D.E. Publicado em 07/12/2017 |
APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 0012425-27.2016.4.04.9999/RS
RELATORA | : | Juíza Federal GISELE LEMKE |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
APELADO | : | TELMO PASA DE LIMA |
ADVOGADO | : | Teodoro Matos Tomaz |
REMETENTE | : | JUIZO DE DIREITO DA 1A VARA DA COMARCA DE OSÓRIO/RS |
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. TEMPO DE SERVIÇO RURAL. REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. RECONHECIMENTO. ATIVIDADE ESPECIAL. RECONHECIMENTO. CONVERSÃO DE TEMPO DE SERVIÇO ESPECIAL EM COMUM. CONCESSÃO DE APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS DE MORA. CUSTAS. JUSTIÇA ESTADUAL. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO.
1. Comprovado o labor rural em regime de economia familiar, mediante a produção de início de prova material, corroborada por prova testemunhal idônea, o segurado faz jus ao cômputo do respectivo tempo de serviço.
2. O reconhecimento da especialidade e o enquadramento da atividade exercida sob condições nocivas são disciplinados pela lei em vigor à época em que efetivamente exercidos, passando a integrar, como direito adquirido, o patrimônio jurídico do trabalhador.
3. Comprovada a exposição do segurado a agente nocivo, na forma exigida pela legislação previdenciária aplicável à espécie, possível reconhecer-se a especialidade do tempo de labor correspondente.
4. O labor exercido em postos de abastecimento de combustível já foi reconhecido pela 3ª Seção desta Corte como periculoso, pelo risco inerente ao trabalho em proximidade de agentes inflamáveis e explosivos, ainda que sejam tomadas as precauções de segurança (TRF4, EMBARGOS INFRINGENTES Nº 2008.70.11.001188-1, 3ª Seção, Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA, POR MAIORIA, D.E. 16/05/2011).
5. Esta Corte já firmou entendimento no sentido de que é possível a conversão do tempo especial para comum, mesmo com relação aos períodos anteriores ao advento da Lei nº 6.887, de 10/12/1980.
6. Cumpridos com os requisitos tempo de serviço e carência, a parte autora tem direito à implementação do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição integral desde a data do requerimento, segundo o cálculo que lhe for mais vantajoso e ao pagamento das parcelas vencidas.
7. Correção monetária pelo IPCA-E e juros de mora conforme o art. 5º da Lei 11.960/2009, que deu nova redação ao art. 1º-F da Lei 9.494/1997.
8. O INSS é isento do pagamento das custas no Foro Federal (inc. I do art. 4º da Lei 9.289/1996) e na Justiça Estadual do Rio Grande do Sul, devendo, contudo, pagar eventuais despesas processuais, como as relacionadas a correio, publicação de editais e condução de oficiais de justiça (art. 11 da Lei Estadual 8.121/1985, com a redação da Lei Estadual 13.471/2010, já considerada a inconstitucionalidade formal reconhecida na ADI nº 70038755864, TJRS, Órgão Especial).
9. Mantida a condenação do INSS fixada na sentença quanto ao pagamento da verba honorária.
10. Determinada a imediata implantação do benefício.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento ao apelo e à remessa oficial e determinar a imediata implantação do benefício, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 28 de novembro de 2017.
Juíza Federal Gisele Lemke
Relatora
Documento eletrônico assinado por Juíza Federal Gisele Lemke, Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 9182624v20 e, se solicitado, do código CRC C0C12541. | |
Informações adicionais da assinatura: | |
Signatário (a): | Gisele Lemke |
Data e Hora: | 01/12/2017 09:46 |
APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 0012425-27.2016.4.04.9999/RS
RELATORA | : | Juíza Federal GISELE LEMKE |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
APELADO | : | TELMO PASA DE LIMA |
ADVOGADO | : | Teodoro Matos Tomaz |
REMETENTE | : | JUIZO DE DIREITO DA 1A VARA DA COMARCA DE OSÓRIO/RS |
RELATÓRIO
Trata-se de ação de concessão de aposentadoria proposta por TELMO PASA DE LIMA (nascido em 14/07/1958), contra o Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, postulando o reconhecimento do trabalho rural, em regime de economia familiar, no período de 14/07/1970 a 18/06/1979, bem como o reconhecimento da atividade especial de 01/04/1980 a 14/09/1982, de 09/09/2002 a 14/11/2011, de 01/02/1986 a 20/09/1988, de 01/08/1989 a 16/05/1994, de 01/01/1995 a 31/03/1999, e de 01/10/1999 a 17/08/2001. O autor postulou a concessão de aposentadoria especial ou, alternativamente, a concessão da aposentadoria por tempo de contribuição com a conversão dos tempos especiais para comum pelo fator 1,4.
Na sentença (fl. 253/260), lavrada em 23/02/2016, o juízo a quo resolveu o mérito para: a) julgar procedentes os pedidos para reconhecer o exercício da atividade rural e de exercício em condições especiais do autor nos períodos requeridos na exordial; b) reconhecer a possibilidade de conversão do tempo de serviço especial para o tempo de serviço comum; c) julgar procedente o pedido para determinar que o INSS implantasse o benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, considerando a RMI equivalente a 100% do salário de benefício; d) julgar procedente o pedido para condenar o INSS ao pagamento das diferenças advindas, desde a DER (14/11/2011), até a efetiva implantação administrativa do benefício, corrigidas pelo IPCA-E, desde cada competência, e mais os juros de mora, de acordo com o art. 1-F da Lei 9.494/97, desde a citação. A Autarquia foi condenada ao pagamento das custas e dos honorários advocatícios, esses fixados em 10% sobre o valor da condenação. Sentença sujeita ao reexame necessário.
No apelo (fl. 261/268), o INSS asseverou que, em relação à atividade rural, não havia qualquer prova material referente ao período postulado. Quanto à suposta atividade especial, mencionou que em todos os períodos requeridos, constou em CTPS o exercício de atividade de frentista, não tendo sido apresentado qualquer formulário ou documento emitido pelas empresas. Destacou que, para que a profissão de frentista pudesse ser enquadrada como especial, seria imprescindível que os agentes aos quais o autor esteve exposto, estivessem elencados no item 1.2.11 do Decreto nº 53.831/64. Ressaltou que a atividade de frentista é desenvolvida nos pátios dos postos de combustíveis em ambiente aberto e arejado, de modo que o trabalhador não fica exposto aos agentes nocivos químicos de forma permanente, além de que os possíveis e baixos níveis de gases se diluem. Enfatizou que seria possível o enquadramento da atividade como especial desde que presente exposição habitual e permanente a agentes prejudiciais à saúde ou à integridade física do segurado, comprovado mediante a apresentação de formulário próprio (SB-40/DSS8030), após o Decreto nº 2.172/97, necessariamente amparado em laudo técnico. Afirmou que nem mesmo o laudo pericial apresentado (fl. 241/244) comprovava a exposição habitual e permanente a agentes nocivos, porquanto não descrevia o grau de concentração dos agentes encontrados, tampouco especificava em que circunstâncias ocorria o contato. Defendeu que a partir de 05/03/1997 os hidrocarbonetos deixaram de ser enquadrados como agentes nocivos pela legislação previdenciária, a qual passou a exigir indicação do grau de concentração. Mencionou que restou comprovada a utilização de EPI eficaz, o que, a partir de 03/12/1998, deve ser considerado como neutralizador dos efeitos dos agentes nocivos. Requereu a reforma da sentença para: 1) afastar o reconhecimento da atividade rural e especial do autor, com o consequente indeferimento da concessão de aposentadoria por tempo de contribuição; 2) em caso de manutenção da sentença, no tocante aos critérios de correção monetária, a retificação do índice de correção monetária estipulado, com a determinação da aplicação das regras trazidas pela Lei 11.960/2009; e 3) o afastamento da condenação ao pagamento das custas processuais.
Com contrarrazões, subiram os autos a esta Corte.
Em 22/09/2017, determinei a intimação da parte autora para que se manifestasse na manutenção do interesse no reconhecimento do caráter especial do período em que esteve em gozo de auxílio doença de natureza não acidentária, em razão da instauração do IRDR - TRF4 8.
O demandante requereu a desistência do mencionado período, sendo homologado o pedido em 17/10/2017.
É o relatório.
VOTO
Sentença sujeita ao reexame necessário.
Do Tempo de Serviço Rural - Considerações Gerais
O tempo de trabalho rural deve ser demonstrado com, pelo menos, um início de prova material contemporânea ao período a ser comprovado, complementada por prova testemunhal idônea. Não é admitida a prova exclusivamente testemunhal, a teor do § 3º do art. 55 da Lei 8.213/1991, preceito jurisprudencialmente ratificado pelo STJ na Súmula 149 e no julgamento do REsp nº 1.321.493/PR (STJ, 1ª Seção, rel. Herman Benjamin, j. 10/10/2012, em regime de "recursos repetitivos" do art. 543-C do CPC1973). Embora o art. 106 da Lei 8.213/1991 relacione os documentos aptos a essa comprovação, tal rol não é exaustivo (STJ, Quinta Turma, REsp 612.222/PB, rel. Laurita Vaz, j. 28/04/2004, DJ 07/06/2004, p. 277).
Não se exige, por outro lado, prova documental contínua da atividade rural, ou em relação a todos os anos integrantes do período correspondente à carência, mas início de prova material (notas fiscais, talonário de produtor, comprovantes de pagamento do ITR ou prova de titularidade de imóvel rural, certidões de casamento, de nascimento, de óbito, certificado de dispensa de serviço militar, quaisquer registros em cadastros diversos) que, juntamente com a prova oral, possibilite um juízo de valor seguro acerca dos fatos que se pretende comprovar:
[...] considerando a inerente dificuldade probatória da condição de trabalhador campesino, o STJ sedimentou o entendimento de que a apresentação de prova material somente sobre parte do lapso temporal pretendido não implica violação da Súmula 149/STJ [...]
(STJ, Primeira Seção, REsp 1321493/PR, rel. Herman Benjamin, j. 10/10/2012, DJe 19/12/2012)
Quanto à questão da contemporaneidade da prova documental com o período relevante para apuração de carência, já decidiu esta Corte: A contemporaneidade entre a prova documental e o período de labor rural equivalente à carência não é exigência legal, de forma que podem ser aceitos documentos que não correspondam precisamente ao intervalo necessário a comprovar. Precedentes do STJ (TRF4, Sexta Turma, REOAC 0017943-66.2014.404.9999, rel. João Batista Pinto Silveira, D.E. 14/08/2015).
Os documentos apresentados em nome de terceiros, sobretudo quando dos pais ou cônjuge, consubstanciam início de prova material do trabalho rural, já que o § 1º do art. 11 da Lei 8.213/1991 define como sendo regime de economia familiar o exercido pelos membros da família "em condições de mútua dependência e colaboração". Via de regra, os atos negociais são formalizados em nome do pater familias, que representa o grupo familiar perante terceiros, função esta em geral exercida pelo genitor ou cônjuge masculino entre os trabalhadores rurais. Nesse sentido, a propósito, preceitua a Súmula nº 73 do Tribunal Regional Federal da 4ª Região: "Admitem-se como início de prova material do efetivo exercício de atividade rural, em regime de economia familiar, documentos de terceiros, membros do grupo parental", e já consolidado na jurisprudência do STJ: "A Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça firmou entendimento no sentido da admissibilidade de documentos em nome de terceiros como início de prova material para comprovação da atividade rural" (STJ, Quinta Turma, REsp 501.009/SC, rel. Arnaldo Esteves Lima, j. 20/11/2006, DJ 11/12/2006, p. 407).
Importante, ainda, ressaltar que o fato de um dos membros da família exercer atividade outra que não a rural não descaracteriza automaticamente a condição de segurado especial de quem postula o benefício. A hipótese fática do inc. VII do art. 11 da Lei 8.213/1991, que utiliza o conceito de economia familiar, somente será descaracterizada se comprovado que a remuneração proveniente do trabalho urbano do membro da família dedicado a outra atividade que não a rural seja tal que dispense a renda do trabalho rural dos demais para a subsistência do grupo familiar:
PREVIDENCIÁRIO. EMBARGOS INFRINGENTES. CONCESSÃO DE APOSENTADORIA RURAL POR IDADE. SEGURADA ESPECIAL. REQUISITOS PREENCHIDOS. O exercício de atividade urbana por um dos componentes do grupo familiar não afasta, por si só, a qualidade de segurado especial dos demais membros, se estes permanecem desenvolvendo atividade rural, em regime de economia familiar. Para a descaracterização daquele regime, é necessário que o trabalho urbano importe em remuneração de tal monta que dispense o labor rural dos demais para o sustento do grupo. Precedentes do STJ.
(TRF4, Terceira Seção, EINF 5009250-46.2012.404.7002, rel. Rogerio Favreto, juntado aos autos em 12/02/2015)
O INSS alega com frequência que os depoimentos e informações tomados na via administrativa apontam para a ausência de atividade rural no período de carência. As conclusões adotadas pelo INSS no âmbito administrativo devem ser corroboradas pela prova produzida em Juízo. Em conflito entre as provas colhidas na via administrativa e aquelas tomadas em juízo, deve-se ficar com estas últimas, pois produzidas com as cautelas legais, garantindo-se o contraditório: "A prova judicial, produzida com maior rigorismo, perante a autoridade judicial e os advogados das partes, de forma imparcial, prevalece sobre a justificação administrativa" (TRF4, Quinta Turma, APELREEX 0024057-21.2014.404.9999, rel. Taís Schilling Ferraz, D.E. 25/06/2015). Dispondo de elementos que impeçam a pretensão da parte autora, cabe ao INSS produzir em Juízo a prova adequada, cumprindo o ônus processual descrito no inc. II do art. 333 do CPC/1973, e no inc. II do art. 373 do CPC/2015.
Do Caso Concreto - Atividade Rural
A título de prova documental do exercício da atividade rural, o autor, nascido em 14/07/1958, junta aos autos:
- pedido de aposentadoria por tempo de contribuição do autor com DER em 14/11/2011 (fl. 17);
- pedido de reconhecimento a atividade rural do autor dirigido ao INSS de Osório no período de 14/07/1970 a 18/06/1979 (fl. 43);
- certificado de conclusão do Curso Primário Elementar do autor em dezembro/1970, no Grupo Escolar Professor Argeu Furtado, localizado em São Cristóvão do Sul/SC (fl. 49);
- certidão de óbito do pai do autor, Elizaldo Alves de Lima, ocorrido em 16/05/1964, deixando 05 filhos: Anselmo Pasa de Lima, menor; Adelia Pasa de Lima, menor; Zaila Pasa de Lima, menor; Telmo Pasa de Lima, menor (autor); e Delmo Pasa de Lima, menor (fl. 50);
- certidão de nascimento do autor, Telmo Pasa de Lima, na data de 14/07/1958, na localidade de Campos Novos/SC, filho de Elizaldo Alves de Lima, Lavrador, e Lourdes Pasa de Lima, Doméstica (fl. 52);
- certidão de registro de imóveis da Comarca de Curitibanos/SC, datada de 01/09/2011, na qual consta o número de ordem 20.354, datado de 11/06/1964, na Circunscrição Distrito de Ponte Alta, uma parte de terras, com área de 43.500 m², e outra parte de terras, com área de 12.350 m², tendo como adquirente o pai do autor, Elizaldo Alves de Lima, e, como transmitente, o espólio de Olimpio Alves Wollinger (pai de Elizaldo Alves de Lima), cujo formal de partilha foi expedido em 02/05/1964. No registro constou que a certidão não comprovava a propriedade atual do imóvel ou a inexistência de ônus reais, gravames ou prestações. (fl. 53);
- certificado de reservista do pai do autor, Elizaldo Alves de Lima, onde constou como profissão sucessiva: Lavrador (fl. 54);
- indeferimento da autorização de justificação administrativa para o período de 14/07/1970 a 14/06/1979 por falta de documentação para a comprovação do exercício da atividade de agricultor (fl. 60);
- documento do autor, onde o INSS, na DER (14/11/2011), computou o tempo de 26 anos, 05 meses e 03 dias (fl. 61/62);
- certidão simplificada da Junta Comercial do Estado de Santa Catarina - JUCESC, datada d 13/04/2009, onde consta que o autor foi empresário, com data de início da atividade (Lanchonete) em 01/10/1988 a 16/05/1989 (data da baixa) (fl. 65);
- certidão de baixa de inscrição no CNPJ da empresa Telmo Pasa de Lima ME na data de 16/05/1989 (fl. 66);
- certidão de inteiro teor de casamento civil dos pais do autor, Elizaldo Alves de Lima, Lavrador, com Lourdes Pasa, Doméstica, registrado em 16/02/1954 (fl. 75);
Foram ouvidas as testemunhas para o período de atividade rural:
Euclides Custodio de Oliveira: declarou que conhece o autor desde nenê; que o autor morava no terreno dos pais dele, que ficava na divisa do terreno da testemunha; que é sítio, é lavoura; que plantavam milho, feijão, abóbora, moranga; que o autor com, mais ou menos 05 anos, já puxava a enxada; que o pai do autor não tinha empregados, era só a família; que as terras da família ficavam em Ponte Alta; que acha que o autor ficou nas terras até uns 23 ou 24 anos; que o preparo da terra era feito na enxada e na foice; que o nome dos pais do autor eram Lourdes e Elizaldo; que o autor tinha mais irmãos; que toda família trabalhava na roça; que vivia dali e, se tinha sobra, o mercado comprava; que tinham umas vaquinhas; que a área era próxima do depoente; que eram vizinhos; que venderam eles venderam a área e que o depoente ainda tinha as terras.
José Valério dos Santos: declarou que conhece o autor desde criança; que o depoente morava na Ponte Alta; que onde eles moravam era, praticamente, zona rural; que o autor se criou na roça; que acha que o autor saiu da roça com uns 21 ou 22 anos; que plantavam milho, feijão; que era só para se manter; que só a família trabalhava; que o autor morava com os pais e tinha irmãos; que o nome do pai era Elizaldo e a mãe, Lourdes; que a área de terras era de 06 alqueires (13 a 14 hectares); que o preparo da terra era feita na base da enxada; que via o autor desde criança trabalhando na roça; que a região é de agricultores; que maior parte da produção era para consumo próprio, se sobrasse era para trocar; que toda família trabalhava na terra e que não tinham outra fonte de renda naquela época.
Leonilda Correia Soares: declarou que faz tempo que conhece o autor, pois eram vizinhos de roça; que a testemunha morava num sítio e eles moravam num outro; que a terra ficava na zona rural de Ponte Alta; que o autor começou a trabalhar desde pequeno; que o autor morava com os pais; que plantavam feijão, milho, moranga, abóbora; que trabalhava somente a família; que às vezes uns ajudavam os outros; que a área de terra tinha em torno de 12 a 15 hectares; que tinham uma vaquinha de leite, um porquinho, galinha; que a produção era para consumo e que se sobrava alguma coisa, vendiam para comprar um trigo, um açúcar; que não tinham maquinários; que tudo era na enxada; que o nome dos pais era Elizaldo e Lourdes; que o autor tinha 05 irmãos; que naquela localidade o meio de sobrevivência era só na roça; que a família não tinha outra fonte de renda, somente a agricultura; que acha que o autor saiu da roça com uns 20 ou 22 anos; que o autor foi para Curitibanos;
As testemunhas foram uníssonas em afirmar que o autor trabalhou na agricultura desde muito cedo. Em observação à documentação juntada, verifico que o material é escasso, no entanto, o presente caso apresenta particularidade, porquanto o pai do autor, que era Lavrador, faleceu em 16/05/1964 deixando 05 filhos, todos menores. Não consta dos autos que a família tivesse qualquer outra fonte de renda naquela época, sendo crível, e confirmado pelas testemunhas, que a família trabalhou na terra e que sua produção era, praticamente, para consumo próprio. As testemunhas afirmaram que o autor saiu da roça com 23/24 anos, 21/22 anos e 20/22 anos, respectivamente. Assim, realizando uma média da idade em que o autor deixou a agricultura, ter-se-ia a idade de 22 anos. O demandante postula o reconhecimento da atividade rural de 14/07/1970 (quando tinha 12 anos de idade) até 18/06/1979 (quando ainda não tinha completado 21 anos de idade, dia imediatamente anterior a contrato de trabalho - 19/06/1979 na Indústria e Comércio de Móveis, Município de Quatro Barras do Estado do Paraná).
No caso dos autos, reconheço que o autor trabalhou na atividade agrícola de 14/07/1970 a 18/06/1979.
Do Tempo de Serviço Especial
Segundo orientação adotada pela Terceira Seção do STJ, o tempo de serviço especial disciplina-se pela lei vigente à época em que exercido o labor, passando a integrar o patrimônio jurídico do trabalhador como direito adquirido (AGRESP 493.458/RS, Rel. Min. Gilson Dipp, 5ª Turma, DJU 23/06/2003, e REsp 491.338/RS, Rel. Min. Hamilton Carvalhido, 6ª Turma, DJU 23/06/2003).
Portanto, uma vez prestado o serviço, o segurado adquire o direito à sua contagem pela legislação então vigente, não podendo ser prejudicado pela lei nova e, ante a diversidade de diplomas legais que se sucederam na disciplina da matéria, torna-se necessário definir qual a legislação aplicável ao caso concreto. Tem-se, então, a seguinte evolução legislativa quanto ao tema sub judice:
a) no período de trabalho até 28/04/1995, quando vigente a Lei n.º 3.807/60 (Lei Orgânica da Previdência Social) e suas alterações, e, posteriormente, a Lei n.º 8.213/91 (Lei de Benefícios), em sua redação original (arts. 57 e 58), é possível o reconhecimento da especialidade do trabalho quando houver a comprovação do exercício de atividade profissional enquadrável como especial nos decretos regulamentadores e/ou na legislação especial, ou mesmo quando demonstrada a sujeição do segurado a agentes nocivos por qualquer meio de prova, exceto para ruído, em que necessária sempre a aferição do nível de decibéis por meio de parecer técnico trazido aos autos, ou simplesmente por referência no formulário padrão emitido pela empresa;
b) a partir de 29/04/1995, inclusive, foi definitivamente extinto o enquadramento por categoria profissional, de modo que, no interregno compreendido entre esta data e 05/03/1997, em que vigentes as alterações introduzidas pela Lei n.º 9.032/95, no art. 57 da Lei de Benefícios, passou a ser necessária a demonstração efetiva de exposição, de forma permanente, não ocasional nem intermitente, a agentes prejudiciais à saúde ou à integridade física, por qualquer meio de prova, considerando-se suficiente, para tanto, a apresentação de formulário padrão preenchido pela empresa, sem a exigência de embasamento em laudo técnico;
c) após 06/03/1997, a partir da vigência do Decreto n.º 2.172/97, que regulamentou as disposições introduzidas no art. 58 da Lei de Benefícios pela Lei n.º 9.528/97, passou-se a exigir, para fins de reconhecimento do tempo de serviço especial, a comprovação da efetiva sujeição do segurado a agentes agressivos por meio da apresentação de formulário padrão, embasado em laudo técnico, ou por meio de perícia técnica.
Tal interpretação das sucessivas normas que regulam o tempo de serviço especial está conforme a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (EDcl no REsp 415.298/SC, 5ª Turma, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, DJe 06/04/2009; AgRg no Ag 1053682/SP, 6ª Turma, Rel. Min. Og Fernandes, DJe 08/09/2009; REsp 956.110/SP, 5ª Turma, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, DJ 22/10/2007; AgRg no REsp 746.102/SP, 6ª Turma, Rel. Min. Og Fernandes, DJe 07/12/2009).
Para o período de atividade especial, o autor juntou os documentos:
- pedido do autor, dirigido à Agência do INSS de Osório/RS, requerendo a conversão em tempo especial em comum (fl. 24);
- cópia da CTPS do autor com os contratos de trabalho (fl. 28/42);
Para o período de atividade especial, foram ouvidas as testemunhas:
Anildo Santos Pereira: declarou que conhece o autor há mais de 20 anos; que, perguntado em que o autor trabalhava entre 1980 e 2000, por aí, respondeu: que eu sabia sempre como frentista em posto de gasolina; que, perguntado sobre quais postos o autor trabalhou, respondeu: quando veio do Paraná, trabalhava com o Túlio, Posto Túlio, daí eu trabalhava no Querência, ele trabalhava comigo ali na mesma época; que a testemunha ficou ali 05 anos, tendo trabalhado de 1986 a 1991; que o autor continuou a trabalhar lá depois desse período (trocou a razão social para Rede Furnas); que depois desse posto passou para o Túlio, como frentista; que eram esses os postos em que o autor trabalhou (Túlio, Furnas e Querência - Dacol); que tinha contato com combustível, o mesmo que eu faço; que a atividade do frentista é abastecer o veículo; que o Querência fica na BR 101, perto da Brigada; que o Querência é o mesmo que Rede Furnas; que o Posto Túlio fica no Aguapé; que o autor não está mais trabalhando no posto Túlio; que no posto Túlio, o autor trabalhou uns 12 anos.
Cintia dos Santos Delize Saucedo: declarou que conhece o autor, uns 25 a 30 anos; que o autor trabalhava no Posto Querência, que depois passou a ter o nome de Rede Furnas; que quando a testemunha tinha 15 ou 16 anos, o autor já trabalha lá; que não tem ideia de por quanto tempo o autor trabalhou lá; que o autor era frentista; que não sabia dizer se antes desse posto, o autor trabalhava em outro, mas que depois, o autor foi trabalhar em outro posto de gasolina (Túlio); que, em 2001, a testemunha trabalhou com o autor no posto Rede Furnas; que o posto Furnas é do Anthony e o Dacol era o Querência; que, como morava na BR e o posto Túlio era na BR, via o autor na parada de ônibus, de uniforme; que via o autor abastecendo carros, que era frentista; que o frentista abastece, olha o óleo, calibra pneus, limpa vidros; que conhece o autor como frentista; que os vizinhos também o conhece como frentista.
Valdir dos Santos Pereira: declarou que conhece o autor faz bastante tempo; que a testemunha começou a trabalhar na década de 80 no posto Querência e depois trabalhou com o autor por 01 ano; que saiu do posto em 1990 e o autor continuou trabalhando lá; que trabalhava como frentista; que depois trocou a razão social do posto para Rede Furnas e o autor continuou trabalhando e que depois foi para o Túlio; que acha que o autor ficou no posto Túlio por uns 11 ou 12 anos, também como frentista; que quem trabalha como frentista tem contato direto com a gasolina, faz manutenção no caminhão, olha água, óleo; que, quando veio do Paraná, ele comentava com a gente que trabalhava no Posto Túlio lá; que o autor havia comentado que no Paraná, ele trabalhou no Posto Túlio por 02 anos ou 02 anos e meio; que o autor já veio sendo frentista lá do Paraná; que faz, mais ou menos, um (01) ano que o autor saiu do posto Túlio.
À fl. 168, restou deferida a realização de prova pericial. Transcrevo o teor do Laudo Pericial, elaborado pelo Engenheiro de Segurança do Trabalho, Sr. Gilberto J. Konrad, datado de 10/08/2015 (fl. 241/244):
Ação Previdenciária: contra o Instituto Nacional do Seguro Social - INSS
Autor: Telmo Pasa de Lima
Profissão: Lubrificador
Apresenta-se Laudo Pericial realizado em 29/06/2015 na Empresa Auto Posto Túlio, sito à BR-101 km 72 - Osório/RS.
Atividades:
Segundo o autor Sr. Telmo Pasa de Lima, realizou as atividades de frentista, lubrificador e serviços gerais no período de 09/09/2002 a 28/02/2013 nas dependências do posto de abastecimento supracitado.
Na tarefa de frentista abastecia automóveis e caminhões com gasolina, metanol e diesel.
Na tarefa de lubrificador realizava a troca de óleo de motores de combustão e diesel e lubrificação de graxeiros automotivos e de máquinas automotivas.
Na tarefa de serviços gerais verificava o nível de água de radiadores e depósito de esguicho de parabrisas, nível do óleo de motores de veículos automotivos. Esporadicamente realizava a limpeza da caixa separadora de óleo do estabelecimento.
O autor informou que recebia do empregador os seguintes Equipamentos de Proteção Individual - EPI:
Botina
Jaleco e calça
Produtos utilizados:
1 - Graxa lubrificante a base de sabão de cálcio para lubrificação de graxeiros;
Perigos mais importantes;
- perigos físicos e químicos: sólido não inflamável.
- perigos específicos: pouco tóxico.
- efeitos adversos a saúde humana: contato prolongado e repetitivo com a pele pode causar dermatite.
Manuseio:
Medidas técnicas;
Utilizar Equipamento de Proteção Individual - EPI, como óculos herméticos para produtos químicos, luvas impermeáveis (PVC, polietileno ou neoprene) e macacão de algodão.
Armazenamento:
Medidas técnicas: não requer medidas técnicas específicas.
Efeitos específicos:
- carcinogênico: segundo o IARC (Internacional Agency for Research on Cancer) existe a evidência suficiente de que esse produto seja carcinogênico em animais de experimentação.
2 - Lubrificante Mineral AP/SL 15W-40;
Classificação de perigo do produto:
Produto não classificado como perigoso no Sistema de Classificação; Norma ABNT - NBR 14725-2:2009
Observação: o produto não possui outros perigos.
Carcinogenicidade: não é esperado que o produto apresente Carcinogenicidade.
3 - Gasolina;
Principal uso; combustível automotivo.
Principais riscos à saúde;
Mutagenicidade em células germinativas: pode provocar defeitos genéticos.
Informações referentes seus componentes químicos;
Etanol;
Resultados positivos para ensaios, in vivo, de Mutagenicidade envolvendo células germinativas e somáticas de mamíferos com aumento da frequência de aberrações cromossômicas, trocas de cromátides-irmãs e aneuplodias foram encontradas nos linfócitos periféricos,
Benzeno;
Danos ao DNA e aumento de incidência de micro núcleos foram relatados em linfócitos humanos e de ratos. Aberrações cromossômicas foram observadas em trabalhadores exposto à substância.
Carcinogenicidade:
Gasolina: desconhecido em humanos.
Etanol: cancerígenos para humanos.
Benzeno: pode provocar leucemia e tumores malignos de cavidade oral, faringe, laringe, esôfago e fígado.
Óleo Diesel S500;
Utilizado como combustível.
Perigo físico/químico; líquidos e vapores inflamáveis.
Informações Toxicológicas;
Toxicidade aguda:
Como depressor do sistema nervoso central, pode causar efeitos narcóticos como dor de cabeça e tontura. Pode causar confusão mental e perda da consciência em altas concentrações. Pode ser fatal se aspirado. Pode causar a morte se ingerido ou inalado. Este produto contém gás sulfídrico, extremamente tóxico.
Toxicidade crônica:
Pode causa dermatite após contato repetido e prolongado com a pele.
Carcinogenicidade: possível carcinógeno em humanos.
Álcool Etílico hidratado e combustível;
Utilizado como combustível.
Perigo de produto: líquido inflamável.
Mutagenicidade em células germinativas: pode provocar defeitos genéticos se ingerido.
Carcinogenicidade: não é esperado que o produto apresente Carcinogenicidade.
Toxicidade à reprodução: pode prejudicar a fertilidade ao feto, se ingerido.
Medidas de proteção pessoal para o manuseio a todos os produtos supracitados:
Olhos: Óculos de proteção ou protetor facial contra respingos.
Corpo e pele: Luvas de proteção PVC, borracha natural ou nitrílica.
Proteção respiratória: recomenda-se usar respiradores com filtro para vapores orgânicos.
Conclusão:
O requerente exerceu atividades como lubrificador, frentista e serviços gerais sendo permanentemente submetido a riscos de explosão em seu local de trabalho com a presença de vapores inflamáveis e também a exposição de produtos nocivos à saúde e possibilidade de prejuízos a reprodução. O local de trabalho, posto de abastecimento ocasionalmente apresentava variações da intempérie expondo-se a ventos fortes com chuvisqueiros e temperaturas baixas impostas pelas estações climáticas da região. (grifo intencional)
Do Trabalho em Posto de Abastecimento de Combustível
O labor exercido em postos de abastecimento de combustível já foi reconhecido pela 3ª Seção desta Corte como periculoso, pelo risco inerente ao trabalho em proximidade de agentes inflamáveis e explosivos, ainda que sejam tomadas as precauções de segurança (TRF4, EMBARGOS INFRINGENTES Nº 2008.70.11.001188-1, 3ª Seção, Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA, POR MAIORIA, D.E. 16/05/2011).
Com efeito, o Anexo 2 da NR-16 trata especificamente das Atividades e Operações Perigosas com Inflamáveis, assim prevendo nos itens 1.m, 2.V.a e 3.q:
1. São consideradas atividades ou operações perigosas, conferindo aos trabalhadores que se dedicam a essas atividades ou operações, bem como aqueles que operam na área de risco adicional de 30 (trinta) por cento, as realizadas:
(...)
m - nas operações em postos de serviço e bombas de abastecimento de inflamáveis líquidos envolvendo o operador de bomba e trabalhadores que operam na área de risco.
2. Para os efeitos desta Norma Regulamentadora - NR entende-se como:
(...)
V. Operações em postos de serviço e bombas de abastecimento de inflamáveis líquidos:
a) atividades ligadas diretamente ao abastecimento de viaturas com motor de explosão.
3. São consideradas áreas de risco:
(...)
q - Abastecimento de inflamáveis. Toda a área de operação, abrangendo, no mínimo, círculo com raio de 7,5 metros com centro no ponto de abastecimento e o círculo com raio de 7,5 metros com centro na bomba de abastecimento da viatura e faixa de 7,5 metros de largura para ambos os lados da máquina.
Portanto, não só o frentista, mas também os demais profissionais que trabalham dentro da área de risco considerada na NR16, fazem jus ao reconhecimento da especialidade do labor.
Da Intermitência na Exposição aos Agentes Nocivos
A habitualidade e permanência do tempo de trabalho em condições especiais prejudiciais à saúde ou à integridade física referidas no artigo 57, § 3º, da Lei 8.213/91, não pressupõem a exposição contínua ao agente nocivo durante toda a jornada de trabalho. A jurisprudência desta Corte volta-se à interpretação no sentido de que tal exposição deve ser ínsita ao desenvolvimento das atividades cometidas ao trabalhador, integrada à sua rotina de trabalho, e não de ocorrência eventual, ocasional. Exegese diversa levaria à inutilidade da norma protetiva, pois em raras atividades a sujeição direta ao agente nocivo se dá durante toda a jornada de trabalho e, em muitas delas, a exposição em tal intensidade seria absolutamente impossível. A propósito do tema, vejam-se os seguintes precedentes da Terceira Seção deste Tribunal: EINF n.º 0003929-54.2008.404.7003, de minha relatoria, D.E. 24/10/2011; EINF n.º 2007.71.00.046688-7, Terceira Seção, Relator Celso Kipper, D.E. 07/11/2011.
Ademais, conforme o tipo de atividade, a exposição ao respectivo agente nocivo, ainda que não diuturna, configura atividade apta à concessão de aposentadoria especial, tendo em vista que a intermitência na exposição não reduz os danos ou riscos inerentes à atividade, não sendo razoável que se retire do trabalhador o direito à redução do tempo de serviço para a aposentadoria, deixando-lhe apenas os ônus da atividade perigosa ou insalubre (TRF4, EINF 2005.72.10.000389-1, Terceira Seção, Relator João Batista Pinto Silveira, D.E. 18/05/2011; TRF4, EINF 2008.71.99.002246-0, Terceira Seção, Relator Luís Alberto D"Azevedo Aurvalle, D.E. 08/01/2010).
Do Equipamento de Proteção Individual - EPI
A utilização de Equipamentos de Proteção Individual (EPI) é irrelevante para o reconhecimento das condições especiais, prejudiciais à saúde ou à integridade física do trabalhador, da atividade exercida no período anterior a 02 de junho de 1998, conforme reconhecido pelo próprio INSS por meio da Ordem de Serviço INSS/DSS nº 564/97, em vigor até a mencionada data.
Quanto à matéria relativa ao uso de EPI, o Colendo Supremo Tribunal Federal, em sede de repercussão geral (ARE 664335, Relator Min. LUIZ FUX, Tribunal Pleno, julgado em 04/12/2014, Acórdão Eletrônico DJE-029 Divulgação 11/02/2015 Publicação 12/02/2015), firmou as seguintes teses:
1 - o direito à aposentadoria especial pressupõe a efetiva exposição do trabalhador a agente nocivo à sua saúde, de modo que, se o EPI for realmente capaz de neutralizar a nocividade não haverá respaldo constitucional à aposentadoria especial;
2 - na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador, no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), no sentido da eficácia do Equipamento de Proteção Individual - EPI, não descaracteriza o tempo de serviço especial para aposentadoria.
Como se vê, considerado o período a partir de 02 de junho de 1998, a desconfiguração da natureza especial da atividade, em decorrência do uso de EPIs, é admissível desde que haja prova hábil (leia-se: laudo técnico) afirmando inequivocamente que a sua utilização pelo trabalhador reduziu efetivamente os efeitos nocivos do agente agressivo a níveis toleráveis, ou os neutralizou. Para tanto, não basta o mero preenchimento dos campos específicos no PPP, onde simplesmente são respondidas as perguntas "EPI eficaz?" e "EPC eficaz?", sem qualquer detalhamento acerca da total elisão ou neutralização do agente nocivo.
Vale referir, ainda, no que diz respeito ao uso de EPIs na tentativa de neutralização de agentes químicos nocivos, que esta Corte tem entendido pela ineficácia, na grande maioria dos casos, dos cremes de proteção (luvas invisíveis), como bem explicitado no voto condutor do acórdão que julgou a APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 5000373-67.2015.4.04.7211/SC, de relatoria do Desembargador Federal Paulo Afonso Brum Vaz, na qual foi observado que "com relação aos agentes químicos, necessário esclarecer que a utilização de cremes de proteção, devidamente aprovados pelo Ministério do Trabalho e Emprego, não possui o condão de neutralizar a ação dos agentes nocivos a que estava exposto o autor. Com efeito, tais cremes são conhecidos como "luvas invisíveis" e são utilizados por não ocasionarem perda de tato ou movimentação dos trabalhadores. Exatamente em decorrência de tais características, torna-se impossível ao trabalhador a avaliação do nível de proteção a que está sujeito, considerando-se o desgaste natural da camada protetora proporcionada por tais cremes em virtude do manuseio de equipamentos, ferramentas, da fricção das mãos com objetos e roupas e mesmo do suor, aspectos ínsitos à prestação laboral em análise. Torna-se, destarte, praticamente impossível a manutenção de uma camada protetiva contínua e homogênea. Assim, inviável a afirmação de que a utilização apenas de cremes de proteção, ainda que de forma adequada, possui o condão de neutralizar a ação de agentes nocivos químicos". (5ª Turma - julgado em 23/05/2017 - unânime).
A propósito, em muitos casos em que há exposição a agentes químicos, por mais que sejam utilizadas luvas químicas na tentativa pouco eficaz de elidir os efeitos danosos, até mesmo os gases inalados serão consideravelmente nocivos à saúde do trabalhador, como nos casos de trabalhadores na indústria calçadista, por exemplo, na qual consabidamente há contato habitual com colas e solventes pelos trabalhadores que atuam na área de montagem, os quais muitas vezes são contratados como "serviços gerais" (AC nº 0025291-38.2014.404.9999, SEXTA TURMA, Relatora SALISE MONTEIRO SANCHOTENE, D.E. 03/08/2016).
Por outro lado, em se tratando de ruído, nem mesmo a comprovação de redução aos limites legais de tolerância pelo uso de EPI é capaz de eliminar a nocividade à saúde, persistindo a condição especial do labor.
Da Forma de Cálculo da Renda Mensal Inicial (RMI)
A renda mensal inicial do benefício será calculada de acordo com as regras da legislação infraconstitucional vigente na data em que o segurado completar todos os requisitos do benefício.
Assim, o segurado que completar os requisitos necessários à aposentadoria antes de 29/11/1999 (início da vigência da Lei n.º 9.876/99), terá direito a uma RMI calculada com base na média dos 36 últimos salários-de-contribuição apurados em período não superior a 48 meses (redação original do art. 29 da Lei n.º 8.213/91), não se cogitando da aplicação do "fator previdenciário", conforme expressamente garantido pelo art. 6º da respectiva lei.
Ao cálculo dos benefícios dos segurados filiados até o dia anterior à data de publicação da Lei nº 9.876, de 29/11/1999, que vierem a cumprir as condições exigidas para a concessão dos benefícios do Regime Geral de Previdência Social, será aplicado o disposto no art. 3º do referido diploma legal.
Do Caso Concreto
Passo ao exame dos períodos controvertidos nesta ação, com base nos elementos contidos nos autos e na legislação de regência, para concluir pelo cabimento ou não do reconhecimento da natureza especial da atividade desenvolvida.
Período: 01/04/1980 a 14/09/1982.
Empresa: Auto Posto Túlio Ltda., localizado em Campina Grande do Sul/PR, BR 116, km 21, Jardim Paulista.
Atividade/função: Serviço Geral.
Agentes nocivos: submetido a riscos de explosão em seu local de trabalho com a presença de vapores inflamáveis e também a exposição de produtos nocivos à saúde e possibilidade de prejuízos a reprodução.
Prova: CTPS (fl. 29) e Laudo Pericial (fl. 241/244)
Enquadramento legal: Periculosidade: Anexo 2 da NR 16 (Portaria n° 3.214/78), itens 1.m, 2.V.a e 3.q; Súmula 198 do extinto TFR.
Conclusão: o agente nocivo ao qual estava exposta a parte autora está elencado como especial e a prova é adequada. Portanto, é cabível o reconhecimento da natureza especial do labor.
Período: 01/02/1986 a 20/09/1988.
Empresa: Dacol Pedrotti Onzi Ltda. localizado em Osório/RS, BR 101.
Atividade/função: Frentista.
Agentes nocivos: submetido a riscos de explosão em seu local de trabalho com a presença de vapores inflamáveis e também a exposição de produtos nocivos à saúde e possibilidade de prejuízos a reprodução.
Prova: CTPS (fl. 30) e Laudo Pericial (fl. 241/244)
Enquadramento legal: Periculosidade: Anexo 2 da NR 16 (Portaria n° 3.214/78), itens 1.m, 2.V.a e 3.q; Súmula 198 do extinto TFR.
Conclusão: o agente nocivo ao qual estava exposta a parte autora está elencado como especial e a prova é adequada. Portanto, é cabível o reconhecimento da natureza especial do labor.
Período: 01/08/1989 a 16/05/1994 (data final de acordo com o CNIS).
Empresa: Dacol Pedrotti Onzi Ltda. localizado em Osório/RS, BR 101, km 96,5.
Atividade/função: Frentista Noturno.
Agentes nocivos: submetido a riscos de explosão em seu local de trabalho com a presença de vapores inflamáveis e também a exposição de produtos nocivos à saúde e possibilidade de prejuízos a reprodução.
Prova: CTPS (fl. 30) e Laudo Pericial (fl. 241/244)
Enquadramento legal: Periculosidade: Anexo 2 da NR 16 (Portaria n° 3.214/78), itens 1.m, 2.V.a e 3.q; Súmula 198 do extinto TFR.
Conclusão: o agente nocivo ao qual estava exposta a parte autora está elencado como especial e a prova é adequada. Portanto, é cabível o reconhecimento da natureza especial do labor.
Período: 01/01/1995 a 31/03/1999 (data final de acordo com a CTPS fl. 38).
Empresa: Dacol Pedrotti Onzi Ltda. localizado em Osório/RS, BR 101, km 96,5.
Atividade/função: Frentista Noturno.
Agentes nocivos: submetido a riscos de explosão em seu local de trabalho com a presença de vapores inflamáveis e também a exposição de produtos nocivos à saúde e possibilidade de prejuízos a reprodução.
Prova: CTPS (fl. 30) e Laudo Pericial (fl. 241/244)
Enquadramento legal: Periculosidade: Anexo 2 da NR 16 (Portaria n° 3.214/78), itens 1.m, 2.V.a e 3.q; Súmula 198 do extinto TFR.
Conclusão: o agente nocivo ao qual estava exposta a parte autora está elencado como especial e a prova é adequada. Portanto, é cabível o reconhecimento da natureza especial do labor.
Período: 01/10/1999 a 17/08/2001.
Empresa: Antony Comércio de Combustíveis Ltda., localizado em Osório/RS, BR 101, km 96,5.
Atividade/função: Frentista.
Agentes nocivos: submetido a riscos de explosão em seu local de trabalho com a presença de vapores inflamáveis e também a exposição de produtos nocivos à saúde e possibilidade de prejuízos a reprodução.
Prova: CTPS (fl. 38) e Laudo Pericial (fl. 241/244)
Enquadramento legal: Periculosidade: Anexo 2 da NR 16 (Portaria n° 3.214/78), itens 1.m, 2.V.a e 3.q; Súmula 198 do extinto TFR.
Conclusão: o agente nocivo ao qual estava exposta a parte autora está elencado como especial e a prova é adequada. Portanto, é cabível o reconhecimento da natureza especial do labor.
Período: 09/09/2002 a 14/11/2011 (DER).
Empresa: Auto Posto Túlio Ltda., localizado em Osório/RS, BR 101, km 83.
Atividade/função: Lubrificador.
Agentes nocivos: submetido a riscos de explosão em seu local de trabalho com a presença de vapores inflamáveis e também a exposição de produtos nocivos à saúde e possibilidade de prejuízos a reprodução.
Prova: CTPS (fl. 38) e Laudo pericial (fl. 241/244)
Enquadramento legal: Periculosidade: Anexo 2 da NR 16 (Portaria n° 3.214/78), itens 1.m, 2.V.a e 3.q; Súmula 198 do extinto TFR.
Conclusão: o agente nocivo ao qual estava exposta a parte autora está elencado como especial e a prova é adequada. Portanto, é cabível o reconhecimento da natureza especial do labor..
Em consulta ao CNIS, observo que o autor esteve em gozo de auxílio doença previdenciário de 03/02/2007 a 18/08/2007, tendo requerido a desistência do referido período.
Deste modo, cabível o reconhecimento da natureza especial do labor exercido pelo autor nos períodos: de 01/04/1980 a 14/09/1982, de 01/02/1986 a 20/09/1988, de 01/08/1989 a 16/05/1994, de 01/01/1995 a 31/03/1999, de 01/10/1999 a 17/08/2001, de 09/09/2002 a 02/02/2007 e de 19/08/2007 a 14/11/2011.
Em decorrência, é devido à parte autora o acréscimo resultante da conversão em tempo comum para fins de aposentadoria.
Da Conversão do Tempo de Serviço Especial para Comum
Cumpre ressaltar que esta Corte já firmou entendimento no sentido de que é possível a conversão do tempo especial para comum, mesmo com relação aos períodos anteriores ao advento da Lei nº 6.887, de 10/12/1980.
No que tange à possibilidade de conversão de tempo de serviço especial prestado a partir de 28/05/1998, a Medida Provisória nº 1.663/98 revogou o §5º do art. 57 da Lei nº 8.213/91. Todavia, a Lei 9.711/98 deixou de convalidar a prefalada revogação, por via expressa ou tácita, motivo pelo qual plena é a vigência dos artigos 57 e 58 da Lei de Benefícios e, por conseguinte, possível a conversão de tempo de serviço especial em comum inclusive após 28/05/1998.
Quanto ao fator de conversão, pacífico é o entendimento de que, em casos como o presente, onde os requisitos da aposentadoria foram implementados durante a vigência da Lei n. 8.213, de 24/07/1991, devem ser aplicados a todo o período laboral os fatores de conversão previstos no artigo 64 do Decreto nº 357/91, que regulamenta o referido diploma legal.
Desta forma, admitida a especialidade da atividade desenvolvida nos períodos de 01/04/1980 a 14/09/1982, de 01/02/1986 a 20/09/1988, de 01/08/1989 a 16/05/1994, de 01/01/1995 a 31/03/1999, de 01/10/1999 a 17/08/2001, de 09/09/2002 a 02/02/2007 e de 19/08/2007 a 14/11/2011, impõe-se a conversão pelo fator multiplicador 1,4 (segurado homem), totalizando o acréscimo de 09 anos, 10 meses e 11 dias.
Dos Requisitos para Concessão de Aposentadoria por Tempo de Serviço/Contribuição
Até 16 de dezembro de 1998, quando do advento da EC n.º 20/98, a aposentadoria por tempo de serviço, disciplinada pelos art. 52 e 53 da Lei n.º 8.213/91, pressupunha o preenchimento, pelo segurado, do prazo de carência (previsto no art. 142 da referida Lei para os inscritos até 24 de julho de 1991 e previsto no art. 25, II, da referida Lei, para os inscritos posteriormente à referida data) e a comprovação de 25 anos de tempo de serviço para a mulher e de 30 anos para o homem, a fim de ser garantido o direito à aposentadoria proporcional no valor de 70% do salário-de-benefício, acrescido de 6% por ano adicional de tempo de serviço, até o limite de 100% (aposentadoria integral), o que se dá aos 30 anos de serviço para as mulheres e aos 35 para os homens.
Com as alterações introduzidas pela EC nº 20/98, o benefício passou denominar-se aposentadoria por tempo de contribuição, disciplinado pelo art. 201, § 7º, I, da Constituição Federal. A nova regra, entretanto, muito embora tenha extinguido a aposentadoria proporcional, manteve os mesmos requisitos anteriormente exigidos à aposentadoria integral, quais sejam, o cumprimento do prazo de carência, naquelas mesmas condições, e a comprovação do tempo de contribuição de 30 anos para mulher e de 35 anos para homem.
Em caráter excepcional, possibilitou-se que o segurado, já filiado ao regime geral de previdência social até a data de publicação da Emenda, ainda se aposente proporcionalmente quando: I) contando com 53 anos de idade, se homem, e com 48 anos de idade se mulher - e atendido ao requisito da carência - II) atingir tempo de contribuição igual, no mínimo, à soma de: a) 30 anos, se homem, e de 25 anos, se mulher; e b) e um período adicional de contribuição (pedágio) equivalente a quarenta por cento do tempo que, na data da publicação da Emenda, faltaria para atingir o mínimo de tempo para a aposentadoria proporcional (art. 9º, § 1º, da EC nº 20/98). O valor da aposentadoria proporcional será equivalente a 70% do salário-de-benefício, acrescido de 5% por ano de contribuição que supere a soma a que se referem os itens "a" e "b" supra, até o limite de 100%.
De qualquer modo, o disposto no art. 56 do Decreto n.º 3.048/99 (§§ 3º e 4º) expressamente ressalvou, independentemente da data do requerimento do benefício, o direito à aposentadoria pelas condições legalmente previstas à época do cumprimento de todos os requisitos, assegurando sua concessão pela forma mais benéfica, desde a entrada do requerimento.
Do Direito à Aposentadoria no Caso Concreto
A composição do tempo de serviço do autor, na DER (14/11/2011) é:
a) tempo reconhecido administrativamente: 26 anos, 05 meses e 03 dias;
b) tempo de atividade rural reconhecido nesta ação: de 14/07/1970 a 18/06/1979, 08 anos, 11 meses e 05 dias;
c) tempo de atividade especial convertida em comum de 01/04/1980 a 14/09/1982, de 01/02/1986 a 20/09/1988, de 01/08/1989 a 16/05/1994, de 01/01/1995 a 31/03/1999, de 01/10/1999 a 17/08/2001, de 09/09/2002 a 02/02/2007 e de 19/08/2007 a 14/11/2011, impondo-se a conversão pelo fator multiplicador 1,4 (segurado homem), totalizando o acréscimo de 09 anos, 10 meses e 11 dias;
Total de tempo de contribuição na DER: 45 anos, 02 meses e 19 dias.
A carência necessária à obtenção do benefício de aposentadoria no ano de 2011 era de 180 meses (art. 142 da Lei n.º 8.213/91) restou cumprida.
Assim, cumprindo com os requisitos tempo de serviço e carência, a parte autora tem direito:
- à implementação do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição integral desde a data do requerimento, segundo o cálculo que lhe for mais vantajoso;
- ao pagamento das parcelas vencidas.
Da Correção Monetária
A correção monetária incidirá a contar do vencimento de cada prestação, e será calculada pelos índices oficiais e aceitos na jurisprudência, quais sejam:
- IPCA-E (a partir de 30/06/2009, conforme RE 870.947, julgado em 20/09/2017).
Dos Juros de Mora
A partir de 30/06/2009, os juros incidem de uma só vez, de acordo com os índices oficiais de remuneração básica e juros aplicados à caderneta de poupança, conforme o art. 5º da Lei 11.960/2009, que deu nova redação ao art. 1º-F da Lei n.º 9.494/1997.
Das Custas Processuais e dos Honorários Advocatícios
O INSS é isento do pagamento das custas no Foro Federal (inc. I do art. 4º da Lei 9.289/1996) e na Justiça Estadual do Rio Grande do Sul, devendo, contudo, pagar eventuais despesas processuais, como as relacionadas a correio, publicação de editais e condução de oficiais de justiça (art. 11 da Lei Estadual 8.121/1985, com a redação da Lei Estadual 13.471/2010, já considerada a inconstitucionalidade formal reconhecida na ADI nº 70038755864, TJRS, Órgão Especial).
Mantida a condenação do INSS fixada na sentença quanto ao pagamento da verba honorária, 10% sobre o valor da condenação.
Da Implantação do Benefício
A Terceira Seção deste Tribunal Regional Federal da Quarta Região definiu a questão da implantação imediata de benefício previdenciário, tanto em casos de concessão quanto de revisão de benefício:
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. CONCESSÃO DE BENEFÍCIO. ART. 461 do CPC. TUTELA ESPECÍFICA. OBRIGAÇÃO DE FAZER. EFICÁCIA PREPONDERANTEMENTE MANDAMENTAL DO PROVIMENTO. CUMPRIMENTO IMEDIATO DO ACÓRDÃO. POSSIBILIDADE. REQUERIMENTO DO SEGURADO. DESNECESSIDADE.
1. Atento à necessidade de aparelhar o processo de mecanismos preordenados à obtenção do resultado prático equivalente à situação jurídica que se verificaria caso o direito material tivesse sido observado espontaneamente pelo "devedor" através da realização da conduta imposta pelo direito material, o legislador, que já havia, na época da edição do Código de Defesa do Consumidor (Lei 8.078/90) instituído a tutela específica do direito do "credor" de exigir o cumprimento dos deveres de fazer ou não fazer decorrentes de relação de consumo, inseriu no ordenamento processual positivo, por meio da alteração no art. 461 do Código de Processo Civil operada pela Lei 8.952/94, a tutela específica para o cumprimento dos deveres de fazer ou não fazer decorrentes das relações do direito material que não as de consumo.
2. A adoção da tutela específica pela reforma processual de 1994 do CPC veio para suprir, em parte, a morosidade judicial, na proporção em que busca dar ao cidadão aquilo e somente aquilo que lhe é devido, tirando o direito do plano genérico-abstrato da norma, conferindo-lhe efeitos concretos, com o fito de lhe garantir a mesma conseqüência do que aquela que seria obtida pelo adimplemento voluntário.
3. A sentença que concede um benefício previdenciário (ou assistencial), em regra, compõe-se de uma condenação a implantar o referido benefício e de outra ao pagamento das parcelas atrasadas. No tocante à determinação de implantação do benefício (para o futuro, portanto), a sentença é condenatória mandamental e será efetiva mediante as atividades de cumprimento da sentença stricto sensu previstas no art. 461 do CPC, sem a necessidade de um processo executivo autônomo (sine intervallo).
4. A respeito do momento a partir do qual se poderá tornar efetiva a sentença, na parte referente à implantação futura do benefício, a natureza preponderantemente mandamental da decisão não implica automaticamente o seu cumprimento imediato, pois há de se ter por referência o sistema processual do Código, não a Lei do Mandado de Segurança, eis que a apelação de sentença concessiva do benefício previdenciário será recebida em seu efeito devolutivo e suspensivo, nos termos do art. 520, caput, primeira parte, do CPC, motivo pelo qual a ausência de previsão de efeito suspensivo ex lege da apelação, em casos tais, traz por conseqüência a impossibilidade, de regra, do cumprimento imediato da sentença.
5. Situação diversa ocorre, entretanto, em segundo grau, visto que o acórdão que concede o benefício previdenciário, que esteja sujeito apenas a recurso especial e/ou recurso extraordinário, enseja o cumprimento imediato da determinação de implantar o benefício, ante a ausência, via de regra, de efeito suspensivo daqueles recursos, de acordo com o art. 542, § 2º, do CPC. Tal cumprimento não fica sujeito, pois, ao trânsito em julgado do acórdão, requisito imprescindível apenas para a execução da obrigação de pagar (os valores retroativamente devidos) e, consequentemente, para a expedição de precatório e de requisição de pequeno valor, nos termos dos parágrafos 1º, 1º-A e 3º do art. 100 da Constituição Federal.
6. O cumprimento imediato da tutela específica, diversamente do que ocorre no tocante à antecipação de tutela prevista no art. 273 do CPC, independe de requerimento expresso por parte do segurado ou beneficiário, pois aquele é inerente ao pedido de que o réu seja condenado a conceder o benefício previdenciário, e o seu deferimento sustenta-se na eficácia mandamental dos provimentos fundados no art. 461 do CPC. Em suma, a determinação da implantação imediata do benefício contida no acórdão consubstancia, tal como no mandado de segurança, uma ordem (à autarquia previdenciária) e decorre do pedido de tutela específica (ou seja, o de concessão do benefício) contido na petição inicial da ação.
7. Questão de ordem solvida para que, no tocante à obrigação de implantar (para o futuro) o benefício previdenciário, seja determinado o cumprimento imediato do acórdão sujeito apenas a recurso especial e/ou extraordinário, independentemente de trânsito em julgado e de pedido específico da parte autora.
(TRF4, Terceira Seção, AC 2002.71.00.050349-7 Questão de ordem, rel. Celso Kipper, j. 09/08/2007)
Neste caso, reconhecido o direito ao benefício, impõe-se a implantação imediata.
A bem da celeridade processual, já que o INSS vem opondo embargos de declaração em todos os casos em que determinada a implantação imediata do benefício, alegando, para fins de prequestionamento, violação do art. 128, ou do inc. I do art. 475-O, tudo do Código de Processo Civil de 1973 (art. 141, ou ao § 5º do art. 520 do Código de Processo Civil de 2015), e art. 37 da Constituição, aborda-se desde logo a matéria.
Não se cogita de ofensa ao art. 128, ou ao inc. I do art. 475-O, do Código de Processo Civil de 1973 (art. 141, ou ao § 5º do art. 520 do Código de Processo Civil de 2015), porque a hipótese, nos termos do precedente da Terceira Seção desta Corte, não é de antecipação, de ofício, de atos executórios. A implantação do benefício decorre da natureza da tutela judicial deferida, como está expresso na ementa acima transcrita.
A invocação do art. 37 da Constituição, por outro lado, é despropositada. Sequer remotamente se verifica ofensa ao princípio da moralidade pela concessão de benefício previdenciário por autoridade judicial competente.
Desta forma, em vista da procedência do pedido e do que estabelecem os arts. 461 e 475-I do Código de Processo Civil de 1973 (arts. 497 e 513 do Código de Processo Civil de 2015), bem como dos fundamentos expostos na questão de ordem cuja ementa foi acima transcrita, deve o INSS implantar o benefício em até quarenta e cinco dias, conforme os parâmetros acima definidos, incumbindo ao representante judicial da autarquia que for intimado desta decisão dar ciência à autoridade administrativa competente e tomar as demais providências necessárias ao cumprimento da tutela específica.
Conclusão
Deve ser dado parcial provimento ao apelo e à remessa oficial para afastar a condenação do INSS ao pagamento das custas processuais.
Ordem para implantação imediata do benefício.
Dispositivo
Ante o exposto, voto no sentido de dar parcial provimento ao apelo e à remessa oficial e determinar a imediata implantação do benefício.
Juíza Federal Gisele Lemke
Relatora
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 28/11/2017
APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 0012425-27.2016.4.04.9999/RS
ORIGEM: RS 00108055320128210059
RELATOR | : | Juíza Federal GISELE LEMKE |
PRESIDENTE | : | Luiz Carlos Canalli |
PROCURADOR | : | Dr. Fábio Nesi Venzon |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
APELADO | : | TELMO PASA DE LIMA |
ADVOGADO | : | Teodoro Matos Tomaz |
REMETENTE | : | JUIZO DE DIREITO DA 1A VARA DA COMARCA DE OSÓRIO/RS |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 28/11/2017, na seqüência 92, disponibilizada no DE de 13/11/2017, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, a DEFENSORIA PÚBLICA e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 5ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU DAR PARCIAL PROVIMENTO AO APELO E À REMESSA OFICIAL E DETERMINAR A IMEDIATA IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Juíza Federal GISELE LEMKE |
VOTANTE(S) | : | Juíza Federal GISELE LEMKE |
: | Des. Federal LUIZ CARLOS CANALLI | |
: | Juiz Federal ÉZIO TEIXEIRA |
Lídice Peña Thomaz
Secretária de Turma
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