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PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
8ª TurmaAGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº 5016118-67.2025.4.03.0000 RELATOR: Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA AGRAVANTE: ANTONIO MARIANO DA SILVA Advogado do(a) AGRAVANTE: BRENO BORGES DE CAMARGO - SP231498-A AGRAVADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I OAgravo de instrumento em que se questiona decisão proferida pelo juízo da 10ª Vara Previdenciária Federal de São Paulo, de conteúdo a seguir reproduzido: No caso tratado nos autos, o autor não cumpriu o determinado no Id. 361973648, ou seja, não demonstrou o prévio esgotamento dos meios disponíveis para confirmar a similaridade e o funcionamento regular da empresa (expedição de notificação pelos correios, com aviso de recebimento, contato com sócios, representantes legais, dentre outros). Sequer comprovou ter diligenciado pessoalmente no endereço indicado, conforme determinado. Conforme já salientado, por quase cinco anos foram determinadas cinco perícias, todas infrutíferas. O aparato judiciário não pode ser utilizado com o intuito de procurar por empresa compatível, cujo ônus é da parte autora. Assim, indefiro o requerimento de expedição de ofícios e concedo o prazo de mais 15 (quinze) dias, improrrogáveis, para o cumprimento integral da decisão anterior, sob pena de indeferimento da prova, conforme previsto no artigo 464, § 1º, III, do Código de Processo Civil. Int. Alega-se, em síntese (destaques constam do original): A negativa judicial à expedição de ofícios às empresas indicadas pelo agravante configura medida desproporcional e manifestamente lesiva ao direito à ampla defesa e ao contraditório, princípios expressamente assegurados pelo artigo 5º, inciso LV, da Constituição Federal. Conforme registrado nos autos, ao longo dos últimos cinco anos, o agravante diligenciou de forma reiterada para a indicação de empresas que se empenhassem atividades semelhantes àquelas desenvolvidas nos vínculos laborais cuja especialidade se pretende comprovar. Ainda assim, apesar de todas as indicações apresentadas, a realização das perícias restou infrutífera, não por inércia ou omissão do agravante, mas, sim, por condutas obstrutivas das próprias empresas indicadas e dos peritos designados, como restou expressamente consignado no despacho de ID 361973648. A situação evidencia que o esgotamento das vias ordinárias — como a mera indicação de empresa, acompanhada de provas de similaridade — não tem se mostrado eficaz para o regular cumprimento da diligência pericial. A insistência do juízo em exigir apenas a repetição dessa conduta, sem permitir a adoção de meios mais eficazes para viabilizar a perícia, como a expedição de ofícios, transforma a diligência em um rito inócuo, meramente formal e fadado ao insucesso, como já demonstrado historicamente nos autos. Não bastasse, o agravante já comprovou documentalmente a regularidade e a compatibilidade das empresas indicadas, inclusive por meio de provas emprestadas, manifestações técnicas e certidões extraídas junto à Receita Federal, com o objetivo de demonstrar a plausibilidade da realização da perícia por similaridade. Ainda assim, o juízo a quo indeferiu a expedição de ofícios, meio este que, além de legítimo, é essencial para obtenção de informações precisas e atualizadas quanto ao efetivo funcionamento das empresas e à disponibilidade para receber a perícia judicial. O indeferimento da expedição dos referidos ofícios, portanto, impede o prosseguimento da instrução probatória em seus moldes adequados e, na prática, inviabiliza a comprovação do direito alegado, configurando evidente cerceamento de defesa. Nesse sentido, é plenamente justificável e absolutamente necessária a expedição de ofícios às empresas indicadas, a fim de obter informações atualizadas sobre o local de funcionamento, descrição das atividades desenvolvidas e eventual disponibilidade para a realização da perícia. Apenas assim será possível que a parte autora indique, de forma eficaz, uma empresa compatível, superando os entraves enfrentados há anos, que têm inviabilizado a instrução processual adequada. Negar tal providência, diante do histórico do processo e dos elementos probatórios já trazidos aos autos, representa conduta judicial que não só ignora os princípios do devido processo legal e da razoabilidade, como também viola frontalmente o direito à prova e o acesso à justiça, ambos assegurados pela Constituição Federal e pelo Código de Processo Civil (art. 369). Dessa forma, deve ser reconhecida a necessidade da expedição dos ofícios requeridos, como meio legítimo e proporcional de permitir a adequada instrução do feito e assegurar ao agravante o exercício pleno de seu direito de defesa. Requer-se “seja deferido o efeito suspensivo em antecipação de tutela para que seja determinada a expedição de ofício as empresas MINERPAL MINERAÇÃO E COMÉRCIO e PORTO SÃO LOURENÇO LTDA, culminando na imediata suspensão da decisão de ID. 366542563, ou, subsidiariamente, que seja deferida a realização de perícia técnica nas referidas empresas”; e ao final seja reforma da a decisão “determinando expedição de ofício as empresas MINERPAL MINERAÇÃO E COMÉRCIO e PORTO SÃO LOURENÇO LTDA, culminando na imediata suspensão da decisão de ID. 366542563, ou, subsidiariamente, que seja deferida a realização de perícia técnica nas referidas empresas”. Foi proferida a seguinte decisão inicial: Vistos. Considerando-se que diante da notícia da interposição do presente agravo de instrumento o juiz a quo determinou “aguardar, no arquivo sobrestado, decisão a ser proferida no recurso noticiado para posterior prosseguimento do feito”, dê-se vista à parte contrária, para resposta (art. 1.019, II, CPC). Encaminhe-se cópia do presente despacho para os autos do processo originário. Intimem-se. São Paulo, data registrada em sistema. Intimado (CPC, art. 1.019, inciso II), o INSS, polo passivo do agravo, deixou de oferecer contraminuta. É o relatório.
Vanessa Mello V O T O De saída, conquanto inexista disposição que autorize o emprego de recurso como o presente em face de provimento jurisdicional que indefere a produção probatória, o Superior Tribunal de Justiça decidiu, no Tema n.º 988, que o “rol do art. 1.015 do CPC é de taxatividade mitigada, por isso admite a interposição de agravo de instrumento quando verificada a urgência decorrente da inutilidade do julgamento da questão no recurso de apelação”. Na situação dos autos, a excepcional urgência que fundamenta o conhecimento do agravo decorre da probabilidade de a instrução probatória ser encerrada sem que se tenha conseguido fazer prova do direito alegado, sendo que a 8.ª Turma desta Corte tem anulado sentenças, em tais contextos processuais, ante o cerceamento do direito à ampla defesa (ApCiv 0003593-61.2013.4.03.6111, Rel. Des. Fed. Newton de Lucca, julgado em 05/08/2020; ApCiv 0032438-11.2015.4.03.9999, Rel. Des. Fed. Luiz de Lima Stefanini, julgado em 23/09/2019; ApCiv 0024288-36.2018.4.03.9999, Rel. Des. Fed. David Dantas, julgado em 28/01/2019). Ainda inicialmente, ressalte-se, como já decidido em outro órgão julgador responsável pela apreciação da matéria previdenciária no Tribunal, que “constitui obrigação legal do empregador fornecer ao empregado perfil profissiográfico previdenciário certificador de atividade nociva quando da rescisão do contrato de trabalho, cabendo à Justiça trabalhista dirimir eventual controvérsia ou omissão no conteúdo do formulário patronal. Aqui, contudo, não se cuida de discussão de relação contratual, senão de reconhecimento da natureza especial de períodos não enquadrados na seara administrativa com supedâneo em apontamentos no Perfil Profissiográfico Previdenciário – PPP, para fins de concessão de aposentadoria especial/por tempo de contribuição, o que confirma a competência da Justiça Federal” (TRF 3ª Região, 9ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5056281-70.2022.4.03.9999, Rel. Desembargador Federal DALDICE MARIA SANTANA DE ALMEIDA, julgado em 19/08/2022, DJEN DATA: 24/08/2022). No mérito propriamente dito, no âmbito previdenciário a prova da especialidade da atividade é realizada, via de regra, conforme prevê a legislação, por meio de documentos, sendo que, excepcionalmente e com a pormenorizada justificativa da parte interessada, é possível se deferir prova pericial, caso seja necessária e se verifique ausentes as hipóteses do art. 464, § 1.º, do Código de Processo Civil, até mesmo por similaridade, conforme já decidiu o Superior Tribunal de Justiça (REsp n. 1.656.508/PR, relator Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 18/4/2017, DJe de 2/5/2017). Mesmo assim, “em regra, em se tratando de empresas em atividade, incumbe à parte autora provar suas alegações, devendo instruir o feito com os documentos necessários (laudo, PPP, formulários). Em relação às empresas inativas, o eventual deferimento de perícia por similaridade depende de que o autor aponte o estabelecimento similar na qual deverá ser feita a perícia, demonstrando ainda que há efetivamente similaridade entre as atividades desempenhadas e no mesmo período e a real impossibilidade de perícia na empresa empregadora, ressaltando que prova pericial precisa ser capaz de retratar fielmente o ambiente de trabalho” (TRF 3ª Região, 7ª Turma, AI - AGRAVO DE INSTRUMENTO - 5003422-38.2021.4.03.0000, Rel. Desembargador Federal INES VIRGINIA PRADO SOARES, julgado em 02/03/2023, DJEN DATA: 09/03/2023). Premissas postas, possível identificar, desde já, segundo a verificação da reprodução dos autos originários sugere e consoante alegado, a possibilidade de assistir razão ao ora agravante. O segurado pleiteou, nos autos subjacentes, a expedição de ofício às empresas Minerpal Mineração e Comércio e Porto São Lourenço Ltda, para que informassem o endereço de funcionamento atualizado e ativo, bem como confirmassem a regularidade de suas atividades operacionais, com vistas à realização da perícia por similaridade. Para justificar seu pedido informou que “Foram realizados contatos telefônicos e tentativas de comunicação por e- mail, conforme dados disponíveis em sites de busca e no próprio site da empresa. Contudo, as tentativas restaram, em sua maioria, infrutíferas. O telefone (13) 3821-5199 se encontra indisponível e não está ativo; o número (44) 99975-0879 não existe e não possui conta vinculada ao WhatsApp; o número (44) 3649-5005 atendeu por meio da funcionária Daniela, a qual se limitou a informar que a filial localizada no Estado de São Paulo está inativa; os números (13) 3872-8102 e (11) 3871-4788 também se mostraram inativos ou não completaram a ligação. Em relação aos e-mails, tanto o contato@minerpal.com.br quanto o minerpal@ig.com.br retornaram como inválidos ou inexistentes”. Veio a decisão agravada, que indeferiu o pedido sob fundamento de que não havia demonstração do prévio esgotamento dos meios disponíveis para confirmar a similaridade e o funcionamento regular das empresas. Todavia, concomitantemente à interposição deste agravo, noticiou em petição nos autos subjacentes que foram contatados advogados com atuação na região de Sete Barras/SP, os quais relataram que a empresa Minerpal se encontra em atividade e é amplamente reconhecida na localidade. Sustentou que “Embora não tenha sido possível a formalização documental dessa informação, tal relato contribui para evidenciar a necessidade de expedição de ofício à empresa, como único meio hábil a confirmar de forma oficial sua atividade e eventual disponibilidade para a realização da perícia técnica.” Trouxe imagens de 2024 obtidas via Google Earth, ostentando a presença de máquinas dragas na Minerpal. Com relação à empresa PORTO SÃO LOURENÇO LTDA, a petição assim esclareceu (destaques constam do original): Como alternativa, o autor compareceu presencialmente à empresa e registrou imagens fotográficas que comprovam a atividade empresarial em andamento, as quais colaciona junto a presente manifestação. Ainda que não tenha avistado as dragas, o laudo técnico pericial (prova emprestada juntada aos autos de ID 364806518) confirma que tais máquinas encontram-se no local de forma eventual, o que reforça a necessidade da prévia ciência da empresa para que as dragas estejam presentes no momento da perícia judicial. Ressalte-se que, conforme informações obtidas por imagens de satélite (Google Maps), as dragas ficam localizadas na área do lago, com acesso restrito. Além disso, anteriormente em ID 364806513, constatou-se que tais máquinas, por vezes, são objeto de locação, e que a própria Minerpal exerce atividade de aluguel. Isso demonstra que, mesmo diante da comprovação de similaridade e atividade empresarial, a realização da perícia segue condicionada a fatores imprevisíveis, como a presença física da draga no momento da inspeção, o que só poderia ser garantido com a intimação prévia da empresa. Diante do exposto, reitera-se o requerimento para que a perícia técnica por similaridade seja realizada nas dependências da empresa Porto São Lourenço Ltda., cuja atividade foi devidamente confirmada por meio de diligência presencial, corroborada por registros fotográficos recentes e demais elementos constantes dos autos. De forma subsidiária, a parte autora indica a empresa Minerpal – Mineração e Comércio Ltda., conforme amplamente fundamentado nos autos, como alternativa viável para a realização da prova pericial, a fim de evitar o prolongamento indevido da instrução processual. Tal petição não foi apreciada, uma vez que o feito se encontra sobrestado até decisão final deste agravo. Com efeito, há de ser considerada a formulação na petição do feito subjacente e nos subsequentes pronunciamentos da parte autora nos autos do processo originário, no sentido de ser necessária a expedição de ofício às empresas para que informem seu “endereço atualizado de funcionamento e de exercício de suas atividades operacionais”, notadamente diante do fato de que “a realização da perícia segue condicionada a fatores imprevisíveis, como a presença física da draga no momento da inspeção, o que só poderia ser garantido com a intimação prévia da empresa”. Do mesmo modo, deve ser levado em conta as dificuldades experimentadas para obter, diretamente, as informações perseguidas, crucial, como salientado na própria deliberação aqui atacada, ao propósito da demanda. E sendo de sabença, outrossim, que o recebimento de uma determinação judicial, via ofício, pela empresa empregadora tem mais força cogente que o pedido da própria parte, tem-se que o aludido pleito comporta deferimento, na esteira de precedente (formado em recurso levado a julgamento por esta magistrada quando à ocasião igualmente convocada no gabinete da eminente Relatora originária deste caso) em que provido recurso para autorizar providência dessa natureza em contexto parecido (TRF 3ª Região, 8ª Turma, AI - AGRAVO DE INSTRUMENTO - 5030662-31.2023.4.03.0000, Rel. Desembargador Federal VANESSA VIEIRA DE MELLO, julgado em 23/04/2024, DJEN DATA: 26/04/2024). Isso tudo levado em conta, cumpre autorizar a expedição de ofício às empresas apontadas, a fim de que prestem informações precisas e atualizadas quanto ao exercício de atividades com utilização de dragas, bem como acerca da disponibilidade para receber a perícia judicial. Ante o exposto, dou provimento ao agravo de instrumento. É o voto.
VANESSA MELLOJuíza Federal ConvocadaE M E N T AEmenta: DIREITO PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. PRODUÇÃO DE PROVA PERICIAL POR SIMILARIDADE. INDEFERIMENTO DE EXPEDIÇÃO DE OFÍCIOS ÀS EMPRESAS INDICADAS. CERCEAMENTO DE DEFESA CONFIGURADO. RECURSO PROVIDO. I. CASO EM EXAME
II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO
III. RAZÕES DE DECIDIR
IV. DISPOSITIVO E TESE
Tese de julgamento:
Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 5º, LV; CPC, arts. 369, 464, § 1º, III, e 1.015; Lei 8.213/1991 (PPP). Jurisprudência relevante citada: STJ, REsp 1.656.508/PR, Rel. Min. Herman Benjamin, Segunda Turma, j. 18/04/2017, DJe 02/05/2017; STJ, Tema 988; TRF3, ApCiv 0003593-61.2013.4.03.6111, Rel. Des. Fed. Newton de Lucca, j. 05/08/2020; TRF3, ApCiv 0032438-11.2015.4.03.9999, Rel. Des. Fed. Luiz de Lima Stefanini, j. 23/09/2019; TRF3, ApCiv 0024288-36.2018.4.03.9999, Rel. Des. Fed. David Dantas, j. 28/01/2019; TRF3, AI 5003422-38.2021.4.03.0000, Rel. Des. Fed. Ines Virgínia Prado Soares, j. 02/03/2023; TRF3, AI 5030662-31.2023.4.03.0000, Rel. Des. Fed. Vanessa Vieira de Mello, j. 23/04/2024. A C Ó R D Ã OVistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Oitava Turma, por unanimidade, deu provimento ao agravo de instrumento, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
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