Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5184247-84.2020.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal AUDREY GASPARINI
Órgão Julgador
8ª Turma
Data do Julgamento
24/11/2020
Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 27/11/2020
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. CERCEAMENTO DE DEFESA. NULIDADE DO LAUDO PERICIAL.
INSUBSISTÊNCIA DA ALEGAÇÃO PROVA ORAL DESNECESSÁRIA. ART. 203, INCISO V, DA
CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA. PESSOA
PORTADORA DE DEFICIÊNCIA. EXIGÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE IMPEDIMENTO DE
LONGO PRAZO. IMPOSSIBILIDADE DE CONCESSÃO DO AMPARO ASSISTENCIAL.
- É notório que a incapacidade laborativa deva ser provada por laudo de perito médico, não se
prestando, a essa finalidade, a produção de prova oral. Matéria preliminar rejeitada.
- O benefício de prestação continuada exige, para a sua concessão, que a parte comprove ter
idade igual ou superior a 65 anos ou deter impedimento de longo prazo de natureza física,
mental, intelectual ou sensorial (art. 20, caput e § 2.º, da Lei n.º 8.742/1993).
- A prova pericial produzida é insuficiente para demonstrar a existência de impedimento de longo
prazo, apta a ensejar a concessão do benefício pleiteado.
- Reconhecimento da improcedência do pedido formulado.
Acórdao
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5184247-84.2020.4.03.9999
RELATOR:Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA
APELANTE: SELMITA MARIA GOMES ATAIDE
Advogado do(a) APELANTE: FELIPE BASTOS DE PAIVA RIBEIRO - SP238063-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5184247-84.2020.4.03.9999
RELATOR:Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA
APELANTE: SELMITA MARIA GOMES ATAIDE
Advogado do(a) APELANTE: FELIPE BASTOS DE PAIVA RIBEIRO - SP238063-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
-R E L A T Ó R I O
Trata-se de demanda objetivando a concessão de benefício assistencial, previsto no art. 203,
inciso V, da Constituição da República.
O juízo a quo julgou improcedente o pedido formulado.
A parte autora apela, pleiteando a reforma da sentença, sustentando, preliminarmente,
necessidade de realização de novo exame pericial e designação de audiência para oitiva de
testemunhas. No mérito, aduz em síntese, o cumprimento dos requisitos legais ao amparo
pretendido.
Sem contrarrazões, subiram os autos.
Parecer do Ministério Público Federal pelo desprovimento do recurso.
É o relatório.
AUDREY GASPARINI
Juíza Federal Convocada
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5184247-84.2020.4.03.9999
RELATOR:Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA
APELANTE: SELMITA MARIA GOMES ATAIDE
Advogado do(a) APELANTE: FELIPE BASTOS DE PAIVA RIBEIRO - SP238063-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
-V O T O
Tempestivo o recurso e presentes os demais requisitos de admissibilidade, passa-se ao exame
da insurgência propriamente dita, considerando-se a matéria objeto de devolução.
Preliminarmente, não procede a alegação de nulidade decorrente do indeferimento do pedido de
realização de novo laudo médico pericial.
É notório que a incapacidade laborativa deva ser provada por laudo de perito médico.
O médico nomeado pelo juízo possui habilitação técnica para proceder ao exame pericial da parte
requerente, de acordo com a legislação em vigência, que regulamenta o exercício da medicina,
não sendo necessária a especialização para o diagnóstico de doenças ou para a realização de
perícias.
Neste processo, o laudo foi produzido por médico de confiança do juízo, que fez a devida
anamnese da pericianda e respondeu a todos os quesitos do juízo e das partes.
Além disso, conforme informou no laudo, foram analisados todos os exames e atestados médicos
apresentados.
A perícia revelou-se suficiente para a formação do convencimento do juízo, revelando, a
insurgência da parte autora, inconformismo insuficiente para gerar dúvidas quanto à integridade
do documento médico produzido.
Eventual contradição entre o laudo pericial e os atestados médicos apresentados pela parte não
pode motivar a nulidade de um ou outro documento médico.
Alega a autora, também, o cerceamento de defesa, visto não ter sido dada oportunidade de
comprovar, por meio de prova testemunhal, a incapacidade laboral da apelante.
O caráter alimentar dos benefícios previdenciários imprime ao processo em que são vindicados a
necessidade de serem facultados todos os meios de prova, não só a documental, a fim de que o
autor possa devidamente comprovar os fatos por ele alegados.
Ocorre que, no presente caso, a prova a ser produzida refere-se a condição de saúde da
requerente, prova técnica que somente poderia ser realizada por profissional da área médica e
habilitado a comparar as limitações causadas pela doença com a atividade habitual da apelante,
não se prestando, a tal fim, a produção de prova oral, pelo que não há que se falar em em
cerceamento de defesa em virtude do indeferimento do pedido de designação de audiência para
oitiva de testemunhas, que, reitere-se, não pode substituir a prova técnica pericial.
Rejeita-se, portanto, as preliminares em questão.
BENEFÍCIO ASSISTENCIAL (PESSOA PORTADORA DE DEFICIÊNCIA)
O benefício de prestação continuada é “a garantia de um salário mínimo de benefício mensal à
pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à
própria manutenção ou de tê-la provida por sua família”, conforme disposto no art. 203, inciso V,
da Constituição Federal, e regulamentado pelos arts. 20 a 21-A, da Lei n.º 8.742/1993.
A legislação exige a presença cumulativa de dois requisitos para a concessão do benefício.
Primeiro, o requerente deve, alternativamente, ter idade igual ou superior a 65 anos (art. 20,
caput, da Lei n.º 8.742/1993) ou ser deficiente, isto é, deter “impedimento de longo prazo de
natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais barreiras,
pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as
demais pessoas (art. 20, § 2.º).
Segundo, o beneficiário deve comprovar situação de miserabilidade, caracterizada pela
inexistência de condições econômicas para prover o próprio sustento ou tê-lo provido por alguém
da família, consoante art. 20, § 3.º., da Lei n.º 8.742/1993 – dispositivo objeto de declaração
parcial de inconstitucionalidade, pela qual firmou o Supremo Tribunal Federal que “sob o ângulo
da regra geral, deve prevalecer o critério fixado pelo legislador no artigo 20, § 3º, da Lei nº
8.742/93”, mas “ante razões excepcionais devidamente comprovadas, é dado ao intérprete do
Direito constatar que a aplicação da lei à situação concreta conduz à inconstitucionalidade,
presente o parâmetro material da Carta da República, qual seja, a miserabilidade, assim
frustrando os princípios observáveis – solidariedade, dignidade, erradicação da pobreza,
assistência aos desemparados” sendo que “em tais casos, pode o Juízo superar a norma legal
sem declará-la inconstitucional, tornando prevalecentes os ditames constitucionais” (STF,
Plenário, RE n.º 567.985, Rel. p/ Acórdão Min. Gilmar Mendes, 2.10.2013).
De se ressaltar, a esse respeito, que a redação original do art. 20, 3.º, da Lei n.º 8.742/1993,
dispunha que “considera-se incapaz de prover a manutenção da pessoa com deficiência ou idosa
a família cuja renda mensal per capita seja inferior a 1/4 (um quarto) do salário-mínimo”.
O dispositivo em questão foi, entretanto, objeto de recentíssimas modificações.
Primeiro, a Lei n.º 13.981, de 24 de março de 2020, alterou o limite da renda mensal per capita
para “1/2 (meio) salário mínimo)”.
Depois, a Lei n.º 13.982, de 2 de abril de 2020, tencionou incluir dois incisos no dispositivo em
epígrafe, fixando o limite anterior de 1/4 do salário mínimo até 31 de dezembro de 2020,
incidindo, a partir de 1.º de janeiro de 2021, o novo teto, de 1/2 salário mínimo – aspecto este que
restou, porém, vetado.
Dessa forma, permanecem, no momento, hígidos tanto o critério da redação original do art. 20,
3.º. da Lei n.º 8.742/1993, quanto a interpretação jurisdicional no sentido de flexibilizá-lo nas
estritas hipóteses em que a miserabilidade possa ser aferida a partir de outros elementos
comprovados nos autos.
DO CASO DOS AUTOS
O laudo médico pericial Id. 126209445, informa que a parte autora é portadora de hipocinesia
moderada do ventrículo esquerdo e coronárias sem obstrução, hipertensão arterial leve,
dislipidemia, hipotireoidismo e arritmia cardíaca.
Consta, no documento, que se trata de patologia passível de acompanhamento e tratamento, as
moléstias avaliadas e o comportamento clínico observado na perícia mostram estabilidade do
quadro com o tratamento e não caracterizam incapacidade total para o trabalho, nem para a vida
independente.
No mais, depreende-se dos autos que a requerente já exerceu atividade laborativa, ausentes
indicativos de que não pode retomá-la ou mesmo se adequar a outro tipo de ocupação
profissional.
O quadro apresentado, portanto, não se ajusta ao de impedimento de longo prazo de natureza
física, mental, intelectual ou sensorial exigido pelo diploma legal a que se fez menção acima.
Considerando-se, por fim, que os requisitos para a concessão do benefício são cumulativos, fica
prejudicada a análise quanto à hipossuficiência econômica.
De rigor, portanto, o indeferimento do benefício, porquanto não comprovado um dos requisitos
indispensáveis à sua concessão.
Condeno a parte autora a pagar custas processuais e honorários de advogado, arbitrados em
10% (dez por cento) sobre o valor atualizado da causa, suspensa, porém, a exigibilidade, na
forma do art. 98, § 3.º, do CPC, por se tratar de beneficiária de gratuidade da justiça.
Posto isso, rejeito a matéria preliminar e nego provimento à apelação.
É o voto.
AUDREY GASPARINI
Juíza Federal Convocada
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. CERCEAMENTO DE DEFESA. NULIDADE DO LAUDO PERICIAL.
INSUBSISTÊNCIA DA ALEGAÇÃO PROVA ORAL DESNECESSÁRIA. ART. 203, INCISO V, DA
CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA. PESSOA
PORTADORA DE DEFICIÊNCIA. EXIGÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE IMPEDIMENTO DE
LONGO PRAZO. IMPOSSIBILIDADE DE CONCESSÃO DO AMPARO ASSISTENCIAL.
- É notório que a incapacidade laborativa deva ser provada por laudo de perito médico, não se
prestando, a essa finalidade, a produção de prova oral. Matéria preliminar rejeitada.
- O benefício de prestação continuada exige, para a sua concessão, que a parte comprove ter
idade igual ou superior a 65 anos ou deter impedimento de longo prazo de natureza física,
mental, intelectual ou sensorial (art. 20, caput e § 2.º, da Lei n.º 8.742/1993).
- A prova pericial produzida é insuficiente para demonstrar a existência de impedimento de longo
prazo, apta a ensejar a concessão do benefício pleiteado.
- Reconhecimento da improcedência do pedido formulado. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Oitava Turma, por
unanimidade, decidiu rejeitar a matéria preliminar e negar provimento à apelação, nos termos do
relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
