D.E. Publicado em 09/06/2016 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, NÃO CONHECER do agravo retido interposto pela autarquia previdenciária, DAR PARCIAL PROVIMENTO à remessa oficial e DAR PROVIMENTO ao recurso de apelação da parte autora, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
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APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 0001100-21.2003.4.03.6125/SP
RELATÓRIO
O Senhor Desembargador Federal FAUSTO DE SANCTIS:
Trata-se de Ação de Conhecimento ajuizada por Lucio Gonçalves, visando à condenação da Autarquia Previdenciária a conceder o benefício de aposentadoria por tempo de serviço (sob a égide anterior à Emenda Constitucional nº 20/98), seja na forma integral, seja na forma proporcional, mediante o reconhecimento de labor sob condições especiais, bem como de atividade levada a efeito no meio rural.
A r. sentença (fls. 185/193), submetida ao reexame necessário, extinguiu o feito sem resolução de mérito, por falta de interesse de agir da parte autora, no tocante ao reconhecimento da especialidade do labor entre 03/05/1974 e 23/11/1977 (uma vez que já reconhecido administrativamente) e julgou parcialmente procedente os demais pleitos para reconhecer como efetivamente trabalhado pela parte autora no campo o período de 01/01/1968 a 31/12/1973, bem como para condenar a autarquia previdenciária a implantar o benefício de aposentadoria por tempo de serviço proporcional, desde a data de citação, devendo as parcelas em atraso ser acrescidas de juros e de correção monetária, fixando-se, por fim, sucumbência recíproca.
Apela a parte autora (fls. 195/197), requerendo apenas a condenação do Instituto Nacional do Seguro Social - INSS ao pagamento de honorários advocatícios.
Consta a interposição de agravo retido pela autarquia previdenciária (fls. 96/98), todavia, não reiterado.
Subiram os autos a esta Corte, sem contrarrazões.
VOTO
O Senhor Desembargador Federal FAUSTO DE SANCTIS:
Primeiramente, não conheço do agravo retido interposto pela autarquia previdenciária (fls. 96/98), vez que não reiterado expressamente, conforme disposto no art. 523, § 1º, do Código de Processo Civil de 1973, aplicável à espécie em razão do princípio do tempus regit actum.
DO REEXAME NECESSÁRIO
O Código de Processo Civil afasta a submissão da sentença proferida contra a União e suas respectivas autarquias e fundações de direito público ao reexame necessário quando a condenação imposta for inferior a 1.000 (mil) salários mínimos (art. 496, I c.c. § 3º, I), cabendo considerar que a legislação processual civil tem aplicação imediata (art. 1.046).
Todavia, cumpre salientar que o C. Superior Tribunal de Justiça, quando do julgamento do REsp 1.144.079/SP (representativo da controvérsia), apreciando a incidência das causas de exclusão da remessa oficial vindas por força da Lei nº 10.352/01 em face de sentenças proferidas anteriormente a tal diploma normativo, fixou entendimento no sentido de que a adoção do princípio tempus regit actum impõe o respeito aos atos praticados sob o pálio da lei revogada, bem como aos efeitos desses atos, impossibilitando a retroação da lei nova, razão pela qual a lei em vigor à data da sentença é a que regula os recursos cabíveis contra o ato decisório e, portanto, a sua submissão ao duplo grau obrigatório de jurisdição - nesse sentido:
Dentro desse contexto, tendo como base o entendimento acima exposto e prestigiando a força vinculante dos precedentes emanados como representativo da controvérsia, entendo deva ser submetido o provimento judicial guerreado ao reexame necessário (ainda que a condenação seja certamente inferior a 1.000 - mil - salários mínimos), tendo como base a legislação vigente ao tempo em que proferida a r. sentença.
DA APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO/CONTRIBUIÇÃO
A aposentadoria por tempo de serviço foi assegurada no art. 202, da Constituição Federal, que dispunha, em sua redação original:
A regulamentação da matéria sobreveio com a edição da Lei de Benefícios, de 24 de julho de 1991, que tratou em vários artigos da aposentadoria por tempo serviço. Nesse contexto, o benefício em tela será devido, na forma proporcional, ao segurado que completar 25 (vinte e cinco) anos de serviço, se do sexo feminino, ou 30 (trinta) anos de serviço, se do sexo masculino (art. 52, da Lei nº 8.213/91). Comprovado o exercício de mais de 35 (trinta e cinco) anos de serviço, se homem, e 30 (trinta) anos, se mulher, concede-se a aposentadoria em tela na forma integral (art. 53, I e II, da Lei nº 8.213/91).
A Lei nº 8.213/91 estabeleceu período de carência de 180 (cento e oitenta) contribuições, revogando o § 8º do art. 32 da Lei Orgânica da Previdência Social - LOPS (que fixava, para a espécie, período de carência de 60 - sessenta - meses). Destaque-se que a Lei nº 9.032/95, reconhecendo a necessidade de disciplinar a situação dos direitos adquiridos e ainda da expectativa de direito que possuíam os filiados ao regime previdenciário até 24 de julho de 1991 (quando publicada com vigência imediata a Lei nº 8.213/91), estabeleceu regra de transição aplicável à situação desses filiados, prevendo tabela progressiva de períodos de carência mínima para os que viessem a preencher os requisitos necessários às aposentadorias por idade, por tempo de serviço e especial, desde o ano de 1991 (quando necessárias as 60 - sessenta - contribuições fixadas pela LOPS) até o ano de 2.011 (quando se exige 180 - cento e oitenta - contribuições).
A Emenda Constitucional nº 20/1998, que instituiu a reforma da previdência, estabeleceu o requisito de tempo mínimo de contribuição de 35 (trinta e cinco) anos para o segurado e de 30 (trinta) anos para a segurada, extinguindo o direito à aposentadoria proporcional e criando o fator previdenciário (tudo a tornar mais vantajosa a aposentação tardia). Importante ser dito que, para os filiados ao regime até sua publicação e vigência (em 15 de dezembro de 1998), foi assegurada regra de transição, de forma a permitir a aposentadoria proporcional - para tanto, previu-se o requisito de idade mínima de 53 (cinquenta e três) anos para os homens e de 48 (quarenta e oito) anos para as mulheres e um acréscimo de 40% (quarenta por cento) do tempo que faltaria para atingir os 30 (trinta) ou 35 (trinta e cinco) anos necessários nos termos da nova legislação.
Tal Emenda, em seu art. 9º, também previu regra de transição para a aposentadoria integral, estabelecendo idade mínima nos termos acima tratados e percentual de 20% (vinte por cento) do tempo faltante para a aposentação. Contudo, tal regra, opcional, teve seu sentido esvaziado pelo próprio Constituinte derivado, que a formulou de maneira mais gravosa que a regra permanente das aposentadorias integrais (que não exige idade mínima nem tempo adicional).
DO TEMPO EXERCIDO EM ATIVIDADE RURAL
O tempo de serviço do segurado trabalhador rural exercido antes da data de início de vigência da Lei nº 8.213/1991 é de ser computado e averbado, independentemente do recolhimento das respectivas contribuições correspondentes, todavia, não se prestando para fins de carência (art. 55, § 2º, da Lei nº 8.213/91).
A comprovação de tal tempo, mesmo que anterior à perda da qualidade de segurado, nos termos do § 3º do art. 55 da Lei nº 8.213/91, deve ser levada a efeito por meio de início de prova material, não sendo admitida, porém, prova exclusivamente testemunhal, salvo na ocorrência de motivo de força maior ou de caso fortuito, a teor da Súm. 149/STJ: "A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeito da obtenção de beneficio previdenciário". Por outro lado, havendo início de prova material, corroborada pelas testemunhas colhidas em juízo, é possível o reconhecimento de tempo anterior ao documento mais remoto (desde que o labor seja confirmado pela prova oral), de acordo com o que restou assentado pelo C. Superior Tribunal de Justiça, quando do julgamento do REsp nº 1.348.633/SP, representativo da controvérsia.
Importante ser dito que o reconhecimento de labor na faina rural não demanda prova do recolhimento das respectivas contribuições sociais, conforme jurisprudência do C. Superior Tribunal de Justiça:
Cabe destacar, ainda, que o fato da prova evidenciar trabalho do menor em nada o prejudica na contagem desse tempo. Na verdade, de todo razoável o cômputo de tal período, pois a autorização constitucional condicionada ao vínculo empregatício (art. 165, X, da Emenda Constitucional nº 1/69) se justificava no intuito de proteção do menor, o que está implícito no dever de educar dos pais nas famílias em que predomina a economia de subsistência. De igual modo, se a atual Constituição veda o trabalho aos menores de 14 (catorze) anos, o faz certamente em benefício deles; logo, em tais condições, descabe prejudicá-los deixando de computar o período de atividade rurícola desde a idade de doze (12) anos. Sobre o tema, o C. Superior Tribunal de Justiça tem entendimento pacífico que o exercício da atividade rural do menor deve ser reconhecido para fins previdenciários, já que as normas proibitivas do trabalho são editadas para protegê-lo - nesse sentido:
Por fim, quanto ao tempo de serviço rural posterior à vigência da Lei nº 8.213/91, na qualidade de pequeno produtor rural em regime de economia familiar, observa-se a regra do art. 39, de referido diploma:
Desta forma, em relação ao reconhecimento de trabalho rural posterior a novembro de 1991, faz-se necessária a prova do recolhimento das contribuições previdenciárias relativas ao período (art. 60, X, do Decreto nº 3.048/99).
DO CONJUNTO PROBATÓRIO DOS AUTOS
De plano, importante ser dito que a parte autora ajuizou a presente demanda postulando tanto o reconhecimento de labor levado a efeito na faina rural como o reconhecimento de exercício de atividade submetida a agente agressivo (com a consequente conversão em tempo comum). Foi proferida a r. sentença impugnada (que, conforme constou do relatório deste Voto, apenas atestou labor no campo em parte do período vindicado), tendo a parte autora ficado silente quanto às pretensões indeferidas (reconhecimento de atividade especial), recorrendo apenas do capítulo atinente à verba honorária.
Nesse diapasão, a análise que ora é feita abarca tão somente as condenações impostas à autarquia previdenciária (trabalho rural e deferimento de aposentadoria por tempo de serviço na forma proporcional, submetidas ao duplo grau de jurisdição, com as observações anteriormente tecidas relativas ao conhecimento da remessa oficial sob a égide do Novo Código de Processo Civil), além da pretensão recursal autoral (consistente na imposição de condenação ao pagamento de honorários advocatícios), não havendo que se falar em apreciação da tese relativa ao suposto trabalho em condições especiais sob pena de incidir, no caso concreto, violação ao princípio que veda a reformatio in pejus.
Do labor rural: Pugna a parte autora pelo reconhecimento de atividade levada a efeito na faina rural no interregno de 18/09/1962 a 28/02/1974. Reconheço, como início de prova documental, o certificado de dispensa de incorporação (fls. 09), de 1971, a certidão do Ministério do Exército (fls. 60 do apenso), de 1968, a certidão de casamento (fls. 65 do apenso), de 1972, e a certidão de nascimento (fls. 66 do apenso), de 1973, todas a indicar a profissão da parte autora como sendo a de lavrador. Tal início de prova é corroborado pelos testemunhos colhidos neste feito (fls. 170/172), que foram coesos e unânimes em atestar a lida campesina no período controvertido.
Saliente-se que o início de prova documental trazido aos autos pode ter sua força probatória ampliada pelos depoimentos das testemunhas para alcança lapso anterior ao documento mais remoto, nos termos assentados pelo C. Superior Tribunal de Justiça quando do julgamento do REsp nº 1.348.633/SP (representativo da controvérsia). A despeito dessa observação, tendo em vista a ausência de recurso de apelação da parte autora atinente a este aspecto e levando em conta a vedação à reformatio in pejus, mantenho os termos fixados pela r. sentença recorrida, motivo pelo qual reconheço como efetivamente laborado no campo o interregno de 01/01/1968 a 31/12/1973.
DO CASO CONCRETO
Somados os períodos incontroversos com aquele ora reconhecido como de atividade rural, perfaz a parte autora 32 anos e 17 dias de tempo de serviço, conforme planilha que ora se determina a juntada, antes da vigência da Emenda Constitucional nº 20/98, suficientes para que ela adquirisse o direito de lhe ser concedido o benefício de aposentadoria por tempo de serviço, na forma proporcional e com cálculos nos termos do disposto no art. 3º, da Emenda Constitucional nº 20/98.
Tendo em vista o fato de o sistema albergar a concessão do melhor benefício (art. 621, da Instrução Normativa INSS 45/2010) e que a parte autora adquiriu o direito de ter seu benefício regido pelas regras anteriores ao advento de indicada Emenda Constitucional (uma vez que tinha mais de 30 anos de labor no momento de sua entrada em vigor), cumpre verificar quanto tempo de trabalho ela possuía nos termos pugnados neste feito - nesse contexto, verifica-se que a parte autora acumula 32 anos, 02 meses e 22 dias de tempo de serviço, conforme planilha que ora se determina a juntada, tempo este que deve ser levado em conta para que seja concedida a aposentadoria vindicada nesta demanda.
Desta forma, tem direito a parte autora a se aposentar por tempo de serviço, na forma proporcional, em razão de ter 32 anos, 02 meses e 22 dias de labor, benefício este cujo cálculo deverá respeitar o disposto no art. 3º, da Emenda Constitucional nº 20/98, em razão do princípio do direito adquirido.
O termo inicial da prestação deve ser a data de citação do ente autárquico nesta demanda, uma vez que se mostra impossível fixá-lo na data do requerimento administrativo comprovado nos autos (fls. 01 do apenso) na justa medida em que a parte autora postula a inclusão de tempo de labor posterior a tal marco. Afastada eventual alegação de prescrição quinquenal.
CONSECTÁRIOS
Os juros de mora e a correção monetária são aplicados na forma prevista no Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal em vigor na data da presente decisão.
A Autarquia Previdenciária está isenta das custas e emolumentos, nos termos do art. 4º, I, da Lei n.º 9.289, de 04.07.1996, do art. 24-A da Lei n.º 9.028, de 12.04.1995, com a redação dada pelo art. 3º da Medida Provisória n.º 2.180- 35 /2001, e do art. 8º, § 1º, da Lei n.º 8.620, de 05.01.1993.
Sucumbente, deve o INSS arcar com os honorários advocatícios, fixados no percentual de 10% (dez por cento), calculados sobre o valor das parcelas vencidas até a data da sentença, consoante o art. 85, § 3º, I, do Código de Processo Civil, observada a Súm. 111/STJ. Destaque-se que a parte autora logrou vencer a maior parte de seus pleitos, motivo pelo qual é de rigor a fixação de verba honorária a seu favor.
Considerando que os recursos atualmente não possuem efeito suspensivo (art. 995, do Código de Processo Civil), determino desde já a expedição de ofício ao Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, instruído com cópia da petição inicial, dos documentos de identificação da parte autora, das procurações, da sentença e da íntegra deste acórdão, a fim de que, naquela instância, sejam adotadas as providências necessárias para que seja implantada a aposentadoria ora concedida, nos termos da disposição contida no art. 497, do Código de Processo Civil. O aludido ofício poderá ser substituído por email, na forma disciplinada por esta Corte.
A decisão deverá ser cumprida nos termos da Recomendação Conjunta nº 04, da Corregedoria Nacional de Justiça com a Corregedoria-Geral da Justiça Federal.
DISPOSITIVO
Ante o exposto, voto por NÃO CONHECER do agravo retido interposto pela autarquia previdenciária, DAR PARCIAL PROVIMENTO à remessa oficial, apenas para aclarar os critérios de juros e de correção monetária, e DAR PROVIMENTO ao recurso de apelação da parte autora, para fixar honorários advocatícios, nos termos anteriormente expendidos.
Fausto De Sanctis
Desembargador Federal
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Data e Hora: | 31/05/2016 17:15:49 |