8ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5098521-06.2024.4.03.9999
RELATOR: Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: BENEDITA APARECIDA PRESTES DE OLIVEIRA KIMURA
Advogado do(a) APELADO: MARIO TARDELLI DA SILVA NETO - SP291134-N
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5098521-06.2024.4.03.9999
RELATOR: Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: BENEDITA APARECIDA PRESTES DE OLIVEIRA KIMURA
Advogado do(a) APELADO: MARIO TARDELLI DA SILVA NETO - SP291134-N
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Demanda proposta objetivando a concessão de aposentadoria por idade a trabalhador rural, prevista no art. 143 da Lei n.º 8.213/91.
O juízo a quo julgou procedente o pedido formulado, reconhecendo à parte autora o direito ao benefício pretendido, a partir da data do requerimento administrativo (20/2/2018). Deferida a antecipação dos efeitos da tutela.
O INSS apela, requerendo, preliminarmente, o recebimento do recurso em seu duplo efeito. No mérito, pleiteia a reforma da sentença, sustentando, em síntese, o não cumprimento dos requisitos legais necessários à concessão em questão. Subsidiariamente, requer a dilação do prazo para cumprimento da tutela antecipada, a revogação da astreinte ou redução/limitação de seu valor.
Com contrarrazões, subiram os autos.
É o relatório.
THEREZINHA CAZERTA
Desembargadora Federal Relatora
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5098521-06.2024.4.03.9999
RELATOR: Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: BENEDITA APARECIDA PRESTES DE OLIVEIRA KIMURA
Advogado do(a) APELADO: MARIO TARDELLI DA SILVA NETO - SP291134-N
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Tempestivo o recurso e presentes os demais requisitos de admissibilidade, passa-se ao exame da insurgência propriamente dita, considerando-se a matéria objeto de devolução.
APOSENTADORIA POR IDADE (RURAL)
O benefício de aposentadoria por idade a trabalhador rural encontra-se disciplinado nos arts. 39, inciso I; 48, §§ 1.º e 2.º; e 143 da Lei n.º 8.213/91.
Antes mesmo do advento da Lei de Benefícios, a Lei Complementar n.º 11, de 25 de maio de 1971, que instituiu o Programa de Assistência ao Trabalhador Rural, em seu art. 4.º dispunha que a aposentadoria seria devida quando se completassem 65 anos de idade, cabendo a concessão do benefício apenas ao respectivo chefe ou arrimo de família (parágrafo único).
Por sua vez, de acordo com o art. 5.º da Lei Complementar n.º 16/73, o trabalhador rural deveria comprovar a sua atividade pelo menos nos três últimos anos anteriores à data do pedido do benefício.
Referidos dispositivos não foram recepcionados pela Constituição Federal de 1988, que passou para 60 anos, para homens, e 55, para mulheres, a idade mínima exigida para a concessão do benefício (art. 201, § 7.º, inciso II), excluindo a exigência da condição de chefe de família.
Além do requisito etário (60 anos, se homem, e 55 anos, se mulher), o trabalhador rural deve comprovar o exercício de atividade rural, mesmo que descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, em número de meses idêntico à carência do benefício.
O dispositivo legal citado deve ser analisado em consonância com o art. 142 da Lei de Benefícios.
Não se exige do trabalhador rural o cumprimento de carência (art. 26, inciso III), como o dever de verter contribuição por determinado número de meses, senão a comprovação do exercício laboral durante o período respectivo.
Vale dizer: em relação às contribuições previdenciárias, é assente, desde sempre, o entendimento de serem desnecessárias, sendo suficiente a comprovação do efetivo exercício de atividade no meio rural (STJ, REsp n.º 207.425, 5.ª Turma, j. em 21/9/1999, v.u., DJ de 25/10/1999, p. 123, Rel. Ministro Jorge Scartezzini; e STJ, RESP n. 502.817, 5.ª Turma, j. em 14/10/2003, v.u., DJ de 17/11/2003, p. 361, Rel. Ministra Laurita Vaz).
Noutro passo, com relação ao art. 143 da Lei n.º 8.213/91, a regra transitória assegurou aos rurícolas o direito de requerer aposentadoria por idade, no valor de um salário mínimo, durante 15 (quinze) anos, contados da vigência da referida Lei.
Assim, o referido prazo expiraria em 25/7/2006.
Entretanto, em relação ao trabalhador rural enquadrado como segurado empregado ou como segurado contribuinte individual, que presta serviços de natureza rural, em caráter eventual, a uma ou mais empresas, sem relação de emprego, o aludido prazo foi prorrogado por mais 2 (dois) anos, estendendo-se até 25/7/2008, em face do disposto na MP n.º 312/06, convertida na Lei n.º 11.368/06.
Posteriormente, a Medida Provisória n.º 410/07, convertida na Lei n.º 11.718/08, estabeleceu nova prorrogação para o prazo previsto no art. 143 da Lei n.º 8.213/91, ao determinar, em seu art. 2.º, que “Para o trabalhador rural empregado, o prazo previsto no art. 43 da Lei n.º 8.213/91, de 24 de julho de 1991, fica prorrogado até o dia 31 de dezembro de 2010” (art. 2.º) e, em seu art. 3.º, que “Na concessão de aposentadoria por idade do empregado rural , em valor equivalente ao salário mínimo, serão contados para efeito de carência: I - até 31 de dezembro de 2010, a atividade comprovada na forma do art. 143 da Lei n.º 8.213, de 24 de julho de 1991; II - de janeiro de 2011 a dezembro de 2015, cada mês comprovado de emprego, multiplicado por 3 (três), limitado a 12 (doze) meses, dentro do respectivo ano civil; e III - de janeiro de 2016 a dezembro de 2020, cada mês comprovado de emprego, multiplicado por 2 (dois), limitado a 12 (doze) meses dentro do respectivo ano civil”.
É de observar-se que, para os empregados rurais e contribuintes individuais eventuais, a regra permanente do art. 48 da Lei n.º 8.213/91 continua a exigir, para concessão de aposentadoria por idade a rurícolas, apenas a comprovação do efetivo exercício de "atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, por tempo igual ao número de meses de contribuição correspondente à carência do benefício pretendido", consoante §§ 1.º e 2.º do referido dispositivo.
Essa comprovação do labor rural, nos termos dos arts. 48 e 143 da Lei de Benefícios, dar-se-á por meio de prova documental, ainda que incipiente, e, nos termos do art. 55, § 3.º, da retrocitada Lei, corroborada por prova testemunhal.
Acrescente-se que a jurisprudência de longa data vem atentando para a necessidade dessa conjunção de elementos probatórios (início de prova documental e colheita de prova testemunhal), o que resultou até mesmo na edição do verbete n.º 149 da Súmula da Jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, in verbis:
"A prova exclusivamente testemunhal não basta a comprovação da atividade rurícola, para efeito de obtenção do benefício previdenciário".
DO CASO DOS AUTOS
O requisito etário restou satisfeito, pois a parte autora completou a idade mínima em 21/12/2017, devendo fazer prova do exercício de atividade rural por 180 meses.
Para demonstrar as alegações, juntou documentos, entre os quais destacam-se:
- Certidão de casamento da autora e de Kazuo Kimura, celebrado em 24/5/1989, em que consta que o nubente é lavrador;
- Certidão de alistamento militar do esposo da autora, em que consta que era agricultor, datada de 19/6/1973;
- Certidão de nascimento das filhas da autora, registradas em 24/4/1990, 7/1/1995, em que consta que o genitor era lavrador, reemitidos em 18/5/2018;
- Comprovantes de remessa de mercadoria em nome do cônjuge da autora, emitidas em 8/4/1992, 10/4/1992, 15/4/1992, 16/4/1992, 22/4/1992, 8/5/1992, 15/5/1992, 22/5/1992, 29/5/1992, 12/6/1992, 17/6/1992, 28/5/1993, 24/11/1993, 26/11/1993, 3/12/1993, 8/12/1993, 10/12/1993, 15/12/1993, 13/12/1993, 20/12/1993, 22/12/1993, 27/12/1993, 29/12/1993, 30/12/1993, 5/1/1994, 7/1/1994, 10/1/1994, 12/1/1994, 14/1/1994, 19/1/1994;
- Certidão de óbito do cônjuge da autora, falecido em 6/4/2007, constando que era lavrador;
- Requerimento administrativo de aposentadoria por idade apresentado em 20/2/2018 e indeferido em razão de não ter sido comprovado o efetivo exercício de atividade rural.
Em contestação o INSS apresentou extrato do sistema CNIS da autora constando apenas um vínculo como empresário/empregador de 1.º/1/1985 a 31/3/1985 e o recebimento de pensão por morte a partir de 14/11/2007;
Há prova testemunhal produzida nos autos.
A testemunha Ivair Francisco Garcia afirmou que conhece a autora há 40 anos, por causa do trabalho, sempre a via no trabalho, desde 15 anos ela já trabalhava na roça da família. Depois que casou ela continuou trabalhando na roça, o marido dela também trabalhava na roça. Depois que o marido faleceu ela foi morar na casa dela. Eles plantavam batata doce, Inhame, jiló, essas coisas, só a família trabalhava lá. Agora ela trabalha como diarista, citou alguns empregadores. Desde a conhece ela sempre trabalhou com roça.
A testemunha Vera Lucia Lemes da Silva Moraes relatou que conhece a autora há 40 anos, nasceram e se criaram no mesmo bairro. A autora começou a trabalhar desde criança, a conheceu trabalhando na roça com os pais, depois que casou ela e o marido continuaram trabalhando na roça, repolho, morango, algumas diversidades tinham, não era grande a roça, não tinham empregados. Depois que o marido faleceu ela foi trabalhar de diarista, citou alguns empregadores.
Em que pese a prova testemunhal confirme a atividade desempenhada pela parte autora é, por si só, insuficiente para atestar o reconhecimento do tempo de serviço rural alegado, porquanto inexistente indicativo material do trabalho campesino, exigido para a comprovação do labor sem registro, conforme balizas estabelecidas na legislação de regência e parâmetros consolidados na jurisprudência.
Verifica-se que fori juntado reduzido número de documentos referentes ao trabalho no campo do esposo da autora, e em que pese possam ser aproveitados como início de prova do labor rural, observa-se que o cônjuge da apelada faleceu 10 anos antes da apresentação do pedido de aposentadoria por idade rural da autora.
Logo, não há nenhuma prova do labor rural da autora contemporânei e as provas emprestadas que pretende utilizar contam mais de 10 anos.
No mais, o CNIS da autora indica como único vínculo o trabalho como empresária, o que também destoa da narrativa de trabalho rural em regime de economia familiar.
Diante da inexistência de conjunto probatório consistente, representado por início de prova material corroborado por prova testemunhal, impossível reconhecer o exercício de atividade rural pela autora.
Condeno a parte autora a pagar custas processuais e honorários de advogado, arbitrados em 10% (dez por cento) sobre o valor atualizado da causa, suspensa, porém, a exigibilidade, na forma do art. 98, § 3.º, do CPC, por se tratar de beneficiária da gratuidade da justiça.
Posto isso, revogo a tutela antecipada concedida e dou provimento ao recurso de apelação do INSS para julgar improcedente o pedido inicial.
É o voto.
THEREZINHA CAZERTA
Desembargadora Federal Relatora
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. ART. 143 DA LEI N.º 8.213/91. APOSENTADORIA POR IDADE A TRABALHADOR RURAL. EXIGÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DA ATIVIDADE DE RURÍCOLA NO PERÍODO ANTERIOR AO REQUERIMENTO. IMPOSSIBILIDADE DE CONCESSÃO DO BENEFÍCIO.
- Para o reconhecimento do tempo de serviço de trabalhador rural, mister a conjugação do início de prova material com prova testemunhal (Artigo 55, § 3º, da Lei n° 8.213/91, Súmula 149 do STJ e REsp 1.133.863/RN).
ACÓRDÃO
DESEMBARGADORA FEDERAL