APELAÇÃO CÍVEL Nº 5007448-62.2016.4.04.7102/RS
RELATOR | : | Des. Federal ROGER RAUPP RIOS |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELANTE | : | LUCIA ANGELA TREVISAN FREITAS |
ADVOGADO | : | MARION SILVEIRA REGO |
: | FABIANO PADOIN VIEIRA | |
APELADO | : | OS MESMOS |
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. REVISÃO. TETOS. EMENDAS CONSTITUCIONAIS 20/1998 E 41/2003. EFEITOS. BENEFÍCIO CONCEDIDO ANTES DA CONSTITUIÇÃO DE 1988. NECESSIDADE DE OBSERVÂNCIA DA LEGISLAÇÃO VIGENTE À ÉPOCA DA CONCESSÃO.
1. Fixado pelo Supremo Tribunal Federal o entendimento de que o limitador (teto) é elemento externo à estrutura jurídica dos benefícios previdenciários, o valor apurado para o salário de benefício integra o patrimônio jurídico do segurado, razão pela qual todo o excesso que não foi aproveitado em razão da restrição poderá ser utilizado sempre que for alterado o teto, adequando-se ao novo limite.
2. O STF não impôs restrição temporal relacionada à data de início do benefício, desde que haja proveito econômico decorrente das majorações do teto promovidas pelas ECs 20/98 e 41/2003; ou seja, nos casos em que o benefício do segurado tenha sido calculado em valor maior do que o limite de pagamento vigente.
3. Tendo em vista os princípios do tempus regit actum e da segurança jurídica, a decisão do Supremo não autoriza um regime híbrido de benefício - aplicando as melhores regras de um sistema e de outro. Assim, sempre considerando a época da concessão, a legalidade depende da observância das regras da Carta de 1988, na forma da Lei 8.213/91, ou do regime anterior, na forma das diversas legislações que vigoraram - LOPS (Lei 3.807/1960 e alterações pelo Decreto-lei 66/1966 e Lei 5.890/1973), CLPS/76 (Decretos 77.077/1976 e 83.080/1979) e CLPS/84 (Decreto 89.312/1984).
4. Portanto, a despeito da coincidência de nomes, nem o maior, e muito menos o menor valor-teto se confundem com o teto de contribuição e pagamento do atual RGPS. No atual regime, o teto é um limitador externo à estrutura jurídica do benefício, incidente somente depois de perfectibilizado o direito (RE 564.354). No regime anterior, porém, as figuras do menor e maior valor-teto eram internas e essenciais ao cálculo da renda mensal inicial (RMI) do benefício, esgotando sua função no próprio ato de concessão.
5. Com base nessas premissas, pode-se afirmar seguramente que o fato de o cálculo da RMI do benefício ter sofrido a incidência do menor valor-teto (mVT) não significa, de per si, que haverá proveito econômico decorrente das majorações do teto de pagamento do RGPS.
6. Por outro lado, mesmo que o salário-de-benefício do segurado não tenha superado o menor valor-teto na época da concessão, ainda assim poderá haver diferenças a serem incorporadas em decorrência das elevações no teto promovidas pelas Emendas 20/98 e 41/03. Isso ocorre especialmente quando o salário mínimo utilizado como divisor na aplicação do art. 58/ADCT está defasado em relação às competências que antecederam o mês de reajuste - repercutindo na sua expressão em número de salários mínimos.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, dar provimento ao apelo do INSS, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 13 de junho de 2017.
Des. Federal ROGER RAUPP RIOS
Relator
Documento eletrônico assinado por Des. Federal ROGER RAUPP RIOS, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 9010251v6 e, se solicitado, do código CRC E0493677. | |
Informações adicionais da assinatura: | |
Signatário (a): | Roger Raupp Rios |
Data e Hora: | 13/06/2017 18:45 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 5007448-62.2016.4.04.7102/RS
RELATOR | : | ROGER RAUPP RIOS |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELANTE | : | LUCIA ANGELA TREVISAN FREITAS |
ADVOGADO | : | MARION SILVEIRA REGO |
: | FABIANO PADOIN VIEIRA | |
APELADO | : | OS MESMOS |
RELATÓRIO
Trata-se de apelações contra sentença que julgou parcialmente procedente o pedido, nos seguintes termos:
Ante o exposto, rejeito a preliminar de legitimidade ativa e a prefacial de decadência, reconheço a prescrição das parcelas vencidas anteriormente a 16/09/2011, e julgo PARCIALMENTE PROCEDENTE o pedido, com resolução do mérito, nos termos do art. 487, I, do CPC/2015, para condenar o INSS a:
a) calcular e implantar a renda mensal atualizada com a aplicação dos novos tetos previstos nas EC nº 20/98 e 41/2003 no benefício da parte autora (NB 1766455180 DIB 25/04/2016), permitindo que agregue a parcela do salário-de-benefício limitado aos novos tetos;
b) pagar eventuais diferenças apuradas nas prestações vencidas, observada a prescrição das anteriores a 16/09/2011 (cinco anos retroativos do ajuizamento da ação), corrigidas monetariamente e acrescidas de juros moratórios, conforme os critérios fixados na fundamentação da sentença.
Mantenho o deferimento da gratuidade judiciária
Diante da sucumbência mínima da parte autora, condeno o INSS ao pagamento de honorários advocatícios em favor do patrono da parte autora, os quais arbitro nos percentuais mínimos fixados no art. 85 do CPC/2015, observando ainda o disposto nas Súmulas 76 do TRF da 4ª Região e 111 do STJ. A Autarquia é isenta de custas (art. 4º, I, da Lei 9.289/96). Deverá, contudo, reembolsar as despesas feitas pela parte autora (parágrafo único, do art. 4º da mesma Lei).
Defiro a reserva dos honorários contratuais (evento 1, PROCADM4, fl. 9).
Havendo recurso voluntário, intime-se a parte contrária para contrarrazões. Decorrido o prazo, apresentadas ou não as contrarrazões, remetam-se os autos ao TRF da 4° Região.
Não havendo interposição de recurso voluntário, encaminhem-se os autos à Contadoria para apuração do valor certo e líquido da condenação. Na hipótese de o valor ultrapassar o limite do art. 496, § 3º, I, do CPC/2015, os autos deverão ser enviados ao TRF da 4ª Região. Caso contrário, proceda-se na forma do art. 509, § 2º, do CPC/2015.
Com o trânsito em julgado, proceda-se nos termos do Título II do Livro I da Parte Especial do CPC/2015.
Requer a parte autora seja reconhecida a prescrição das parcelas anteriores a 05/06/2006 por força da Ação Civil Pública nº 0004911-28.2011.4.03.6183.
A Autarquia, por sua vez, requer a reforma da sentença sustentando a ilegitimidade da parte autora para pedido de revisão de benefício de outra pessoa. Quanto ao mérito, refere a decadência do direito de revisar o benefício, assim como a não interrupção da prescrição pelo ajuizamento da Ação Civil Pública nº 4911-28.2011.4.03.6183/SP. Refere a impossibilidade da revisão ora postulada. Por fim, afirma a aplicabilidade dos critérios definidos pela Lei 11960/2009, ao cálculo da correção monetária do débito judicial e requer o presquestionamento das disposições legais declinadas.
Com contrarrazões.
É o relatório.
VOTO
Inicialmente, importa referir que o apelo deve ser conhecido, por ser próprio, regular e tempestivo.
Ilegitimidade ativa
Sustenta a autarquia a ilegitimidade ativa ad causam da parte autora com relação ao pedido de pagamento das diferenças do benefício de aposentadoria especial titularizado pelo falecido.
Rejeito a alegação de ilegitimidade da parte autora para propositura da ação revisional uma vez que havendo indeferimento indevido, cancelamento indevido, ou mesmo pagamento a menor de benefício, a obrigação assume natureza puramente econômica, logo transmissível.
Acrescente-se, ainda, o fato da Lei nº 8.213/91 assegurar aos sucessores o direito a postular valores não recebidos em vida pelo segurado.
Art. 112. O valor não recebido em vida pelo segurado só será pago aos seus dependentes habilitados à pensão por morte ou, na falta deles, aos seus sucessores na forma da lei civil, independentemente de inventário ou arrolamento.
Assim sendo, a pensionista é dependente previdenciária habilitada, inclusive recebendo pensão por morte, tem legitimidade ativa para propor ação, em nome próprio, a fim de pleitear a revisão do benefício pertencente ao segurado finado que deu origem ao seu benefício atual, com reflexos neste, bem como o pagamento das diferenças decorrentes a que teria direito o segurado falecido em vida, visto que tal direito integra-se ao patrimônio do morto e transfere-se aos sucessores, por seu caráter econômico e não personalíssimo.
A propósito o seguinte precedente deste Regional, verbis:
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. LEGITIMIDADE ATIVA. REVISÃO. DECADÊNCIA. DIREITO ADQUIRIDO AO MELHOR BENEFÍCIO. RETROAÇÃO DO PERÍODO BÁSICO DE CÁLCULO. VIGÊNCIA DAS LEIS 6.950/1981 E 7.789/1981. ARTIGO 144 DA LEI 8.213/1991. NOVO TETO
1. Viúva que é dependente previdenciária habilitada, inclusive recebendo pensão por morte, tem legitimidade ativa para propor ação, em nome próprio, a fim de pleitear a revisão da aposentadoria por tempo de serviço pertencente ao segurado finado que deu origem ao seu benefício atual, com reflexos neste, bem como o pagamento das diferenças decorrentes a que teria direito o segurado falecido em vida, visto que tal direito integra-se ao patrimônio do morto e transfere-se aos sucessores, por seu caráter econômico e não personalíssimo. Inteligência do Art. 112 da Lei 8.213/91. Precedentes do STJ e desta Corte.
(...)
(TRF4, Apelação Cível Nº 5001276-02.2010.404.7107, 6ª TURMA, Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA, POR UNANIMIDADE, JUNTADO AOS AUTOS EM 07/04/2011)
Decadência
O prazo decadencial do art. 103 da Lei nº 8.213/1991 incide sobre alterações no ato de concessão do benefício e na espécie isto não é buscado. O que pretende a parte autora é a incidência imediata de novos tetos (introduzidos pelas Emendas Constitucionais 20/1998 e 41/2003) aos recebimentos mensais de seu benefício, assim não incidindo restrição a prazo sucessivamente reaberto pelos novos pagamentos.
Dessa forma, tendo em vista que o que pretende a parte autora não envolve a revisão do ato de concessão de seu benefício, não existe, neste caso, limite decadencial para que revise seu benefício.
Da prescrição quinquenal
Deixo de conhecer do apelo da autarquia no ponto em que sustentou a prescrição das parcelas das anteriores ao qüinqüênio da propositura do feito, uma vez que tal foi exatamente determinado pela sentença recorrida.
Em se tratando de beneficio previdenciário de prestação continuada a prescrição atinge apenas os créditos relativos às parcelas vencidas há mais de cinco anos da data do ajuizamento da ação.
Contudo, o ajuizamento da Ação Civil Pública nº 0004911-28.2011.4.03.6183, perante a 1ª Vara Federal Previdenciária de São Paulo, em 05/05/2011, tendo o mesmo objeto, interrompeu o prazo prescricional quinquenal, que somente voltará a correr após a ação coletiva transitar em julgado - inteligência dos arts. 202 e 203 do Código Civil de 2002.
Assim, estão prescritas apenas as parcelas anteriores a 05/05/2006 - cinco anos antes do ajuizamento da Ação Civil Pública nº 0004911-28.2011.4.03.6183, pelo que merece acolhida o recurso da parte autora.
Da revisão postulada
Requer a parte autora a revisão do benefício previdenciário, mediante a readequação da renda mensal aos novos limites de salário-de-contribuição estabelecidos pelas ECs 20/98 e 41/2003.
Sobre o tema cumpre referir que o Plenário do Supremo Tribunal Federal, no julgamento do Recurso Extraordinário nº 564354, tendo como relatora a Ministra Carmem Lúcia Antunes Rocha, entendeu, por maioria de votos "que só após a definição do valor do benefício é que se aplica o limitador (teto). Ele não faz parte do cálculo do benefício a ser pago. Assim, se esse limite for alterado, ele é aplicado ao valor inicialmente calculado". Em outras palavras, o teto, segundo tal interpretação, tem por função apenas limitar o valor do benefício previdenciário no momento de seu pagamento, não impedindo que o valor eventualmente glosado em virtude de sua incidência venha a ser, total ou parcialmente, considerado por ocasião de um aumento real do valor do teto, o que ocorreu por intermédio das Emendas Constitucionais 20/98 e 41/03.
O julgado foi assim ementado:
DIREITOS CONSTITUCIONAL E PREVIDENCIÁRIO. REVISÃO DE BENEFÍCIO. ALTERAÇÃO NO TETO DOS BENEFÍCIOS DO REGIME GERAL DE PREVIDÊNCIA. REFLEXOS NOS BENEFÍCIOS CONCEDIDOS ANTES DA ALTERAÇÃO. EMENDAS CONSTITUCIONAIS N. 20/1998 E 41/2003. DIREITO INTERTEMPORAL: ATO JURÍDICO PERFEITO. NECESSIDADE DE INTERPRETAÇÃO DA LEI INFRACONSTITUCIONAL. AUSÊNCIA DE OFENSA AO PRINCÍPIO DA IRRETROATIVIDADE DAS LEIS. RECURSO EXTRAORDINÁRIO A QUE SE NEGA PROVIMENTO.
1. Há pelo menos duas situações jurídicas em que a atuação do Supremo Tribunal Federal como guardião da Constituição da República demanda interpretação da legislação infraconstitucional: a primeira respeita ao exercício do controle de constitucionalidade das normas, pois não se declara a constitucionalidade ou inconstitucionalidade de uma lei sem antes entendê-la; a segunda, que se dá na espécie, decorre da garantia constitucional da proteção ao ato jurídico perfeito contra lei superveniente, pois a solução de controvérsia sob essa perspectiva pressupõe sejam interpretadas as leis postas em conflito e determinados os seus alcances para se dizer da existência ou ausência da retroatividade constitucionalmente vedada.
2. Não ofende o ato jurídico perfeito a aplicação imediata do art. 14 da Emenda Constitucional n. 20/1998 e do art. 5º da Emenda Constitucional n. 41/2003 aos benefícios previdenciários limitados a teto do regime geral de previdência estabelecido antes da vigência dessas normas, de modo a que passem a observar o novo teto constitucional.
3. Negado provimento ao recurso extraordinário.
(RE 564354, Rel. Min. CÁRMEN LÚCIA, Tribunal Pleno, julgado em 08-09-2010, REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-030 DIVULG 14-02-2011 PUBLIC 15-02-2011 EMENT VOL-02464-03 PP-00487)
Na linha de entendimento adotada pela Corte Suprema, o salário-de-benefício é o resultado da média corrigida dos salários-de-contribuição que compõem o período básico de cálculo, calculada nos termos da lei previdenciária e com a incidência do fator previdenciário, quando couber. Após, para fins de apuração da renda mensal inicial, o salário-de-benefício é limitado ao valor máximo do salário-de-contribuição vigente no mês do cálculo do benefício (art. 29, § 2º da Lei 8.213/91) e, ato contínuo, recebe a aplicação do coeficiente de cálculo relativo ao tempo de serviço/contribuição. Portanto, segundo o STF, o salário-de-benefício é preexistente à referida glosa.
Entrementes, o salário-de-benefício reflete o histórico contributivo do segurado, traduzindo, nos termos da lei, o aporte das contribuições vertidas ao longo de sua vida laboral. Assim, em princípio, a renda mensal inicial do benefício deveria corresponder ao valor do salário-de-benefício apurado, proporcional ao tempo de serviço/contribuição do segurado, e assim se manter, submetida à política de reajustes da Previdência Social.
Entretanto, a legislação previdenciária estabelece tetos que devem ser respeitados, no tocante tanto ao valor máximo da contribuição previdenciária que deve ser recolhida pelo segurado em cada competência (art. 28, § 5º, da Lei 8.212/91) como ao valor máximo de benefício a ser pago pela Previdência Social (artigos 29, § 2º, 33 e 41-A, § 1º, todos da Lei 8.213/91). Tais limites são fixados levando em consideração ser o salário-de-contribuição a principal base de cálculo das contribuições arrecadadas e, também, das prestações previdenciárias. Da escolha dos critérios técnicos e políticos para a fixação desses limites depende o equilíbrio atuarial do sistema de seguridade social.
Conclui-se, portanto, que, embora o segurado fizesse jus à percepção de benefício em montante superior ao limite estabelecido na Lei, pois lastreado em contribuições suficientes para tanto, não poderá receber da Seguradora contraprestação mensal em valor que exceda ao teto do salário-de-contribuição.
Deve-se observar, no entanto, que o entendimento manifestado pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento do Recurso Extraordinário 564354 é no sentido de que a restrição existe apenas para fins de pagamento, não havendo redução do salário-de-benefício, que, como se viu, é a própria média corrigida dos salários-de-contribuição integrantes do período básico de cálculo, com a incidência do fator previdenciário, quando couber. Assim, a equação original no momento da concessão fica inalterada: o salário-de-benefício, expressão do aporte contributivo do segurado, será sempre a base de cálculo da renda mensal a ser percebida em cada competência, respeitado o limite máximo do salário-de-contribuição então vigente.
Isto significa que, elevado o teto do salário-de-contribuição sem que tenha havido reajuste das prestações previdenciárias (como no caso das Emendas Constitucionais 20/1998 e 41/2003), ou reajustado em percentual superior ao concedido àquelas, o benefício recupera o que normalmente receberia se o teto à época fosse outro.
Em suma, nos termos delineados no RE 564.354, a revisão dos tetos promove uma readequação da renda natural que o benefício teria, posterior e possibilitada por uma majoração dos limites máximos de pagamento mensal.
Frisa-se, ainda, que o STF não impôs restrição temporal relacionada à data de início do benefício, desde que haja proveito econômico decorrente das majorações do teto promovidas pelas ECs 20/98 e 41/2003; ou seja, nos casos em que o benefício do segurado tenha sido calculado em valor maior do que o limite de pagamento vigente. Com base nisso, tanto esta Corte quanto o próprio Pretório Excelso, refutam a tese costumeiramente alegada pelo INSS no sentido de que o aludido direito somente se aplicaria às aposentadorias iniciadas a partir de 5 de abril de 1991 (RE 806.332 AgR, Rel. Min. Dias Toffoli; RE 937.565, Rel. Min. Luiz Fux; RE 959.061 AgR, Rel. Min. Edson Fachin; RE 915.305, Rel. Min. Teori Zavascki; e RE 998.396, Rel. Min. Rosa Weber, DJe 29/03/2017).
Contudo, tendo em vista os princípios do tempus regit actum e da segurança jurídica, acredito não haver voz dissonante nesta Corte de que a decisão do Supremo não autoriza um regime híbrido de benefício - aplicando as melhores regras de um sistema e de outro. Assim, sempre considerando a época da concessão, a legalidade depende da observância das regras da Carta de 1988, na forma da Lei 8.213/91, ou do regime anterior, na forma das diversas legislações que vigoraram - LOPS (Lei 3.807/1960 e alterações pelo Decreto-lei 66/1966 e Lei 5.890/1973), CLPS/76 (Decretos 77.077/1976 e 83.080/1979) e CLPS/84 (Decreto 89.312/1984).
Tal distinção é crucial porque, no contexto atual do RGPS, constituído pela Constituição Cidadã, o teto é um limite máximo tanto para contribuição quanto para o recebimento de benefício - tudo a um só tempo. Porém, no regime anterior, admitiam-se limites diferentes para o salário-de-contribuição e para o salário-de-benefício. O Limite Máximo do Salário-de-Contribuição (Dec. 89.312/1984, art. 135 c/c art. 211), pois, não se confundia e não tinha correspondência obrigatória com o Maior Valor-Teto do Salário-de-Benefício (Dec. 89.312/1984, art. 21 § 4º).
O que se infere das redações dos diplomas legais supramencionados é que somente existe a figura do Menor e Maior Valor-Teto (correspondentes a dez e vinte salários mínimos) por ocasião do cálculo da RMI do benefício. O menor valor-teto, com efeito, é referido apenas para apuração da chamada parcela básica do benefício e serve como substituto da expressão 'dez salários mínimos', incidindo sobre ele o coeficiente da espécie de aposentadoria.
A Lei 5.890/73, que alterou a Lei Orgânica da Previdência Social - LOPS, trouxe pela primeira vez a sistemática das parcelas básica e adicional, ambas necessárias para apuração da RMI dos benefícios:
Art. 5º Os benefícios a serem pagos sob a forma de renda mensal terão seus valores fixados da seguinte forma:
I - quando o salário de benefício for igual ou inferior a 10 (dez) vezes o maior salário mínimo vigente no País, aplicar-se-lhe-ão os coeficientes previstos nesta e na Lei nº 3.807, de 26 de agosto de 1960.
II - quando o salário de benefício for superior ao do item anterior, será ele dividido em duas parcelas: a primeira igual a 10 (dez) vezes o maior salário mínimo vigente no País; a segunda, será o valor excedente ao da primeira.
a) sobre a primeira parcela aplicar-se-ão os coeficientes previstos no item anterior;
b) sobre a segunda, aplicar-se-á um coeficiente igual a tantos 1/30 (um trinta avos) quantos forem os grupos de 12 (doze) contribuições acima de 10 (dez) salários mínimos, respeitado, em cada caso, o limite máximo de 80% (oitenta por cento) do valor da parcela.
III - o valor da renda mensal no caso do item anterior será a soma das parcelas calculadas na forma das alíneas 'a' e 'b', não podendo ultrapassar o valor correspondente a 90% (noventa por cento) de 20 (vinte) vezes o maior salário mínimo vigente no País.
Nada obstante, a CLPS/76 (Decreto 77.077/76), art. 225, § 3º, apenas substituiu as expressões '10 vezes o maior salário mínimo' por menor valor-teto e '20 vezes o maior salário mínimo' por maior valor-teto. A sistemática de cálculo, entretanto, foi mantida:
Art 28 O valor do benefício de prestação continuada será calculado da seguinte forma:
I - quando o salário-de-benefício for igual ou inferior ao menor valor-teto (artigo 225, § 3º), serão aplicados os coeficientes previstos nesta Consolidação;
II - quando for superior ao menor valor-teto, o salário-de-benefício será dividido em duas parcelas, a primeira igual ao menor valor-teto e a segunda correspondente ao que exceder o valor da primeira, aplicando-se:
a) à primeira parcela os coeficientes previstos no item I;
b) à segunda um coeficiente igual a tantos 1/30 (um trinta avos) quantos forem os grupos de 12 (doze) contribuições acima do menor valor-teto, respeitado, em cada caso, o limite máximo de 80% (oitenta por cento) do valor dessa parcela;
III - na hipótese do item II o valor da renda mensal será a soma das parcelas calculadas na forma das letras a e b , não podendo ultrapassar 90% (noventa por cento) do maior valor-teto (artigo 225, § 3º).
Como se vê, na sistemática então vigente, caso o salário-de-benefício fosse superior ao menor valor-teto (mais que 10 salários mínimos), o cálculo da renda mensal seria o resultado da soma de duas parcelas: a parcela básica, igual ao menor valor-teto e sobre a qual incide o coeficiente da espécie de benefício, conforme sua integralidade ou proporcionalidade; e a parcela adicional, correspondente ao valor excedente ao menor valor-teto multiplicado por tantos 1/30 quantos fossem os grupos de 12 contribuições acima do menor valor-teto, até o máximo de 80%.
Nesse contexto, o menor valor-teto (mVT) era etapa interna do cálculo do benefício - substituto da expressão dez salários mínimos -, jamais assumindo a função de limite máximo do salário-de-contribuição, do salário-de-benefício ou da renda mensal e pagamento do benefício. Isso fica evidente porque inúmeros benefícios foram deferidos com renda superior a ao mVT (soma das parcelas básica e adicional), sem que houvesse qualquer glosa.
Somente após a apuração da renda mensal - soma das parcelas básica e adicional - é que poderia haver a incidência de um limitador externo para fins de pagamento: 90% do valor do maior valor-teto (MVT) (CLPS/76, art.28, III).
Depreende-se, então, à luz da Constituição de 1988 e da decisão da Suprema Corte, que o teto atual do RGPS, enquanto limitador externo ao cálculo do benefício, incidindo sobre os salários-de-contribuição e sobre o pagamento mensal, não era unificado na vigência nos diplomas normativos do regime anterior. Apenas na CLPS/76 (Decreto 77.077/76), por exemplo, encontram-se fixados três limites máximos, não necessariamente relacionados:
SALÁRIO-DE-CONTRIBUIÇÃO: limitado em 20 (vinte) vezes o maior valor-de-referência (art. 138, I);
SALÁRIO-DE-BENEFÍCIO: limitado no maior valor-teto vigente na data do início do benefício (art. 26, § 4º c/c art. 225, § 3º);
RENDA/PAGAMENTO: o valor da renda mensal não pode ultrapassar 90% (noventa por cento) do maior valor-teto (art. 28, c/c art. 225, § 3º).
Portanto, a despeito da coincidência de nomes, nem o maior, e muito menos o menor valor-teto se confundem com o teto de contribuição e pagamento do atual RGPS. Como já se disse, no atual regime, o teto é um limitador externo à estrutura jurídica do benefício, incidente somente depois de perfectibilizado o direito (RE 564.354). No regime anterior, porém, as figuras do menor e maior valor-teto eram internas e essenciais ao cálculo da renda mensal inicial (RMI) do benefício, esgotando sua função no próprio ato de concessão.
Com base nessas premissas, pode-se afirmar seguramente que o fato de o cálculo da RMI do benefício ter sofrido a incidência do menor valor-teto (mVT) não significa, de per si, que haverá proveito econômico decorrente das majorações do teto de pagamento do RGPS.
Por outro lado, mesmo que o salário-de-benefício do segurado não tenha superado o menor valor-teto na época da concessão, ainda assim poderá haver diferenças a serem incorporadas em decorrência das elevações no teto promovidas pelas Emendas 20/98 e 41/03. Isso ocorre especialmente quando o salário mínimo utilizado como divisor na aplicação do art. 58/ADCT está defasado em relação às competências que antecederam o mês de reajuste - repercutindo na sua expressão em número de salários mínimos.
A propósito, cumpre lembrar que, por força do art. 58/ADCT, todos os benefícios concedidos antes de 5 de outubro de 1988 (promulgação da CF), foram recompostos da seguinte forma: suas rendas mensais foram transformadas em número equivalente de salários mínimos na data da concessão e pagos desta forma, sem qualquer limitação, até a implantação dos planos de custeio e benefício.
Como é sabido, tal regra vigorou entre 5 de abril de 1989 (§ único do art. 58/ADCT) até 9 de dezembro de 1991 (publicação do RPS, aprovado pelo Decreto nº 357/1991). Entretanto, a partir da regulamentação e vigência plena da Lei 8.213/91, em dezembro de 1991, houve a limitação dos pagamentos e das rendas mensais ao teto estabelecido por esta norma (arts. 33 e 41, §3º), mantendo-se sobre esta renda limitada os reajustes subsequentes.
Logo, a partir dessa regra de transição que surge uma das hipóteses de aplicação do RE 564.354 aos benefícios concedidos antes da CF/88. Isso porque tanto os benefícios anteriores à CF/88 quanto o teto do salário-de-contribuição receberam o mesmo índice de reajuste em janeiro de 1992. Assim, por exemplo, se, por força do ADCT, o segurado vinha recebendo uma renda de 14,8 salários mínimos em dezembro de 1991, em janeiro de 1992 sua renda foi substituída por 10 salários mínimos - o teto de pagamento fixado pela nova Lei. Como consequência, os reajustes subsequentes não levaram em consideração a renda histórica a que faria jus o beneficiário, mas tão somente o limite imposto pelo teto de pagamento - situação que o precedente do STF busca corrigir.
No caso concreto, o benefício originário tem início (DIB) em 01/03/1985 e verifica-se que a autora pretende a evolução de seu salário-de-benefício integral/global, sem consideração da sistemática da parcela básica e adicional (evento 1, CALC2, e INIC1, pgs. 8/9). Além de implicar em recálculo da renda inicial e afronta à decadência, o que foi rechaçado pelo STF no RE 564.354, tal providência caracterizaria regime híbrido, porque desconsidera a sistemática de menor e maior valo-teto, que vigia à época da concessão, e aplica indistintamente as regras que só foram estatuídas com o advento da Lei 8.213/91.
É nesse contexto que se insere o parecer da contadoria da Subseção Judiciária de Porto Alegre, proferido em vários processos atinentes à matéria:
Desta forma, se simplesmente levássemos em conta o salário-de-benefício multiplicado pelo coeficiente (80%) em detrimento das sistemáticas da parcela 'básica' e da parcela 'adicional', estaríamos desconsiderando os dispositivos legais da época.
Em relação à parcela 'adicional', deve-se ter em mente que a mesma leva em conta que no cálculo de RMI da aposentadoria só são considerados os 36 (trinta e seis) últimos salários-de-contribuição de um período não superior a 48 meses. Considerando que o tempo total de contribuição de um segurado pode variar de 25 até 35 anos de contribuição, dependendo da espécie da aposentadoria e do sexo do segurado,a sistemática da parcela 'adicional' visava agregar à conta efeitos do tempo total em que o segurado contribuiu acima do menor valor teto durante sua vida contributiva, ao invés de simplesmente levar em conta o período das 36 últimas contribuições.
Desta forma, caso desprezássemos a proporcionalidade da parcela adicional, estaríamos igualando o segurado que durante 30 (trinta) anos contribuiu acima do menor valor teto com aquele que, por exemplo, apenas durante 5 (cinco) anos contribuiu acima do menor valor teto. Logo, desprezar a proporcionalidade contida na parcela adicional, além de ilegal, seria também algo matematicamente injusto com aqueles que contribuíram durante toda a vida laborativa.
Desta forma, todas as limitações sofridas pelo autor para fins de cálculo da parcela básica e da parcela adicional foram previstas em lei. Tais limitações não se refletem em limitação para fins de pagamento, mas tão somente provém das regras então vigentes à época para aposentadorias.
Portanto, com base em toda nossa análise acima exposta, entendemos que o valor que deve servir para fins de evolução da renda do segurado ao longo do tempo é o valor da RMI então apurada. Com base neste valor, evoluímos a renda mensal da parte Autora e não apuramos direito às Emendas Constitucionais nº 20/1998 e nº 41/2003.
[constante do processo nº 5002897-21.2016.4.04.7108/RS - evento 15]
Assim, tendo em vista a necessidade de se observar as regras vigentes à época da concessão, e considerando que a renda não foi limitada ao menor valor-teto, como quer fazer crer a autora, dou provimento ao recurso do INSS para julgar a ação improcedente.
Invertidos os ônus da sucumbência, a parte autora pagará honorários advocatícios de 10% sobre o valor atualizado da causa, suspensa a exigibilidade por até 5 anos em razão do deferimento de AJG.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por dar provimento ao apelo do INSS.
É o voto.
Des. Federal ROGER RAUPP RIOS
Relator
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 13/06/2017
APELAÇÃO CÍVEL Nº 5007448-62.2016.4.04.7102/RS
ORIGEM: RS 50074486220164047102
RELATOR | : | Des. Federal ROGER RAUPP RIOS |
PRESIDENTE | : | Paulo Afonso Brum Vaz |
PROCURADOR | : | Dr. Sérgio Cruz Arenhart |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELANTE | : | LUCIA ANGELA TREVISAN FREITAS |
ADVOGADO | : | MARION SILVEIRA REGO |
: | FABIANO PADOIN VIEIRA | |
APELADO | : | OS MESMOS |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 13/06/2017, na seqüência 648, disponibilizada no DE de 29/05/2017, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, a DEFENSORIA PÚBLICA e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 5ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU DAR PROVIMENTO AO APELO DO INSS.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Des. Federal ROGER RAUPP RIOS |
VOTANTE(S) | : | Des. Federal ROGER RAUPP RIOS |
: | Des. Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ | |
: | Des. Federal ROGERIO FAVRETO |
Lídice Peña Thomaz
Secretária de Turma
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