
POLO ATIVO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
POLO PASSIVO:IVANETE CARVALHO CURICO
REPRESENTANTE(S) POLO PASSIVO: ELOIR FRANCISCO MILANO DA SILVA - SP273806-A
RELATOR(A):CANDICE LAVOCAT GALVAO JOBIM
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
GABINETE DA DESEMBARGADORA FEDERAL CANDICE LAVOCAT GALVÃO JOBIM
APELAÇÃO CÍVEL (198)1002230-66.2024.4.01.9999
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: IVANETE CARVALHO CURICO
RELATÓRIO
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL CANDICE LAVOCAT GALVÃO JOBIM (RELATORA):
Trata-se de apelação interposta pelo INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS em face de sentença que julgou parcialmente procedente o pedido inicial para conceder uma parcela do benefício de seguro-defeso à parte autora referente ao período de 2018/2019.
Em suas razões recursais (Fls. 158/165) o INSS sustenta que no período em que a autora pleiteia o recebimento do seguro-defeso houve o recebimento de salário-maternidade. Alega que, a parte autora não cumpriu os requisitos legais para obter o seguro-desemprego pretendido, tendo como consequência a improcedência dos pedidos.
As contrarrazões foram apresentadas (Fls. 167/172).
É o relatório.
ASSINADO DIGITALMENTE
Candice Lavocat Galvão Jobim
Desembargadora Federal
Relatora
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
GABINETE DA DESEMBARGADORA FEDERAL CANDICE LAVOCAT GALVÃO JOBIM
APELAÇÃO CÍVEL (198)1002230-66.2024.4.01.9999
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: IVANETE CARVALHO CURICO
VOTO
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL CANDICE LAVOCAT GALVÃO JOBIM (RELATORA):
O ponto em debate reside no preenchimento dos requisitos pela parte autora para o recebimento do benefício de seguro-defeso.
O seguro-desemprego do pescador artesanal, também conhecido como seguro-defeso, foi criado pela Lei n. 8.287/90 (posteriormente revogada pela Lei n. 10.779/2003, que disciplina a matéria atualmente), e consiste no pagamento de um salário-mínimo mensal ao pescador durante o período de defeso, em que a atividade pesqueira é vedada.
Nos termos do artigo 1º da Lei 10.779/2003, o pescador artesanal que exercer sua atividade profissional ininterruptamente, de forma individual ou em regime de economia familiar, fará jus ao seguro-desemprego, no valor de um salário mínimo mensal, durante o período de defeso de atividade pesqueira para a preservação da espécie. O artigo 2º, §2º, do mesmo diploma legal, por sua vez, lista os documentos que devem ser apresentados ao INSS para a percepção do mencionado benefício:
a) registro como pescador profissional, categoria artesanal, devidamente atualizado no Registro Geral da Atividade Pesqueira, emitido pelo Ministério da Pesca e Aquicultura com antecedência mínima de um ano, contado da data de requerimento do benefício;
b) cópia do documento fiscal de venda do pescado a empresa adquirente, consumidora ou consignatária da produção, em que conste, além do registro da operação realizada, o valor da contribuição previdenciária ou o comprovante dessa contribuição, caso tenha comercializado sua produção a pessoa física;
c) outros estabelecidos pelo Ministério da Previdência Social que comprovem: o exercício da profissão; a dedicação à pesca pelo período compreendido entre o defeso anterior e aquele em curso, ou nos doze meses anteriores ao do defeso em curso, o que for menor; que não dispõe de outra fonte de renda diversa da decorrente da atividade pesqueira.
Trata-se o seguro-desemprego do pescador artesanal de uma assistência financeira temporária concedida aos pescadores profissionais artesanais que, durante o período de “defeso”, são obrigados a paralisar a sua atividade para preservação da espécie. Para ter direito, o pescador deve comprovar que exerce a pesca de maneira ininterrupta, seja sozinho ou em regime de economia familiar.
Nos termos do art. 1º da Lei nº 10.779/2003:
Art. 1º O pescador profissional que exerça sua atividade de forma artesanal individualmente ou em regime de economia familiar, ainda que com o auxílio eventual de parceiros, fará jus ao benefício de seguro-desemprego, no valor de um salário-mínimo mensal, durante o período de defeso de atividade pesqueira para a preservação da espécie.
§ 1º Entende-se como regime de economia familiar o trabalho dos membros da mesma família, indispensável à própria subsistência e exercido em condições de mútua dependência e colaboração, sem a utilização de empregados.
A interpretação dada pela União a essa disposição legal é literal, pois entende que o pescador artesanal que conte habitualmente com o auxílio de parceiros não pode receber o seguro-desemprego durante o período de defeso.
Entrementes, a interpretação literal da citada disposição legal leva à materialização de situações inteiramente incongruentes, contrapondo-se até mesmo à proteção ambiental que animou a outorga do seguro desemprego aos pescadores artesanais, porque aqueles que pescam em regime de parceria, caso não recebam esse benefício, continuarão a pescar durante o período de defeso por força da própria necessidade (e de igualdade de tratamento em relação ao pescador individual).
Ora, a reunião de pescadores artesanais, em regime de parceria, não descaracteriza a natureza do trabalho que desenvolvem. E o fenômeno deve ser identificado pela sua essência: a reunião de pescadores não altera a natureza da pesca artesanal. O pescador artesanal que pesca ao lado de outro pescador artesanal continua sendo pescador artesanal. A reunião não provoca nenhuma metamorfose. Portanto, o fundamento para a concessão do benefício, para um e para outro, é um só.
Cumpre também assinalar que existem muitos pescadores artesanais que não constituíram família, de modo que não têm como pescar em regime de economia familiar, numa interpretação restritiva. A formação de parceria é inevitável nestes casos, assim como nos casos em que o pescador tem filhos pequenos que precisam ficar sob os cuidados da mãe.
Por outro lado, não se pode perder de vista que é reconhecido o direito ao benefício nos casos de parceria eventual (art. 1º da Lei nº 10.779/2003). Ocorre, no entanto, que a própria atividade do pescador artesanal não é contínua, podendo-se considerar a sua eventualidade em decorrência dos períodos de proibição fixados pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), em relação à espécie marinha, fluvial ou lacustre, a cuja captura o pescador se dedique (art. 1º, § 2º, da Lei nº 10.779/2003).
Vale ressaltar ainda que a Lei n. 10.779/2003, que dispõe sobre a concessão do benefício de seguro desemprego, durante o período de defeso, ao pescador profissional que exerce a atividade pesqueira de forma artesanal, prevê em seu artigo 2º, os documentos cuja apresentação é necessária junto ao órgão competente do Ministério do Trabalho e Emprego.
O inciso IV é expresso ao exigir atestado da Colônia de Pescadores a que o pescador esteja filiado, de forma que nenhum outro atestado ou declaração é bastante para preencher o requisito legal, como atestado de sindicatos ou associações locais de pescadores.
A Resolução 468/05 do CODEFAT ampliou ilegalmente o rol de requisitos, admitindo a apresentação de atestado por órgão representativo da categoria, e não necessariamente da Colônia de Pescadores. O normativo já não goza de vigência, sendo alterado pela Resolução 566/07, que observou os limites legais.
O período de defesa da atividade pesqueira é fixado pelo IBAMA, em relação a espécie marinha, fluvial ou lacustre a cuja captura o pescador se dedique, e pode variar entre dois e cinco meses. Tem por escopo a proteção das espécies, garantindo a procriação suficiente para a manutenção da vida marinha, garantindo o meio ambiente e, por consequência, também o sustento daqueles que têm a pesca como renda familiar. A exigência de requisitos para auferir seguro-defeso durante tal período é plenamente legítima, pois atua no sentido de reduzir fraudes da concessão do seguro-desemprego a pescadores profissionais artesanais durante o período em que a pesca é proibida.
O segurado especial está sujeito à contribuição obrigatória sobre a receita bruta proveniente da comercialização da sua produção. Se vender o pescado para empresa ou cooperativa, o segurado especial não terá em seu poder o comprovante de recolhimento da contribuição, mas deverá reter o documento que comprova a aquisição da mercadoria pela pessoa jurídica que se sub-rogou na responsabilidade pelo recolhimento da contribuição e que forma prova suficiente para instruir o requerimento de seguro-desemprego. Nos demais casos, o próprio segurado especial ficará obrigado a recolher a contribuição, indicando na guia de recolhimento o número de Cadastro Específico do INSS – CEI, e esse documento será igualmente suficiente para instruir o requerimento de seguro-desemprego.
Para os fins do art. 2º, II, da Lei nº 10.779/03, o segurado especial não precisa exibir a GPS referente ao recolhimento de contribuição facultativa, mas se sujeita ao ônus de apresentar: (i) a nota fiscal de venda do pescado a adquirente pessoa jurídica ou pessoa física equiparada à jurídica; ou (ii) o comprovante de recolhimento direto da contribuição obrigatória, com identificação do CEI - Cadastro Específico do INSS.
Cumpre esclarecer, que no caso concreto o período de defeso foi estabelecido de 15/11/2018 a 15/03/2019.
A fim de comprovar os requisitos para a concessão do seguro-defeso a parte autora apresentou a seguinte documentação: formulários de requerimento de seguro-desemprego do pescador artesanal datados de 24/10/2018 e 15/11/2019 (Fls. 18 e 42); guias de pagamento da contribuição social (Fls. 19 e 43); ofício ao Sindicato dos Pescadores Artesanais de São Paulo de Olivença para registro de pescador (Fls. 20/21); formulário de requerimento de licença de pescador artesanal com emissão em 23/06/2009 (Fls. 35/36); carteira de filiação à federação das colônias de pescadores do Maranhão. Há ainda, comprovante de que a parte autora gozou de benefício de salário-maternidade no período de 12/09/2018 a 09/01/2019.
Nesse contexto, a análise dos documentos demonstra o preenchimento dos requisitos exigidos para obtenção do seguro-defeso, biênio 2018/2019. No entanto, considerando o gozo do benefício de salário-maternidade (NB 184.782.259-00) no período de 12/09/2018 a 09/01/2019 e que não é possível a percepção simultânea de dois benefícios previdenciários, por força do disposto no § 1º, do art. 2º, da Lei nº 10.779/2003, a parte autora faz jus ao seguro apenas a partir da cessação do benefício de salário-maternidade. Destarte, por não haver apelação da parte autora, a sentença deve permanecer incólume.
Majoro os honorários de sucumbência em 2%, ante o oferecimento de contrarrazões, nos termos do § 11 do art. 85 do Código de Processo Civil, e determino a sua incidência com base na Súmula nº 111 do Superior Tribunal de Justiça.
Ante o exposto, CONHEÇO do recurso e, no mérito, NEGO PROVIMENTO à apelação do INSS.
É como voto.
ASSINADO DIGITALMENTE
Candice Lavocat Galvão Jobim
Desembargadora Federal
Relatora
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
GABINETE DA DESEMBARGADORA FEDERAL CANDICE LAVOCAT GALVÃO JOBIM
APELAÇÃO CÍVEL (198)1002230-66.2024.4.01.9999
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: IVANETE CARVALHO CURICO
PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. PESCADOR PROFISSIONAL. SEGURO-DESEMPREGO. RECEBIMENTO SALÁRIO-MATERNIDADE DURANTE O PERÍODO SEGURO-DESEMPREGO. DIREITO A UMA PARCELA SEGURO-DEFESO. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO INSS DESPROVIDO.
1. O ponto em debate reside no preenchimento dos requisitos para o recebimento do benefício de seguro-defeso.
2. O seguro-desemprego do pescador artesanal, também conhecido como seguro-defeso, foi criado pela Lei n. 8.287/90 (posteriormente revogada pela Lei n. 10.779/2003, que disciplina a matéria atualmente), e consiste no pagamento de um salário-mínimo mensal ao pescador durante o período de defeso, em que a atividade pesqueira é vedada.
3. Nos termos do artigo 1º da Lei 10.779/2003, o pescador artesanal que exercer sua atividade profissional ininterruptamente, de forma individual ou em regime de economia familiar, fará jus ao seguro-desemprego, no valor de um salário mínimo mensal, durante o período de defeso de atividade pesqueira para a preservação da espécie. O artigo 2º, §2º, do mesmo diploma legal, por sua vez, lista os documentos que devem ser apresentados ao INSS para a percepção do mencionado benefício: a) registro como pescador profissional, categoria artesanal, devidamente atualizado no Registro Geral da Atividade Pesqueira, emitido pelo Ministério da Pesca e Aquicultura com antecedência mínima de um ano, contado da data de requerimento do benefício; b) cópia do documento fiscal de venda do pescado a empresa adquirente, consumidora ou consignatária da produção, em que conste, além do registro da operação realizada, o valor da contribuição previdenciária ou o comprovante dessa contribuição, caso tenha comercializado sua produção a pessoa física; c) outros estabelecidos pelo Ministério da Previdência Social que comprovem: o exercício da profissão; a dedicação à pesca pelo período compreendido entre o defeso anterior e aquele em curso, ou nos doze meses anteriores ao do defeso em curso, o que for menor; que não dispõe de outra fonte de renda diversa da decorrente da atividade pesqueira.
4. Cumpre esclarecer, que no caso concreto o período de defeso foi estabelecido de 15/11/2018 a 15/03/2019.
5. A fim de comprovar os requisitos para a concessão do seguro-defeso, a parte autora apresentou a seguinte documentação: formulários de requerimento de seguro-desemprego do pescador artesanal datados de 24/10/2018 e 15/11/2019 (Fls. 18 e 42); guias de pagamento da contribuição social (Fls. 19 e 43); ofício ao Sindicato dos Pescadores Artesanais de São Paulo de Olivença para registro de pescador (Fls. 20/21); formulário de requerimento de licença de pescador artesanal com emissão em 23/06/2009 (Fls. 35/36); carteira de filiação à federação das colônias de pescadores do Maranhão. Há, ainda, comprovante de que a parte autora gozou de benefício de salário-maternidade no período de 12/09/2018 a 09/01/2019.
6. Nesse contexto, a análise dos documentos demonstra o preenchimento dos requisitos exigidos para obtenção do seguro-defeso, biênio 2018/2019. No entanto, considerando o gozo do benefício de salário-maternidade (NB 184.782.259-00) no período de 12/09/2018 a 09/01/2019 e que não é possível a percepção simultânea de dois benefícios previdenciários, por força do disposto no § 1º, do art. 2º, da Lei nº 10.779/2003, a parte autora faz jus ao seguro apenas a partir da cessação do benefício de salário-maternidade. Destarte, por não haver apelação da parte autora, a sentença deve permanecer incólume.
7. Apelação do INSS desprovida.
ACÓRDÃO
Decide a Segunda Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, por unanimidade, NEGAR PROVIMENTO à apelação da parte autora, nos termos do voto da Relatora.
Brasília, na data lançada na certidão do julgamento.
ASSINADO DIGITALMENTE
Candice Lavocat Galvão Jobim
Desembargadora Federal
Relatora