
POLO ATIVO: MARIANA NASCIMENTO DA SILVA SOUSA
REPRESENTANTE(S) POLO ATIVO: NATHALIA CRISTINA FERREIRA MONTES - GO38755-A
POLO PASSIVO:INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RELATOR(A):URBANO LEAL BERQUO NETO

Gab. 25 - DESEMBARGADOR FEDERAL URBANO LEAL BERQUÓ NETO
PROCESSO: 1023982-36.2020.4.01.9999 PROCESSO REFERÊNCIA: 5384562-17.2017.8.09.0014
CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198)
POLO ATIVO: MARIANA NASCIMENTO DA SILVA SOUSA
REPRESENTANTES POLO ATIVO: NATHALIA CRISTINA FERREIRA MONTES - GO38755-A
POLO PASSIVO:INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RELATOR: URBANO LEAL BERQUO NETO
RELATÓRIO
Trata-se de apelação interposta pela autora em face de sentença que julgou improcedente pedido de conversão de Benefício de Prestação Continuada - BPC/LOAS - em auxílio-doença rural e/ou aposentadoria rural por invalidez.
Deferida a gratuidade de justiça no 1º grau de jurisdição.
Em suas razões, a recorrente alega que a sentença deve ser reformada por ter sido produzida nos autos vasta prova material, corroborada pelos depoimentos testemunhais, no intuito de comprovar sua condição de rurícola, bem como a incapacidade total e permanente para o trabalho.
Alega, ainda, que o Juízo sentenciante “limitou-se a fundamentar a negativa ao pedido de aposentadoria por invalidez no fato de que não há início de prova material razoável para demonstrar a qualidade de segurada especial no momento do pedido de conversão, desconsiderando que a qualidade de segurada especial deveria se referir ao momento anterior a concessão do benefício assistencial ao portador da deficiência o que impossibilitaria a conversão.”
Aduz que no momento da concessão do benefício assistencial possuía qualidade de segurada especial e que somente se mudou para a cidade após o deferimento do pedido administrativo do BPC e da aposentadoria por idade rural do seu marido.
Intimado para apresentar contrarrazões, o INSS não se manifestou.
É o relatório.

Gab. 25 - DESEMBARGADOR FEDERAL URBANO LEAL BERQUÓ NETO
PROCESSO: 1023982-36.2020.4.01.9999 PROCESSO REFERÊNCIA: 5384562-17.2017.8.09.0014
CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198)
POLO ATIVO: MARIANA NASCIMENTO DA SILVA SOUSA
REPRESENTANTES POLO ATIVO: NATHALIA CRISTINA FERREIRA MONTES - GO38755-A
POLO PASSIVO:INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RELATOR: URBANO LEAL BERQUO NETO
V O T O
Presentes os pressupostos recursais, conheço do recurso.
Diante da inexistência de preliminares ou/e defesa indireta de mérito, mister a depuração do cerne da pretensão.
A questão devolvida ao conhecimento do Judiciário gira em torno da implementação dos requisitos necessários à concessão de aposentadoria rural por invalidez à época do deferimento administrativo do BPC/LOAS, ocorrido em 1.2.2014 (ID 80213539 – pág. 27). Tal benefício foi-lhe atribuído em razão de doenças psiquiátricas.
Ao sentenciar, o nobre magistrado afirmou que “Embora o laudo médico concluir que a periciada ‘encontra-se incapaz ao laboro de forma permanente e total para suas atividades diárias desde dezembro de 2018, devido a patologia da mesma’, esta não comprovou a carência necessária para o deferimento do auxílio pleiteado, pois conforme se observa, a requerente abandonou o campo a aproximadamente 3 anos. Além disso, a incapacidade surgiu em momento posterior a sua qualidade de segurada especial, sendo impossível a conversão do benefício conforme pretendido.”
No pronunciamento judicial, afirmou-se que a incapacidade da recorrente surgiu em “momento posterior a sua qualidade de segurada especial”. Para tanto, o julgador baseou-se na data fixada no laudo pericial, qual seja, dia 3.12.2018 (ID 80213539 – págs 13 a 17).
Já a apelante afirma que reunia as condições exigidas para o deferimento da aposentadoria por invalidez rural à época da concessão do BPC.
Os requisitos previstos na Lei de Benefícios para a concessão da aposentadoria por invalidez são:
1) o cumprimento do período de carência, quando exigida;
2) a qualidade de segurado;
3) a incapacidade para o trabalho.
O benefício assistencial concedido outrora pelo INSS deu-se em razão da incapacidade da apelante para labor tida por total e permanente. Tenho por inconteste, portanto, tal requisito.
Cabe-nos agora analisar se os demais requisitos foram preenchidos antes da concessão do BPC/LOAS.
O reconhecimento da qualidade de segurada especial, trabalhadora rural, desafia o preenchimento dos requisitos fundamentais da existência de início de prova material da atividade rural exercida e a corroboração dessa prova indiciária por robusta prova testemunhal.
Sobre os documentos admitidos como prova material, é pacífica a jurisprudência do STJ e desta Corte no sentido de que o rol do art. 106 da Lei 8.213/91 é meramente exemplificativo, (STJ AgRG no REsp 1073730/CE) sendo admissíveis, portanto, outros documentos hábeis à comprovação do exercício de atividade rural, além dos ali previstos.
A autora carreou aos autos os seguintes documentos a fim de comprovar suas alegações:
- Contrato de Comodato em nome do seu marido realizado em 26.4.2016 (ID 80213537 – pág. 20);
- Escritura Pública de inventário e Partilha lavrada em janeiro de 2015 para fazer constar o recebimento de gleba de terra a título de herança (mesmo ID – págs. 28 a 30)
- Carteira de credenciamento do seu marido à Agência Goiânia de Defesa Agropecuária (AGRODEFESA), emitida em 20.11.2013, onde se lê no campo “ATIVIDADE ECONOMICA” as atividades de bovinocultura de corte e leite (pág. 33);
- Notas fiscais avulsas relativas à compra e venda de gado datadas de 2013 e 2014 (págs. 34 a 37);
- Informações retiradas dos arquivos do INSS onde há informação que o Senhor Alancardec Sousa Figueira, esposo da Senhora Mariana, é aposentado por idade e é filiado ao sistema na categoria de “Segurado Especial” (ID 80213539 – pág. 37);
Utiliza-se, também, dos depoimentos de duas testemunhas que afirmam conhecer a autora há uns 30 anos, sempre laborando na roça (ID 80213541). Ainda nesta esteira, junta estudo socioeconômico realizado por determinação do Juízo a quo, onde se afirma que o casal foi diagnosticado “com depressão severa e que necessitam acompanhamento médico em psiquiatria e acompanhamento familiar com equipe técnica assistente social e psicóloga”. Conclui que “a promovente Mariana Nascimento da Silva Souza, recebe o BPC p/ Pessoa com deficiência, porém enquadra aos critérios exigidos para a conversão do auxílio doença rural no qual justifico o DEFERIMENTO” (ID 80213539 - págs. 47 a 51).
Os dois primeiros documentos mostram-se inservíveis para demonstrar a condição de segurada especial haja vista que foram produzidos em data posterior à concessão do BPC. Não se pode dizer o mesmo em relação aos três últimos, os quais demonstram que o Senhor Alancardec de Sousa Figueira, marido da autora, era detentor da condição de segurado especial à época dos fatos. Prova inconteste, saliente-se, é que aposentou-se por idade na condição de segurado especial (trabalhador campesino).
A extensão de provas em nome de terceiros, segundo orientação jurisprudencial do TRF da 1ª Região é admitida quando se quer comprovar a condição de rurícola e constitui indício aceitável de prova material do exercício da atividade rural (Precedentes - AC 00625271720134019199 0062527- 17.2013.4.01.9199, JUIZ FEDERAL FRANCISCO NEVES DA CUNHA (CONV.), TRF1 - SEGUNDA TURMA, e-DJF1 DATA:29/01/2016).
Esse é o entendimento do STJ manifestado no REsp 267.355/MS, relatado pelo Ministro Jorge Scartezzini, publicado no DJ 20.11.2000:
“A qualificação profissional de lavrador ou agricultor do marido, constante dos assentamentos de registro civil, é extensível à esposa, e constitui indício aceitável de prova material do exercício da atividade rural...”.
Neste contexto, tenho por comprovado o início de prova material, corroborada pela testemunhal, exigido pela Lei de Benefícios.
Em contraposição à afirmação do juízo sentenciante de que não prospera o pedido de conversão do benefício assistencial em benefício previdenciário pelo fato da autora ter se mudado para a cidade em 2018, assente a postulante que realmente se mudou, porém o fez no intuito de ter melhores condições de tratamento das graves doenças que lhe acometem.
Em detida análise, vemos que cabe razão à apelante. A afirmação do perito quanto à data de início da incapacidade, dezembro de 2018, portanto quase 5 (cinco) anos após a concessão do BPC, não pode ser levada em consideração para a negativa do direito postulado quando as condições para a implementação da aposentadoria já existiam.
Posto isso, DOU PROVIMENTO à apelação para converter o benefício assistencial – BPC/LOAS – em aposentadoria rural por invalidez.
Condeno a autarquia ao pagamento dos atrasados a partir da DER, com inclusão de juros de mora e correção monetária de acordo com o Manual de Cálculos da Justiça Federal, descontadas eventuais parcelas recebidas a título do benefício BPC-LOAS e observada possível prescrição quinquenal.
Fixo os honorários de sucumbência em 10% sobre o valor dos atrasados, ao teor da Súmula 111 do STJ.
É o voto.
Desembargador Federal URBANO LEAL BERQUÓ NETO
Relator

Gab. 25 - DESEMBARGADOR FEDERAL URBANO LEAL BERQUÓ NETO
PROCESSO: 1023982-36.2020.4.01.9999 PROCESSO REFERÊNCIA: 5384562-17.2017.8.09.0014
CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198)
POLO ATIVO: MARIANA NASCIMENTO DA SILVA SOUSA
REPRESENTANTES POLO ATIVO: NATHALIA CRISTINA FERREIRA MONTES - GO38755-A
POLO PASSIVO:INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. CONVERSÃO DO BPC/LOAS EM APOSENTADORIA RURAL POR INVALIDEZ. POSSIBILIDADE. REQUISITOS NECESSÁRIOS IMPLEMENTADOS ANTES DA CONCESSÃO DO BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. SENTENÇA REFORMADA.
1. A concessão de benefícios por incapacidade rural exige o preenchimento de requisitos que compreendem: o cumprimento do período de carência, quando exigida, prevista no art. 25 da Lei 8.2138/91, qualidade de segurado, nos termos do art. 15 da Lei de Benefícios, incapacidade definitiva para o exercício da atividade laborativa e comprovação do exercício da atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento.
2. In casu, as condições para o implemento do benefício previdenciário foram atendidas em momento anterior à concessão do BPC.
3. A extensão de provas da condição de segurado especial em nome de terceiros componentes do núcleo familiar, especificamente do marido da autora, é admitida quando se deseja comprovar a condição de rurícola.
4. Início de prova material corroborada pela testemunhal. Atendimento às exigências da Lei de Benefícios.
4. A mudança para a cidade após a concessão do BPC não pode ser entrave ao reconhecimento do direito já existente no momento da DER.
5. Apelação a que dá provimento.
A C Ó R D Ã O
Decide a Nona Turma do Tribunal Regional Federal da Primeira Região, por unanimidade, DAR PROVIMENTO à apelação, nos termos do voto do Relator.
Desembargador Federal URBANO LEAL BERQUÓ NETO
Relator