regras para a concessão da agora chamada aposentadoria por tempo de contribuição.
Assinale-se, entretanto, que a referida emenda constitucional, em seu art. 3º, ressalvou o direito adquirido dos segurados que até a data de sua publicação haviam preenchidos os requisitos legais para a concessão de benefício previdenciário. Além disso, introduziu uma regra de transição (art. 9º), a qual assegura a concessão de aposentadoria por tempo de contribuição proporcional ou integral ao segurado filiado ao RGPS até a data de publicação dessa emenda.
Note-se que, para valer-se do tempo de serviço/contribuição ulterior, é necessária a submissão do segurado à nova legislação (regras de transição, no caso de aposentadoria proporcional; regras permanentes, no caso da aposentadoria integral, já que as regras de transição não são aplicáveis em relação a ela, como se verá alhures).
Em síntese, se o segurado se filiou à Previdência Social antes da vigência da EC nº 20/98 e conta tempo de serviço posterior àquela data, poderá trazer ao caso examinado a incidência de três hipóteses:
A) Das Regras Antigas, com limitação do tempo de serviço e carência em 16-12-98, para verificar o preenchimento das condições legais para a Aposentadoria por Tempo de Serviço, seja proporcional ou integral, cujo salário de benefício deverá ser calculado nos termos da redação original do art. 29 da Lei n. 8.213/91: exige-se o implemento da carência e do tempo de serviço mínimo de 25 anos para a segurada e 30 anos para o segurado, que corresponderá a 70% do salário de benefício, acrescido de 6% (seis por cento) para cada ano de trabalho que superar aquela soma, até o máximo de 100%, que dará ensejo à inativação integral (conforme previsto nos arts. 142, 52 e 53, I e II, todos da Lei n.º 8213/91);
B) Das Regras Permanentes (EC nº 20/98), sem qualquer restrição temporal pela legislação previdenciária, apenas com limitação na DER. A Aposentadoria por Tempo de Contribuição é devida ao segurado que, cumprindo a carência exigida, prevista no art. 142 da Lei nº 8.213/91, completar 35 anos de contribuição, se homem, e 30 anos de contribuição, se mulher;
C) Das Regras de Transição - Aposentadoria por Tempo de Contribuição proporcional ou integral, com o cômputo do tempo trabalhado até 28/11/1999, dia anterior à edição da lei do fator previdenciário (Lei nº 9876/99), cujo salário de benefício deverá ser calculado nos termos da redação original do art. 29 da Lei n.º 8.213/91. Para a inativação proporcional, é preciso o implemento da carência (art. 142 da Lei n.º 8213/91) e do tempo de contribuição mínimo de 25 anos, se mulher e 30 anos, se homem e, respectivamente, a idade mínima de 48 anos e 53 anos e, se for o caso, do pedágio de 20% para a aposentadoria integral ou 40% para a proporcional que, em 16/12/1998, faltava para atingir aquele mínimo necessário à outorga da inativação (art. 9.º, § 1.º, I, 'a' e 'b', da EC n.º 20/98), que corresponderá a 70% do salário de benefício, acrescido de 5% (cinco por cento) para cada ano de trabalho que superar aquela soma, até o máximo de 100%, que corresponderá à inativação integral (inciso II da norma legal antes citada). Ressalte-se, porém, que não se aplica a exigência da idade e do pedágio para a aposentadoria integral, porquanto mais gravosa ao segurado, entendimento, inclusive, do próprio INSS (Instrução Normativa INSS/DC n.º 57/2001), mantido nos regramentos subsequentes.
Importante lembrar que, independentemente do tempo encontrado, impõe-se a realização das simulações possíveis, uma vez que os salários de contribuição poderão variar nos períodos apurados e não necessariamente de um tempo de serviço mais reduzido advirá uma RMI menor.
Reconhece-se, portanto, o direito do segurado ao cálculo da RMI que lhe for mais vantajosa. Assim, caso o segurado preencha os requisitos para a concessão do benefício à luz das regras antigas, das regras permanentes e das regras de transição, a RMI do benefício deve ser calculada conforme as regras que lhe forem mais vantajosas. Não obstante, só há de se falar em direito adquirido ao melhor benefício se o segurado efetivamente preencher os requisitos para a aposentadoria em mais de um momento.
Caso presente
Considerando-se o tempo de serviço já contabilizado pelo INSS (evento 4, ANEXOSPET4, p. 2-3) e o período de atividade rural reconhecido nesta demanda, chega-se ao seguinte quadro:
Tempo já reconhecido pelo INSS | Anos | Meses | Dias | Carência |
Até 16/12/1998 | 0 | 0 | 0 | 0 |
Até 28/11/1999 | 0 | 0 | 0 | 0 |
Até a DER (22/07/2015) | 23 | 3 | 23 | 278 |
Período | Tempo | Fator | Tempo com fator | Conta para carência? | Carência |
22/07/1981 a 03/04/1988 | 6 anos, 8 meses e 12 dias | 1 | 6 anos, 8 meses e 12 dias | não | 0 |
Total | 6 anos, 8 meses e 12 dias | 0 |
Marco temporal | Tempo total | Carência | Idade | Pontos |
Até 16/12/1998 | 6 anos, 8 meses e 12 dias | 0 | 29 anos e 4 meses | - |
Até 28/11/1999 | 6 anos, 8 meses e 12 dias | 0 | 30 anos e 4 meses | - |
Até a DER (22/07/2015) | 30 anos, 0 mês e 5 dias | 278 | 46 anos e 0 mês | 76 |
Pedágio (Lei nº 9.876/99) | 7 anos, 3 meses e 28 dias |
Tempo mínimo para aposentação | 30 anos, 0 mês e 0 dia |
Em 16/12/1998 a autora não tinha direito à aposentadoria por tempo de serviço, ainda que proporcional (regras anteriores à EC 20/98), porque não preenchia o tempo mínimo de serviço (25 anos) e a carência (102 contribuições).
Posteriormente, em 28/11/1999, a autora não tinha direito à aposentadoria por tempo de contribuição porque não preenchia o tempo mínimo de contribuição (30 anos) e a carência (108 contribuições).
Por fim, em 22/07/2015 (DER), a autora tinha direito à aposentadoria integral por tempo de contribuição (regra permanente do art. 201, §7º, da CF/88). O cálculo do benefício deve ser feito de acordo com a Lei nº 9.876/99, com a incidência do fator previdenciário, uma vez que a pontuação totalizada é inferior a 85 pontos (MP 676/2015, convertida na Lei nº 13.183/2015).
Correção monetária e juros
Correção monetária
Após o julgamento, pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal, em regime de repercussão geral, do Tema 810 (RE n. 870.947), a que se seguiu, o dos embargos de declaração da mesma decisão, rejeitados e com afirmação de inexistência de modulação de efeitos, deve a atualização monetária obedecer ao Tema 905 do Superior Tribunal de Justiça, que estabelece para as condenações judiciais de natureza previdenciária:
As condenações impostas à Fazenda Pública de natureza previdenciária sujeitam-se à incidência do INPC, para fins de correção monetária, no que se refere ao período posterior à vigência da Lei 11.430/2006, que incluiu o art. 41-A na Lei 8.213/91.
Assim, a correção monetária das parcelas vencidas dos benefícios previdenciários será calculada conforme a variação dos seguintes índices, que se aplicam conforme a pertinente incidência ao período compreendido na condenação:
- IGP-DI de 05/96 a 03/2006 (art. 10 da Lei n.º 9.711/98, combinado com o art. 20, §§5º e 6º, da Lei n.º 8.880/94);
- INPC a partir de 04/2006 (art. 41-A da lei 8.213/91)
Tratando-se, por fim, da apuração de montante correspondente às parcelas vencidas de benefícios assistenciais, deve observar-se a aplicação do IPCA-E.
Juros moratórios
Os juros de mora, de 1% (um por cento) ao mês, serão aplicados a contar da citação (Súmula 204 do STJ), até 29 de junho de 2009. A partir de 30 de junho de 2009, os juros moratórios serão computados de forma equivalente aos aplicáveis à caderneta de poupança, conforme dispõe o art. 5º da Lei nº 11.960/09, que deu nova redação ao art. 1º-F da Lei nº 9.494/97.
Custas judiciais e despesas processuais
O INSS é isento do pagamento das custas na Justiça do Estado do Rio Grande do Sul (art. 5º, inciso I, da Lei Estadual/RS nº 14.634/2014, que instituiu a Taxa Única de Serviços Judiciais). Contudo, a isenção não exime a autarquia previdenciária da obrigação de reembolsar eventuais despesas processuais, tais como a remuneração de peritos e assistentes técnicos e as despesas de condução de oficiais de justiça (art. 4º, inciso I e parágrafo único, Lei nº 9.289/96; art. 2º c/c art. 5º, ambos da Lei Estadual/RS nº 14.634/2014).
Essa regra deve ser observada mesmo no período anterior à Lei Estadual/RS nº 14.634/2014, diante da redação conferida pela Lei Estadual nº 13.471/2010 ao art. 11 da Lei Estadual nº 8.121/1985 e da declaração de inconstitucionalidade da norma estadual que dispensou as pessoas jurídicas de direito público do pagamento das despesas processuais (ADIN estadual nº 70038755864). Desse modo, subsiste a isenção apenas em relação às custas.
No que diz respeito ao preparo e ao porte de remessa e retorno, as autarquias estão isentas por força de norma isentiva do CPC (art. 1007, caput e §1º).
Honorários advocatícios
Não há falar em majoração dos honorários advocatícios, uma vez que está sendo dado parcial provimento à apelação do INSS, para reconhecer a sua isenção em relação às custas processuais.
Implantação imediata do benefício
Considerando os termos do art. 497 do CPC, que repete dispositivo constante do art. 461 do antigo CPC, e o fato de que, em princípio, esta decisão não está sujeita a recurso com efeito suspensivo (TRF4, AC 2002.71.00.050349-7, Terceira Seção, Relator para Acórdão Celso Kipper, D.E. 01/10/2007), o julgado deve ser cumprido imediatamente, observando-se o prazo de trinta dias úteis para a implantação do benefício postulado.
Dispositivo
Em face do que foi dito, voto no sentido de dar parcial provimento à apelação do INSS, para reconhecer a sua isenção em relação às custas processuais, e, de ofício, determinar a implantação imediata do benefício e fixar os índices de correção monetária aplicáveis.
Documento eletrônico assinado por ADRIANE BATTISTI, Juíza Federal Convocada, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40002479671v15 e do código CRC 8de150e3.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): ADRIANE BATTISTI
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Apelação Cível Nº 5012744-02.2019.4.04.9999/RS
RELATOR: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: JUDITE PESSUTTO OMIZZOLO
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSO CIVIL. NÃO CONHECIMENTO DA REMESSA OFICIAL. SEGURADO TRABALHADOR RURAL. INÍCIO DE PROVA MATERIAL. SEGURADO TRABALHADOR RURAL. PERÍODO ANTERIOR À LEI Nº 8.213/1991. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO. CONSECTÁRIOS. ÍNDICES DE ATUALIZAÇÃO MONETÁRIA.
1. A remessa necessária não deve ser admitida quando se puder constatar seguramente que, a despeito da iliquidez da sentença, o proveito econômico obtido na causa será inferior a 1.000 (mil) salários (art. 496, § 3º, I, CPC) - situação em que se enquadram, invariavelmente, as ações destinadas à concessão ou ao restabelecimento de benefício previdenciário pelo Regime Geral de Previdência Social.
2. É legalmente indispensável a existência de início de prova material para a comprovação, mediante o depoimento de testemunhas, de tempo de atividade rural.
3. O tempo de serviço do segurado trabalhador rural, anterior à data de início de vigência da Lei nº 8.213/1991, será computado independentemente do recolhimento das contribuições, exceto para efeito de carência.
4. Se o segurado se filiou à Previdência Social antes da vigência da Emenda Complementar nº 20, de 15 de dezembro de 1998, e conta tempo de serviço posterior a esta data, deve-se examinar, para o fim de conceder-lhe o benefício mais vantajoso, o preenchimento dos requisitos para a aposentadoria por tempo de serviço, consideradas as regras anteriores à sua promulgação, para a aposentadoria por tempo de contribuição, pelas regras permanentes do novo regime então instituído, e, ainda, para a aposentadoria por tempo de contribuição, proporcional ou integral, pelas regras de transição.
5. Considerada a eficácia mandamental dos provimentos fundados no art. 497, caput, do Código de Processo Civil, e tendo em vista que a decisão não está sujeita, em princípio, a recurso com efeito suspensivo, é imediato o cumprimento do acórdão quanto à implantação do benefício devido à parte autora, a ser efetivado em 30 (trinta) dias.
6. A correção monetária incidirá a contar do vencimento de cada prestação e será calculada pelo INPC a partir de abril de 2006 (Medida Provisória n. 316, de 11 de agosto de 2006, convertida na Lei n.º 11.430, que acrescentou o artigo 41-A à Lei n.º 8.213), conforme decisão do Supremo Tribunal Federal no RE nº 870.947 e do Superior Tribunal de Justiça no REsp nº 1.492.221/PR.
7. Os juros de mora, de 1% (um por cento) ao mês, serão aplicados a contar da citação (Súmula 204 do Superior Tribunal de Justiça), até 29 de junho de 2009; a partir de então, os juros moratórios serão computados de acordo com os índices oficiais de remuneração básica e juros aplicados à caderneta de poupança, conforme dispõe o artigo 5º da Lei nº 11.960, que deu nova redação ao artigo 1º-F da Lei nº 9.494, conforme decisão do Supremo Tribunal Federal no RE nº 870.947 e do Superior Tribunal de Justiça no REsp nº 1.492.221/PR.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação do INSS, para reconhecer a sua isenção em relação às custas processuais, e, de ofício, determinar a implantação imediata do benefício e fixar os índices de correção monetária aplicáveis, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 18 de maio de 2021.
Documento eletrônico assinado por ADRIANE BATTISTI, Juíza Federal Convocada, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40002479672v4 e do código CRC 3f8f6364.Informações adicionais da assinatura:
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO Virtual DE 11/05/2021 A 18/05/2021
Apelação Cível Nº 5012744-02.2019.4.04.9999/RS
RELATORA: Juíza Federal ADRIANE BATTISTI
PRESIDENTE: Juiz Federal ALTAIR ANTONIO GREGORIO
PROCURADOR(A): ANDREA FALCÃO DE MORAES
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: JUDITE PESSUTTO OMIZZOLO
ADVOGADO: TIAGO AUGUSTO ROSSI (OAB RS078812)
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 11/05/2021, às 00:00, a 18/05/2021, às 14:00, na sequência 35, disponibilizada no DE de 30/04/2021.
Certifico que a 5ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 5ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DAR PARCIAL PROVIMENTO À APELAÇÃO DO INSS, PARA RECONHECER A SUA ISENÇÃO EM RELAÇÃO ÀS CUSTAS PROCESSUAIS, E, DE OFÍCIO, DETERMINAR A IMPLANTAÇÃO IMEDIATA DO BENEFÍCIO E FIXAR OS ÍNDICES DE CORREÇÃO MONETÁRIA APLICÁVEIS.
RELATORA DO ACÓRDÃO: Juíza Federal ADRIANE BATTISTI
Votante: Juíza Federal ADRIANE BATTISTI
Votante: Juiz Federal ALTAIR ANTONIO GREGORIO
Votante: Juíza Federal GISELE LEMKE
LIDICE PEÑA THOMAZ
Secretária
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