Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5078599-13.2023.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal LUCIANA ORTIZ TAVARES COSTA ZANONI
Órgão Julgador
7ª Turma
Data do Julgamento
15/05/2024
Data da Publicação/Fonte
DJEN DATA: 20/05/2024
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO:APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO/PROGRAMADA.
TRABALHO RURAL RECONHECIDO. REQUISITOS NÃO SATISFEITOS.RECURSO
PARCIALMENTE PROVIDO.
1. A aposentadoria por tempo de contribuição integral, antes ou depois da EC/98, necessita da
comprovação de 35 anos de serviço, se homem, e 30 anos, se mulher, além do cumprimento da
carência, nos termos do art. 25, II, da Lei 8213/91. Aos já filiados quando do advento da
mencionada lei, vige a tabela de seu art. 142 (norma de transição), em que, para cada ano de
implementação das condições necessárias à obtenção do benefício, relaciona-se um número de
meses de contribuição inferior aos 180 exigidos pela regra permanente do citado art. 25, II. O art.
4º, por sua vez, estabeleceu que o tempo de serviço reconhecido pela lei vigente deve ser
considerado como tempo de contribuição, para efeito de aposentadoria no regime geral da
previdência social (art. 55 da Lei 8213/91).
2.A EC 103/2019, vigente a partir de 13/11/2019, por sua vez, extinguiu a aposentadoria por
tempo de contribuição, estabelecendo a aposentadoria programada, com exigência de novos
requisitos: 65 anos de idade, se homem, e 62 anos, se mulher, observado o tempo mínimo de
contribuição; ou 60 anos de idade, se homem, e 55 anos, se mulher, para os trabalhadores rurais
e segurados especiais (art. 201, § 7º, da Constituição Federal).
3. Oartigo 3º da Emenda Constitucional 103/2019 assegura o direito à concessão da
aposentadoria por tempo de contribuição para os segurados que preencheram os requisitos
legaisem data anterior a sua vigência (13/11/2019), os quais podem pedir benefício a qualquer
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
tempo (art. 3º da EC), garantindo-se cálculo e reajuste com base na legislação vigente à época
em que foram cumpridos os requisitos (art. 3º, §§ 1º e 2º, da EC).
4. Restaram estabelecidas 04 (quatro) regras de transição para àqueles que já eram filiados ao
RGPS e ainda não tinham implementado os requisitos até 13/11/2019, a saber (arts. 15, 16, 17 e
20 da EC 103/2019): a) sistema de pontos, idade e tempo de contribuição; b)tempo de
contribuição e idade mínima; c) tempo de contribuição e pedágio de 50% com fator previdenciário
, sem o requisito da idade; d) tempo de contribuição, pedágio e requisito da idade mínima.
5. Nos termos do artigo 55, §§2º e 3º, da Lei 8.213/1991, é desnecessário a comprovação do
recolhimento de contribuições previdenciárias pelo segurado especial ou trabalhador rural no
período anterior à vigência da Lei de Benefícios, caso pretenda o cômputo do tempo de serviço
rural, no entanto, tal período não será computado para efeito de carência (TRF3ª Região,
2009.61.05.005277-2/SP, Des. Fed. Paulo Domingues, DJ 09/04/2018; TRF3ª Região,
2007.61.26.001346-4/SP, Des. Fed. Carlos Delgado, DJ 09/04/2018; TRF3ª Região,
2007.61.83.007818-2/SP. Des. Fed. Toru Yamamoto. DJ 09/04/2018; EDcl no AgRg no REsp
1537424/SC, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em
27/10/2015, DJe 05/11/2015; AR 3.650/RS, Rel. Ministro ERICSON MARANHO
(DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ/SP), TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 11/11/2015,
DJe 04/12/2015).
6. Considerando a dificuldade do trabalhador rural na obtenção da prova escrita, o Eg. STJ vem
admitindo outros documentos além daqueles previstos no artigo 106, parágrafo único, da Lei nº
8.213/91, cujo rol não é taxativo, mas sim, exemplificativo, podendo ser admitido início de prova
material sobre parte do lapso temporal pretendido, bem como tempo de serviço rural anterior à
prova documental, desde que complementado por idônea e robusta prova testemunhal. Nesse
passo, a jurisprudência sedimentou o entendimento de que a prova testemunhal possui aptidão
para ampliar a eficácia probatória da prova material trazida aos autos, sendo desnecessária a sua
contemporaneidade para todo o período de carência que se pretende comprovar. Precedentes.
7. No que tange à possibilidade do cômputo do labor rural efetuado pelo menor de idade, o
próprio C. STF entende que as normas constitucionais devem ser interpretadas em benefício do
menor. Por conseguinte, a norma constitucional que proíbe o trabalho remunerado a quem não
possua idade mínima para tal não pode ser estabelecida em seu desfavor, privando o menor do
direito de ver reconhecido o exercício da atividade rural para fins do benefício previdenciário,
especialmente se considerarmos a dura realidade das lides do campo que obrigada ao trabalho
em tenra idade (ARE 1045867, Relator: Ministro Alexandre de Moraes, 03/08/2017, RE 906.259,
Rel: Ministro Luiz Fux, in DJe de 21/09/2015).
8. No caso, diante das robustas provas materiais corroboradas pela prova oral, não há dúvida em
reconhecer a atividade rural exercida pelo autor de 24/02/1973 a 01/01/1978, devendo ser
consideradocomo tempo de contribuição, não podendo tal período ser computado para efeito de
carência, nos termos do art. 55, §2º, da Lei 8.213/1991.
9. Por ocasião daDER em 16/01/2017 o INSS apurou um total de 28 anos, 09 meses e 03 dias de
tempo de contribuição (fl. 318)
10. Somando-se o tempo incontroverso reconhecido administrativamente com o período
reconhecido neste feito - de 24/02/1973 a 01/01/1978 ou seja, 4 anos, 10 meses e 08 dias,
verifica-seque oautor, na data do requerimento administrativo, nãopossuía o tempode
serviço/contribuição exigido.
11. A sentença deve ser mantida no ponto que reconheceu o labor rural no período de 24/02/1973
a 01/01/1978e, quanto ao pedido de aposentadoria por tempo de contribuição, deve ser
reformada, julgando-se improcedente o pedido.
12. Diante do parcial provimento do recurso do INSS, com o indeferimento do pedido de
aposentadoriaportempodecontribuição, a hipótese dos autos é de sucumbência recíproca, motivo
pelo qual as despesas processuais devem ser proporcionalmente distribuídas entre as partes, na
forma do artigo 86, do CPC/15, não havendo como se compensar as verbas honorárias, por se
tratar de verbas de titularidade dos advogados e não da parte (artigo 85, § 14, do CPC/15).
13. Revogados os efeitos da tutela antecipada (recurso representativo de controvérsia - REsp nº
1.401.560/M. Repetibilidade dos valores recebidos pela parte autora em virtude de tutela de
urgência concedida, a ser vindicada nestes próprios autos, após regular liquidação.
14. Parcialmente provido o recurso do INSS.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região
7ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5078599-13.2023.4.03.9999
RELATOR:Gab. 22 - DES. FED. INÊS VIRGÍNIA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: JACONIAS JOSE DA COSTA
Advogado do(a) APELADO: MARIA IZABEL VAL PRADO - MS14314-A
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5078599-13.2023.4.03.9999
RELATOR: Gab. 22 - DES. FED. INÊS VIRGÍNIA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: JACONIAS JOSE DA COSTA
Advogado do(a) APELADO: MARIA IZABEL VAL PRADO - MS14314-A
R E L A T Ó R I O
A EXMA.JUÍZA CONVOCADA LUCIANA ORTIZ(RELATORA):Trata-se de apelação interposta
pelo Instituto Nacional do Seguro Social - INSS em face da sentença de fls. 47/51 que julgou
procedente o pedido de concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição,
mediante o cômputo de tempo de serviço rural condenando-o a pagar o benefício, verbis:
“Ante o exposto, JULGO PROCEDENTE o pedido formulado por JACONIAS JOSÉ DA COSTA
contra o INSS a fim de: reconhecer o exercício do trabalho rural no período de 24/02/1973 a
01/01/1978; reconhecer o tempo de atividade urbana comum e rural, com registro em CTPS
e/ou no CNIS, nos termos da tabela que consta da fundamentação; condenar o INSS a realizar
a averbação dos períodos reconhecidos; e condenar o INSS a conceder ao autor
APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO, no valor de 100% do salário de
benefício, bem como ao pagamento das parcelas vencidas, devidas desde a data do
requerimento administrativo (16/01/2017 fls.11). O valor das parcelas vencidas deve sofrer
correção monetária desde a data em que deveriam ter sido pagas. Os juros de mora correm
desde a citação (STJ, REsp nº 1.112.114, sob o rito do artigo 1.036 do CPC, tema 23) e, para
as parcelas supervenientes à citação, desde o respectivo vencimento. Diante do decidido pelo
STF, na ADI 4357-DF, e pelo STJ no REsp 1.495.146-MG (Rel. Min. Mauro Campbell Marques,
julgado em 22/02/2018 - recurso repetitivo), as condenações impostas à Fazenda Pública de
natureza previdenciária sujeitam-se à incidência do INPC, para fins de correção monetária, no
que se refere ao período posterior à vigência da Lei nº 11.430/2006, que incluiu o art. 41-A na
Lei nº 8.213/91. Quanto aos juros de mora, no período posterior à vigência da Lei nº
11.960/2009, incidem segundo a remuneração oficial da caderneta de poupança e; em relação
ao período posterior à vigência da EC nº 113/2021, deverá ser aplicada a taxa referencial do
Sistema Especial de Liquidação e de Custódia (Selic), cujo índice acumulado mensalmente
deverá incidir, uma única vez, até o efetivo pagamento. Saliento a inviabilidade de se postergar
os efeitos da tutela, considerando o caráter alimentar do benefício postulado. Sob essa ótica, o
TRF4 firmou entendimento no sentido de que, nas causas similares a esta, deve-se determinar
a imediata implementação do benefício previdenciário, independentemente de requerimento
expresso (TRF4, QUOAC2002.71.00.050349-7, rel. p/Acórdão Celso Kipper, D.E. 01/10/2007).
Em razão disso, o INSS deverá implementar o benefício concedido no prazo de 30 (trinta) dias,
em consonância com o artigo 497 do CPC. Servirá a presente sentença como OFÍCIO.
Sucumbente, condeno o INSS ao pagamento dos honorários advocatícios na importância de
10% sobre o valor das prestações vencidas até a data desta sentença (súmula 111 do STJ e
art. 85, § 2º, do CPC). Ficando isento do pagamento de custas e despesas processuais (art. 6º
da Lei Estadual 11.608/03). Extingo o processo, com resolução de mérito, nos termos do artigo
487, inciso I, do Código de Processo Civil. Sentença não sujeita a reexame necessário (artigo
496, §3º, inciso I, do Código de Processo Civil), pois o valor da condenação, ainda que apurada
em liquidação, não ultrapassará 1.000 salários-mínimos. Certificado o trânsito em julgado,
arquivem-se os autos. P.I.C.”
Antecipou, ainda, os efeitos da tutela para imediata implantação do benefício/.
O INSS pede, preliminarmente, o recebimento do recursonos efeitos devolutivo e suspensivo.
No mérito, pugna pelareforma da sentença, em síntese, sob os seguintes
fundamentos:ausência de prova material contemporânea ao período rural de 24/02/1973 a
01/01/1978; o tempo de contribuição apurado até a DER é insuficiente; não comprovação dos
requisitos necessários à concessão do benefício pleiteado;os períodos de atividade rural
anteriores a 1991 não podem ser considerados para efeito de carência. É o que diz
expressamente o art. 55, § 2º da Lei n.º 8.213/91; o período de trabalho rural como “diarista” ou
“segurado especial”, posterior à Lei nº 8.213/91, apenas pode ser considerado para fins de
concessão de “aposentadoria por tempo de contribuição” caso tenha havido o recolhimento de
contribuição previdenciária no período, impossibilidade do cômputo do trabalho do menor.
Prequestiona, para efeito de recurso especial ou extraordinário, ofensa a dispositivos de lei
federal e de preceitos constitucionais.
Regularmente processado o feito, os autos subiram a este Eg. Tribunal.
É o Relatório.
Obs: Todas as folhas mencionadas referem-se ao processo extraído em PDF pela ordem
decrescente de páginas.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5078599-13.2023.4.03.9999
RELATOR: Gab. 22 - DES. FED. INÊS VIRGÍNIA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: JACONIAS JOSE DA COSTA
Advogado do(a) APELADO: MARIA IZABEL VAL PRADO - MS14314-A
V O T O
A EXMA.JUÍZA CONVOCADA LUCIANA ORTIZ(RELATORA):):Recebo a apelação interposta
sob a égide do Código de Processo Civil/2015, e, em razão de sua regularidade formal, possível
sua apreciação, nos termos do artigo 1.011 do Código de Processo Civil.
O autor ajuizou a presente ação objetivando o reconhecimento do labor rural exercido no
período de 24/02/1973 a 01/01/1978 com a consequente concessão da aposentadoria por
tempo de contribuição.
Processado o feito, sobreveio a sentença que julgou procedente o pedido e motivou a
interposição de recurso pelo INSS.
Inicialmente, considerando que os recursos atualmente não possuem efeito suspensivo (caput
do artigo 995 do Código de Processo Civil), bem como que a suspensão ou manutenção da
tutela antecipada é matéria intrínseca ao pedido (eis que deve ser apreciada a produção
imediata dos seus efeitos em caso de risco de dano grave, de difícil ou impossível reparação,
bem como deve ser demonstrada a probabilidade de provimento do recurso), deixo para
analisá-la após o mérito.
REGRA GERAL PARA APOSENTADORIA POR TEMPO DE
SERVIÇO/CONTRIBUIÇÃO/PROGRAMADA
Como é sabido, após a EC 20/98, a aposentadoria por tempo de serviço cedeu lugar à
aposentadoria por tempo de contribuição.
Em resumo, antes de 16/12/1998 (data da vigência da Emenda 20), bastava o segurado
comprovar 30 anos de tempo de serviço, se mulher, ou 35 anos, se homem, para concessão da
aposentadoria integral; ou 25 anos, se mulher, e 30 anos, se homem, para concessão da
aposentadoria proporcional.
Após a EC 20/98, o tempo de serviço reconhecido pela lei vigente deve ser considerado como
tempo de contribuição, passando a ser necessário comprovar 35 anos de tempo contributivo, se
homem, e 30 anos, se mulher, além da carência correspondente a 180 contribuições mensais
(art. 25, inciso II, c/c art. 142, ambos da Lei 8.213/1991), deixando de existir a aposentadoria
proporcional. Esta última, no entanto, foi assegurada aos já filiados antes do advento da
Emenda, mediante os seguintes requisitos: 53 anos de idade e 30 anos de tempo de serviço, se
homem; ou 48 anos de idade e 25 anos de tempo de serviço, se mulher; bem como o adicional
de 40% sobre o tempo faltante ao tempo de serviço exigido para a aposentadoria proporcional.
A EC 103/2019, vigente a partir de 13/11/2019, por sua vez, extinguiu a aposentadoria por
tempo de contribuição, estabelecendo a aposentadoria programada, com exigência de novos
requisitos: 65 anos de idade, se homem, e 62 anos, se mulher, observado o tempo mínimo de
contribuição; ou 60 anos de idade, se homem, e 55 anos, se mulher, para os trabalhadores
rurais e segurados especiais (art. 201, § 7º, da Constituição Federal).
Restou assegurado, também, no artigo 3º da nova Emenda Constitucional, o direito à
concessão da aposentadoria por tempo de contribuição para os segurados que tivessem
preenchido as condições em data anterior a sua vigência (13/11/2019), os quais podem pedir
benefício a qualquer tempo (art. 3º da EC), garantindo-se cálculo e reajuste com base na
legislação vigente à época em que foram cumpridos os requisitos (art. 3º, §§ 1º e 2º, da EC).
Além disso, restaram estabelecidas 04 (quatro) regras de transição para àqueles que já eram
filiados ao RGPS e ainda não tinham implementado os requisitos até 13/11/2019, a saber (arts.
15, 16, 17 e 20 da EC 103/2019): a) sistema de pontos, idade e tempo de contribuição; b)tempo
de contribuição e idade mínima; c) tempo de contribuição e pedágio de 50% com fator
previdenciário, sem o requisito da idade; d) tempo de contribuição, pedágio e requisito da idade
mínima.
Otempo de serviço do trabalhador rural poderá ser computado, independentemente do
recolhimento de contribuição, exceto para fins de carência, até o dia 31/10/1991, conforme o
disposto no art. 60, X, do Decreto nº 3.048/99, in verbis:
"Art. 60. Até que lei específica discipline a matéria, são contados como tempo de contribuição,
entre outros:
(...)
X - o tempo de serviço do segurado trabalhador rural anterior à competência novembro de
1991;"
PROVASDO TEMPO DE ATIVIDADE RURAL.
A comprovação do tempo de serviço em atividade rural, seja para fins de concessão de
benefício previdenciário ou para averbação de tempo de serviço, deve ser feita mediante a
apresentação de início de prova material, conforme preceitua o artigo 55, § 3º, da Lei de
Benefícios, não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal, entendimento cristalizado
na Súmula nº 149, do C. STJ: "A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação
da atividade rurícola, para efeito de obtenção do benefício previdenciário".
Entende-se por início de prova material documentos contemporâneos ao período que se busca
comprovar, espontaneamente produzidos no passado.
Considerando a dificuldade do trabalhador rural na obtenção da prova escrita, o Eg. STJ vem
admitindo outros documentos além daqueles previstos no artigo 106, parágrafo único, da Lei nº
8.213/91, cujo rol não é taxativo, mas sim, exemplificativo (AgRg no REsp nº 1362145/SP, 2ª
Turma, Relator Ministro Mauro Campell Marques, DJe 01/04/2013; AgRg no Ag nº
1419422/MG, 6ª Turma, Relatora Ministra Assussete Magalhães, DJe 03/06/2013; AgRg no
AREsp nº 324.476/SE, 2ª Turma, Relator Ministro Humberto Martins, DJe 28/06/2013).
Vale lembrar, que dentre os documentos admitidos pelo Eg. STJ estão aqueles que atestam a
condição de rurícola do cônjuge, cuja qualificação pode estender-se a esposa, desde que a
continuação da atividade rural seja comprovada por robusta prova testemunhal (AgRg no
AREsp nº 272.248/MG, 2ª Turma, Relator Ministro Humberto Martins, DJe 12/04/2013; AgRg no
REsp nº 1342162/CE, 1ª Turma, Relator Ministro Sérgio Kukina, DJe 27/09/2013).
Em reforço, a Súmula nº 6 da TNU: "A certidão de casamento ou outro documento idôneo que
evidencie a condição de trabalhador rural do cônjuge constitui início razoável de prova material
da atividade rurícola".
E atendendo as precárias condições em que se desenvolve o trabalho do lavrador e as
dificuldades na obtenção de prova material do seu labor, quando do julgamento do REsp.
1.321.493/PR, realizado segundo a sistemática de recurso representativo da controvérsia (CPC,
art. 543-C), abrandou-se a exigência da prova admitindo-se início de prova material sobre parte
do lapso temporal pretendido, a ser complementada por idônea prova testemunhal.
Frisa-se, ademais, que a C. 1ª Seção do C. Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do
Recurso Especial n.º 1.348.633/SP, também representativo de controvérsia, admite, inclusive, o
tempo de serviço rural anterior à prova documental, desde que, claro, corroborado por prova
testemunhal idônea. Nesse sentido, precedentes desta E. 7ª Turma (AC 2013.03.99.020629-
8/SP, Des. Fed. Paulo Domingues, DJ 09/04/2018).
Nesse passo, a jurisprudência sedimentou o entendimento de que a prova testemunhal possui
aptidão para ampliar a eficácia probatória da prova material trazida aos autos, sendo
desnecessária a sua contemporaneidade para todo o período de carência que se pretende
comprovar (Recurso Especial Repetitivo 1.348.633/SP, (Rel. Ministro Arnaldo Esteves Lima,
Primeira Seção, DJe 5/12/2014) e Súmula 577 do Eg. STJ.
No que tange à possibilidade do cômputo do labor rural efetuado pelo menor de idade, o próprio
C. STF entende que as normas constitucionais devem ser interpretadas em benefício do menor.
Sobre a questão, a Eg. Sétima Turma desta Corte Regional assentou o entendimento de que,
em virtude das peculiaridades de um Brasil com elevado contingente populacional no meio rural
antes da década de 70, impõe-se admitir,para o cômputo geral do tempo de serviço, o trabalho
rural desenvolvido antes da Constituição de 1967, a partir dos 12 anos de idade e, apartir da
Constituição Federal de 1988, prevalece a idade nela estabelecida.
Por conseguinte, a norma constitucional que proíbe o trabalho remunerado a quem não possua
idade mínima para tal não pode ser estabelecida em seu desfavor, privando o menor do direito
de ver reconhecido o exercício da atividade rural para fins do benefício previdenciário,
especialmente se considerarmos a dura realidade das lides do campo que obrigada ao trabalho
em tenra idade (ARE 1045867, Relator: Ministro Alexandre de Moraes, 03/08/2017, RE
906.259, Rel: Ministro Luiz Fux, in DJe de 21/09/2015).
Nesse sentido os precedentes desta E. 7ª Turma: AC nº 2016.03.99.040416-4/SP, Rel. Des.
Fed. Toru Yamamoto, DJe 13/03/2017; AC 2003.61.25.001445-4, Rel. Des. Fed. Carlos
Delgado, DJ 09/04/2018.
CASO CONCRETO
Segundo a inicial, o autor começou a trabalhar com 12 anos de idade na área rural com seus
pais, na fazenda do senhor Nécio Turra, na cidade de Brasilândia-MS, onde trabalhou de
meados de janeiro de 1973 a 31 de março de 1983, com anotação em CTPS apenas do período
de 02/01/1978 a 31/03/1983, não sendo anotado o período de meados de janeiro de 1973 a
02/01/1978, já que o senhor Jaconias não possuía CTPS devido à sua idade, para anotar tal
período trabalhado, tal período que o INSS não reconheceu como tempo trabalhado.
Para comprovar o labor rural no período de 24/02/1973 (doze anos de idade) a 01/01/1978
(imediatamente anterior ao vínculo rural como campeiro para o mesmo empregador), o autor
apresentou suaCTPS emitida em 07/02/1977 com primeiro vínculo tendo como empregador
Nécio Turra na Fazenda Santo Reis como campeiro, de 02/01/1978 a 31/03/1983 (fl.288/ 309);
recibos de salários e a declaração de fl. 87.
Os documentos colacionados (cópia de sua CTPSindicando seu primeiro registro na data de
02/01/1978 (até 31/03/1983) como trabalhador rural (na propriedade de Nécio Turra) e
declaração firmada por Cleomedes Turra no sentido de que o autor trabalhou na fazenda de
seu pai (Nécio Turra), bem como os recibos constituem início de prova material do labor rural no
período vindicado.
Ademais, há que se registrar que tais elementos probatórios foram corroborados pela prova oral
produzida em juíz e não impugnada pelas partes
As testemunhas Cleomedes Turra e João Turra confirmaram que Jaconias trabalhou na
propriedade de Nécio Turra (pai das testemunhas), desde meados da década de 70, ainda
criança, ao lado do pai, e sem registro em CTPS, tendo sido registrado apenas por ocasião de
sua maioridade.
Consoante anteriormente assentado, a prova testemunhal, desde que idônea, tal como
verificado in casu, autoriza a ampliação da eficácia probatória dos documentos juntados ao
feito, razão pela qual mostra-se possível reconhecer o trabalho rural no período pretendido pela
parte autora.
Emerge dos autos que o autor nasceu e cresceu em família vinculada ao campo, bem como
permaneceu na função rurícola até quando obteve o primeiro registro formal registrado em sua
carteira de trabalho, na mesma propriedade rural.
Por tais razões, possível a averbação de referidoperíodode labor
campesino,independentemente do recolhimento de contribuições previdenciárias, não podendo
tal período ser computado para efeito de carência, nos termos do art. 55, §2º, da Lei
8.213/1991.
Por ocasião daDER em 16/01/2017 o INSS apurou um total de 28 anos, 09 meses e 03 dias de
tempo de contribuição (fl. 318)
Ora, somando-se o tempo incontroverso reconhecido administrativamente com o período
reconhecido neste feito - de 24/02/1973 a 01/01/1978 ou seja, 4 anos, 10 meses e 08 dias,
verifica-seque oautor, na data do requerimento administrativo, nãopossuía o tempode
serviço/contribuição exigido.
Portanto, a sentença deve ser mantida no ponto que reconheceu o labor rural no período de
24/02/1973 a 01/01/1978e, quanto ao pedido de aposentadoria por tempo de contribuição, deve
ser reformada, julgando-se improcedente o pedido.
Diante do parcial provimento do recurso do INSS, com o indeferimento do pedido de
aposentadoriaportempodecontribuição, a hipótese dos autos é de sucumbência recíproca,
motivo pelo qual as despesas processuais devem ser proporcionalmente distribuídas entre as
partes, na forma do artigo 86, do CPC/15, não havendo como se compensar as verbas
honorárias, por se tratar de verbas de titularidade dos advogados e não da parte (artigo 85, §
14, do CPC/15).
Ante o exposto, dou parcial provimento ao recurso para, mantendo o reconhecimento do labor
rural no período de 24/02/1973 a 01/01/1978, julgar improcedente o pedido de concessão de
aposentadoria por tempo de contribuição, revogando a tutela concedida.
É COMO VOTO.
/gabiv/.soliveir..
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO:APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO/PROGRAMADA.
TRABALHO RURAL RECONHECIDO. REQUISITOS NÃO SATISFEITOS.RECURSO
PARCIALMENTE PROVIDO.
1. A aposentadoria por tempo de contribuição integral, antes ou depois da EC/98, necessita da
comprovação de 35 anos de serviço, se homem, e 30 anos, se mulher, além do cumprimento da
carência, nos termos do art. 25, II, da Lei 8213/91. Aos já filiados quando do advento da
mencionada lei, vige a tabela de seu art. 142 (norma de transição), em que, para cada ano de
implementação das condições necessárias à obtenção do benefício, relaciona-se um número de
meses de contribuição inferior aos 180 exigidos pela regra permanente do citado art. 25, II. O
art. 4º, por sua vez, estabeleceu que o tempo de serviço reconhecido pela lei vigente deve ser
considerado como tempo de contribuição, para efeito de aposentadoria no regime geral da
previdência social (art. 55 da Lei 8213/91).
2.A EC 103/2019, vigente a partir de 13/11/2019, por sua vez, extinguiu a aposentadoria por
tempo de contribuição, estabelecendo a aposentadoria programada, com exigência de novos
requisitos: 65 anos de idade, se homem, e 62 anos, se mulher, observado o tempo mínimo de
contribuição; ou 60 anos de idade, se homem, e 55 anos, se mulher, para os trabalhadores
rurais e segurados especiais (art. 201, § 7º, da Constituição Federal).
3. Oartigo 3º da Emenda Constitucional 103/2019 assegura o direito à concessão da
aposentadoria por tempo de contribuição para os segurados que preencheram os requisitos
legaisem data anterior a sua vigência (13/11/2019), os quais podem pedir benefício a qualquer
tempo (art. 3º da EC), garantindo-se cálculo e reajuste com base na legislação vigente à época
em que foram cumpridos os requisitos (art. 3º, §§ 1º e 2º, da EC).
4. Restaram estabelecidas 04 (quatro) regras de transição para àqueles que já eram filiados ao
RGPS e ainda não tinham implementado os requisitos até 13/11/2019, a saber (arts. 15, 16, 17
e 20 da EC 103/2019): a) sistema de pontos, idade e tempo de contribuição; b)tempo de
contribuição e idade mínima; c) tempo de contribuição e pedágio de 50% com fator
previdenciário, sem o requisito da idade; d) tempo de contribuição, pedágio e requisito da idade
mínima.
5. Nos termos do artigo 55, §§2º e 3º, da Lei 8.213/1991, é desnecessário a comprovação do
recolhimento de contribuições previdenciárias pelo segurado especial ou trabalhador rural no
período anterior à vigência da Lei de Benefícios, caso pretenda o cômputo do tempo de serviço
rural, no entanto, tal período não será computado para efeito de carência (TRF3ª Região,
2009.61.05.005277-2/SP, Des. Fed. Paulo Domingues, DJ 09/04/2018; TRF3ª Região,
2007.61.26.001346-4/SP, Des. Fed. Carlos Delgado, DJ 09/04/2018; TRF3ª Região,
2007.61.83.007818-2/SP. Des. Fed. Toru Yamamoto. DJ 09/04/2018; EDcl no AgRg no REsp
1537424/SC, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em
27/10/2015, DJe 05/11/2015; AR 3.650/RS, Rel. Ministro ERICSON MARANHO
(DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ/SP), TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 11/11/2015,
DJe 04/12/2015).
6. Considerando a dificuldade do trabalhador rural na obtenção da prova escrita, o Eg. STJ vem
admitindo outros documentos além daqueles previstos no artigo 106, parágrafo único, da Lei nº
8.213/91, cujo rol não é taxativo, mas sim, exemplificativo, podendo ser admitido início de prova
material sobre parte do lapso temporal pretendido, bem como tempo de serviço rural anterior à
prova documental, desde que complementado por idônea e robusta prova testemunhal. Nesse
passo, a jurisprudência sedimentou o entendimento de que a prova testemunhal possui aptidão
para ampliar a eficácia probatória da prova material trazida aos autos, sendo desnecessária a
sua contemporaneidade para todo o período de carência que se pretende comprovar.
Precedentes.
7. No que tange à possibilidade do cômputo do labor rural efetuado pelo menor de idade, o
próprio C. STF entende que as normas constitucionais devem ser interpretadas em benefício do
menor. Por conseguinte, a norma constitucional que proíbe o trabalho remunerado a quem não
possua idade mínima para tal não pode ser estabelecida em seu desfavor, privando o menor do
direito de ver reconhecido o exercício da atividade rural para fins do benefício previdenciário,
especialmente se considerarmos a dura realidade das lides do campo que obrigada ao trabalho
em tenra idade (ARE 1045867, Relator: Ministro Alexandre de Moraes, 03/08/2017, RE
906.259, Rel: Ministro Luiz Fux, in DJe de 21/09/2015).
8. No caso, diante das robustas provas materiais corroboradas pela prova oral, não há dúvida
em reconhecer a atividade rural exercida pelo autor de 24/02/1973 a 01/01/1978, devendo ser
consideradocomo tempo de contribuição, não podendo tal período ser computado para efeito de
carência, nos termos do art. 55, §2º, da Lei 8.213/1991.
9. Por ocasião daDER em 16/01/2017 o INSS apurou um total de 28 anos, 09 meses e 03 dias
de tempo de contribuição (fl. 318)
10. Somando-se o tempo incontroverso reconhecido administrativamente com o período
reconhecido neste feito - de 24/02/1973 a 01/01/1978 ou seja, 4 anos, 10 meses e 08 dias,
verifica-seque oautor, na data do requerimento administrativo, nãopossuía o tempode
serviço/contribuição exigido.
11. A sentença deve ser mantida no ponto que reconheceu o labor rural no período de
24/02/1973 a 01/01/1978e, quanto ao pedido de aposentadoria por tempo de contribuição, deve
ser reformada, julgando-se improcedente o pedido.
12. Diante do parcial provimento do recurso do INSS, com o indeferimento do pedido de
aposentadoriaportempodecontribuição, a hipótese dos autos é de sucumbência recíproca,
motivo pelo qual as despesas processuais devem ser proporcionalmente distribuídas entre as
partes, na forma do artigo 86, do CPC/15, não havendo como se compensar as verbas
honorárias, por se tratar de verbas de titularidade dos advogados e não da parte (artigo 85, §
14, do CPC/15).
13. Revogados os efeitos da tutela antecipada (recurso representativo de controvérsia - REsp
nº 1.401.560/M. Repetibilidade dos valores recebidos pela parte autora em virtude de tutela de
urgência concedida, a ser vindicada nestes próprios autos, após regular liquidação.
14. Parcialmente provido o recurso do INSS. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sétima Turma, por
unanimidade, decidiu dar parcial provimento ao recurso para, mantendo o reconhecimento do
labor rural no período de 24/02/1973 a 01/01/1978, julgar improcedente o pedido de concessão
de aposentadoria por tempo de contribuição, revogando a tutela concedida, nos termos do
relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
