Ementa para citação:
EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE RURAL. CUMULAÇÃO. APOSENTADORIA URBANA. POSSIBILIDADE. CONSECTÁRIOS LEGAIS. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.
1. A acumulação de pensão por morte de trabalhador rural com aposentadoria por tempo de serviço de trabalhador urbano não era vedada pela legislação anterior à Lei 8.213/91, consoante o princípio tempus regit actum.
2. A regra prevista no parágrafo 4º do art. 287 do Decreto nº 83.080/79 extrapola os parâmetros impostos pelas leis previdenciárias, o que não é possível, já que não há autorização legal para tanto.
3. Consoante decidido pelo STF no RE nº 870.947 e pelo STJ no REsp nº 1.492.221, em se tratando de débito de natureza previdenciária, a correção monetária deve observar o INPC a partir de 04/2006 (início da vigência da Lei nº 11.430/06, que acrescentou o artigo 41-A à Lei n.º 8.213/91); os juros de mora, por sua vez, incidem à razão de 1% ao mês até 29/06/2009 e, a partir de então, pelos índices oficiais da caderneta de poupança (art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, na redação dada pelo art. 5º da Lei nº 11.960/09).
4. Na hipótese de desprovimento do recurso interposto pela parte vencida contra sentença publicada sob a vigência do novo Código Processual Civil (Lei nº 13.105/2015), impõe-se a majoração da verba honorária fixada na origem, com base no art. 85, §11, desse diploma normativo.
(TRF4 5045885-80.2017.4.04.9999, QUINTA TURMA, Relator OSNI CARDOSO FILHO, juntado aos autos em 10/08/2018)
INTEIRO TEOR
Apelação/Remessa Necessária Nº 5045885-80.2017.4.04.9999/RS
RELATOR: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL – INSS
APELADO: SELITA GOTZ (Sucessor)
APELADO: CARLOTA LAGEMANN GOTZ (Sucessão)
APELADO: NOILI INES GOTZ (Sucessor)
APELADO: RUBEM ALCEU GOTZ (Sucessor)
APELADO: EDY DREXLER (Sucessor)
APELADO: ROSELI SALETE GOTZ (Sucessor)
RELATÓRIO
Trata-se de ação ordinária em que a autora postula a concessão de pensão em decorrência do falecimento de seu esposo em 14/04/1990, aposentado como trabalhador rural. O pleito foi negado administrativamente sob a alegação de vedação de acumulação do benefício com a aposentadoria urbana por ela percebida.
Processado o feito, sobreveio sentença que, em 15/08/2016, julgou procedente o pedido, para condenar a autarquia previdenciária a implantar à autora o benefício da pensão por morte, a partir da data do óbito. Determinou o pagamento dos respectivos valores atrasados, observada a prescrição quinquenal, corrigidos monetariamente pela TR até 24/03/2015 e, a partir daí, pelo IPCA-E, com o acréscimo de juros de mora calculados através dos índices oficiais de remuneração básica e juros de caderneta de poupança até 25/03/2015 e, desde então, no percentual de 6% ao ano. Os honorários advocatícios foram fixados em 10% sobre o valor atualizado das parcelas vencidas até a data da sentença.
O INSS interpôs recurso de apelação em que argumenta, em síntese, que a legislação vigente na data do óbito vedava o recebimento conjunto da aposentadoria urbana com pensão por morte de trabalhador rural.
Com contrarrazões apresentadas pela sucessão da autora (falecida em 23/02/2014 – evento 19 dos autos originários), vieram os autos a esta Corte, inclusive, por força de reexame necessário.
É o relatório.
Em pauta.
VOTO
Da cumulação dos benefícios
Inicialmente, cabe ressaltar que é indiscutível o direito da autora à percepção de pensão por morte em decorrência do óbito do de cujus, estando a controvérsia limitada à possibilidade de cumulação desta, concedida em decorrência da qualidade de segurado rural, e da aposentadoria urbana percebida pela autora.
Neste ponto, importa referir que, pela aplicação do princípio tempus regit actum nas questões previdenciárias, o pedido de pensão deverá ser examinado à luz dos normativos que vigiam e regulamentavam a matéria por ocasião do óbito, ocorrido em 14/04/1990.
O direito à pensão por morte de trabalhador rural somente veio a ser efetivamente criado através do art. 6º da referida Lei Complementar nº 11/71. Posteriormente, a Lei nº 7.604/87, em seu art. 4º, dispôs que esta pensão, a partir de 01/04/87, passaria a ser devida aos dependentes do trabalhador rural falecido em data anterior a 26/05/71.
Assim, quanto à concessão de pensão anteriormente à edição da Lei 8.213/91, a matéria era regida pela Lei Complementar 11/71, que criou o Programa de Assistência ao Trabalhador Rural (PRORURAL), a ser executado pelo FUNRURAL, com personalidade jurídica de natureza autárquica.
Com a edição da Lei Complementar 16/73, houve a alteração na LC 11/71, estabelecendo a impossibilidade de cumulação de pensão rural com aposentadoria também rural, conforme o art. 6º, § 2º, daquele dispositivo legal:
“ART.6 – (caput)
§ 1º (…)
§ 2º Fica vedada a acumulação do benefício da pensão com o da aposentadoria por velhice ou por invalidez de que tratam os artigos 4 e 5, da Lei Complementar nº 11, de 25 de maio de 1971, ressalvado ao novo chefe ou arrimo da unidade familiar o direito de optar pela aposentadoria quando a ela fizer jus, sem prejuízo do disposto no parágrafo anterior.”
A Lei 8.213/91 veio a unificar os dois sistemas previdenciários, o urbano e o rural, e por seu artigo 124, estabeleceu as vedações à cumulação de benefícios previdenciários, dentre as quais não se encontra proibição à percepção conjunta de aposentadoria e pensão, sejam da área urbana ou rural.
Antes do advento da Lei de Benefícios da Previdência Social, como já referido, vigia o sistema do FUNRURAL para os trabalhadores da área rurícola e, para os da área urbana, o Decreto 89.312/84 (CLPS). Este dizia, em seu art. 20:
Art.20 – Salvo no caso de direito adquirido, não é permitido o recebimento conjunto de :
a) auxílios-natalidade, quando o pai e a mãe são segurados;
b) aposentadoria e auxílio-doença;
c) aposentadoria e abono de permanência em serviço;
d) duas ou mais aposentadorias;
e) renda mensal vitalícia e qualquer benefício da previdência social urbana ou outro regime, salvo o pecúlio de que tratam os artigos 55 a 57.
Através da leitura atenta dos dispositivos acima elencados, constata-se que, havendo disposição expressa sobre as hipóteses em que era vedada a cumulação de benefícios, as situações não elencadas nos referidos preceitos eram permitidas, porque as vedações eram numerus clausus.
Assim sendo, considerando que inexistia, à época do óbito do esposo da autora, vedação legal à percepção cumulativa de aposentadoria urbana com pensão rural, não poderia haver óbice à percepção de pensão pelos simples fato de exercer atividade urbana.
Com efeito, a regra disposta no parágrafo 4º do art. 287 do Decreto 83.080/79 extrapola os parâmetros impostos pelas próprias leis antes referidas, o que não é possível, já que não há autorização legal para tanto. O ordenamento jurídico brasileiro, estabelecido pela Constituição Federal de 1988, apenas permite a edição de decretos denominados de executivos, pois visam à fiel execução das leis, sendo vedada a instituição dos chamados decretos autônomos (art. 84, inciso IV da CF/88). Tendo em vista que o regulamento é ato estritamente subordinado e inferior à lei, no momento em que a contraria, é nulo.
Portanto, verifica-se que não há vedação de cumulação de benefícios no caso dos autos, devendo ser mantida a sentença.
Já foi firmada orientação no âmbito do Superior Tribunal de Justiça a respeito do tema:
PREVIDENCIÁRIO. CUMULAÇÃO DE PENSÃO POR MORTE, DECORRENTE DO VÍNCULO URBANO DO INSTITUIDOR DO BENEFÍCIO, E APOSENTADORIA RURAL. POSSIBILIDADE. EXEGESE DA LC 16/73. 1. É possível a cumulação de aposentadoria rural por idade e de pensão por morte de trabalhador urbano, dada a gênese diversa de tais institutos, pois a aposentadoria se traduz em prestação garantida ao próprio segurado, enquanto a pensão se constitui em prestação destinada aos dependentes do instituidor. Precedentes. 2. A vedação legal à concomitante percepção de benefícios previdenciários rurais (assim prevista no § 2º do art. 6º da LC 16/73) não pode ser estendida à cumulação de benefícios de natureza rural e urbana, que é a hipótese versada nos presentes autos. 3. Recurso especial improvido. (REsp 1392400/RS, Rel. Ministro SÉRGIO KUKINA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 16/04/2015, DJe 24/04/2015)
No mesmo sentido vem reiteradamente decidindo o TRF4:
PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. CONSECTÁRIOS LEGAIS. RURAL. ANTERIOR À LC 11/71. CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS MORATÓRIOS. 1. Os requisitos para a obtenção do benefício de pensão por morte estão elencados na legislação previdenciária vigente à data do óbito, cabendo a parte interessada preenchê-los. No caso, a parte deve comprovar: (a) ocorrência do evento morte; (b) a qualidade de segurado do de cujus e (c) a condição de dependente de quem objetiva a pensão. 2. Nos termos do art. 4º da Lei nº 7.604/87, deve ser concedida a pensão por morte, com base na LC nº 11/71, desde 01/04/1987, aos casos em que o óbito foi anterior a 26/05/1971. 3. A cumulação de que trata o §2º do art. 6º da LC 16/73 se estabelece entre aposentadoria por idade ou por invalidez rural e a pensão por morte rural, segundo a dicção da própria lei. 4. Nos termos do julgamento do RE nº 870.947/SE (Tema 810), pelo STF, em 20/09/2017, a correção monetária dos débitos da Fazenda Pública se dá através do IPCA-E. Os juros moratórios devem atender a disciplina da Lei nº 11.960/09. Adequação de ofício cabível. (TRF4, AC 0016158-98.2016.4.04.9999, QUINTA TURMA, Relator ALTAIR ANTONIO GREGÓRIO, D.E. 28/02/2018) g.n.
Termo inicial / Prescrição quinquenal
O termo inicial do benefício de pensão por morte deve ser fixado de acordo com as leis vigentes por ocasião do óbito, de modo que a pensão é devida a contar de 14/04/1990, independentemente da data do requerimento.
Considerando que, desde a data do óbito, transcorreram mais de cinco anos até o ajuizamento da presente ação (29/07/2015), restam atingidas pela prescrição as parcelas anteriores a 29/07/2010.
Correção monetária
A correção monetária incidirá a contar do vencimento de cada prestação e será calculada pelo INPC a partir de 4-2006 (Lei n.º 11.430/06, que acrescentou o artigo 41-A à Lei n.º 8.213/91), conforme decisão do STF no RE nº 870.947, DJE de 20-11-2017 e do STJ no REsp nº 1.492.221/PR, DJe de 20-3-2018.
Juros moratórios
a) os juros de mora, de 1% (um por cento) ao mês, serão aplicados a contar da citação (Súmula 204 do STJ), até 29-6-2009;
b) a partir de 30-6-2009, os juros moratórios serão computados de acordo com os índices oficiais de remuneração básica e juros aplicados à caderneta de poupança, conforme dispõe o artigo 5º da Lei nº 11.960/09, que deu nova redação ao artigo 1º-F da Lei nº 9.494/97, consoante decisão do STF no RE nº 870.947, DJE de 20-11-2017 e do STJ no REsp nº 1.492.221/PR, DJe de 20-3-2018.
Honorários advocatícios
No que tange aos honorários advocatícios, entendo que devem ser majorados, por força do disposto no art. 85, § 11, do CPC, para 15% (quinze por cento) das parcelas vencidas até a data da sentença.
Prequestionamento
Em arremate, consigno que o enfrentamento das questões suscitadas em grau recursal, assim como a análise da legislação aplicável, são suficientes para prequestionar junto às instâncias Superiores os dispositivos que as fundamentam. Assim, deixo de aplicar os dispositivos legais ensejadores de pronunciamento jurisdicional distinto do que até aqui foi declinado. Desse modo, evita-se a necessidade de oposição de embargos de declaração tão-somente para este fim, o que evidenciaria finalidade procrastinatória do recurso, passível de cominação de multa (artigo 538 do CPC).
Em face do que foi dito, voto no sentido de negar provimento ao apelo e à remessa oficial, determinando, de ofício, a adequação dos consectários legais e a majoração dos honorários advocatícios.
Documento eletrônico assinado por OSNI CARDOSO FILHO, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40000565059v14 e do código CRC 048097b5.
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EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE RURAL. CUMULAÇÃO. APOSENTADORIA URBANA. POSSIBILIDADE. CONSECTÁRIOS LEGAIS. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.
1. A acumulação de pensão por morte de trabalhador rural com aposentadoria por tempo de serviço de trabalhador urbano não era vedada pela legislação anterior à Lei 8.213/91, consoante o princípio tempus regit actum.
2. A regra prevista no parágrafo 4º do art. 287 do Decreto nº 83.080/79 extrapola os parâmetros impostos pelas leis previdenciárias, o que não é possível, já que não há autorização legal para tanto.
3. Consoante decidido pelo STF no RE nº 870.947 e pelo STJ no REsp nº 1.492.221, em se tratando de débito de natureza previdenciária, a correção monetária deve observar o INPC a partir de 04/2006 (início da vigência da Lei nº 11.430/06, que acrescentou o artigo 41-A à Lei n.º 8.213/91); os juros de mora, por sua vez, incidem à razão de 1% ao mês até 29/06/2009 e, a partir de então, pelos índices oficiais da caderneta de poupança (art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, na redação dada pelo art. 5º da Lei nº 11.960/09).
4. Na hipótese de desprovimento do recurso interposto pela parte vencida contra sentença publicada sob a vigência do novo Código Processual Civil (Lei nº 13.105/2015), impõe-se a majoração da verba honorária fixada na origem, com base no art. 85, §11, desse diploma normativo.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, decidiu negar provimento ao apelo e à remessa oficial, determinando, de ofício, a adequação dos consectários legais e a majoração dos honorários advocatícios, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 07 de agosto de 2018.
Documento eletrônico assinado por OSNI CARDOSO FILHO, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40000565060v10 e do código CRC 203ab077.
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