
POLO ATIVO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
POLO PASSIVO:ALZEMIRO DELGADO
REPRESENTANTE(S) POLO PASSIVO: CARLOS ALBERTO VIEIRA DA ROCHA - MT11101-A
RELATOR(A):EULER DE ALMEIDA SILVA JUNIOR
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
Gab. 28 - DESEMBARGADOR FEDERAL EULER DE ALMEIDA
Processo Judicial Eletrônico
APELAÇÃO CÍVEL (198): 1006820-62.2019.4.01.9999
RELATÓRIO
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL EULER DE ALMEIDA (RELATOR):
Trata-se de recurso de apelação, interposto pelo Instituto Nacional do Seguro social (INSS) em face de Alzemiro Delgado, com a finalidade de obter a reforma da sentença (ID 15002940 - Pág. 41 a 43) proferida pelo Juiz de Direito da Vara Cível da Comarca de São Francisco do Guaporé/RO que concedeu aposentadoria por idade rural pelo RGPS.
Foi concedida a tutela provisória.
O recurso foi recebido e processado em ambos os efeitos (§ 1º do art. 1.012 e conexos do CPC/2015), a exceção da tutela provisória mencionada, que foi executada independente da preclusão da decisão que a concedeu.
Nas razões recursais (ID 15002940 - Pág. 55), a parte recorrente alegou, em síntese: 1) falta de comprovação do direito ao benefício previdenciário de aposentadoria por idade rural por prova idônea e suficiente, na forma da legislação de regência e do entendimento jurisprudencial que mencionou; 2) exercício de trabalho urbano até o ano de 2007, o que descaracteriza a qualidade de segurado especial do recorrente.
Nas contrarrazões, foi pedida a manutenção da sentença recorrida.
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
Gab. 28 - DESEMBARGADOR FEDERAL EULER DE ALMEIDA
Processo Judicial Eletrônico
APELAÇÃO CÍVEL (198): 1006820-62.2019.4.01.9999
VOTO
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL EULER DE ALMEIDA (RELATOR):
O recurso pode ser conhecido, porque presentes os pressupostos recursais (competência do relator e da turma julgadora, tempestividade, adequação e observância das normas pertinentes a eventual preparo recursal).
A sentença concedeu aposentadoria por idade rural, enquanto o autor requereu aposentadoria por idade híbrida (ID 15002938 - Pág. 4).
É possível o conhecimento da impugnação do INSS para efeito de adequação da modalidade de aposentadoria adequada ou mais favorável ao interessado, levando-se em consideração, inclusive, o princípio da fungibilidade dos pedidos de aposentadoria.
A aposentadoria por idade híbrida é a obtida com a utilização de tempo de serviço/contribuição rural e urbana para efeito de cumprimento de carência, observada a idade mínima prevista na legislação vigente ao tempo do cumprimento de todos os requisitos legais para implementação do benefício (art. 48, §3º, da Lei 8.213/91; Tese 1007 do STJ e arts. 257, 316 e 317 da IN Pres/INSS nº 128/2022).
A concessão do benefício previdenciário referido na causa depende da demonstração, por prova idônea e suficiente de tempo de serviço/contribuição, efetivada por prova documental plena ou início razoável de prova material, corroborada com prova testemunhal. A Súmula 27 do TRF1 estabelece que “Não é admissível prova exclusivamente testemunhal para reconhecimento de tempo de exercício de atividade urbana e rural (Lei 8.213/1991, art. 55, § 3º)”.
A parte rural da carência não se encontrar sujeita ao recolhimento das contribuições correspondentes para efeito de sua utilização para obtenção do benefício de aposentadoria por idade no RGPS, conforme entendimento jurisprudencial dominante (EDcl no REsp n. 1.674.221/SP, relator Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, Primeira Seção, julgado em 27/11/2019, DJe de 2/12/2019).
Na consideração da abrangência temporal da documentação apresentada, pode ser aplicada a inteligência da Súmula 577 do STJ, que estabelece que “É possível reconhecer o tempo de serviço rural anterior ao documento mais antigo apresentado desde que amparado em convincente prova testemunhal colhida sob contraditório”.
O autor nasceu em 24/03/1953 e completou 65 anos em 24/03/2018 (ID 15002938 - Pág. 21). Apresentou requerimento administrativo (DER em 09/04/2018, conforme ID 15002938 - Pág. 25).
No caso em apreço, o labor urbano foi comprovado pela apresentação do CNIS (ID 15002940 - Pág. 2 a 7), com registro de contribuição de 01/11/1984 a 30/06/1985, 02/01/1987 a 12/1988, 18/04/1989 a 01/05/1990, 01/08/1994 a 19/06/1995, 01/02/1996 a 08/1996, 01/09/1997 a 06/03/1999, 02/08/1999 a 16/02/2000, 02/01/2001 a 21/05/2001, 02/09/2002 a 30/03/2003, 01/11/2003 a 05/01/2004, 05/04/2005 a 31/07/2005, 19/09/2005 a 06/2006, 01/11/2006 a 29/05/2007. Total de 123 contribuições mensais como carência, insuficiente por si só.
Resta a comprovação de 57 meses de tempo rural em regime de economia familiar para a complementação do período de carência (180 meses).
Para fins de comprovação da atividade rural em regime de economia familiar, pelo período necessário de 57 meses de carência, o autor juntou aos autos os seguintes documentos: instrumento particular de compra e venda de imóvel rural, no qual o autor figura como comprador de uma área de terra rural, pelo preço de R$ 20.000,00 (vinte mil reais), datado de 07/06/2010 e com reconhecimento de firma por semelhança em 28/05/2014 (ID 15002938 - Pág. 32 e 33); contrato particular de comodato rural, no qual a esposa do autor figura como comodatária de um imóvel rural, com área de 98,5963 hectares, datado de 10/03/1998, com reconhecimento de firma por semelhança em 29/08/2014 (ID 15002938 - Pág. 34 e 35); fichas de atendimento, com inserção manuscrita do endereço do autor no setor chacareiro do município de Porto Murtinho, em18/02/2003, 22/03/2007, 20/08/2014 (ID 15002938 - Pág. 36 a 40); comprovante de contribuição sindical, ano de 2013 e 2014 (ID 15002938 - Pág. 41 a 43); comprovante de filiação ao Sindicato dos Trabalhadores Rurais São Francisco do Guapore/RO, com data de 15/09/2014 e de 13/09/2017 (ID 15002938 - Pág. 44 e 45); declaração de atividade rural emitida pelo Sindicato dos Trabalhadores Rurais São Francisco do Guapore/RO na qual informam que o autor exerceu atividade rural no período de 07/06/2010 a 15/09/2017 (ID 15002939 - Pág. 3 a 6); nota fiscal de produtor com inserção manuscrita de informações, com indicação da data de 10/06/2011, 22/06/2012, 28/06/2013, 19/08/2015 (ID 15002939 - Pág. 9 a 14); notas fiscais de insumos agrícolas emitidas em 17/01/2014 e 20/08/2016, em nome da esposa do autor (ID 15002939 - Pág. 15 e 18); contrato de concessão de uso, sob condição resolutiva, celebrado com o Incra em 24/09/2012, no qual o autor e sua esposa figuraram como beneficiários de um imóvel rural localizado em São Francisco do Guaporé/RO, com área de 17,1194 hectares, e estão qualificados como agricultores (ID 15002939 - Pág. 23 e 24).
A prova testemunhal produzida durante a instrução processual (ID 15002935, ID 15002936 e ID 15002937) foi idônea e suficiente para demonstrar o exercício de atividade rural, em regime de economia familiar, e se encontra amparada por início de prova documental contemporânea à prestação laboral que se pretende reconhecida em juízo.
Em que pese a sentença tenha se referido ao benefício de “aposentadoria rural por idade”, o pedido e a causa de pedir tratou da aposentadoria por idade na modalidade híbrida, ou seja, com contagem de tempo urbano e rural.
Não é possível a manutenção da aposentadoria por idade rural concedida na sentença recorrida pela existência de vínculos urbanos de longa duração, durante o período de carência, razão pela qual deve ser reformada em parte.
O tempo de serviço rural acima referido (na condição de segurado especial), acrescido do tempo já certificado pelo CNIS, pode ser utilizado para o cumprimento da carência mínima necessária para concessão de aposentadoria por idade híbrida.
Foram alcançadas a carência mínima de 180 contribuições e a idade mínima, necessárias para a concessão do benefício previdenciário.
A atualização monetária e juros moratórios, incidentes sobre as parcelas pretéritas, devem ser calculados na forma do Manual de Cálculos da Justiça Federal, em sua versão vigente ao tempo da execução do julgado. O referido ato incorporou, progressivamente, as determinações legais e jurisprudenciais supervenientes (Tema 810 do STF, Tema 905 do STJ e art. 3º e conexos da EC 113/2021), o que implica perda de objeto da matéria correlata.
Honorários recursais, quando devidos, na forma da legislação processual de regência (§11 do art. 85, do CPC do c/c 5º, XXXVI, da CF/88 e Súmula 26-TRF da 1ª Região), observada eventual inexigibilidade (§3º do art. 98 do CPC/2015).
Ante o exposto, conheço do recurso do INSS para, no mérito, dar-lhe parcial provimento para reformar a sentença para a desconstituição da aposentadoria por idade rural e a concessão de aposentadoria por idade híbrida desde o requerimento administrativo (09/04/2018).
Mantenho os honorários advocatícios de sucumbência fixado na sentença recorrida em favor da parte autora-recorrida, porque resultou vencedor, considerada globalmente a demanda.
Sem honorários recursais (§11 do art. 85 do CPC/2015 c/c Tese 1.059 do STJ).
Modifico a tutela provisória de urgência para se adequar ao julgado acima, ou seja, aposentadoria por idade híbrida, com DIB na DER (09/04/2018).
É o voto.
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
Gab. 28 - DESEMBARGADOR FEDERAL EULER DE ALMEIDA
Processo Judicial Eletrônico
CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198)
PROCESSO: 1006820-62.2019.4.01.9999
PROCESSO DE REFERÊNCIA: 7001318-11.2018.8.22.0023
RECORRENTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RECORRIDO: ALZEMIRO DELGADO
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. RGPS. APOSENTADORIA POR IDADE. HÍBRIDA. ATIVIDADE LABORAL RURAL E URBANA COMPROVADAS. REQUISITOS LEGAIS COMPROVADOS. APLICAÇÃO DA TESE 1007 DO STJ. SENTENÇA REFORMADA. ADEQUAÇÃO DA TUTELA À APOSENTADORIA HÍBRIDA.
1. A aposentadoria por idade híbrida é a obtida com a utilização de tempo de serviço/contribuição rural e urbana para efeito de cumprimento de carência, observada a idade mínima prevista na legislação vigente ao tempo do cumprimento de todos os requisitos legais para implementação do benefício (art. 48, §3º, da Lei 8.213/91; Tese 1007 do STJ e arts. 257, 316 e 317 da IN Pres/INSS nº 128/22).
2. Período de labor rural remoto e descontínuo, anterior ao advento da Lei 8.213/1991, pode ser computado para fins da carência necessária à obtenção da aposentadoria híbrida por idade (TESE 1007 do STJ).
3. A prova testemunhal produzida durante a instrução processual foi idônea e suficiente para demonstrar o exercício de atividade rural, em regime de economia familiar, e se encontra amparada por início de prova documental contemporânea à prestação laboral que se pretende reconhecida em juízo.
4. Foram alcançadas a carência mínima de 180 contribuições e a idade mínima, necessárias para a concessão de aposentadoria por idade híbrida.
5. Apelação do INSS provida em parte para desconstituição da aposentadoria por idade rural e sua substituição pela aposentadoria por idade híbrida desde o requerimento administrativo (09/04/2018). Modificação da tutela de urgência para se adequar à aposentadoria por idade híbrida.
ACÓRDÃO
Decide a Nona Turma do Tribunal Regional Federal da Primeira Região, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação cível, nos termos do voto do Relator.
Desembargador Federal EULER DE ALMEIDA