APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 5001506-93.2014.404.7207/SC
RELATOR | : | RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | JOSE NATAL ANDRADE |
ADVOGADO | : | MELISSA BARRETO OLIVEIRA FRANCALACCI |
MPF | : | MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL |
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. MANDADO DE SEGURANÇA. BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. CANCELAMENTO. ERRO ADMINISTRATIVO. BOA-FÉ. IMPOSSIBILIDADE DE DEVOLUÇÃO DOS VALORES. BENEFÍCIO DE VALOR MÍNIMO. DESCONTO. IMPOSSIBILIDADE. ART. 201, § 2º DA CF-88.
1. Esta Corte vem se manifestando no sentido da impossibilidade de repetição dos valores recebidos de boa-fé pelo segurado, dado o caráter alimentar das prestações previdenciárias, sendo relativizadas as normas dos arts. 115, II, da Lei nº 8.213/91, e 154, § 3º, do Decreto nº 3.048/99.
2. Consoante orientação das Turmas componentes da 3ª Seção desta Corte, não é possível o desconto de valores na renda mensal do benefício previdenciário se isso implicar redução à quantia inferior ao salário-mínimo, em atenção aos termos do artigo 201, § 2º, da Constituição Federal.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Colenda 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação e à remessa oficial, nos termos do relatório, votos e notas taquigráficas que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 28 de abril de 2015.
Des. Federal RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA
Relator
Documento eletrônico assinado por Des. Federal RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 7411187v2 e, se solicitado, do código CRC BA85F40A. | |
Informações adicionais da assinatura: | |
Signatário (a): | Ricardo Teixeira do Valle Pereira |
Data e Hora: | 30/04/2015 19:15 |
APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 5001506-93.2014.404.7207/SC
RELATOR | : | RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | JOSE NATAL ANDRADE |
ADVOGADO | : | MELISSA BARRETO OLIVEIRA FRANCALACCI |
MPF | : | MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL |
RELATÓRIO
JOSÉ NATAL ANDRADE impetrou mandado de segurança contra ato do Chefe da Agência do INSS em Imbituba-SC, com os seguintes pedidos (evento 1/1):
a) seja expedida, liminarmente, ordem ao Impetrado no sentido de cessar as cobranças realizadas na folha do pagamento do benefício nº 148.608.181-6, cobrar ou descontar qualquer valor a título de cobrança de valores recebidos pela impetrante referente ao benefício de nº 1357638652;
...
e) finalmente, que seja concedida definitivamente a ordem impetrada, para o fim de ser declarada a inexigibilidade do crédito que está sendo cobrado pelo INSS, face o caráter alimentar dos benefícios previdenciários, o recebimento dos valores de boa-fé e a sua irrepetibilidade, proibindo o desconto dos valores recebidos do benefício de aposentadoria de nº 148.608.181-6, bem como que seja restituído todo e qualquer desconto na folha de pagamento do impetrante a contar da data da impetração do presente processo, DEVENDO O INSS LHE DEVOLVER TODOS OS VALORES EVENTUALMENTE JÁ DESCONTADOS A CONTAR DA DATA DA IMPETRAÇÃO, ACRESCIDOS DE CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS DE MORA.
...
A liminar foi deferida por ocasião do julgamento do agravo de instrumento 5005449-11.2014.404.0000/SC nesta Corte.
Sobreveio sentença, cujo dispositivo possui este teor (evento 48):
Ante o exposto, torno definitiva a medida liminar deferida e CONCEDO A SEGURANÇA (art. 269, inc. I, do CPC) para determinar o cancelamento do desconto de 30% efetuado sobre a aposentadoria por idade NB 41/148.608.181-6 em razão dos valores recebidos na aposentadoria por idade NB 41/135.763.865-2, e condenar o INSS a restituir ao impetrante os valores descontados a partir do ajuizamento desta demanda (28/02/2014).
Sem honorários advocatícios (art. 25 da Lei nº 12.016/09).
Custas na forma da lei.
Comunique-se a autoridade coatora.
Cientifique-se o Ministério Público Federal.
Espécie sujeita ao reexame necessário (§1º do art. 14 da Lei nº 12.016/09).
...
Irresignado, o INSS interpôs recurso de apelação, requerendo (evento 58):
... seja a sentença reformada para o fim de admitir o prosseguimento da cobrança dos valores indevidamente recebidos pela parte-autora, ainda que de boa-fé.
O Ministério Público Federal opinou pelo desprovimento do recurso e do reexame necessário (evento 5 nesta instância).
É o relatório.
Des. Federal RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA
Relator
Documento eletrônico assinado por Des. Federal RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 7411185v2 e, se solicitado, do código CRC 1780E6D8. | |
Informações adicionais da assinatura: | |
Signatário (a): | Ricardo Teixeira do Valle Pereira |
Data e Hora: | 30/04/2015 19:15 |
APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 5001506-93.2014.404.7207/SC
RELATOR | : | RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | JOSE NATAL ANDRADE |
ADVOGADO | : | MELISSA BARRETO OLIVEIRA FRANCALACCI |
MPF | : | MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL |
VOTO
A fim de evitar tautologia, perfilho-me à sentença prolatada pelo Juiz Federal Rafael Martins Costa Moreira, adotando os seus fundamentos como razões de voto (evento 48):
Decadência
Não merece prosperar a prefacial suscitada pelo INSS em suas informações, uma vez que a consignação de débito na aposentadoria por idade NB 41/148.608.181-6 teve início na competência de 12/2013 (evento 03, HISCRE2, p. 2), ao passo que o ajuizamento da ação ocorreu em 28/02/2014, não tendo decorrido o lapso de 120 dias no interregno.
Ilegitimidade passiva da autoridade coatora apontada
A autarquia alega que o gerente da APS de Tubarão não praticou o ato que culminou na constituição regular do débito, defendendo a sua ilegitimidade passiva para a causa.
Contudo, a preliminar resta prejudicada, tendo em vista que declinação de competência a esta Subseção Judiciária de Laguna/SC.
Inadequação da via eleita e ausência de ato abusivo ou ilegal
Melhor sorte não assiste à parte impetrada em relação às preliminares invocadas.
Nesse sentido, a alegada inadequação da via eleita não merece prosperar diante da jurisprudência do TRF da 4ª Região, segundo a qual não é possível o desconto de valores na renda mensal do benefício previdenciário se isso implicar redução a quantia inferior ao salário-mínimo (AMS n.º 2005.71.04.002599-0/RS). Em sendo assim, como o caso dos autos trata de benefício de valor mínimo, desnecessária a dilação probatória para a comprovação da alegada boa-fé no recebimento dos valores recebidos irregularmente.
No tocante à ausência de ato abusivo ou ilegal por regularidade do débito, a preliminar se confunde com o próprio mérito da causa, e juntamente com ele será apreciada.
Mérito
No mérito, a medida liminar deve ser confirmada em sede de sentença.
A questão já foi devidamente analisada por ocasião da concessão da liminar na decisão monocrática proferida nos autos do Agravo de Instrumento n. 5005449-11.2014.404.0000 (evento 16), que foi mantida pela 5ª Turma do TRF da 4ª Região (evento 41), cujos fundamentos adoto como razões de decidir, a fim de evitar tautologia:
' Sobre a controvérsia posta nos presentes autos, registro que a Lei nº 8.213/1991, na hipótese de descontos de valores indevidamente pagos, incidentes sobre a renda mensal do benefício, estabelece o seguinte:
Art. 115. Podem ser descontados dos benefícios:
(...)
II - pagamento de benefício além do devido;
(...)
§ 1º Na hipótese do inciso II, o desconto será feito em parcelas, conforme dispuser o regulamento, salvo má-fé. (Renumerado pela Lei nº 10.820, de 17.12.2003)
(...)
Por sua vez, o Regulamento da Previdência - Decreto nº 3.048/1999 reza que:
Art. 154. O Instituto Nacional do Seguro Social pode descontar da renda mensal do benefício:
(...)
II - pagamentos de benefícios além do devido, observado o disposto nos §§ 2º ao 5º;
(...)
§ 2º A restituição de importância recebida indevidamente por beneficiário da previdência social, nos casos comprovados de dolo, fraude ou má-fé, deverá ser atualizada nos moldes do art. 175, e feita de uma só vez ou mediante acordo de parcelamento na forma do art. 244, independentemente de outras penalidades legais. (Redação dada pelo Decreto nº 5.699, de 2006)
§ 3º Caso o débito seja originário de erro da previdência social, o segurado, usufruindo de benefício regularmente concedido, poderá devolver o valor de forma parcelada, atualizado nos moldes do art. 175, devendo cada parcela corresponder, no máximo, a trinta por cento do valor do benefício em manutenção, e ser descontado em número de meses necessários à liquidação do débito. (grifei)
§ 4º Se o débito for originário de erro da previdência social e o segurado não usufruir de benefício, o valor deverá ser devolvido, com a correção de que trata o parágrafo anterior, da seguinte forma:
I - no caso de empregado, com a observância do disposto no art. 365; e
II - no caso dos demais beneficiários, será observado:
a) se superior a cinco vezes o valor do benefício suspenso ou cessado, no prazo de sessenta dias, contados da notificação para fazê-lo, sob pena de inscrição em Dívida Ativa; e
b) se inferior a cinco vezes o valor do benefício suspenso ou cessado, no prazo de trinta dias, contados da notificação para fazê-lo, sob pena de inscrição em Dívida Ativa. (...)
No presente caso, o impetrante obteve aposentadoria por idade rural (NB 135.763.865-2) com DIB em 11/10/2007, porém, em razão de suposto equívoco da autarquia no reconhecimento da condição de segurado especial (pescador), pela existência de vínculos urbanos em concomitância (evento 1/CARNE_INSS2 do processo originário), o benefício restou posteriormente cancelado, gerando um complemento negativo a ser descontado em parcelas mensais de 30% da aposentadoria por idade urbana concedida ao segurado (NB 148.608.181-6).
Ao que tudo indica, a hipótese em exame trata de pagamento a maior decorrente de erro da autarquia previdenciária ao conceder a aposentadoria por idade rural ao impetrante, não havendo qualquer comportamento doloso, fraudulento ou de má-fé por parte do segurado, que apresentou sua documentação para análise do INSS. Ainda que a percepção do amparo rural tenha sido indevida, seu pagamento provavelmente resultou de equívoco administrativo, para o qual o beneficiário não concorreu.
Em situações como a presente, registro que a esta Corte vem se manifestando no sentido da impossibilidade de repetição dos valores recebidos de boa-fé pelo segurado, dado o caráter alimentar das prestações previdenciárias, sendo relativizadas as normas dos arts. 115, II, da Lei nº 8.213/91, e 154, § 3º, do Decreto nº 3.048/99.
Vejamos:
PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. APOSENTADORIA POR IDADE. REVISÃO ADMINISTRATIVA. DECADÊNCIA. INOCORRÊNCIA. DEVIDO PROCESSO LEGAL. OBSERVÂNCIA. DESCONTO MENSAL NO BENEFÍCIO. IMPOSSIBILIDADE. CARÁTER ALIMENTAR DA VERBA.
1. No período anterior à Lei 9.784/99 não existia prazo decadencial para a revisão dos atos administrativos, embora seja razoável examinar a possibilidade de revisão à luz do princípio da segurança jurídica.
2. Para a Autarquia rever seus próprios atos, deve seguir o procedimento administrativo de revisão da concessão dos benefícios previdenciários, regulado pelo artigo 69 da Lei 8.212/91. Observada tal sistemática legal assecuratória do devido processo legal, mediante o contraditório e a ampla defesa, mostra-se intocável o ato revisional.
3. Havendo percepção de valores de boa-fé, padece de sedimento a pretensão da Autarquia que visa à não repetição das quantias pagas, já que a regra do artigo 154, §3º do decreto 3.048/99, deve ceder diante do caráter alimentar dos benefícios, a cujas verbas, conforme é sabido, é ínsita a irrepetibilidade.
(AC n°2008.71.99.004091-7/RS, Rel. Des. Federal Victor Luiz dos Santos Laus, 6ª Turma, D.E. 10/11/2008)
AGRAVO REGIMENTAL. DEVOLUÇÃO DE DIFERENÇAS RELATIVAS A PRESTAÇÃO ALIMENTAR. DESCABIDA.
1. O caráter eminentemente alimentar dos benefícios previdenciários faz com que tais benefícios, quando recebidos a maior em boa-fé, não sejam passíveis de devolução.
2. Agravo de instrumento provido.
(AI nº 2008.04.00.036811-7/RS, Rel. Des. Federal Luís Alberto D'Azevedo Aurvalle, Turma Suplementar, D.E. 08/01/2009)
PREVIDENCIÁRIO. PAGAMENTOS FEITOS INDEVIDAMENTE. DESCONTO DO BENEFÍCIO EM MANUTENÇÃO.
Dada a manifesta natureza alimentar do benefício previdenciário, a norma do inciso II do art. 115 da Lei nº 8.213/91 deve restringir-se às hipóteses em que, para o pagamento a maior feito pela Administração, tenha concorrido o beneficiário. Precedentes do STJ pela aplicação do princípio da irrepetibilidade ou não-devolução dos alimentos.
(AC nº 2007.72.16.000693-5/SC, Rel. Des. Federal Celso Kipper, 5ª Turma, D.E. 14/10/2008)
No mesmo sentido vem se manifestando o Superior Tribunal de Justiça, conforme se pode observar do seguinte precedente:
'AGRAVO REGIMENTAL. DEVOLUÇÃO DE DIFERENÇAS RELATIVAS A PRESTAÇÃO ALIMENTAR. DESCABIDA.
O caráter eminentemente alimentar dos benefícios previdenciários faz com que tais benefícios, quando recebidos a maior em boa-fé, não sejam passíveis de devolução.
Agravo regimental a que se nega provimento'.
(AgRg no Resp nº 705.249/SC, Rel. Ministro Paulo Medina, DJ de 20/02/2006)
Assim, havendo relevância na tese aventada pelo agravante, e sendo inquestionável o receio de dano, entendo recomendável a manutenção dos pagamentos até decisão final, suspendendo-se qualquer desconto decorrente da revisão administrativa.
Não bastasse isso, saliente-se que, no caso, também não se mostra possível a incidência de descontos sobre a renda mensal do benefício regularmente concedido ao segurado, uma vez que possui valor mínimo.
Com efeito, por força do disposto no artigo 201, § 2º, da Constituição Federal, que estabelece que 'nenhum benefício que substitua o salário de contribuição ou o rendimento do trabalho do segurado terá valor mensal inferior ao salário mínimo', o desconto efetuado pelo INSS, no caso de pagamento indevido de benefício previdenciário, não pode reduzir os proventos a valor inferior ao do salário mínimo, a fim de garantir ao segurado ou pensionista remuneração mensal que permita a manutenção de suas necessidades e de sua família, em respeito à dignidade da pessoa humana.
Nesse sentido, o entendimento deste Egrégio Tribunal:
PREVIDENCIÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. BENEFÍCIO DE VALOR MÍNIMO. DESCONTO. ART. 115, II, DA LEI 8.213/91. IMPOSSIBILIDADE. ART. 201, § 2º DA CF/88.
1. A teor do disposto no art. 115, II, da Lei 8.213/91, o INSS pode descontar da renda mensal do benefício os pagamentos efetuados além do devido, respeitando, quando o débito for originário de erro da Previdência Social, o limite de 30% do valor do benefício em manutenção, conforme os termos do art. 154, § 3º, do Decreto 3.048/99.
2. Ainda que respeitado o limite previsto em lei, os descontos que reduzam os proventos do segurado à quantia inferior ao salário mínimo ferem a garantia constitucional de remuneração mínima e atentam contra o princípio do respeito à dignidade da pessoa humana.
3. De acordo com a orientação das Turmas componentes da 3ª Seção desta Corte não é possível o desconto de valores na renda mensal do benefício previdenciário se isso implicar redução a quantia inferior ao salário-mínimo, em atenção aos termos do artigo 201, § 2º, da Constituição Federal.
(AMS n.º 2005.71.04.002599-0/RS, de minha relatoria, DJU de 28.6.2006)
AGRAVO DE INSTRUMENTO. PREVIDENCIÁRIO. LEI Nº 8.213/91. ART. 115, II. DESCONTOS. BENEFÍCIO DE VALOR MÍNIMO. CF, ART. 201, § 5º. FIXAÇÃO DE MULTA CONTRA A FAZENDA PÚBLICA. CPC, ART. 461, § 3º E 4º.
1. Não é possível o desconto dos valores indevidamente pagos ao segurado (Lei nº 8.213/91, art. 115, II), credor de benefício de valor mínimo, em face do art. 201, § 5º, da Constituição. Ante o conflito entre dois valores consagrados pela ordem jurídica, prevalece aquele mais caro aos fundamentos do Estado: a dignidade da pessoa humana.
2. Não há razão para fixação de astreinte contra a Administração Pública porque milita em favor dela a presunção de que cumprirá a decisão judicial, somente cabendo a aplicação de multa em caso de recalcitrância no descumprimento.
(AI n. 2000.04.01.021879-8/RS, rel. Des. Federal Nylson Paim de Abreu, relator para o acórdão Des.Federal Luiz Carlos de Castro Lugon, DJU de 20.9.2000)
No mesmo sentido os julgados: AC 200071010030832, 5ª Turma, julgado em 06-06-2002, Rel. Des. Fed. Paulo Afonso Brum Vaz e AG 200304010504292, 6ª Turma, julgado em 11-02-2004, Rel. Des. Fed. Nylson Paim de Abreu.
Ainda, vale transcrever o que o Desembargador Federal Luiz Carlos de Castro Lugon oportunamente observou no julgamento da AC nº 1999.04.01.005654-0, DJ de 18-07-01, verbis:
Perdurando o desconto dos valores indevidamente pagos à impetrante, estará sendo vilipendiado o princípio do valor mínimo e reduzida a supremacia da norma constitucional. Não se cuida de inconstitucionalidade da norma prevista no art. 115, II, da Lei nº 8.213/91, mas de aparente antinomia, que deve ser solucionada pela prevalência das regras e princípios constitucionais sobre as normas inferiores. Ante o conflito entre dois valores consagrados pela ordem jurídica, prevalece aquele mais caro aos fundamentos do Estado: a dignidade da pessoa humana. É certo que repugna à consciência jurídica de qualquer cidadão o enriquecimento sem causa, porém não se pode negar a esse mesmo cidadão as condições mínimas para a sua sobrevivência, diminuídas por um erro que a ele não pode ser atribuído, cometido unicamente pela administração. Destarte, deve ser restabelecido o pagamento do benefício da autora no valor de um salário mínimo, ficando vedada a realização de qualquer desconto que o reduza à importância inferior ao piso mínimo constitucional.'
Reitero que a jurisprudência do TRF da 4ª Região e do STJ orienta-se no sentido de que, estando de boa-fé o segurado, as parcelas são irrepetíveis, porque alimentares, e eventual fraude ou má-fé deve ser comprovada em processo judicial próprio, com a observância do contraditório e da ampla defesa (TRF4, AC 2004.72.07.004444-2, DJ 07.12.2007; STJ, AGARESP 201101841532, DJE 02/04/2012).
Portanto, diante da ilegalidade do ato da autoridade coatora, e não sobrevindo aos autos fato novo modificativo que pudesse alterar o entendimento adotado em sede de liminar, a procedência é medida que se impõe.
No tocante ao pedido de devolução dos valores indevidamente descontados, somente é possível o deferimento do pleito em relação aos descontos efetuados a partir da data de ajuizamento do presente writ (28/02/2014), uma vez que o mandado de segurança não é substitutivo de ação de cobrança. Nesse sentido é a Súmula nº. 271 do STF, in verbis:
'Concessão de mandado de segurança não produz efeitos patrimoniais, em relação a período pretérito, os quais devem ser reclamados administrativamente ou pela via judicial própria.'
A propósito:
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. MANDADO DE SEGURANÇA. BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. REDUÇÃO. BOA-FÉ. IMPOSSIBILIDADE DE DEVOLUÇÃO DOS VALORES. Esta Corte vem se manifestando no sentido da impossibilidade de repetição dos valores recebidos de boa-fé pelo segurado, dado o caráter alimentar das prestações previdenciárias, sendo relativizadas as normas dos arts. 115, II, da Lei nº 8.213/91, e 154, § 3º, do Decreto nº 3.048/99. O mandado de segurança não comporta efeitos patrimoniais pretéritos, nos termos das Súmulas 269 e 271 do STF. Sendo assim, deve o INSS pagar ao impetrante apenas as prestações vencidas desde a data da impetração do mandamus. (APELREEX 5002586-87.2012.404.7102, Quinta Turma do TRF4.ªR., Rel.ª Juíza MARIA ISABEL PEZZI KLEIN, D.E. 21/02/2013). (grifei)
Em conclusão, existente na hipótese direito líquido e certo a ser amparado em sede de mandado de segurança, é o caso de concessão da ordem, para determinar ao impetrado que se abstenha definitivamente de proceder à consignação de débito na aposentadoria por idade do impetrante (NB 41/148.608.181-6) em razão dos valores recebidos na aposentadoria por idade NB 41/135.763.865-2. Por conseguinte, deverá a autoridade coatora restituir ao impetrante os valores descontados a partir da data de ajuizamento do presente mandamus (28/02/2014), ressalvada a via ordinária para a repetição das parcelas anteriores ao ajuizamento.
Registre-se, a fim de prevenir oposição de embargos de declaração, que não se está a afirmar a inconstitucionalidade do artigo 115 da Lei 8.213/91, mas somente a reputar incabível a restituição dos valores recebidos de boa-fé, dado o caráter alimentar das prestações previdenciárias, sendo relativizadas as normas dos arts. 115, II, da Lei nº 8.213/91, e 154, § 3º, do Decreto nº 3.048/99 à luz do texto constitucional. Vale dizer, a hipótese é de interpretação da norma infraconstitucional à luz da Carta Maior.
Quando muito, poder-se-ia cogitar de interpretação conforme a Constituição, a propósito da qual já entendeu o Supremo Tribunal Federal que não se confunde com a declaração de inconstitucionalidade da norma a que se refere o art. 97 da Constituição. A propósito:
"I. Controle incidente de inconstitucionalidade: reserva de plenário (CF, art. 97). "Interpretação que restringe a aplicação de uma norma a alguns casos, mantendo-a com relação a outros, não se identifica com a declaração de inconstitucionalidade da norma que é a que se refere o art. 97 da Constituição.." (cf. RE 184.093, Moreira Alves, DJ 05.09.97). II. Citação por edital e revelia: suspensão do processo e do curso do prazo prescricional, por tempo indeterminado - C.Pr.Penal, art. 366, com a redação da L. 9.271/96.
1. Conforme assentou o Supremo Tribunal Federal, no julgamento da Ext. 1042, 19.12.06, Pertence, a Constituição Federal não proíbe a suspensão da prescrição, por prazo indeterminado, na hipótese do art. 366 do C.Pr.Penal.
2. A indeterminação do prazo da suspensão não constitui, a rigor, hipótese de imprescritibilidade: não impede a retomada do curso da prescrição, apenas a condiciona a um evento futuro e incerto, situação substancialmente diversa da imprescritibilidade.
3. Ademais, a Constituição Federal se limita, no art. 5º, XLII e XLIV, a excluir os crimes que enumera da incidência material das regras da prescrição, sem proibir, em tese, que a legislação ordinária criasse outras hipóteses.
4. Não cabe, nem mesmo sujeitar o período de suspensão de que trata o art. 366 do C.Pr.Penal ao tempo da prescrição em abstrato, pois, "do contrário, o que se teria, nessa hipótese, seria uma causa de interrupção, e não de suspensão." 5. RE provido, para excluir o limite temporal imposto à suspensão do curso da prescrição." (STF, 1ª Turma, RE 460971/RS, Relator Min. SEPÚLVEDA PERTENCE, julg. 13/02/2007, DJU, 30/03/2007, p. 76)
"Caderneta de poupança. Direito adquirido. Interpretação do artigo 17 da Medida Provisória nº 32/89 convertida na Lei 7.730/89. Redução do percentual da inflação aplicável ao caso. - Inexistência de ofensa ao artigo 97 da Constituição Federal. Com efeito, o acórdão recorrido não declarou a inconstitucionalidade do artigo 17, I, da Medida Provisória nº 32/89, convertida na Lei 7.730/89, mas, apenas, em respeito ao direito adquirido, o interpretou no sentido de que não se aplicava ele às cadernetas de poupança em que, antes da edição dela, já se iniciara o período de aquisição da correção monetária. Note-se que no controle difuso interpretação que restringe a aplicação de uma norma a alguns casos, mantendo-a com relação a outros, não se identifica com a declaração de inconstitucionalidade da norma que é a que se refere o artigo 97 da Constituição, e isso porque, nesse sistema de controle, ao contrário do que ocorre no controle concentrado, não é utilizável a técnica da declaração de inconstitucionalidade sem redução do texto, por se lhe dar uma interpretação conforme à Constituição, o que implica dizer que inconstitucional é a interpretação da norma de modo que a coloque em choque com a Carta Magna, e não a inconstitucionalidade dela mesma que admite interpretação que a compatibiliza com esta. - Falta de prequestionamento (súmulas 282 e 356) da questão constitucional relativa ao direito adquirido no que diz respeito à redução do percentual da inflação aplicável ao caso. Recursos extraordinários não conhecidos." (STF, 1ª Turma, RE 184093/SP, Relator Min. MOREIRA ALVES, julg. 29/04/1997, DJU 05/09/1997, p.41894)
Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação e à remessa oficial.
Des. Federal RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA
Relator
Documento eletrônico assinado por Des. Federal RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 7411186v2 e, se solicitado, do código CRC 536A5F6B. | |
Informações adicionais da assinatura: | |
Signatário (a): | Ricardo Teixeira do Valle Pereira |
Data e Hora: | 30/04/2015 19:15 |
EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 28/04/2015
APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 5001506-93.2014.404.7207/SC
ORIGEM: SC 50015069320144047207
RELATOR | : | Des. Federal RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA |
PRESIDENTE | : | Rogerio Favreto |
PROCURADOR | : | Dra. Solange Mendes de Souza |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | JOSE NATAL ANDRADE |
ADVOGADO | : | MELISSA BARRETO OLIVEIRA FRANCALACCI |
MPF | : | MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 28/04/2015, na seqüência 248, disponibilizada no DE de 30/03/2015, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 5ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO E À REMESSA OFICIAL.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Des. Federal RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA |
VOTANTE(S) | : | Des. Federal RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA |
: | Des. Federal ROGERIO FAVRETO | |
: | Des. Federal LUIZ CARLOS DE CASTRO LUGON |
Lídice Peña Thomaz
Diretora de Secretaria
Documento eletrônico assinado por Lídice Peña Thomaz, Diretora de Secretaria, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 7514963v1 e, se solicitado, do código CRC 5D797CDF. | |
Informações adicionais da assinatura: | |
Signatário (a): | Lídice Peña Thomaz |
Data e Hora: | 29/04/2015 12:53 |