
9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5004249-27.2023.4.03.6128
RELATOR: Gab. 51 - DES. FED. FONSECA GONÇALVES
APELANTE: VALDOMIRO JOSE DE LIMA
Advogado do(a) APELANTE: GABRIEL CESAR FERREIRA ZAFANI - SP402353-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5004249-27.2023.4.03.6128
RELATOR: Gab. 51 - DES. FED. FONSECA GONÇALVES
APELANTE: VALDOMIRO JOSE DE LIMA
Advogado do(a) APELANTE: GABRIEL CESAR FERREIRA ZAFANI - SP402353-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Cuida-se de ação ajuizada em 09/08/2023, que tem por objeto a concessão de aposentadoria por invalidez previdenciário, o restabelecimento de auxílio-doença ou a obtenção de auxílio-acidente, a partir do dia seguinte à cessação do NB 616.656.893-6 (28/03/2018), com pedido de tutela de urgência.
O feito foi sentenciado em 17/01/2024. O pedido foi julgado improcedente, despercebida incapacidade total apta a gerar benefício.
O autor interpôs apelação. Nas razões desfiadas alega, em síntese, que preencheu os requisitos para o restabelecimento do auxílio-doença, devendo ser submetido a processo de reabilitação profissional. Reitera a gravidade da enfermidade que o assalta e tolhe o exercício de seu labor habitual de serralheiro.
Sem contrarrazões, subiram os autos a esta Corte.
É o relatório.
9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5004249-27.2023.4.03.6128
RELATOR: Gab. 51 - DES. FED. FONSECA GONÇALVES
APELANTE: VALDOMIRO JOSE DE LIMA
Advogado do(a) APELANTE: GABRIEL CESAR FERREIRA ZAFANI - SP402353-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Porque preenche os pressupostos de admissibilidade, conhece-se do recurso.
Pretende o autor, aos influxos deste recurso, o restabelecimento de auxílio-doença acoplado a serviço de reabilitação profissional.
Os artigos 59, 89 e 90, todos da Lei nº 8.213/91 dão regramento à matéria, nos seguintes termos:
“Art. 59. O auxílio-doença será devido ao segurado que, havendo cumprido, quando for o caso, o período de carência exigido nesta lei, ficar incapacitado para o seu trabalho ou atividade habitual por mais de 15 (quinze) dias consecutivos” (grifos apostos).
"Art. 89. A habilitação e a reabilitação profissional e social deverão proporcionar ao beneficiário incapacitado parcial ou totalmente para o trabalho, e às pessoas portadoras de deficiência, os meios para a (re)educação e (re)adaptação profissional e social indicados para participar do mercado de trabalho e do contexto em que vive".
"Art. 90. A prestação de que trata o artigo anterior é devida em caráter obrigatório aos segurados, inclusive aposentados e, na medida da possibilidade do órgão da Previdência Social, aos seus dependentes".
Para o auxílio-doença, eis os requisitos que no caso se exigem: (i) qualidade de segurado; (ii) carência de doze contribuições mensais (artigo 25, I, da Lei nº 8.213/91), salvo quando legalmente inexigida; (iii) incapacidade parcial ou temporária para o exercício de atividade profissional e (iv) surgimento da patologia após a filiação do segurado ao Regime Geral de Previdência Social - RGPS, exceto se, cumprido o período de carência, a incapacidade advier de agravamento ou progressão de doença ou lesão (§1º do preceptivo legal transcrito).
Alega o autor na inicial: "A atividade de serralheiro, nos termos do Perfil Profissiográfico Previdenciário em anexo, consiste em “executar serviços gerais de soldagem, traçagem, corte com ferramentas manuais e equipamentos mecânicos, trabalhando com peças e artefatos de ferro perfilado e chapas. Executando ainda, trabalho com perfis diversos relativos a montagem e instalações industriais, rebarbamentos manuais em esmeril.”, o que em consequência direta e lógica faz com que esteja exposto de modo habitual e permanente ao agente nocivo poeira metálica. A empresa do autor chegou até chegou a mudá-lo de função, para a de Líder, entretanto, nota-se também nos termos do PPP, que este continua trabalhando no setor industrial, liderando operários na execução de serviços de corte e solda, instruindo procedimentos operacionais para soldagem, corte, rebarbamento e preparadores de ferramentas, continuando exposto a agentes nocivos. O autor acreditava que esta exposição aos agentes nocivos como a “poeira metálica” foi que desencadeou seus problemas cardiovasculares e pulmonares crônicos de natureza grave, chegando inclusive a ingressar ação acidentária na justiça estadual, entretanto, o Laudo Médico Pericial naquele feito concluiu que estas doenças não possuem relação com seu trabalho, afastando o nexo causal. Este resultado, fez com que o autor fosse obrigado a propor novamente a ação, porém desta vez nesta especializada, pois afastado o nexo causal naqueles autos (laudo anexo)".
Percebo que o autor, nascido em 29/11/1971 (ID 288735871), esteve em gozo de auxílio-doença previdenciário no período de 07/11/2016 a 27/03/2018 (ID’s 288735937, 288735938 e 288735940).
À busca de concessão/restabelecimento de benefício por incapacidade, ajuizou a presente ação em 09/08/2023. Em suas dobras, aos rigores do devido processo legal, exame médico-pericial foi efetuado em 26/09/2023 (ID 288735964), por especialista em Medicina Intensiva (Nutrição parenteral e enteral), conforme consulta ao sítio eletrônico do Conselho Federal de Medicina (CFM).
Os achados revelam que o autor – serralheiro empregado e com escolaridade correspondente ao ensino fundamental incompleto (7ª série) – sofre de hipertensão arterial sistêmica, dislipidemia, miocardiopatia isquêmica, insuficiência cardíaca e bronquiectasia.
Sobre eles dissertou o senhor Perito: “O autor não apresenta sinais clínicos de descompesação de doença cardiológica estando assintomática no momento do ato pericial. O autor após avaliação clínica criteriosa e associado a documentos analisados não apresenta incapacidade para a atividade laboral” (ID 288735964 – Pág. 15).
Fundado nisso, concluiu: “Não há incapacidade para atividade habitual ou qualquer atividade e sim redução da capacidade” (ID 288735964).
Fixou a data de início da doença em 1º/09/2015, conforme relatório do INSS e a data de início da incapacidade em 27/03/2018 (data da cessação do benefício anterior) (ID 288735964 – Pág. 8). Destacou a viabilidade de reabilitação profissional (ID 288735964 – Pág. 12).
Conforme “Dossiê Médico” do INSS (ID 288735948), a concessão de auxílio-doença ao autor, no período de 07/11/2016 a 27/03/2018, ocorreu por padecer de “cardiopatia isquêmica crônica – CID I25”, fixando a DID em 1º/09/2015 e a DII em 07/11/2016, “baseado em atestado médico” (ID 288735948 – Pág. 1).
O autor juntou aos autos atestados médicos emitidos por especialistas em Cardiologia e Pneumologia (ID’s 288735933 e 288735934), passados em março e abril/2023, relatando estar acometido de patologias cardíacas e respiratórias severas. Sugerem afastamento por auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez.
Aportou nos autos laudo pericial de ação acidentária precedente (ID 288735935), exame realizado em 11/04/2023, a retratar que o autor padece de hipertensão arterial, doença isquêmica crônica do coração, angina pectoris, histórico de infarto agudo do miocárdio, bronquiectasia e hemoptise.
Expôs-se naquele trabalho pericial: “Embora o exame físico do autor não tenha mostrado sinais clínicos exuberantes no presente exame físico, provavelmente por estar sob controle medicamentoso adequado (vide receita em anexo e citados no item 7 desse laudo), a sua história clínica pregressa, com angina, infartos do miocárdio e cirurgias de revascularização do miocárdio e também com lobectomia em pulmão direito, e associado às alterações citadas nos exames complementares apresentados, já se observa uma redução parcial definitiva da sua capacidade funcional, particularmente para atividades que venham a exigir esforços físicos intensos e repetitivos. Nesse sentido, observa-se nos exames complementares mais recentes as seguintes descrições: “alterações difusas da repolarização ventricular, distúrbio da condução intraventricular, comprometimento sistólico segmentar do ventrículo esquerdo, ectasia moderada da raiz da aorta, refluxo mitral discreto”. Como observação, o autor foi informado e orientado sobre o nível elevado de sua pressão arterial quando da realização do exame físico. Dessa forma, pode-se considerar que o autor já apresenta um quadro de incapacidade total definitiva para a sua função original, enquanto serralheiro, dado as limitações cardiovasculares e respiratórias apresentadas e o tipo de trabalho realizado, com provável exigência de esforços manuais constantes. No entanto, caso seja submetido a processo de reabilitação profissional, poderá em princípio e a não ser que sua evolução clínica o impeça, exercer atividade compatível em menor grau de esforço físico e complexidade e, assim, podendo o autor ser classificado como portador de incapacidade parcial definitiva. Entretanto, deve ser considerado que a análise da capacidade funcional no caso do autor, sob o aspecto acidentário, restou prejudicada pela não caracterização do nexo de causalidade entre as patologias em questão e o trabalho do autor. Dessa forma, o autor, SMJ, deverá ser analisado e amparado sob o ponto de vista previdenciário e não acidentário, caso haja necessidade em sua evolução clínica” (ID 288735935 – Págs. 14/15).
O conjunto probatório é iniludível: está-se diante de incapacidade parcial e permanente.
Como visto, o autor requer em seu recurso de apelação, o restabelecimento do auxílio-doença e a condenação do INSS a submetê-lo a processo de reabilitação profissional.
Alertaram os senhores Peritos desta ação e da ação acidentária que não é de afastar possibilidade de reabilitação profissional. Para o autor apenas estão contraindicadas as atividades que exijam maiores esforços físicos.
Tais conclusões, portanto, jovem ainda o autor, conduzem ao deferimento de auxílio-doença, com avaliação de elegibilidade do autor a processo de reabilitação profissional.
Reabilitação profissional, recorde-se, constitui serviço da Previdência Social, previsto no artigo 89 da Lei n.º 8.213/91, de caráter obrigatório (para o segurado e para a Previdência, arts. 90 e 101, II, ambos da Lei nº 8.213/91)). Assoma de relevância ao perseguir a efetivação do direito social ao trabalho e da proteção à pessoa com deficiência, fazendo coro com o princípio da dignidade da pessoa humana e com o do valor social do trabalho, fundamentos, todos, da República Federativa do Brasil (art. 1º, III e IV, da CF).
Não custa refrisar que o autor esteve em gozo de auxílio-doença até 27/03/2018. Portanto, os requisitos qualidade de segurado e carência, que se achavam presentes para o pleito e deferimento do benefício por incapacidade anterior, não se esvaneceram, na consideração de que conserva qualidade de segurado quem se acha no gozo de benefício (artigo 15, I, da Lei nº 8.213/91) e não a perde por ausência de contribuições quem está incapacitado (STJ, AgRg no REsp n. 1.245.217/SP, 5ª. Turma, Rel. o Min. Gilson Dipp, p. de 20/06/2012).
Debaixo dessa moldura, o benefício que se enseja é o auxílio-doença, com verificação da elegibilidade do autor a procedimento de reabilitação profissional, nos moldes do Tema 177 da TNU.
O termo inicial do benefício deve recair em 28/03/2018, dia seguinte à cessação do benefício que o autor estava a receber, uma vez que o conjunto probatório conforta essa retroação; para a cessação do benefício deve ser observado o disposto no artigo 62 e § único, da Lei nº 8.213/91. Deverá ser observada a prescrição quinquenal das parcelas anteriores ao lustro que recua do ajuizamento da ação (09/08/2023).
Ao autor serão pagas, de uma única vez, as prestações vencidas desde a data de início do benefício fixada neste julgado, descontando-se o período em que tenha comprovadamente recebido benefício inacumulável, acrescidas de correção monetária, calculada na forma da Lei nº 6.899/81 e legislação superveniente, aplicadas as diretrizes do Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal.
Juros de mora correm da citação, no percentual de 0,5% (meio por cento) ao mês, até a entrada em vigor da Lei nº 10.406/2002 e, a partir de então, à razão de 1% (um por cento) ao mês (artigo 406 do Código Civil). Desde de julho de 2009, incide a taxa de juros aplicável à remuneração da caderneta de poupança (Repercussão Geral no RE nº 870.947), observada, quanto ao termo final de sua incidência, a tese firmada em Repercussão Geral no RE nº 579.431.
A contar do mês de promulgação da Emenda Constitucional nº 113, de 8/12/2021, a apuração do débito se dará unicamente pela Taxa SELIC, mensalmente e de forma simples, nos termos do disposto em seu artigo 3º, ficando vedada a incidência da Taxa SELIC cumulada com juros e correção monetária.
Invertida a sucumbência, condeno o INSS a arcar com os pagar honorários advocatícios dela decorrentes, arbitrados em 10% (dez por cento) sobre o valor das parcelas vencidas até a data deste acórdão, consoante critérios do artigo 85 do CPC e Súmula n. 111 do Superior Tribunal de Justiça.
Todavia, na fase de execução, o percentual deverá ser reduzido se a condenação ou o proveito econômico ultrapassar 200 (duzentos) salários mínimos (art. 85, § 4º, II, do CPC).
Livre o INSS de custas, na forma do artigo 4º, I, da Lei nº 9.289/96.
Anoto no fecho que, conforme consulta realizada no Cadastro Nacional de Informações Sociais – CNIS, o autor esteve em gozo do auxílio-doença previdenciário NB 647.678.067-4 no período de 11/01/2024 a 09/04/2024.
Considerando a cessação do benefício e uma vez presentes os requisitos do artigo 300 do Código de Processo Civil, a saber, perigo na demora e plausibilidade do direito alegado, CONCEDO AO AUTOR TUTELA DE URGÊNCIA, determinando a implantação do auxílio-doença deferido, em até 45 (quarenta e cinco) dias da intimação desta decisão.
Comunique-se ao INSS, via sistema, o teor do presente julgado, com vistas à implantação do benefício (auxílio doença), por força da tutela de urgência ora deferida.
Diante do exposto, dou provimento à apelação do autor para lhe conceder auxílio-doença a partir de 28/03/2018, cujas parcelas, observada a prescrição quinquenal, serão acrescidas acrescidas de correção monetária e juros de mora, na forma enunciada. Deverá ser analisada a elegibilidade do autor a procedimento de reabilitação profissional. Honorários advocatícios da sucumbência também fixados, tudo nos termos da fundamentação.
É como voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-DOENÇA. INCAPACIDADE PARCIAL E PERMANENTE. REABILITAÇÃO PROFISSIONAL. CESSAÇÃO INDEVIDA.
- Pleito de restabelecimento de auxílio-doença e de reconhecimento de direito a serviço de reabilitação profissional.
- Os artigos 59, 89 e 90, todos da Lei n° 8.213/91, regem a matéria.
- O exame médico-pericial realizado e o conjunto probatório concluíram pela incapacidade parcial e definitiva do autor para sua atividade habitual de serralheiro, deixando claro que remonta a 27/03/2018, data da cessação do auxílio-doença anterior.
- Faz jus, pois, ao auxílio-doença e deve ser verificada elegibilidade a processo de reabilitação profissional.
- Restabelecimento do auxílio-doença devido desde o dia seguinte à sua cessação administrativa (28/03/2018), uma vez que o conjunto probatório conforta essa retroação; para a cessação do benefício deve ser observado o disposto no artigo 62 e § único, da Lei nº 8.213/91. Deverá ser observada a prescrição quinquenal das parcelas anteriores ao lustro que recua do ajuizamento da ação (09/08/2023).
- Ao autor serão pagas, de uma única vez, as prestações vencidas desde a data de início do benefício fixada neste julgado, descontando-se o período em que tenha comprovadamente recebido benefício inacumulável, acrescidas de correção monetária, calculada na forma da Lei nº 6.899/81 e legislação superveniente, aplicadas as diretrizes do Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal.
- Juros de mora correm da citação, no percentual de 0,5% (meio por cento) ao mês, até a entrada em vigor da Lei nº 10.406/2002 e, a partir de então, à razão de 1% (um por cento) ao mês (artigo 406 do Código Civil). Desde de julho de 2009, incide a taxa de juros aplicável à remuneração da caderneta de poupança (Repercussão Geral no RE nº 870.947), observada, quanto ao termo final de sua incidência, a tese firmada em Repercussão Geral no RE nº 579.431.
- A contar do mês de promulgação da Emenda Constitucional nº 113, de 8/12/2021, a apuração do débito se dará unicamente pela Taxa SELIC, mensalmente e de forma simples, nos termos do disposto em seu artigo 3º, ficando vedada a incidência da Taxa SELIC cumulada com juros e correção monetária.
- Invertida a sucumbência, condenado o INSS a pagar honorários advocatícios dela decorrentes, arbitrados em 10% (dez por cento) sobre o valor das parcelas vencidas até a data deste acórdão, consoante critérios do artigo 85 do CPC e Súmula n. 111 do Superior Tribunal de Justiça.
- Todavia, na fase de execução, o percentual deverá ser reduzido se a condenação ou o proveito econômico ultrapassar 200 (duzentos) salários mínimos (art. 85, § 4º, II, do CPC).
- Livre o INSS de custas, na forma do artigo 4º, I, da Lei nº 9.289/96.
- Presentes os requisitos do artigo 300 do Código de Processo Civil, a saber, perigo na demora e plausibilidade do direito alegado, concede-se a tutela de urgência requerida pelo autor.
- Apelação do autor provida. Tutela de urgência deferida.