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EMENTA: PROCESSO CIVIL. TRIBUTÁRIO. LEGITIMIDADE PASSIVA DA UNIÃO. EMPREGADAS GESTANTES AFASTADAS POR FORÇA DA LEI 14. 151/2021. RESPONSABILIDADE PELO SALÁRIO. PROTEÇÃO DA MATERNIDADE PELA SEGURIDADE SOCIAL. ENQUADRAMENTO COMO SALÁRIO MATERNIDADE. POSSIBILIDADE DE COMPENSAÇÃO. TRF4. 5020652-85.2021.4.04.7107

Data da publicação: 19/10/2022, 07:01:05

EMENTA: PROCESSO CIVIL. TRIBUTÁRIO. LEGITIMIDADE PASSIVA DA UNIÃO. EMPREGADAS GESTANTES AFASTADAS POR FORÇA DA LEI 14.151/2021. RESPONSABILIDADE PELO SALÁRIO. PROTEÇÃO DA MATERNIDADE PELA SEGURIDADE SOCIAL. ENQUADRAMENTO COMO SALÁRIO MATERNIDADE. POSSIBILIDADE DE COMPENSAÇÃO. 1. 1. A legitimidade passiva é da União, considerando-se que a discussão jurídica de fundo é de natureza tributária, e que também pretende a compensação de valores atinentes ao recolhimento das contribuições previdenciárias pagas em decorrência do afastamento compulsório das trabalhadoras gestantes. A propósito: TRF4, Conflito de Competência 5037909-07.2021.4.04.0000, Corte Especial, fev/2022. 2, A Lei 14.151/2021 é omissa quanto à responsabilidade pelo pagamento da remuneração da gestante que, afastada de suas atividades presenciais, esteja impossibilitada de exercer suas tarefas de forma remota. 3. A ordem constitucional estabelece expressamente a proteção da maternidade pela Seguridade Social (art. 201, II), razão pela qual os ônus financeiros decorrentes do afastamento em questão devem ser suportados pela coletividade, e não pelo empregador. 4. É compatível com o ordenamento jurídico o enquadramento como salário maternidade dos valores pagos às trabalhadoras afastadas durante o período de emergência, sendo possível que as respectivas remunerações sejam compensadas, forte no art. 72, § 1º, da Lei 8.213/1991. (TRF4 5020652-85.2021.4.04.7107, SEGUNDA TURMA, Relatora MARIA DE FÁTIMA FREITAS LABARRÈRE, juntado aos autos em 11/10/2022)

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Otávio Francisco Caruso da Rocha, 300, 6º andar - Bairro: Praia de Belas - CEP: 90010-395 - Fone: (51) 3213-3161 - Email: gmfatima@trf4.jus.br

Apelação/Remessa Necessária Nº 5020652-85.2021.4.04.7107/RS

RELATORA: Desembargadora Federal MARIA DE FÁTIMA FREITAS LABARRÈRE

APELANTE: UNIÃO - FAZENDA NACIONAL (INTERESSADO)

APELADO: SINALSUL INDUSTRIA DE AUTO PECAS LTDA (IMPETRANTE)

ADVOGADO: JANE CRISTINA FERREIRA (OAB RS049135)

MPF: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL (MPF)

INTERESSADO: DELEGADO DA RECEITA FEDERAL DO BRASIL - UNIÃO - FAZENDA NACIONAL - CAXIAS DO SUL (IMPETRADO)

INTERESSADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (INTERESSADO)

INTERESSADO: GERENTE EXECUTIVO - INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS - CAXIAS DO SUL (IMPETRADO)

RELATÓRIO

O feito foi assim relatado na origem:

Trata-se de mandado de segurança impetrado por SINALSUL INDUSTRIA DE AUTO PECAS LTDA contra ato do GERENTE EXECUTIVO DO INSS EM CAXIAS DO SUL/RS e do DELEGADO DA RECEITA FEDERAL DO BRASIL EM CAXIAS DO SUL/RS, via pela qual busca seja declarado o direito de:

I. enquadrar como salário-maternidade ou autorizar o ressarcimento dos valores devidos às gestantes afastadas por força da Lei nº 14.151/2021, quando não for possível trabalho à distância, devido à função;

II. possibilitar a compensação dos valores correspondentes ao salário-maternidade pagos pela empresa a tais empregadas gestantes afastadas de suas atividades presenciais, quando do recolhimento das contribuições previdenciárias, nos termos do artigo 72, §1º, da Lei nº 8.213/91;

III. excluir da base de cálculo das contribuições previdenciárias patronais destinadas à previdência social e aos terceiros (Sistema S) os valores relativos ao salário-maternidade, decorrentes dos afastamentos pela Lei nº 14.151/2021.

Em sede liminar, requer seja assegurado o direito de:

I) enquadrar como salário-maternidade os valores pagos às gestantes afastadas por força da Lei nº 14.151/2021, haja vista as funções não comportarem o teletrabalho;

II) autorizar a compensação dos valores pagos pela empresa a tais empregadas, desde as competências dos afastamentos, quando do recolhimento das contribuições previdenciárias, nos termos do artigo 72, §1º, da Lei nº 8.213/91;

III) excluir da base de cálculo das contribuições previdenciárias patronais destinadas à previdência social e aos terceiros (Sistema S) os pagamentos feitos a esse título;

IV) estender tais determinações a outras empregadas que se verificarem nessa situação enquanto perdurar os efeitos da Lei nº 14.151/2021.

Em síntese, a impetrante refere que a Lei nº 14.151/21 determinou o afastamento das gestantes, especialmente quando suas funções se enquadram em trabalhos necessariamente realizados de forma presencial, ficando à disposição do empregador para exercer atividades por meio de teletrabalho, trabalho remoto ou outra forma de trabalho à distância, sem prejuízo da remuneração e enquanto perdurar a grave crise sanitária gerada pela Covid-19. Menciona que possui em seu quadro de funcionários diversas gestantes afastadas, que atuam no setor de montagem, na função de montadoras, a qual não comporta trabalho à distância. Aduz que a legislação foi omissa quanto à responsabilidade pelo pagamento da remuneração das empregadas gestantes que não podem desenvolver atividades remotas, razão pela qual os salários vêm sendo pagos normalmente pega empresa, com recolhimento de contribuição previdenciária patronal e de terceiros, sendo este o ato coator vergastado de ambas autoridades impetradas. Sustenta que o ônus pelo pagamento do benefício atribuído às empregadas gestantes não pode ser transferido para a empresa, mas sim para a coletividade, mediante adiantamento do salário-maternidade. Discorre acerca do direito postulado, defendendo, ao final, o preenchimento dos requisitos necessários ao deferimento da liminar e da posterior concessão da segurança.

Comprovado o recolhimento das custas (evento 3).

Indeferido o pedido liminar (evento 5, DESPADEC1).

No evento 15, PET1, o INSS manifestou interesse em ingressar no feito. Preliminarmente, invocou a inadequação da via eleita, a ilegitimidade da autoridade apontada como coatora, a incompetência da Justiça Federal para dirimir a controvérsia, a ilegitimidade do empregador para postular em favor das empregadas gestantes, bem como a ilegitimidade do INSS. No mérito, pugnou pela denegação da segurança.

No evento 17, PET1, a UNIÃO - FAZENDA NACIONAL requereu seu ingresso no feito e pugnou pela denegação da segurança.

O DELEGADO DA RECEITA FEDERAL DO BRASIL EM CAXIAS DO SUL/RS prestou informações no ​​​​​evento 18, INF_MSEG1, arguindo sua ilegitimidade passiva e a falta de interesse de agir do impetrante no tocante à declaração de direito à exclusão da base de cálculo das contribuições previdenciárias patronais e a terceiros, a título de salário-maternidade.

O GERENTE EXECUTIVO DO INSS EM CAXIAS DO SUL/RS prestou informações no evento 19, INF_MSEG1, defendendo preliminarmente a ilegitimidade passiva do INSS e a competência da Justiça do Trabalho para processo e julgamento da demanda e, no mérito, a denegação da segurança em razão da inexistência de direito líquido e certo.

O MPF deixou de se manifestar quanto ao mérito da demanda e opinou pelo regular processamento do feito (evento 22, PARECER1).

Vieram conclusos para sentença.

Devidamente instruído, sobreveio sentença com o seguinte dispositivo:

a) REJEITO as preliminares de inadequação da via eleita, de ilegitimidade ativa e de incompetência da Justiça Federal;

b) ACOLHO a preliminar de ilegitimidade passiva do Gerente Executivo do INSS em Caxias do Sul/RS e JULGO EXTINTO o feito, sem resolução de mérito, em relação ao referido impetrado (artigo 485, inciso VI, CPC);

c) e, no mérito, CONCEDO A SEGURANÇA, com fulcro no artigo 487, I, do CPC, para os efeitos de:

c.1) enquadrar como salário-maternidade os valores pagos às trabalhadoras gestantes contratadas pela impetrante e afastadas por força da Lei nº 14.151/21, quando não for possível o trabalho à distância devido à função, enquanto perdurarem suas razões, a vigência da lei, e a pandemia da Covid-19, nos termos do art. 394-A da CLT, art. 72 da Lei nº 8.213/91, o art. 201, II, e 203, I, da Constituição Federal e item 8 da Convenção nº 103 da OIT (Decreto nº 10.088/19);

c.2) autorizar a compensação dos valores pagos a ser efetivada quando do recolhimento das contribuições incidentes sobre a folha de salários e demais rendimentos pagos ou creditados, a qualquer título, à pessoa física que preste serviço à impetrante, nos exatos termos do artigo 72, §1º, da Lei nº 8.213/91;

c.3) declarar inexigível e determinar à impetrada que se abstenha de exigir da impetrante contribuições sociais (contribuição previdenciária patronal e SAT/RAT) e destinadas a terceiros incidentes sobre as referidas verbas pagas às trabalhadoras gestantes, afastadas por força da Lei nº 14.151/21, visto que enquadradas como salário-maternidade.

A compensação só poderá ser implementada após o trânsito em julgado da presente sentença (art. 170-A do CTN).

Condeno a União à restituição das custas processuais adiantadas pela parte autora, atualizadas pelo IPCA-E desde o pagamento (art. 82, §2º c/c art. 84 do CPC).

Sem honorários advocatícios (art. 25 da Lei nº 12.016/09).

Sentença sujeita ao duplo grau de jurisdição (art. 14, § 1.º, da Lei nº 12.016/2009).

Sentença publicada e registrada eletronicamente.

Intimem-se, inclusive o MPF.

Interposta apelação, intime-se a parte contrária para apresentar contrarrazões, querendo, no prazo legal. Vindas ou decorrido o prazo, remetam-se os autos ao Egrégio TRF da 4ª Região.

A União apelou, requerendo a reforma da sentença, para que seja reconhecida sua ilegitimidade passiva quanto ao pedido de pagamento de benefício previdenciário; no mais, requer seja reformada a sentença, julgando-se improcedentes os pedidos da impetrante.

Com contrarrazões, vieram os autos para julgamento.

O Ministério Público Federal manifestou-se pelo prosseguimento do feito, sem pronunciar-se sobre o mérito da causa.

É o relatório.

VOTO

Preliminar. Ilegitimidade passiva da União.

Não procede a prefacial, considerando que a discussão jurídica de fundo é de natureza tributária, pois também pretende a compensação de valores pagos em decorrência do afastamento compulsório das trabalhadoras gestantes. A propósito: TRF4, Conflito de Competência 5037909-07.2021.4.04.0000, Corte Especial, fev/2022.

Mérito

Embora já tenha me manifestado no sentido da improcedência do pedido autoral, estou revendo meu posicionamento para negar provimento ao presente apelo.

Não se discute que, pela letra da Lei nº 14.151/2021, a empregada gestante deverá permanecer afastada das atividades de trabalho presencial, sem prejuízo da remuneração, devendo exercer "as atividades em seu domicílio, por meio de teletrabalho, trabalho remoto ou outra forma de trabalho a distância."

No entanto, como é sabido, nem todas as atividades da empregada são passíveis de trabalho remoto, muitas delas só podem ser prestadas presencialmente, sem condições de afastamento físico.

Não parece, todavia, razoável imputar o custo decorrente da determinação do referido afastamento previsto na Lei nº 14.151/21 ao empregador.

O art. 201, II da Constituição Federal estabelece a proteção à maternidade pela seguridade social, de modo que eventuais ônus financeiros decorrentes do afastamento em questão devem ser suportados pela coletividade, e não pelo empregador.

A legislação, todavia, é omissa no tocante à responsabilidade pelo pagamento da remuneração da gestante que, afastada das atividades presenciais, esteja impossibilitada de exercer suas tarefas de forma remota.

Em recente decisão da Primeira Turma deste Tribunal, da relatoria do Des. Leandro Paulsen (TRF4, AG 5012750-28.2022.4.04.0000, juntado aos autos em 20/06/2022) questão idêntica a dos presentes autos foi decidida de acordo com a analogia (art. 4º da LINDB), como se pode verificar, a seguir:

A ordem constitucional estabelece expressamente a proteção da maternidade pela seguridade social (art. 201, II). Neste contexto, eventuais ônus financeiros decorrentes do afastamento em questão devem ser suportados pela coletividade, e não pelo empregador.

Aliás, o ordenamento jurídico já cuida de hipóteses assemelhadas, sendo legítimo que nos valhamos da analogia, no caso, porquanto é instrumento de integração normativa, nos termos do art. 4º da LINDB: "Quando a lei for omissa, o juiz decidirá o caso de acordo com a analogia, os costumes e os princípios gerais de direito".

A propósito, vale atentar para a previsão trazida no art. 394-A, § 3º, da Consolidação das Leis Trabalhistas:

Art. 394-A. Sem prejuízo de sua remuneração, nesta incluído o valor do adicional de insalubridade, a empregada deverá ser afastada de:

Art. 394-A. Sem prejuízo de sua remuneração, nesta incluído o valor do adicional de insalubridade, a empregada deverá ser afastada de: (Redação dada pela Lei nº 13.467, de 2017)

I - atividades consideradas insalubres em grau máximo, enquanto durar a gestação; (Incluído pela Lei nº 13.467, de 2017)

II - atividades consideradas insalubres em grau médio ou mínimo, quando apresentar atestado de saúde, emitido por médico de confiança da mulher, que recomende o afastamento durante a gestação; (Incluído pela Lei nº 13.467, de 2017) (Vide ADIN 5938)

III - atividades consideradas insalubres em qualquer grau, quando apresentar atestado de saúde, emitido por médico de confiança da mulher, que recomende o afastamento durante a lactação. (Incluído pela Lei nº 13.467, de 2017) (Vide ADIN 5938)

§ 1o (VETADO)

§ 2o Cabe à empresa pagar o adicional de insalubridade à gestante ou à lactante, efetivando-se a compensação, observado o disposto no art. 248 da Constituição Federal, por ocasião do recolhimento das contribuições incidentes sobre a folha de salários e demais rendimentos pagos ou creditados, a qualquer título, à pessoa física que lhe preste serviço. (Incluído pela Lei nº 13.467, de 2017)

§ 3o Quando não for possível que a gestante ou a lactante afastada nos termos do caput deste artigo exerça suas atividades em local salubre na empresa, a hipótese será considerada como gravidez de risco e ensejará a percepção de salário-maternidade, nos termos da Lei no 8.213, de 24 de julho de 1991, durante todo o período de afastamento. (destaquei)

Portanto, tenho que a solução para o caso passa pelo pagamento de salário maternidade para as gestantes durante o período de afastamento. Consequentemente, há que permitir que as respectivas remunerações sejam compensadas, forte no art. 72, § 1º, da Lei 8.213/1991, in verbis:

Art. 72. O salário-maternidade para a segurada empregada ou trabalhadora avulsa consistirá numa renda mensal igual a sua remuneração integral.

§ 1º Cabe à empresa pagar o salário-maternidade devido à respectiva empregada gestante, efetivando-se a compensação, observado o disposto no art. 248 da Constituição Federal, quando do recolhimento das contribuições incidentes sobre a folha de salários e demais rendimentos pagos ou creditados, a qualquer título, à pessoa física que lhe preste serviço.

Com efeito, "é compatível com o ordenamento jurídico o enquadramento como salário maternidade dos valores pagos às trabalhadoras afastadas durante o período de emergência, sendo possível que as respectivas remunerações sejam compensadas, forte no art. 72, § 1º, da Lei 8.213/91".

Merece, portanto, ser mantida a sentença que concedeu a segurança para enquadrar como salário maternidade os valores pagos às trabalhadoras gestantes afastadas por força da Lei 14.151/2021, enquanto durar o afastamento, aplicando-se tal determinação inclusive em relação às gravidezes vindouras durante o período de emergência e enquanto perdurarem os efeitos da lei, bem como para excluir os respectivos pagamentos da base de cálculo das contribuições previdenciárias patronais destinadas à previdência social e aos terceiros.

Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação e a remessa necessária.



Documento eletrônico assinado por MARIA DE FÁTIMA FREITAS LABARRÈRE, Desembargadora Federal Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40003410305v4 e do código CRC 89640648.Informações adicionais da assinatura:
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5020652-85.2021.4.04.7107
40003410305.V4


Conferência de autenticidade emitida em 19/10/2022 04:01:04.

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação/Remessa Necessária Nº 5020652-85.2021.4.04.7107/RS

RELATOR: Juiz Federal IVORI LUÍS DA SILVA SCHEFFER

APELANTE: UNIÃO - FAZENDA NACIONAL (INTERESSADO)

APELADO: SINALSUL INDUSTRIA DE AUTO PECAS LTDA (IMPETRANTE)

VOTO DIVERGENTE

A Lei n° 14.151, de 2021, que dispõe sobre o afastamento de empregadas gestantes das atividades laborais presenciais durante a emergência de saúde pública do novo coronavírus, assim previa em seu art. 1º (redação original):

Art. 1º Durante a emergência de saúde pública de importância nacional decorrente do novo coronavírus, a empregada gestante deverá permanecer afastada das atividades de trabalho presencial, sem prejuízo de sua remuneração.

O dispositivo foi alterado pela Lei 14.311, de 2022, passando a contar com a seguinte redação:

Art. 1º Durante a emergência de saúde pública de importância nacional decorrente do coronavírus SARS-CoV-2, a empregada gestante que ainda não tenha sido totalmente imunizada contra o referido agente infeccioso, de acordo com os critérios definidos pelo Ministério da Saúde e pelo Plano Nacional de Imunizações (PNI), deverá permanecer afastada das atividades de trabalho presencial.

Como se vê, a Lei 14.151, de 2021, estabelece que a empregada gestante afastada deve perceber remuneração, não fazendo menção ao pagamento de salário-maternidade.

De salientar que o texto inicial do Projeto de Lei n° 2.058, de 2021, que deu origem à Lei n° 14.311, de 2022, previa o pagamento de salário-maternidade, em substituição à remuneração, à empregada gestante sem imunização completa que fosse afastada de suas atividades. Confira-se:

Art. 2º O art. 1º da Lei nº 14.151, de 12 de maio de 2021, passa a vigorar com a seguinte redação:

“Art. 1º Durante a emergência de saúde pública de importância nacional decorrente do coronavírus SARS-CoV-2, a empregada gestante que ainda não tenha sido totalmente imunizada contra o referido agente infeccioso, de acordo com os critérios definidos pelo Ministério da Saúde e pelo Plano Nacional de Imunizações (PNI), deverá permanecer afastada das atividades de trabalho presencial.

(...)

§ 4º Na hipótese de a natureza do trabalho ser incompatível com a sua realização em seu domicílio, por meio de teletrabalho, trabalho remoto ou outra forma de trabalho a distância, a empregada gestante de que trata o caput deste artigo terá sua situação considerada como gravidez de risco até completar a imunização e receberá, em substituição à sua remuneração, o salário-maternidade, nos termos da Lei nº 8.213, de 24 de julho de 1991, desde o início do afastamento até 120 (cento e vinte) dias após o parto ou por período maior, nos casos de prorrogação na forma do inciso I do caput do art. 1º da Lei nº 11.770, de 9 de setembro de 2008

Todavia, o trecho do Projeto de Lei que previa o pagamento de salário-maternidade às empregadas gestantes afastadas foi vetado, de modo que a Lei n° 14.311, de 2022, não traz previsão alguma quanto à concessão do benefício.

Logo, além de restar claro que o legislador, ao criar a Lei n° 14.151, de 2021, não teve por objetivo a concessão de salário-maternidade às empregadas afastadas, tampouco a norma correlata posterior (Lei n° 14.311, de 2022) trouxe qualquer previsão neste sentido.

Ademais, o salário-maternidade está previsto no art. 71 da Lei n° 8.213, de 1991, como sendo devido à segurada da Previdência Social, durante 120 (cento e vinte) dias, com início no período entre 28 (vinte e oito) dias antes do parto e a data de ocorrência deste, observadas as situações e condições previstas na legislação no que concerne à proteção à maternidade, e no art. 392 da CLT, o qual estipula que "A empregada gestante tem direito à licença-maternidade de 120 (cento e vinte) dias, sem prejuízo do emprego e do salário", de modo que não é dado ao judiciário reconhecer extensão de benefício não prevista em lei, sob pena de atuar como legislador positivo, o que é vedado pela Constituição, que só lhe concede o atuar como legislador negativo. Quanto a isso, é pacífica a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (STF), de que o seguinte julgado é exemplo:

TRIBUTÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. IMPOSTO DE RENDA PESSOA FÍSICA. LEGISLAÇÃO QUE ESTABELECE LIMITES À DEDUÇÃO DE GASTOS COM EDUCAÇÃO. CONSTITUCIONALIDADE. IMPOSSIBILIDADE DE O PODER JUDICIÁRIO ATUAR COMO LEGISLADOR POSITIVO. PRECEDENTES. 1. A jurisprudência do STF é no sentido de que não pode o Poder Judiciário estabelecer isenções tributárias, redução de impostos ou deduções não previstas em lei, ante a impossibilidade de atuar como legislador positivo. 2. Assim, não é possível ampliar os limites estabelecidos em lei para a dedução, da base de cálculo do IRPF, de gastos com educação (AI 724.817-AgR, rel. Min. Dias Toffoli, Primeira Turma, DJe de 09-03-2012; e RE 603.060-AgR, rel. Min. Cármen Lúcia, Primeira Turma, DJe de 03-03-2011). 3. Agravo regimental a que se nega provimento (RE nº 606.179 AgR, 2ª T., rel. Min. Teori Albino Zavascki, DJe de 03-06-2013).

Ainda, cumpre ressaltar que o parágrafo único do art. 1°, da Lei n° 14.151, de 2021, disciplina que A empregada afastada nos termos do caput deste artigo ficará à disposição para exercer as atividades em seu domicílio, por meio de teletrabalho, trabalho remoto ou outra forma de trabalho a distância. Desta forma, não há como reconhecer o direito à fruição do benefício ao salário-maternidade à empregada considerada à disposição do empregador.

Por outro lado, o § 1º do referido art. 1º da Lei nº 14.151, de 2021, tanto na redação original como na que foi dada pela Lei nº 14.311, de 2022, estabelece que a empregada gestante afastada de suas atividades deve perceber remuneração.

Enfim, o mandado de segurança deve ser utilizado para corrigir ilegalidade praticada pela autoridade, e não para impugnar ato estritamente pautado pelo disposto em lei, como aqui ocorre.

Com essas razões, divirjo do relator, a fim de reformar a sentença, denegando-se o mandado de segurança.

Ante o exposto, voto por dar provimento à apelação e à remessa necessária.



Documento eletrônico assinado por RÔMULO PIZZOLATTI, Desembargador Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40003442879v5 e do código CRC d2e3c479.Informações adicionais da assinatura:
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Apelação/Remessa Necessária Nº 5020652-85.2021.4.04.7107/RS

RELATORA: Desembargadora Federal MARIA DE FÁTIMA FREITAS LABARRÈRE

APELANTE: UNIÃO - FAZENDA NACIONAL (INTERESSADO)

APELADO: SINALSUL INDUSTRIA DE AUTO PECAS LTDA (IMPETRANTE)

ADVOGADO: JANE CRISTINA FERREIRA (OAB RS049135)

MPF: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL (MPF)

INTERESSADO: DELEGADO DA RECEITA FEDERAL DO BRASIL - UNIÃO - FAZENDA NACIONAL - CAXIAS DO SUL (IMPETRADO)

INTERESSADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (INTERESSADO)

INTERESSADO: GERENTE EXECUTIVO - INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS - CAXIAS DO SUL (IMPETRADO)

EMENTA

PROCESSO CIVIL. TRIBUTÁRIO. LEGITIMIDADE PASSIVA DA UNIÃO. EMPREGADAS GESTANTES AFASTADAS POR FORÇA DA LEI 14.151/2021. RESPONSABILIDADE PELO SALÁRIO. PROTEÇÃO DA MATERNIDADE PELA SEGURIDADE SOCIAL. ENQUADRAMENTO COMO SALÁRIO MATERNIDADE. POSSIBILIDADE DE COMPENSAÇÃO.

1. 1. A legitimidade passiva é da União, considerando-se que a discussão jurídica de fundo é de natureza tributária, e que também pretende a compensação de valores atinentes ao recolhimento das contribuições previdenciárias pagas em decorrência do afastamento compulsório das trabalhadoras gestantes. A propósito: TRF4, Conflito de Competência 5037909-07.2021.4.04.0000, Corte Especial, fev/2022.

2, A Lei 14.151/2021 é omissa quanto à responsabilidade pelo pagamento da remuneração da gestante que, afastada de suas atividades presenciais, esteja impossibilitada de exercer suas tarefas de forma remota.

3. A ordem constitucional estabelece expressamente a proteção da maternidade pela Seguridade Social (art. 201, II), razão pela qual os ônus financeiros decorrentes do afastamento em questão devem ser suportados pela coletividade, e não pelo empregador.

4. É compatível com o ordenamento jurídico o enquadramento como salário maternidade dos valores pagos às trabalhadoras afastadas durante o período de emergência, sendo possível que as respectivas remunerações sejam compensadas, forte no art. 72, § 1º, da Lei 8.213/1991.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 2ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por maioria, vencido o Desembargador Federal RÔMULO PIZZOLATTI, negar provimento à apelação e a remessa necessária, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Porto Alegre, 06 de outubro de 2022.



Documento eletrônico assinado por MARIA DE FÁTIMA FREITAS LABARRÈRE, Desembargadora Federal Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40003410306v5 e do código CRC 8758ea53.Informações adicionais da assinatura:
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5020652-85.2021.4.04.7107
40003410306 .V5


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Poder Judiciário
Tribunal Regional Federal da 4ª Região

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 08/08/2022 A 16/08/2022

Apelação/Remessa Necessária Nº 5020652-85.2021.4.04.7107/RS

RELATORA: Desembargadora Federal MARIA DE FÁTIMA FREITAS LABARRÈRE

PRESIDENTE: Desembargador Federal RÔMULO PIZZOLATTI

PROCURADOR(A): PAULO GILBERTO COGO LEIVAS

APELANTE: UNIÃO - FAZENDA NACIONAL (INTERESSADO)

APELADO: SINALSUL INDUSTRIA DE AUTO PECAS LTDA (IMPETRANTE)

ADVOGADO: JANE CRISTINA FERREIRA (OAB RS049135)

MPF: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL (MPF)

Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 08/08/2022, às 00:00, a 16/08/2022, às 16:00, na sequência 304, disponibilizada no DE de 28/07/2022.

Certifico que a 2ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:

APÓS O VOTO DA DESEMBARGADORA FEDERAL MARIA DE FÁTIMA FREITAS LABARRÈRE NO SENTIDO DE NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO E A REMESSA NECESSÁRIA, NO QUE FOI ACOMPANHADA PELO JUIZ FEDERAL EDUARDO VANDRÉ OLIVEIRA LEMA GARCIA E A DIVERGÊNCIA INAUGURADA PELO DESEMBARGADOR FEDERAL RÔMULO PIZZOLATTI NO SENTIDO DE DAR PROVIMENTO À APELAÇÃO E À REMESSA NECESSÁRIA, O JULGAMENTO FOI SOBRESTADO NOS TERMOS DO ART. 942 DO CPC/2015.

Votante: Desembargadora Federal MARIA DE FÁTIMA FREITAS LABARRÈRE

Votante: Desembargador Federal RÔMULO PIZZOLATTI

Votante: Juiz Federal EDUARDO VANDRÉ OLIVEIRA LEMA GARCIA

MARIA CECÍLIA DRESCH DA SILVEIRA

Secretária

MANIFESTAÇÕES DOS MAGISTRADOS VOTANTES

Divergência - GAB. 21 (Des. Federal MARIA DE FÁTIMA FREITAS LABARRÈRE) - Desembargadora Federal MARIA DE FÁTIMA FREITAS LABARRÈRE.



Conferência de autenticidade emitida em 19/10/2022 04:01:04.

Poder Judiciário
Tribunal Regional Federal da 4ª Região

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 29/09/2022 A 06/10/2022

Apelação/Remessa Necessária Nº 5020652-85.2021.4.04.7107/RS

RELATORA: Desembargadora Federal MARIA DE FÁTIMA FREITAS LABARRÈRE

PRESIDENTE: Desembargador Federal RÔMULO PIZZOLATTI

PROCURADOR(A): PAULO GILBERTO COGO LEIVAS

APELANTE: UNIÃO - FAZENDA NACIONAL (INTERESSADO)

APELADO: SINALSUL INDUSTRIA DE AUTO PECAS LTDA (IMPETRANTE)

ADVOGADO: JANE CRISTINA FERREIRA (OAB RS049135)

MPF: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL (MPF)

Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 29/09/2022, às 00:00, a 06/10/2022, às 16:00, na sequência 4, disponibilizada no DE de 19/09/2022.

Certifico que a 2ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:

PROSSEGUINDO NO JULGAMENTO, A 2ª TURMA DECIDIU, POR MAIORIA, VENCIDO O DESEMBARGADOR FEDERAL RÔMULO PIZZOLATTI, NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO E A REMESSA NECESSÁRIA, NOS TERMOS DO VOTO DA RELATORA.

RELATORA DO ACÓRDÃO: Desembargadora Federal MARIA DE FÁTIMA FREITAS LABARRÈRE

Votante: Desembargadora Federal LUCIANE AMARAL CORRÊA MÜNCH

Votante: Juiz Federal ALEXANDRE ROSSATO DA SILVA ÁVILA

MARIA CECÍLIA DRESCH DA SILVEIRA

Secretária



Conferência de autenticidade emitida em 19/10/2022 04:01:04.

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