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APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO/ ESPECIAL. EXPOSIÇÃO A AGENTES NOCIVOS: AMIANTO E RUÍDO. PROVAS INSUFICIENTES PARA RECONHECIMENTO DO DIREITO. AVERBAÇÃO DO...

Data da publicação: 21/12/2024, 23:22:41

PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO/ ESPECIAL. EXPOSIÇÃO A AGENTES NOCIVOS: AMIANTO E RUÍDO. PROVAS INSUFICIENTES PARA RECONHECIMENTO DO DIREITO. AVERBAÇÃO DO TEMPO DE SERVIÇO EM CONDIÇÕES ESPECIAIS. POSSIBILIDADE. 1. A aposentadoria especial é devida ao segurado que tiver trabalhado sujeito a condições especiais que prejudiquem sua saúde ou sua integridade física durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, de modo habitual e permanente, não ocasional, nem intermitente, a teor dos arts. 57 e 58 da Lei n. 8.213/91. 2. Se for comprovado que o segurado exerceu uma atividade especial de acordo com os critérios estabelecidos pela legislação vigente na época do exercício, ele adquire o direito ao cômputo desse período como tempo de serviço especial. 3. Até 28/04/1995, é possível reconhecer a especialidade do trabalho com base na categoria profissional; a partir de 29/04/1995, é necessário demonstrar a exposição efetiva e contínua a agentes prejudiciais à saúde por meio de qualquer forma de prova; e a partir de 06/05/1997, a comprovação deve ser feita por meio de um formulário-padrão embasado em laudo técnico ou por perícia técnica. 4. A atividade é considerada especial quando há exposição a ruído acima de 80 dB até 05/03/1997, acima de 90 dB entre 06/03/1997 e 18/11/2003 e acima de 85 dB a partir de 19/11/2003 (conforme decisão no REsp 1.398.260). A condição especial do trabalho persiste mesmo se o ruído for reduzido aos limites de tolerância pelo uso de Equipamento de Proteção Individual (EPI). 5. A análise dos Perfis Profissiográficos Previdenciários e demais provas documentais já reconheceu a exposição do autor a condições especiais de trabalho no período de 14/03/1995 a 08/06/2010, o que foi devidamente documentado e verificado. Esse intervalo, já reconhecido como especial, justifica a decisão de primeira instância pela averbação desse tempo pelo INSS como especial. Para o período estendido de 09/06/2010 a 10/11/2016, no entanto, as provas apresentadas não demonstraram exposição contínua a agentes nocivos acima dos limites estabelecidos pela legislação vigente, sustentando a decisão da sentença que não reconheceu este intervalo adicional como especial. 6. Com base nas evidências apresentadas e na legislação aplicável, é reconhecida a especialidade do período de 06/01/1988 a 23/06/1989, durante o qual foram exercidas atividades como mecânico. Este período, juntamente com os períodos reconhecidos pela sentença de 14/03/1995 a 08/06/2010, devido à exposição a amianto com fator de conversão de 1,75, e os períodos de 14/03/1995 a 05/03/1997, de 01/02/2000 a 19/04/2004 e de 20/04/2004 a 08/06/2010, devido a ruídos excessivos com fator de conversão de 1,4, ainda não alcançam o tempo total necessário para o deferimento completo do pedido de aposentadoria especial. Portanto, determina-se a averbação destes períodos como especiais no dossiê previdenciário do apelante, mas sem deferimento do benefício de aposentadoria especial. 7. Apelação do autor parcialmente provida, nos termos do item 6. (TRF 1ª Região, SEGUNDA TURMA, APELAÇÃO CIVEL (AC) - 1015195-18.2020.4.01.9999, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL JOAO LUIZ DE SOUSA, julgado em 20/09/2024, DJEN DATA: 20/09/2024)

Brasão Tribunal Regional Federal
JUSTIÇA FEDERAL
Tribunal Regional Federal da 1ª Região

PROCESSO: 1015195-18.2020.4.01.9999  PROCESSO REFERÊNCIA: 5049463-15.2019.8.09.0103
CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198)

POLO ATIVO: GILBERTO PEREIRA DE SOUZA
REPRESENTANTE(S) POLO ATIVO: JOSE ARY DE SOUZA GOMES - GO32108-A e EUZELIO HELENO DE ALMEIDA - GO25825-A
POLO PASSIVO:INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

RELATOR(A):JOAO LUIZ DE SOUSA


Brasão Tribunal Regional Federal

PODER JUDICIÁRIO

Tribunal Regional Federal da 1ª Região

Gab. 6 - DESEMBARGADOR FEDERAL JOÃO LUIZ DE SOUSA

Processo Judicial Eletrônico

APELAÇÃO CÍVEL (198) 1015195-18.2020.4.01.9999

RELATÓRIO

O EXCELENTÍSSIMO DESEMBARGADOR FEDERAL JOÃO LUIZ DE SOUSA (RELATOR):  

Trata-se de apelação interposta pelo autor, Gilberto Pereira de Souza, contra a sentença que julgou parcialmente procedente sua ação previdenciária em face do Instituto Nacional do Seguro Social — INSS, visando ao reconhecimento de períodos laborados em condições especiais para a concessão de aposentadoria especial.

O juízo de primeira instância reconheceu como especiais alguns períodos de trabalho do autor, expostos a amianto e ruídos excessivos, mas não todos os pleiteados.

Inconformado, o autor apela, alegando cerceamento de defesa pela não realização de interrogatório livre ou informal e oitiva de testemunhas, conforme previsto no artigo 139, inciso VIII do CPC, o que, em sua visão, prejudicou a comprovação completa da exposição a agentes nocivos.

Adicionalmente, contesta o não reconhecimento de outros períodos laborados sob condições prejudiciais, apesar das provas documentais apresentadas, como CTPS e PPP. No mérito, o apelante solicita a reforma integral da decisão para que seja reconhecida a especialidade de todos os períodos laborados sob condições nocivas anteriores a 28/04/1995, o pagamento das prestações atrasadas desde a data do requerimento administrativo, a aplicação de correção monetária e juros moratórios de natureza alimentar desde o vencimento de cada prestação, e a fixação dos honorários de sucumbência no patamar máximo de 20%. Subsidiariamente, requer a anulação da sentença e remessa dos autos ao primeiro grau para realização de novas diligências probatórias.

Após o decurso do prazo para contrarrazões, encaminhados os autos para contrarrazões.

É o relatório.


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Tribunal Regional Federal da 1ª Região

Gab. 6 - DESEMBARGADOR FEDERAL JOÃO LUIZ DE SOUSA

Processo Judicial Eletrônico

APELAÇÃO CÍVEL (198) 1015195-18.2020.4.01.9999

VOTO

O EXCELENTÍSSIMO DESEMBARGADOR FEDERAL JOÃO LUIZ DE SOUSA (RELATOR):  

Presentes os pressupostos de admissibilidade, recebo a apelação do INSS no duplo efeito.

O cerne da controvérsia trazida à análise concerne à aferição do alegado direito da parte autora ao benefício previdenciário de aposentadoria especial, com efeitos retroativas à data do requerimento administrativo.

Da preliminar

O inconformismo do autor, manifestado por meio de apelação, centra-se na alegação de cerceamento de defesa devido à não realização de interrogatório livre ou informal e oitiva de testemunhas, conforme previsto no artigo 139, inciso VIII, do Código de Processo Civil. Ele sustenta que essa omissão prejudicou a comprovação completa da exposição a agentes nocivos.

No entanto, é imperativo destacar que a questão em discussão é eminentemente de direito e não apenas de fato, tendo como ponto central a interpretação e aplicação de normas legais e regulamentares que definem os critérios para a concessão de aposentadoria especial em função da exposição a agentes nocivos. O magistrado de primeiro grau, ao analisar as provas documentais apresentadas — tais como o Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP) e laudos técnicos —, detém a competência para decidir sobre a necessidade de produção de mais provas, incluindo a realização de interrogatórios ou a oitiva de testemunhas.

Conforme o princípio da livre convicção motivada do juiz, previsto no artigo 371 do CPC, o magistrado tem a prerrogativa de indeferir diligências que considere desnecessárias ao esclarecimento da causa. No caso presente, a análise foi embasada em critérios técnicos e legais, consistentes com a documentação relevante apresentada para apurar a exposição a agentes nocivos. A decisão de não realizar o interrogatório ou a oitiva de testemunhas baseou-se na suficiência dos documentos para a resolução da lide, concentrando-se na interpretação das normas aplicáveis ao tempo de serviço especial reivindicado pelo autor.

Portanto, não se verifica o alegado cerceamento de defesa, visto que a determinação dos períodos especiais foi conduzida sob um enfoque jurídico, apreciando-se a adequação da prova documental às exigências legais para a concessão do benefício previdenciário. A insistência do autor na realização de mais provas orais, portanto, não se justifica quando os elementos já constantes nos autos permitem ao julgador uma decisão fundamentada e dentro dos marcos regulatórios estabelecidos para casos dessa natureza.

Rejeito, pois, a preliminar.

Do mérito.

Nos termos do art. 57 e 58 da lei n. 8.213/91, a aposentadoria especial é devida ao segurado que tiver trabalhado sujeito a condições especiais que prejudiquem sua saúde ou sua integridade física durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme dispuser a lei.

Neste diapasão, o segurado deverá comprovar o tempo de trabalho permanente, não ocasional nem intermitente, em condições especiais, com exposição aos agentes nocivos químicos, físicos, biológicos ou associação de agentes prejudiciais.

Cumpre destacar que a consideração do tempo de serviço como especial deve ser feita de acordo com a legislação vigente à época da prestação do serviço, e não da data em que perfeitas todas as condições para a aposentadoria, tal como disposto no § 1º, art. 70, do Decreto nº 3.048/99, com redação do Decreto nº 4.827/03.

Esse é o entendimento consagrado por esta Corte:

PREVIDENCIÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. APOSENTADORIA ESPECIAL. CONCESSÃO. RECONHECIMENTO DE TEMPO LABORADO EM CONDIÇÕES ESPECIAIS. CALOR. POEIRA DE SÍLICA. RUÍDO. LEGISLAÇÃO APLICÁVEL. EPI. CÔMPUTO DO TEMPO EM GOZO DO BENEFÍCIO AUXÍLIO-DOENÇA COMO ESPECIAL. EC 20/98. JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA.

1.A questão de atribuição de efeito suspensivo ao recurso resta prejudicada, uma vez que não concedido até esta data, não há utilidade na sua apreciação neste momento processual, uma vez que não cabe recurso com efeito suspensivo a partir deste julgado. 

2. O cômputo do tempo de serviço prestado em condições especiais deve observar a legislação vigente à época da prestação laboral, tal como disposto no § 1º do art. 70 do Decreto nº 3.048/99, com redação dada pelo Decreto nº 4.827/03.

3.O impetrante exercia atividade de operador de lingotamento em indústria metalúrgica, categoria profissional que estava inserida no código 2.5.1 do Quadro Anexo II do Decreto nº 83.080/79, sendo considerada de natureza insalubre por presunção legal até o advento da Lei 9.532/95.

4. Os formulários acostados aos autos comprovaram ainda a exposição do impetrante ao agente agressivo calor em uma intensidade acima dos limites de tolerância estabelecidos no código 1.1.1 do quadro anexo do Decreto n° 53.831/64 e pela NR-15 da Portaria n° 3.214/78, nos termos do código 2.0.4 dos Decretos n° 2.172/97 e n° 3.048/98, além da exposição ao agente poeira de sílica, com enquadramento no código 1.2.10, do Quadro anexo do Decreto 53.831/64 e no código 2.3.1, Anexo II, do Decreto nº 83.080/79.

5.Considera-se especial a atividade exercida com exposição a ruídos superiores a 80 decibéis até 05/03/97 (Súmula nº 29 da AGU), e, a partir de então, acima de 85 decibéis, desde que aferidos esses níveis de pressão sonora por meio de perícia técnica, trazida aos autos ou noticiada no preenchimento de formulário expedido pelo empregador.

6.Para configuração da especialidade da atividade, não é necessário que o trabalhador permaneça exposto ao nível máximo de ruído aludido na legislação durante toda a sua jornada de trabalho.

7.A utilização de equipamentos de proteção individual não descaracteriza a atividade prestada sob condições especiais, pois seu uso não significa que estejam erradicadas as condições adversas que justificam a contagem de tempo de maneira específica, prestando-se tão somente a amenizar ou reduzir os danos delas decorrentes.

8.O período em gozo do benefício previdenciário de auxílio-doença, deve ser computado como tempo especial, tendo em vista que antes e depois da concessão do benefício, o impetrante laborou em condições especiais.

9.O segurado que implementou o tempo de contribuição necessário para obtenção da aposentadoria integral ou especial não se submete às regras de transição.

10. Apelação desprovida. Remessa oficial, tida por interposta, parcialmente provida.

(Numeração Única: 0004403-44.2006.4.01.3813; AMS 2006.38.13.004409-3 / MG; APELAÇÃO EM MANDADO DE SEGURANÇA; Relator JUIZ FEDERAL GUILHERME MENDONÇA DOEHLER; Órgão 3ª TURMA SUPLEMENTAR; Publicação 31/05/2012 e-DJF1 P. 254) Destaquei

Em relação à época em que vigiam os Decretos nºs 53.831/64 e 83.080/79, para a comprovação do efetivo trabalho em atividade tida como perigosa, insalubre ou penosa, bastava que a categoria profissional a que pertencia o trabalhador se enquadrasse no rol constante nos anexos que integravam referidos diplomas, ressalvada a hipótese referente ao agente insalubre “ruído”, que sempre exigiu laudo pericial.

Na sequência, a Lei n. 9.032/95, publicada em 29.04.1995, passou a exigir a demonstração da especialidade da atividade, através dos formulários SB-40 e DSS 8030, o que persistiu até a edição da Medida Provisória 1.523/96, de 14.10.1996, convertida na Lei n. 9.528/97, de 11.12.1997, a partir de quando começou a ser exigida, obrigatoriamente, a comprovação da condição especial por meio de laudo técnico assinado por médico do trabalho ou engenheiro de segurança do trabalho.

Nesse contexto, nas hipóteses de tempo de serviço prestado após 29/04/95, deve o trabalhador comprovar a exposição permanente, não ocasional e nem intermitente aos agentes prejudiciais à saúde.

Saliente-se que, em razão da sobreposição de leis entre os Decretos n. 53.831/1964 e 83.080/1979, quando o primeiro fixou o limite de insalubridade em 80dB (oitenta decibéis) e o último delimitou em 90dB(noventa decibéis), estabeleceu-se que atividade especial é aquela desenvolvida em ambiente com ruído médio superior a 80dB (oitenta decibéis), em razão da vigência simultânea e sem incompatibilidade dos seus anexos.

Com o advento do Decreto n. 2.172, de 05/03/1997, considera-se agente nocivo a exposição a níveis de ruído superior a 90dB; e acima de 85dB  (oitenta e cinco decibéis) a partir da edição do Decreto n. 4.882, de 18/11/2003.  Ou seja, atendidas as demais condições legais, considera-se especial, no âmbito do RGPS, a atividade exercida com exposição a ruído:

I – superior a 80 decibéis até 05/03/1997;

II – superior a 90 decibéis de 06/03/1997 até 18/11/2003 e

III – superior a 85 decibéis a partir de então.

Com relação à conversão tempo de serviço especial em comum, a jurisprudência mais recente do STJ permite tal transmudação, inclusive após 28/05/98 (Resp 956110/SP).

Por outro lado, em se tratando de conversão do tempo de serviço comum em especial, para fins de concessão do benefício de aposentadoria especial, o Superior Tribunal de Justiça, em sede de recurso repetitivo do artigo 543-C do CPC/73, então vigente, decidiu que “para que o segurado faça jus à conversão de tempo de serviço comum em especial, é necessário que ele tenha reunido os requisitos para o benefício pretendido antes da Lei n. 9.032/95, de 28/4/95, independentemente do momento em que foi prestado o serviço.” (EDcl no REsp 1.310.034/PR, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 26/11/2014, DJe 02/02/2015).

Quanto ao uso de equipamento de proteção individual ou coletiva pelo segurado, registre-se que o Supremo Tribunal Federal, no julgamento do Agravo em Recurso Extraordinário ARE n. 664.335, com repercussão geral reconhecida, decidiu que a utilização de EPI descaracteriza o labor exercido em condições especiais, desde que comprovada a real eficácia dos equipamentos de proteção, neutralizando a nocividade do agente.

Contudo, em relação ao agente físico ruído, restou definido pelo STF que, ainda que comprovada a utilização de EPI (protetores auriculares), a atividade mantém-se como especial. A Corte Constitucional fixou a tese no sentido de que “na hipótese de exposição do trabalho a ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador, no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), no sentido da eficácia do Equipamento de Proteção Individual – EPI, não descarateriza o tempo de serviço especial para aposentadoria”, pois, ainda que os protetores auriculares reduzam o nível de ruído aos limites de tolerância permitidos, a potência do som “causa danos ao organismo que vão muito além daqueles relacionados à perda das funções auditivas”.

Confira-se:

"RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. DIREITO CONSTITUCIONAL PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA ESPECIAL. ART. 201, § 1º, DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. REQUISITOS DE CARACTERIZAÇÃO. TEMPO DE SERVIÇO PRESTADO SOB CONDIÇÕES NOCIVAS. FORNECIMENTO DE EQUIPAMENTO DE PROTEÇÃO INDIVIDUAL - EPI. TEMA COM REPERCUSSÃO GERAL RECONHECIDA PELO PLENÁRIO VIRTUAL. EFETIVA EXPOSIÇÃO A AGENTES NOCIVOS À SAÚDE. NEUTRALIZAÇÃO DA RELAÇÃO NOCIVA ENTRE O AGENTE INSALUBRE E O TRABALHADOR. COMPROVAÇÃO NO PERFIL PROFISSIOGRÁFICO PREVIDENCIÁRIO PPP OU SIMILAR. NÃO CARACTERIZAÇÃO DOS PRESSUPOSTOS HÁBEIS À CONCESSÃO DE APOSENTADORIA ESPECIAL. CASO CONCRETO. AGENTE NOCIVO RUÍDO. UTILIZAÇÃO DE EPI. EFICÁCIA. REDUÇÃO DA NOCIVIDADE. CENÁRIO ATUAL. IMPOSSIBILIDADE DE NEUTRALIZAÇÃO. NÃO DESCARACTERIZAÇÃO DAS CONDIÇÕES PREJUDICIAIS. BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO DEVIDO. AGRAVO CONHECIDO PARA NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO EXTRAORDINÁRIO.

1. Conduz à admissibilidade do Recurso Extraordinário a densidade constitucional, no aresto recorrido, do direito fundamental à previdência social (art. 201, CRFB/88), com reflexos mediatos nos cânones constitucionais do direito à vida (art. 5º, caput, CRFB/88), à saúde (arts. 3º, 5º e 196, CRFB/88), à dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, CRFB/88) e ao meio ambiente de trabalho equilibrado (arts. 193 e 225, CRFB/88).

2. A eliminação das atividades laborais nocivas deve ser a meta maior da Sociedade - Estado, empresariado, trabalhadores e representantes sindicais -, que devem voltar-se incessantemente para com a defesa da saúde dos trabalhadores, como enuncia a Constituição da República, ao erigir como pilares do Estado Democrático de Direito a dignidade humana (art. 1º, III, CRFB/88), a valorização social do trabalho, a preservação da vida e da saúde (art. 3º, 5º, e 196, CRFB/88), e o meio ambiente de trabalho equilibrado (art. 193, e 225, CRFB/88).

3. A aposentadoria especial prevista no artigo 201, § 1º, da Constituição da República, significa que poderão ser adotados, para concessão de aposentadorias aos beneficiários do regime geral de previdência social, requisitos e critérios diferenciados nos "casos de atividades exercidas sob condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, e quando se tratar de segurados portadores de deficiência, nos termos definidos em lei complementar".

4. A aposentadoria especial possui nítido caráter preventivo e impõe-se para aqueles trabalhadores que laboram expostos a agentes prejudiciais à saúde e a fortiori possuem um desgaste naturalmente maior, por que não se lhes pode exigir o cumprimento do mesmo tempo de contribuição que aqueles empregados que não se encontram expostos a nenhum agente nocivo.

5. A norma inscrita no art. 195, § 5º, CRFB/88, veda a criação, majoração ou extensão de benefício sem a correspondente fonte de custeio, disposição dirigida ao legislador ordinário, sendo inexigível quando se tratar de benefício criado diretamente pela Constituição. Deveras, o direito à aposentadoria especial foi outorgado aos seus destinatários por norma constitucional (em sua origem o art. 202, e atualmente o art. 201, § 1º, CRFB/88). Precedentes: RE 151.106 AgR/SP, Rel. Min. Celso de Mello, julgamento em 28/09/1993, Primeira Turma, DJ de 26/11/93; RE 220.742, Rel. Min. Néri da Silveira, julgamento em 03/03/98, Segunda Turma, DJ de 04/09/1998.

6. Existência de fonte de custeio para o direito à aposentadoria especial antes, através dos instrumentos tradicionais de financiamento da previdência social mencionados no art. 195, da CRFB/88, e depois da Medida Provisória nº 1.729/98, posteriormente convertida na Lei nº 9.732, de 11 de dezembro de 1998. Legislação que, ao reformular o seu modelo de financiamento, inseriu os §§ 6º e 7º no art. 57 da Lei n.º 8.213/91, e estabeleceu que este benefício será financiado com recursos provenientes da contribuição de que trata o inciso II do art. 22 da Lei nº 8.212/91, cujas alíquotas serão acrescidas de doze, nove ou seis pontos percentuais, conforme a atividade exercida pelo segurado a serviço da empresa permita a concessão de aposentadoria especial após quinze, vinte ou vinte e cinco anos de contribuição, respectivamente.

7. Por outro lado, o art. 10 da Lei nº 10.666/2003, ao criar o Fator Acidentário de Prevenção-FAP, concedeu redução de até 50% do valor desta contribuição em favor das empresas que disponibilizem aos seus empregados equipamentos de proteção declarados eficazes nos formulários previstos na legislação, o qual funciona como incentivo para que as empresas continuem a cumprir a sua função social, proporcionando um ambiente de trabalho hígido a seus trabalhadores.

8. O risco social aplicável ao benefício previdenciário da aposentadoria especial é o exercício de atividade em condições prejudiciais à saúde ou à integridade física (CRFB/88, art. 201, § 1º), de forma que torna indispensável que o indivíduo trabalhe exposto a uma nocividade notadamente capaz de ensejar o referido dano, porquanto a tutela legal considera a exposição do segurado pelo risco presumido presente na relação entre agente nocivo e o trabalhador.

9. A interpretação do instituto da aposentadoria especial mais consentânea com o texto constitucional é aquela que conduz a uma proteção efetiva do trabalhador, considerando o benefício da aposentadoria especial excepcional, destinado ao segurado que efetivamente exerceu suas atividades laborativas em 'condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física'.  

10. Consectariamente, a primeira tese objetiva que se firma é: o direito à aposentadoria especial pressupõe a efetiva exposição do trabalhador a agente nocivo à sua saúde, de modo que, se o EPI for realmente capaz de neutralizar a nocividade não haverá respaldo constitucional à aposentadoria especial. 

11. A Administração poderá, no exercício da fiscalização, aferir as informações prestadas pela empresa, sem prejuízo do inafastável judicial review. Em caso de divergência ou dúvida sobre a real eficácia do Equipamento de Proteção Individual, a premissa a nortear a Administração e o Judiciário é pelo reconhecimento do direito ao benefício da aposentadoria especial. Isto porque o uso de EPI, no caso concreto, pode não se afigurar suficiente para descaracterizar completamente a relação nociva a que o empregado se submete.

12. In casu, tratando-se especificamente do agente nocivo ruído, desde que em limites acima do limite legal, constata-se que, apesar do uso de Equipamento de Proteção Individual (protetor auricular) reduzir a agressividade do ruído a um nível tolerável, até no mesmo patamar da normalidade, a potência do som em tais ambientes causa danos ao organismo que vão muito além daqueles relacionados à perda das funções auditivas. O benefício previsto neste artigo será financiado com os recursos provenientes da contribuição de que trata o inciso II do art. 22 da Lei no 8.212, de 24 de julho de 1991, cujas alíquotas serão acrescidas de doze, nove ou seis pontos percentuais, conforme a atividade exercida pelo segurado a serviço da empresa permita a concessão de aposentadoria especial após quinze, vinte ou vinte e cinco anos de contribuição, respectivamente. O benefício previsto neste artigo será financiado com os recursos provenientes da contribuição de que trata o inciso II do art. 22 da Lei no 8.212, de 24 de julho de 1991, cujas alíquotas serão acrescidas de doze, nove ou seis pontos percentuais, conforme a atividade exercida pelo segurado a serviço da empresa permita a concessão de aposentadoria especial após quinze, vinte ou vinte e cinco anos de contribuição, respectivamente.

13. Ainda que se pudesse aceitar que o problema causado pela exposição ao ruído relacionasse apenas à perda das funções auditivas, o que indubitavelmente não é o caso, é certo que não se pode garantir uma eficácia real na eliminação dos efeitos do agente nocivo ruído com a simples utilização de EPI, pois são inúmeros os fatores que influenciam na sua efetividade, dentro dos quais muitos são impassíveis de um controle efetivo, tanto pelas empresas, quanto pelos trabalhadores. 

14. Desse modo, a segunda tese fixada neste Recurso Extraordinário é a seguinte: na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador, no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), no sentido da eficácia do Equipamento de Proteção Individual - EPI, não descaracteriza o tempo de serviço especial para aposentadoria.

15. Agravo conhecido para negar provimento ao Recurso Extraordinário."

(ARE 664335, Rel. Ministro Luiz Fux, Tribunal Pleno – STF, julgado em 04/12/2014, DJe-029 de 12/02/2015) Destaquei

O recorrente busca a reforma da decisão que indeferiu seu pedido de aposentadoria especial, alegando exposição a agentes nocivos, em especial poeira de amianto e ruído, durante períodos laborados nas empresas SAMA S.A. e Anglo American Níquel Brasil Ltda. Segundo o autor, tais períodos deveriam ser reconhecidos como especiais conforme critérios dos Decretos nº 53.831/64 e subsequentes regulamentações que especificam os agentes nocivos e os critérios para a concessão do benefício pleiteado.

Inicialmente, é essencial considerar que, para a concessão de aposentadoria especial, a legislação exige a comprovação de exposição a agentes nocivos de forma habitual e permanente, não ocasional nem intermitente, pelo período mínimo estipulado pela norma, seja de 15, 20 ou 25 anos, dependendo do agente nocivo.

No presente caso, a sentença a quo realizou minuciosa análise dos períodos laborados e das substâncias às quais o autor esteve exposto, conforme evidenciado nos documentos apresentados, como o Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP).

Quanto ao agente nocivo amianto, observa-se que o Decreto nº 2.172/97, que regulamentou a matéria durante parte dos períodos alegados pelo autor, especifica a necessidade de exposição contínua e ininterrupta ao agente por um tempo mínimo de 20 anos para homens. O recorrente, no entanto, não comprovou de forma inequívoca tal exposição ininterrupta ao amianto pelo tempo mínimo exigido, conforme os períodos especificados em seu PPP.

Adicionalmente, quanto ao ruído, a legislação e as súmulas pertinentes estabelecem os limites de decibéis que configuram a exposição como especial. A sentença analisou tecnicamente os períodos de exposição e os níveis de ruído alegados, confrontando-os com os limites legais vigentes à época. Constatou-se que, em muitos dos períodos laborados, os níveis de ruído reportados no PPP e demais documentações não superavam os limites estabelecidos para a caracterização da atividade como especial.

Importante frisar a decisão do Supremo Tribunal Federal, que, apesar de reconhecer a periculosidade do amianto, não elimina a necessidade de demonstração factual e documental específica da exposição nociva e de seus efeitos prejudiciais ao trabalhador, conforme a legislação previdenciária vigente. A mera presença no ambiente de trabalho não é suficiente para a comprovação do tempo especial sem a corroboração de provas consistentes.

Por fim, a eficácia dos EPIs, embora não seja absoluta para descaracterizar a especialidade do período laborado, também foi considerada pela sentença, que não encontrou provas de que os EPIs utilizados eram ineficazes para neutralizar a nocividade dos agentes, conforme as alegações do autor.

Com base nas evidências detalhadamente examinadas e na legislação aplicável, a decisão de primeira instância é mantida, exceto quanto ao período de 06/01/1988 a 23/06/1989. A análise dos documentos evidenciou que, durante este período específico, o autor esteve engajado em atividades como mecânico, profissão reconhecida pelas normativas vigentes até 28/04/1995 como passível de enquadramento especial devido à exposição habitual e permanente a condições nocivas, especificamente em indústrias metalúrgicas e mecânicas. Portanto, é concedido provimento parcial à apelação para reconhecer e averbar como especial o mencionado período no dossiê previdenciário do autor.

Portanto, a apelação é parcialmente provida apenas para incluir o reconhecimento do período de 06/01/1988 a 23/06/1989 como especial, enquanto se nega provimento ao recurso quanto aos demais períodos contestados pela defesa.

Posto isso, dou parcial provimento à apelação do autor, nos termos da presente fundamentação.

É como voto.




Brasão Tribunal Regional Federal

PODER JUDICIÁRIO

Tribunal Regional Federal da 1ª Região

Gab. 6 - DESEMBARGADOR FEDERAL JOÃO LUIZ DE SOUSA

Processo Judicial Eletrônico

APELAÇÃO CÍVEL (198) 1015195-18.2020.4.01.9999

APELANTE: GILBERTO PEREIRA DE SOUZA

Advogados do(a) APELANTE: EUZELIO HELENO DE ALMEIDA - GO25825-A, JOSE ARY DE SOUZA GOMES - GO32108-A

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

EMENTA

PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO/ ESPECIAL. EXPOSIÇÃO A AGENTES NOCIVOS: AMIANTO E RUÍDO. PROVAS INSUFICIENTES PARA RECONHECIMENTO DO DIREITO. AVERBAÇÃO DO TEMPO DE SERVIÇO EM CONDIÇÕES ESPECIAIS. POSSIBILIDADE.

1. A aposentadoria especial é devida ao segurado que tiver trabalhado sujeito a condições especiais que prejudiquem sua saúde ou sua integridade física durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, de modo habitual e permanente, não ocasional, nem intermitente, a teor dos arts. 57 e 58 da Lei n. 8.213/91.

2. Se for comprovado que o segurado exerceu uma atividade especial de acordo com os critérios estabelecidos pela legislação vigente na época do exercício, ele adquire o direito ao cômputo desse período como tempo de serviço especial.

3. Até 28/04/1995, é possível reconhecer a especialidade do trabalho com base na categoria profissional; a partir de 29/04/1995, é necessário demonstrar a exposição efetiva e contínua a agentes prejudiciais à saúde por meio de qualquer forma de prova; e a partir de 06/05/1997, a comprovação deve ser feita por meio de um formulário-padrão embasado em laudo técnico ou por perícia técnica.

4. A atividade é considerada especial quando há exposição a ruído acima de 80 dB até 05/03/1997, acima de 90 dB entre 06/03/1997 e 18/11/2003 e acima de 85 dB a partir de 19/11/2003 (conforme decisão no REsp 1.398.260). A condição especial do trabalho persiste mesmo se o ruído for reduzido aos limites de tolerância pelo uso de Equipamento de Proteção Individual (EPI).

5. A análise dos Perfis Profissiográficos Previdenciários e demais provas documentais já reconheceu a exposição do autor a condições especiais de trabalho no período de 14/03/1995 a 08/06/2010, o que foi devidamente documentado e verificado. Esse intervalo, já reconhecido como especial, justifica a decisão de primeira instância pela averbação desse tempo pelo INSS como especial. Para o período estendido de 09/06/2010 a 10/11/2016, no entanto, as provas apresentadas não demonstraram exposição contínua a agentes nocivos acima dos limites estabelecidos pela legislação vigente, sustentando a decisão da sentença que não reconheceu este intervalo adicional como especial.

6. Com base nas evidências apresentadas e na legislação aplicável, é reconhecida a especialidade do período de 06/01/1988 a 23/06/1989, durante o qual foram exercidas atividades como mecânico. Este período, juntamente com os períodos reconhecidos pela sentença de 14/03/1995 a 08/06/2010, devido à exposição a amianto com fator de conversão de 1,75, e os períodos de 14/03/1995 a 05/03/1997, de 01/02/2000 a 19/04/2004 e de 20/04/2004 a 08/06/2010, devido a ruídos excessivos com fator de conversão de 1,4, ainda não alcançam o tempo total necessário para o deferimento completo do pedido de aposentadoria especial. Portanto, determina-se a averbação destes períodos como especiais no dossiê previdenciário do apelante, mas sem deferimento do benefício de aposentadoria especial.

7. Apelação do autor parcialmente provida, nos termos do item 6.

ACÓRDÃO

Decide a Segunda Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação do autor, nos termos do voto do relator.

Brasília - DF.

ASSINADO DIGITALMENTE

Desembargador Federal João Luiz de Sousa

Relator

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