Ementa para citação:

EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO/CONTRIBUIÇÃO. REQUISITOS NÃO IMPLEMENTADOS. ATIVIDADE RURAL. INÍCIO DE PROVA MATERIAL. ATIVIDADE URBANA DO GENITOR.

1. É devido o reconhecimento do tempo de serviço rural, em regime de economia familiar, quando comprovado mediante início de prova material corroborado por testemunhas. Hipótese em que é devido o reconhecimento da atividade agrícola no período de 30-09-1972 (12 anos) a 31-12-1979, haja vista que, muito embora o pai do autor possuísse uma “bodega”, certo é que não há comprovação de que os rendimentos por ele auferidos fossem suficientes para a manutenção do grupo familiar, de modo a tornar a atividade rural mera complementação daquela renda, nos termos do que foi definido pelo STJ no Recurso Especial repetitivo n. 1.304.479, da Relatoria do Ministro Herman Benjamin, DE de 19-12-2012.

2. Considerando que no período de 1972 a 1979 o autor era menor de idade, não se poderia exigir, dessa forma, a apresentação de início de prova material em nome próprio, haja vista que estes eram emitidos em nome do pai, na condição de chefe do grupo familiar. Desse modo, o referido recurso repetitivo não se aplica à hipótese.

3. A partir de 1980 não é possível reconhecer o tempo de serviço rural, seja porque o demandante já não mais exercia a atividade agrícola, seja porque os valores obtidos pelo seu genitor, decorrentes do exercício de atividade urbana, demonstram a dispensabilidade do trabalho rural para a subsistência do grupo familiar.

4. Não comprovado o tempo de serviço suficiente, deve ser indeferida a aposentadoria por tempo de contribuição postulada, e averbado o tempo rural reconhecido para futura concessão de benefício previdenciário.

(TRF4, AC 0009194-31.2012.404.9999, Sexta Turma, Relator Celso Kipper, D.E. 30/03/2015)


INTEIRO TEOR

D.E.

Publicado em 31/03/2015

APELAÇÃO CÍVEL Nº 0009194-31.2012.404.9999/RS

RELATOR:Des. Federal CELSO KIPPER
APELANTE:GILMAR SCARIOT
ADVOGADO:Elisandra Kleber Piva
APELADO:INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL – INSS
ADVOGADO:Procuradoria Regional da PFE-INSS

EMENTA

PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO/CONTRIBUIÇÃO. REQUISITOS NÃO IMPLEMENTADOS. ATIVIDADE RURAL. INÍCIO DE PROVA MATERIAL. ATIVIDADE URBANA DO GENITOR.

1. É devido o reconhecimento do tempo de serviço rural, em regime de economia familiar, quando comprovado mediante início de prova material corroborado por testemunhas. Hipótese em que é devido o reconhecimento da atividade agrícola no período de 30-09-1972 (12 anos) a 31-12-1979, haja vista que, muito embora o pai do autor possuísse uma “bodega”, certo é que não há comprovação de que os rendimentos por ele auferidos fossem suficientes para a manutenção do grupo familiar, de modo a tornar a atividade rural mera complementação daquela renda, nos termos do que foi definido pelo STJ no Recurso Especial repetitivo n. 1.304.479, da Relatoria do Ministro Herman Benjamin, DE de 19-12-2012.

2. Considerando que no período de 1972 a 1979 o autor era menor de idade, não se poderia exigir, dessa forma, a apresentação de início de prova material em nome próprio, haja vista que estes eram emitidos em nome do pai, na condição de chefe do grupo familiar. Desse modo, o referido recurso repetitivo não se aplica à hipótese.

3. A partir de 1980 não é possível reconhecer o tempo de serviço rural, seja porque o demandante já não mais exercia a atividade agrícola, seja porque os valores obtidos pelo seu genitor, decorrentes do exercício de atividade urbana, demonstram a dispensabilidade do trabalho rural para a subsistência do grupo familiar.

4. Não comprovado o tempo de serviço suficiente, deve ser indeferida a aposentadoria por tempo de contribuição postulada, e averbado o tempo rural reconhecido para futura concessão de benefício previdenciário.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação do autor, e determinar o cumprimento imediato do acórdão no tocante à averbação do período reconhecido, votos e notas taquigráficas que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Porto Alegre, 25 de março de 2015.

Des. Federal CELSO KIPPER

Relator


Documento eletrônico assinado por Des. Federal CELSO KIPPER, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 6754076v10 e, se solicitado, do código CRC E9FB56D5.
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0009194-31.2012.404.9999/RS

RELATOR:Des. Federal CELSO KIPPER
APELANTE:GILMAR SCARIOT
ADVOGADO:Elisandra Kleber Piva
APELADO:INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL – INSS
ADVOGADO:Procuradoria Regional da PFE-INSS

RELATÓRIO

Cuida-se de apelação contra sentença em que o magistrado a quo julgou improcedente o pedido de concessão de aposentadoria por tempo de contribuição, condenando a parte autora ao pagamento de custas processuais e de honorários advocatícios, os quais restaram fixados em R$ 900,00.

Apela o autor, requerendo a reforma da sentença para reconhecer o tempo de serviço rural, em regime de economia familiar, de 30-09-1972 (12 anos) a 24-07-1991, com a consequente concessão de aposentadoria por tempo de contribuição desde 18-02-2010, condenando-se ao apelado, ainda, aos ônus sucumbenciais.

Com a apresentação de contrarrazões remissivas à contestação, vieram os autos a esta Corte.

Nesta instância, foi determinada a expedição de ofício ao DETRAN/RS para que informasse a data em que o autor obteve sua primeira habilitação como motorista.

Cumprida a determinação e após a intimação das partes acerca dos documentos juntados, vieram os autos a este Relator para julgamento.

É o relatório.

VOTO

A controvérsia restringe-se ao reconhecimento do tempo de serviço laborado em atividade rural, em regime de economia familiar, no período de 30-09-1972 (12 anos) a 24-07-1991, com a consequente concessão de aposentadoria por tempo de serviço/contribuição.

DA ATIVIDADE RURAL

Para a comprovação do tempo de atividade rural com vista à obtenção de aposentadoria por tempo de serviço/contribuição, faz-se necessário início de prova material, não sendo admitida, via de regra, prova exclusivamente testemunhal (art. 55, § 3º, da Lei n. 8.213/91; Súmula 149 do STJ). A respeito, está pacificado nos Tribunais que não se exige comprovação documental ano a ano do período que se pretende comprovar (TRF – 4ª Região, AC n. 2003.04.01.009616-5, Terceira Seção, Rel. Des. Luís Alberto D”Azevedo Aurvalle, D.E. de 19-11-2009; TRF – 4ª Região, EAC n. 2002.04.01.025744-2, Terceira Seção, Rel. para o Acórdão Des. Federal Ricardo Teixeira do Valle Pereira, julgado em 14-06-2007; TRF – 4ª Região, EAC n. 2000.04.01.031228-6, Terceira Seção, Rel. Des. Federal Celso Kipper, DJU de 09-11-2005), bem como que constituem prova material os documentos civis (STJ, AR n. 1166/SP, Terceira Seção, Rel. Min. Hamilton Carvalhido, DJU de 26-02-2007; TRF – 4ª Região, AC n. 2003.71.08.009120-3/RS, Quinta Turma, Rel. Des. Federal Celso Kipper, D.E. de 20-05-2008; TRF – 4ª Região, AMS n. 2005.70.01.002060-3, Sexta Turma, Rel. Des. Federal João Batista Pinto Silveira, DJ de 31-05-2006) – tais como certificado de alistamento militar, certidões de casamento e de nascimento, dentre outros – em que consta a qualificação como agricultor tanto da parte autora como de seu cônjuge ou de seus pais (Súmula 73 desta Corte). No entanto, não existe consenso sobre o alcance temporal dos documentos, para efeitos probatórios, nem se há ou não necessidade de documento relativo ao início do período a ser comprovado. Para chegar a uma conclusão, parece necessário averiguar a função da prova material na comprovação do tempo de serviço.

A prova material, conforme o caso, pode ser suficiente à comprovação do tempo de atividade rural, bastando, para exemplificar, citar a hipótese de registro contemporâneo em CTPS de contrato de trabalho como empregado rural. Em tal situação, não é necessária a inquirição de testemunhas para a comprovação do período registrado.

Na maioria dos casos que vêm a juízo, no entanto, a prova material não é suficiente à comprovação de tempo de trabalho, necessitando ser corroborada por prova testemunhal. Nesses casos, a prova material (ainda que incipiente) tem a função de ancoragem da prova testemunhal, sabido que esta é flutuante, sujeita a esquecimentos, enganos e desvios de perspectiva. A prova material, portanto, serve de base, sustentação, pilar em que se apoia (apesar dos defeitos apontados) a necessária prova testemunhal.

Em razão disso, entendo que, no mais das vezes, não se pode averiguar os efeitos da prova material em relação a si mesma, devendo a análise recair sobre a prova material em relação à prova testemunhal, aos demais elementos dos autos e ao ambiente socioeconômico subjacente; em outras palavras, a análise deve ser conjunta. A consequência dessa premissa é que não se pode afirmar, a priori, que há necessidade de documento relativo ao início do período a ser comprovado, ou que a eficácia probatória do documento mais antigo deva retroagir um número limitado de anos. O alcance temporal da prova material dependerá do tipo de documento, da informação nele contida (havendo nuances conforme ela diga respeito à parte autora ou a outrem), da realidade fática presente nos autos ou que deles possa ser extraída e da realidade socioeconômica em que inseridos os fatos sob análise.

Também se discute, na presente ação, sobre a possibilidade de ser reconhecido, para fins de aposentadoria, tempo de serviço referente à atividade rural em regime de economia familiar exercida por menor com idade inferior a catorze anos.

O reconhecimento do tempo de serviço rural em regime de economia familiar deu-se somente a partir da edição da Lei 8213/91, que, em seu art. 11, inciso VII, e parágrafo primeiro, assim dispõe:

Art. 11 – São segurados obrigatórios da Previdência Social as seguintes pessoas físicas:

(…) omissis

VII – como segurado especial: o produtor, o parceiro, o meeiro e o arrendatário rurais, o garimpeiro, o pescador artesanal e o assemelhado, que exerçam suas atividades, individualmente ou em regime de economia familiar, ainda que com o auxílio eventual de terceiros, bem como seus respectivos cônjuges ou companheiros e filhos maiores de 14 (quatorze) anos ou a eles equiparados, desde que trabalhem, comprovadamente, com o grupo familiar respectivo.

§ 1º Entende-se como regime de economia familiar a atividade em que o trabalho dos membros da família é indispensável à própria subsistência e é exercido em condições de mútua dependência e colaboração, sem a utilização de empregados. (…)

A mesma Lei n. 8.213/91, em seu art. 55, § 2º, possibilita que o tempo de serviço do segurado trabalhador rural, anterior à data de início de sua vigência, seja computado independentemente do recolhimento das contribuições a ele correspondentes, exceto para efeito de carência. E é com relação a esse tempo de serviço – anterior ao início da vigência da Lei n. 8.213/91 – que se trata aqui.

Pois bem, o art. 11, inc. VII, da Lei n. 8.213/91, acima transcrito, estabelece a idade mínima de 14 anos para que o trabalhador rural em regime de economia familiar possa ser considerado segurado especial da Previdência Social. A idade de 14 anos não é aleatória. À toda evidência, o legislador procurou coerência com a idade mínima permitida para o exercício de atividade laboral segundo a norma constitucional vigente quando da edição da Lei supramencionada. A lógica foi a seguinte: se o art. 7º, inc. XXXIII, da Constituição Federal de 1988, em sua versão original, proibia qualquer trabalho a menores de quatorze anos, salvo na condição de aprendiz, deveria esta idade ser considerada limite mínimo para a obtenção da condição de segurado especial e, em conseqüência, para o reconhecimento do tempo de serviço rural.

Desde já é preciso dizer que tal lógica não pode prevalecer para períodos anteriores à proibição de trabalho para menores de quatorze anos de idade. Assim, sob a égide das Constituições Federais de 1967 e 1969, proibia-se o trabalho a quem contasse menos de 12 anos de idade. Ora, em tal período deveria ser reconhecido para fins previdenciários, pelo menos, o trabalho rural desempenhado a partir dos 12 anos de idade. Aliás, é essa a interpretação dada à Lei n. 8.213/91 pelo próprio INSS no âmbito administrativo, como se vê da Ordem de Serviço INSS/DSS 623, de 19 de maio de 1999 (DOU de 08-07-1999):

2 – DO LIMITE DE IDADE PARA INGRESSO NO RGPS

2.1 – O limite mínimo para ingresso na Previdência Social dos segurados que exercem atividade urbana ou rural é o seguinte:

a) até 28.02.67 = 14 anos;

b) de 01.03.67 a 04.10.88 = 12 anos;

c) de 05.10.88 a 15.12.98 = 14 anos, sendo permitida a filiação de menor aprendiz a partir de 12 anos;

d) a partir de 16.12.98 = 16 anos, exceto para o menor aprendiz que é de 14 anos.

Procurei demonstrar que a idade mínima considerada pela Lei n. 8.213/91 para possibilitar que o trabalhador rural em regime de economia familiar seja considerado segurado especial está intimamente ligada com a idade mínima constitucionalmente prevista para o exercício de qualquer trabalho. Mas não é só. Na verdade, desde há muito tempo, tem-se considerado pelos tribunais pátrios, inclusive o Supremo Tribunal Federal, que não podem ser prejudicados em seus direitos trabalhistas e previdenciários os menores de idade que exerçam efetivamente atividade laboral, ainda que cont

rariamente à Constituição e à lei, no tocante à idade mínima permitida para o referido trabalho. O limite mínimo de idade para que alguém possa trabalhar é garantia constitucional em prol do menor, vale dizer, norma protetiva do menor norteadora da legislação trabalhista e previdenciária. A mesma norma editada para proteger o menor não pode, no entanto, prejudicá-lo naqueles casos em que, não obstante a proibição constitucional, efetivamente trabalhou.

Nesse sentido, em matéria previdenciária, precedente do Supremo Tribunal Federal, sob o regime constitucional anterior:

ACIDENTE DO TRABALHO. SEGURO OBRIGATÓRIO ESTABELECIDO NO ART. 165- XVI DA CONSTITUIÇÃO: ALCANCE. CONTRATO LABORAL COM AFRONTA A PROIBIÇÃO CONSTITUCIONAL DO TRABALHO DO MENOR DE DOZE ANOS.

Menor de doze anos que prestava serviços a um empregador, sob a dependência deste, e mediante salário. Tendo sofrido o acidente de trabalho faz jus ao seguro próprio. Não obsta ao beneficio a regra do art. 165-X da Carta da Republica, que foi inscrita na lista das garantias dos trabalhadores em proveito destes, não em seu detrimento.

Recursos extraordinários conhecidos e providos.

(STF, RE 104.654-6/SP, 2ª Turma, Rel. Min. Francisco Rezek, julgado unânime em 11.03.86, DJ 25.04.86, p. 6.514)

Do voto do ilustre Ministro Relator, extraio um parágrafo que resume o fundamento daquela decisão:

Está claro, ainda, que a regra do inciso X do mesmo dispositivo constitucional – proibindo qualquer trabalho ao menor de doze anos – foi inscrita na lista das garantias dos trabalhadores em proveito destes, e não em seu detrimento. Não me parece, assim, razoável o entendimento da origem, que invoca justamente uma norma voltada para a melhoria da condição social do trabalhador, e faz dela a premissa de uma conclusão que contraria o interesse de seu beneficiário, como que a prover nova espécie de ilustração para a secular ironia “summum jus, summa injuria”.

Vê-se, pois, que o STF alarga ainda mais a interpretação acima deduzida. Já não se trata de limitar os efeitos de natureza previdenciária àquelas atividades desempenhadas segundo a idade constitucionalmente permitida, considerando-se a Constituição vigente à época do efetivo exercício laboral, mas de estender aqueles efeitos mesmo se o exercício do trabalho tenha se dado contra expressa proibição constitucional, relativa à idade mínima para tal.

Tal entendimento vem também evidenciado no precedente de que colho a ementa a seguir:

Agravo de instrumento. 2. Trabalhador rural ou rurícola menor de quatorze anos. Contagem de tempo de serviço. Art. 11, VII, da Lei nº 8213. Possibilidade. Precedentes. 3. Alegação de violação aos arts. 5°, XXXVI; e 97, da CF/88. Improcedente. Impossibilidade de declaração de efeitos retroativos para o caso de declaração de nulidade de contratos trabalhistas. Tratamento similar na doutrina do direito comparado: México, Alemanha, França e Itália. Norma de garantia do trabalhador que não se interpreta em seu detrimento. Acórdão do STJ em conformidade com a jurisprudência desta Corte. 4. Precedentes citados: AgRAI 105.794, 2ª T., Rel. Aldir Passarinho, DJ 02.05.86; e RE 104.654, 2ª T., Rel. Francisco Rezek, DJ 25.04.86 5. Agravo de instrumento a que se nega provimento.

(Agravo de Instrumento nº 529.694-1/RS, Segunda Turma, Rel. Min. Gilmar Mendes, DJ 11-03-2005)

Existe outro fundamento relevante para o reconhecimento de efeitos previdenciários àquele que, embora conte com idade inferior à mínima permitida para o exercício de qualquer trabalho, efetivamente o desempenhe. Trata-se de um argumento que diz respeito ao seu contrário, ou seja, à hipótese de não-reconhecimento daqueles efeitos, e pode ser resumido assim: a vida e o direito, nesse caso, seriam muito cruéis para o menor, criança ainda, pois além de ter sido obrigado ao trabalho em tenra idade – sem valer-se da proteção da família e do Estado – ainda não teria considerado tal trabalho para fins previdenciários, resultando, na prática, uma dupla punição.

Com base em tais fundamentos, o Superior Tribunal de Justiça vem, reiteradamente, reconhecendo para fins previdenciários o tempo de serviço rural desempenhado antes dos quatorze anos de idade, como se constata, apenas a título de exemplo, das decisões assim ementadas:

PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. TEMPO DE SERVIÇO. RURÍCOLA. MENOR DE 12 ANOS. LEI Nº 8.213/91, ART. 11, INCISO VII. PRECEDENTES. SÚMULA 07/STJ.

1 – Demonstrado o exercício da atividade rural do menor de doze anos, em regime de economia familiar, o tempo de serviço é de ser reconhecido para fins previdenciários, porquanto as normas que proíbem o trabalho do menor foram editadas para protegê-lo e não para prejudicá-lo. Precedentes.

2 – Recurso especial conhecido.

(STJ, RE 331.568/RS, Sexta Turma, Rel. Min. Fernando Gonçalves, julgado unânime em 23-10-2001, DJ 12-11-2001)

PREVIDENCIÁRIO – RECURSO ESPECIAL – RECONHECIMENTO DE TEMPO DE SERVIÇO RURAL ANTERIOR AOS 14 ANOS DE IDADE – POSSIBILIDADE – NORMA CONSTITUCIONAL DE CARÁTER PROTECIONISTA – IMPOSSIBILIDADE DE RESTRIÇÃO AOS DIREITOS DO TRABALHADOR – DIVERGÊNCIA JURISPRUDENCIAL NÃO COMPROVADA – ART. 255 E PARÁGRAFOS DO RISTJ.

– Desde de que comprovada atividade rural por menor de 12 (doze) anos de idade, impõe-se o seu reconhecimento para fins previdenciários. Precedentes.

– A simples transcrição de ementas não é suficiente para caracterizar o dissídio jurisprudencial apto a ensejar a abertura da via especial, devendo ser mencionadas e expostas as circunstâncias que identifiquem ou assemelhem os casos confrontados, bem como, juntadas certidões ou cópias integrais dos julgados paradigmas.

– Inteligência do art. 255 e seus parágrafos do RISTJ.

– Precedentes desta Corte.

– Recurso parcialmente conhecido, e nessa parte provido.

(STJ, RE 396.338/RS, Quinta Turma, Rel. Min. Jorge Scartezzini, julgado unânime em 02.04.2002, DJ 22-04-2002)

PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO. NOTAS FISCAIS EM NOME DO PAI. INÍCIO DE PROVA MATERIAL. CÔMPUTO DE ATIVIDADE RURAL EXERCIDA ANTES DE COMPLETAR QUATORZE ANOS DE IDADE EM REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. POSSIBILIDADE. ALUNO-APRENDIZ. ESCOLA PÚBLICA PROFISSIONAL.

I – As notas fiscais de produtor rural, em nome do pai do Autor, constituem início razoável de prova material, a completar a prova testemunhal, para comprovação de atividade rural em regime de economia familiar.

II – Deve-se considerar o período de atividade rural do menor de 12 (doze) anos, para fins previdenciários, desde que devidamente comprovado, pois a proteção conferida ao menor não pode agora servir para prejudicá-lo.

III – O tempo de atividade como aluno-aprendiz é contado para fins de aposentadoria previdenciária.

IV – Recurso conhecido e provido.

(STJ, RE 382.085, Quinta Turma, Rel. Min. Gilson Dipp, julgado unânime em 06.06.2002, DJ 01-07-2002)

De qualquer sorte, o efetivo exercício da atividade rural deve ser comprovado, não bastando, obviamente, a comprovação de que seja filho de agricultor. Para tanto, devem ser comprovados os requisitos do art. 11, § 1º, da Lei n. 8.213/91 (trabalho dos membros da família indispensável à própria subsistência e exercido em condições de mútua dependência e colaboração, sem a utilização de empregados).

Para a comprovação da atividade rural, o autor trouxe aos autos os seguintes documentos:

a) Certidão de Nascimento do autor, lavrada em 1960, na qual o seu genitor foi qualificado como agricultor (fl. 26);

b) Histórico Escolar, no qual se verifica que o requerente estudou em uma escola rural entre 1972 a 1976 (fl. 27);

c) Notas Fiscais de Comercialização Agrícola em nome do pai do autor, emitidas

nos anos de 1974, 1977, 1978, 1981, 1982, 1983, 1984, 1985, 1986 e 1987 (fls. 28 e 30-43);

d) Matrícula do Registro de Imóveis do Município de Ronda Alta – RS, na qual se verifica que o pai do autor, ali qualificado como agricultor, adquiriu um lote rural com 22 hectares, sem constar a data da compra, mas cujo registro ocorreu em 1979, sendo vendido em 1993 (fls. 17-18);

e) Notas Fiscais de Comercialização Agrícola em nome da mãe do demandante, emitidas nos anos de 1988, 1989, 1990 e 1991 (fls. 44-51).

Em complementação, no dia 23-08-2011 foi realizada audiência de instrução, na qual foi tomado o depoimento pessoal do autor, e na qual foram ouvidas as testemunhas Oscar Francisco Santin, Valcir Vedana e Alexandre Motim. Todos os depoimentos foram gravados em mídia digital, e constam no CD anexado aos autos (fl. 180).

A análise do conjunto probatório permite o reconhecimento do exercício de atividades rurais em regime de economia familiar apenas no período de 30-09-1972 (12 anos) a 31-12-1979, senão vejamos.

As informações do CNIS – Cadastro Nacional de Informações Sociais juntadas às fls. 77-78 demonstram que o genitor do demandante era proprietário da Comercial Scariot desde maio de 1966, empresa individual do ramo do comércio varejista de mercadorias em geral. As informações do CNIS juntadas às fls. 80-81 ainda comprovam que, pelo menos entre 1985 e 1988, o pai dele esteve vinculado à Previdência Social na condição de empresário (contribuinte individual), recolhendo contribuições previdenciárias sobre salários de contribuição superiores a 5 salários mínimos, em média. O próprio autor, em seu depoimento pessoal, afirmou que seu genitor possuía uma “bodega”, concomitantemente ao exercício de atividades na lavoura, fato que foi corroborado pelas testemunhas.

Além disso, cabe destacar que: (i) em seu depoimento pessoal, o autor informa que trabalha como motorista de caminhão há, aproximadamente, 30 anos; considerando que a audiência foi realizada em 2011, conclui-se que ele exerce tal atividade urbana desde aproximadamente 1981; (ii) o autor não juntou documentos em nome próprio em que ele seja qualificado como agricultor/lavrador, fato que causa estranheza, considerando que ele requer o reconhecimento do tempo rural dos 12 aos 31 anos de idade, e que contraiu o matrimônio aos 26 anos. De fato, conforme documento emitido pelo DETRAN/RS, a data da primeira habilitação do autor, na categoria “D”, data de 19-07-1979, indicando, em cotejo com os demais elementos de prova, que exercia atividade diversa da agricultura desde o final da década de 1970 ou início da década de 1980.

Disso se conclui que a partir de 1980 não é possível reconhecer o tempo de serviço rural, seja porque o demandante já não mais exercia a atividade agrícola, seja porque os valores obtidos pelo seu genitor, decorrentes do exercício de atividade urbana, demonstram a dispensabilidade do trabalho rural para a subsistência do grupo familiar.

Possível, contudo, o reconhecimento da atividade agrícola no período de 30-09-1972 (12 anos) a 31-12-1979, haja vista que, muito embora o pai do autor possuísse uma “bodega”, certo é que não há comprovação de que os rendimentos por ele auferidos fossem suficientes para a manutenção do grupo familiar, de modo a tornar a atividade rural mera complementação daquela renda, nos termos do que foi definido pelo STJ no Recurso Especial repetitivo n. 1.304.479, da Relatoria do Ministro Herman Benjamin, DE de 19-12-2012.

Em relação ao início de prova material, o referido REsp n. 1.304.479 fixou orientação no sentido de que a extensão de prova material em nome de um integrante do núcleo familiar a outro não é possível quando aquele passa a exercer trabalho incompatível com o labor rurícola, como o de natureza urbana.

No caso concreto, contudo, considerando que no período de 1972 a 1979 o autor era menor de idade, não se poderia exigir, dessa forma, a apresentação de início de prova material em nome próprio, haja vista que estes eram emitidos em nome do pai, na condição de chefe do grupo familiar. Desse modo, o referido recurso repetitivo não se aplica à hipótese dos autos.

Assim, deve ser reconhecido o tempo de serviço rural, em regime de economia familiar, entre 30-09-1972 (12 anos) e 31-12-1979.

CONCLUSÃO

Sem o reconhecimento do tempo de serviço rural postulado, não há como deferir a aposentadoria por tempo de serviço/contribuição ao autor, uma vez que, conforme contagem de fl. 131, o INSS reconheceu apenas 16 anos e 11 meses de tempo de contribuição até a DER, em 18-02-2010.

O tempo rural reconhecido deve ser averbado pelo INSS para futura concessão de benefício previdenciário.

Sucumbente em maior monta, deve o autor responder integralmente pelo pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios, nos termos em que fixados na sentença.

Considerando a eficácia mandamental dos provimentos fundados no art. 461 do CPC, e tendo em vista que a presente decisão não está sujeita, em princípio, a recurso com efeito suspensivo (TRF4, 3ª Seção, Questão de Ordem na AC n. 2002.71.00.050349-7/RS, Rel. para o acórdão Des. Federal Celso Kipper, julgado em 09-08-2007), determino o cumprimento imediato do acórdão no tocante à averbação do período reconhecido (NB 151.600.963-8), a ser efetivada em 45 dias.

Ante o exposto, voto por dar parcial provimento à apelação do autor, e determinar o cumprimento imediato do acórdão no tocante à averbação do período reconhecido.

Des. Federal CELSO KIPPER

Relator


Documento eletrônico assinado por Des. Federal CELSO KIPPER, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 6754075v14 e, se solicitado, do código CRC 7A6E3DF3.
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 24/06/2014

APELAÇÃO CÍVEL Nº 0009194-31.2012.404.9999/RS

ORIGEM: RS 14811000012621

RELATOR:Des. Federal CELSO KIPPER
PRESIDENTE:Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
PROCURADOR:Procurador Regional da República Fábio Bento Alves
APELANTE:GILMAR SCARIOT
ADVOGADO:Elisandra Kleber Piva
APELADO:INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL – INSS
ADVOGADO:Procuradoria Regional da PFE-INSS

Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 24/06/2014, na seqüência 454, disponibilizada no DE de 06/06/2014, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL – INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.

Certifico que o(a) 6ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

RETIRADO DE PAUTA.

Elisabeth Thomaz

Diretora Substituta de Secretaria


Documento eletrônico assinado por Elisabeth Thomaz, Diretora Substituta de Secretaria, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 6819987v1 e, se solicitado, do código CRC EF8CAE58.
Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): Elisabeth Thomaz
Data e Hora: 24/06/2014 15:10

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 25/03/2015

APELAÇÃO CÍVEL Nº 0009194-31.2012.404.9999/RS

ORIGEM: RS 00126216520108210148

RELATOR:Des. Federal CELSO KIPPER
PRESIDENTE:Desembargador Federal CELSO KIPPER
PROCURADOR:Procurador Regional da República Paulo Gilberto Cogo Leivas
APELANTE:GILMAR SCARIOT
ADVOGADO:Elisandra Kleber Piva
APELADO:INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL – INSS
ADVOGADO:Procuradoria Regional da PFE-INSS

Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 25/03/2015, na seqüência 34, disponibilizada no DE de 09/03/2015, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL – INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.

Certifico que o(a) 6ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU DAR PARCIAL PROVIMENTO À APELAÇÃO DO AUTOR, E DETERMINAR O CUMPRIMENTO IMEDIATO DO ACÓRDÃO NO TOCANTE À AVERBAÇÃO DO PERÍODO RECONHECIDO.

RELATOR ACÓRDÃO:Des. Federal CELSO KIPPER
VOTANTE(S):Des. Federal CELSO KIPPER
:Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA
:Des. Federal RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA

Gilberto Flores do Nascimento

Diretor de Secretaria


Documento eletrônico assinado por Gilberto Flores do Nascimento, Diretor de Secretaria, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 7445062v1 e, se solicitado, do código CRC BB6E41F7.
Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): Gilberto Flores do Nascimento
Data e Hora: 25/03/2015 18:12

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