Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5168249-76.2020.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal GILBERTO RODRIGUES JORDAN
Órgão Julgador
9ª Turma
Data do Julgamento
24/09/2020
Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 30/09/2020
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. ÓBITO EM 2012, NA VIGÊNCIA DA LEI Nº
8.213/91. QUALIDADE DE SEGURADO. VÍNCULO EMPREGATÍCIO AO TEMPO DO
FALECIMENTO. PENSÃO POR MORTE DEFERIDA EXCLUSIVAMENTE AOS FILHOS
HAVIDOS DE OUTRO RELACIONAMENTO. LITISCONSÓRCIO PASSIVO NECESSÁRIO.
UNIÃO ESTÁVEL. AUSÊNCIA DE PROVA DOCUMENTAL. DEPOIMENTOS INCONSISTENTES
E CONTRADITÓRIOS. RELACIONAMENTO AMOROSO SEM O PROPÓSITO DE CONSTITUIR
FAMÍLIA. UNIÃO ESTÁVEL NÃO CARACTERIZADA.
- O óbito de Luiz Mariano da Silva, ocorrido em 26 de outubro de 2012, foi comprovado pela
respectiva Certidão.
- Também restou superado o requisito da qualidade de segurado. Conforme se depreende das
informações constantes nos extratos do CNIS, seu último vínculo empregatício havia sido
estabelecido desde 22 de junho de 2012, cuja cessação, em 26 de outubro de 2012, decorreu de
seu falecimento.
- Na Certidão de Óbito restou consignado que, por ocasião do falecimento, o segurado contava
42 anos de idade, era solteiro e tinha por endereço a Avenida Liberdade, s/nº, em Caconde – SP.
- A ação foi ajuizada na Comarca de Muzambinho – MG e, durante seu trâmite, foi remetida ao
Juízo de Direito da Comarca de Caconde – SP, por força do disposto no art. 50 do CPC/2015.
- Conforme se depreende dos extratos do Sistema Único de Benefício – DATAPREV, na seara
administrativa, o benefício de pensão por morte foi instituído em favor dos filhos menores, havidos
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
de outro relacionamento. Os titulares da pensão foram citados e integraram a lide, em
litisconsórcio passivo necessário e contestaram o pedido.
- A controvérsia cinge-se, portanto, à comprovação da suposta união estável mantida entre a
autora Leonor de Fátima Moreira e o segurado Luiz Mariano da Silva.
- Com o desiderato de comprovar o vínculo marital, a parte autora instruiu os autos com a
Declaração firmada pela enfermeira responsável pelo Posto de Saúde Amadeu de Almeida Lima
de Muzambinho – MG, com data de 09 de novembro de 2012, no sentido de que a parte autora e
Luiz Mariano da Silva estavam relacionados no mesmo prontuário médico, registrado com o
número 475.
- É de se observar, no entanto, que no referido prontuário, enquanto constam diversos
atendimentos à parte autora, realizados entre 2002 e 2012, no tocante ao paciente Luiz Mariano
da Silva observa-se uma única consulta, realizada em 08 de julho de 2011.
- Também consta a DANFE – Documento de Auxílio à Nota Fiscal, emitido pela empresa Tuka
Motos, em nome de Luiz Mariano da Silva, na qual consta seu endereço situado na Rua Operário
João Nadalete, nº 67, em Muzambinho – SP.
- Tal documento não se presta ao fim colimado, por ter sido emitido em 01 de novembro de 2012,
vale dizer, quase uma semana após o sepultamento do segurado.
- Na nota fiscal emitida em 31 de agosto de 2012 consta o endereço da postulante situado na Rua
Domingos Armelin, nº 115, em Muzambinho – SP, tal documento, no entanto, foi preenchido de
forma manual e se encontra rasurado.
- É certo que, de acordo com a Súmula nº 382 do Supremo Tribunal Federal, "a vida em comum
sob o mesmo teto, "more uxório", não é indispensável à caracterização do concubinato", sendo,
ademais, suficiente a prova testemunhal à comprovação da união estável, conforme precedentes:
STJ, 6ª Turma, RESP nº 783697, Rel. Min. Nilson Naves, j. 20/06/2006, DJU 20/06/2006; AR nº
3.905/PE, 3ª Seção, Rel. Min. Campos Marques, DJe 01/08/2013.
- Não obstante, os depoimentos colhidos nos autos se revelaram inconsistentes e contraditórios,
omitindo deliberadamente acerca de ponto relevante à solução da lide. Conquanto as
testemunhas arroladas pela parte autora afirmem que, ao tempo do falecimento, os viam como
casados, admitiram não saber por quanto tempo eles estiveram juntos e não narraram quaisquer
fatos que pudessem caracterizar união estável.
- Dos depoimentos prestados pelas testemunhas arroladas pelos corréus, infere-se que a parte
autora e o falecido segurado mantiveram relacionamento afetivo com contornos de namoro o qual
não preenche os requisitos necessários à caracterização da união estável.
- A relação afetiva que ostente somente contornos de namoro, ainda que duradouro, como no
caso em apreço, em que o relacionamento do casal não atendeu aos requisitos doa rt. 1.723 do
Código Civil, não caracteriza união estável. Precedentes.
- Em razão da sucumbência recursal, os honorários são majorados em 100%, observando-se o
limite máximo de 20% sobre o valor da causa, a teor dos §§ 2º e 11 do art. 85 do CPC/2015,
ficando suspensa sua execução, em razão de o autor ser beneficiário da Justiça Gratuita,
enquanto persistir sua condição de miserabilidade.
- Apelação da parte autora a qual se nega provimento.
Acórdao
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5168249-76.2020.4.03.9999
RELATOR:Gab. 33 - DES. FED. GILBERTO JORDAN
APELANTE: LEONOR DE FATIMA MOREIRA
Advogados do(a) APELANTE: HAROLDO VICENTE MAGALHAES - SP397298-N, JOSIANI
BOCOLI MAGALHAES - SP397304-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, BEATRIZ TAVARES DA
SILVA, LUIZ GUSTAVO DA SILVA, Y. C. T. D. S.
Advogado do(a) APELADO: CLAUCIO RODRIGUES - SP266192-N
Advogado do(a) APELADO: FLAVIANO LAURIA SANTOS - SP195534-N
Advogado do(a) APELADO: FLAVIANO LAURIA SANTOS - SP195534-N
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5168249-76.2020.4.03.9999
RELATOR:Gab. 33 - DES. FED. GILBERTO JORDAN
APELANTE: LEONOR DE FATIMA MOREIRA
Advogados do(a) APELANTE: HAROLDO VICENTE MAGALHAES - SP397298-N, JOSIANI
BOCOLI MAGALHAES - SP397304-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, BEATRIZ TAVARES DA
SILVA, LUIZ GUSTAVO DA SILVA, Y. C. T. D. S.
Advogado do(a) APELADO: CLAUCIO RODRIGUES - SP266192-N
Advogado do(a) APELADO: FLAVIANO LAURIA SANTOS - SP195534-N
Advogado do(a) APELADO: FLAVIANO LAURIA SANTOS - SP195534-N
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de apelação interposta em ação ajuizada por LEONOR DE FÁTIMA MOREIRA em face
do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL – INSS e de Y.C.T.D.S. (incapaz), Luiz
Gustavo da Silva e Beatriz Tavares da Silva, objetivando o benefício de pensão por morte, em
decorrência do falecimento de Luiz Mariano da Silva, ocorrido em 26 de outubro de 2012.
A r. sentença recorrida julgou improcedente o pedido, ao reputar não comprovada a dependência
econômica da autora em relação ao falecido segurado (id 124799722 – p. 1/11).
Em suas razões recursais, pugna a parte autora pela reforma da sentença, com o decreto de
procedência do pleito. Aduz ter logrado comprovar os requisitos necessários à concessão do
benefício. Argui que as provas documentais carreadas aos autos, as quais foram corroboradas
pelos depoimentos das testemunhas, estariam a caracterizar a união estável mantida com o
segurado até a data de seu falecimento, o que implica no quadro de dependência econômica, na
condição de companheira (id 124799727 – p. 1/8).
Contrarrazões (id 124799733 – p. 1/3).
Devidamente processado o recurso, subiram os autos a esta instância para decisão.
Manifestação do Ministério Público Federal em que opina pelo não provimento do recurso
interposto, mantendo-se a r. sentença (id 132159234 – p. 1/4).
É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5168249-76.2020.4.03.9999
RELATOR:Gab. 33 - DES. FED. GILBERTO JORDAN
APELANTE: LEONOR DE FATIMA MOREIRA
Advogados do(a) APELANTE: HAROLDO VICENTE MAGALHAES - SP397298-N, JOSIANI
BOCOLI MAGALHAES - SP397304-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, BEATRIZ TAVARES DA
SILVA, LUIZ GUSTAVO DA SILVA, Y. C. T. D. S.
Advogado do(a) APELADO: CLAUCIO RODRIGUES - SP266192-N
Advogado do(a) APELADO: FLAVIANO LAURIA SANTOS - SP195534-N
Advogado do(a) APELADO: FLAVIANO LAURIA SANTOS - SP195534-N
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Tempestivo o recurso e respeitados os demais pressupostos de admissibilidade recursais, passo
ao exame da matéria objeto de devolução.
DA PENSÃO POR MORTE
O primeiro diploma legal brasileiro a prever um benefício contra as consequências da morte foi a
Constituição Federal de 1946, em seu art. 157, XVI. Após, sobreveio a Lei n.º 3.807, de 26 de
agosto de 1960 (Lei Orgânica da Previdência Social), que estabelecia como requisito para a
concessão da pensão o recolhimento de pelo menos 12 (doze) contribuições mensais e fixava o
valor a ser recebido em uma parcela familiar de 50% (cinquenta por cento) do valor da
aposentadoria que o segurado percebia ou daquela a que teria direito, e tantas parcelas iguais,
cada uma, a 10% (dez por cento) por segurados, até o máximo de 5 (cinco).
A Constituição Federal de 1967 e sua Emenda Constitucional n.º 1/69, também disciplinaram o
benefício de pensão por morte, sem alterar, no entanto, a sua essência.
A atual Carta Magna estabeleceu em seu art. 201, V, que:
"A previdência social será organizada sob a forma de regime geral, de caráter contributivo e de
filiação obrigatória, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial, e
atenderá, nos termos da lei a:
V - pensão por morte do segurado, homem ou mulher, ao cônjuge ou companheiro e
dependentes, observado o disposto no § 2º."
A Lei n.º 8.213, de 24 de julho de 1991 e seu Decreto Regulamentar n.º 3048, de 06 de maio de
1999, disciplinaram em seus arts. 74 a 79 e 105 a 115, respectivamente, o benefício de pensão
por morte, que é aquele concedido aos dependentes do segurado, em atividade ou aposentado,
em decorrência de seu falecimento ou da declaração judicial de sua morte presumida.
Depreende-se do conceito acima mencionado que para a concessão da pensão por morte é
necessário o preenchimento de dois requisitos: ostentar o falecido a qualidade de segurado da
Previdência Social, na data do óbito e possuir dependentes incluídos no rol do art. 16 da
supracitada lei.
A qualidade de segurado, segundo Wladimir Novaes Martinez, é a:
"denominação legal indicativa da condição jurídica de filiado, inscrito ou genericamente atendido
pela previdência social. Quer dizer o estado do assegurado, cujos riscos estão
previdenciariamente cobertos." (Curso de Direito Previdenciário. Tomo II - Previdência Social.
São Paulo: LTr, 1998, p. 594).
Mantém a qualidade de segurado aquele que, mesmo sem recolher as contribuições, conserve
todos os direitos perante a Previdência Social, durante um período variável, a que a doutrina
denominou "período de graça", conforme o tipo de segurado e a sua situação, nos termos do art.
15 da Lei de Benefícios, a saber:
"Mantém a qualidade de segurado, independentemente de contribuições:
I - sem limite de prazo, quem está em gozo de benefício;
II - até 12 (doze) meses após a cessação das contribuições, o segurado que deixar de exercer
atividade remunerada abrangida pela Previdência Social ou estiver suspenso ou licenciado sem
remuneração;
III - até 12 (doze) meses após cessar a segregação, o segurado acometido de doença de
segregação compulsória;
IV - até 12 (doze) meses após o livramento, o segurado retido ou recluso;
V - até 3 (três) meses após o licenciamento, o segurado incorporado às Forças Armadas para
prestar serviço militar;
VI - até (seis) meses após a cessação das contribuições, o segurado facultativo."
É de se observar, ainda, que o § 1º do supracitado artigo prorroga por 24 (vinte e quatro) meses
tal período de graça aos que contribuíram por mais de 120 (cento e vinte) meses.
Em ambas as situações, restando comprovado o desemprego do segurado perante o órgão do
Ministério do Trabalho ou da Previdência Social, os períodos serão acrescidos de mais 12 (doze)
meses. A comprovação do desemprego pode se dar por qualquer forma, até mesmo oral, ou pela
percepção de seguro-desemprego.
Convém esclarecer que, conforme disposição inserta no § 4º do art. 15 da Lei nº 8.213/91, c.c. o
art. 14 do Decreto Regulamentar nº 3.048/99, com a nova redação dada pelo Decreto nº
4.032/01, a perda da qualidade de segurado ocorrerá no 16º dia do segundo mês seguinte ao
término do prazo fixado no art. 30, II, da Lei nº 8.212/91 para recolhimento da contribuição,
acarretando, consequentemente, a caducidade de todos os direitos previdenciários.
Conforme já referido, a condição de dependentes é verificada com amparo no rol estabelecido
pelo art. 16 da Lei de Benefícios, segundo o qual possuem dependência econômica presumida o
cônjuge, o(a) companheiro(a) e o filho menor de 21 (vinte e um) anos, não emancipado ou
inválido. Também ostentam a condição de dependente do segurado, desde que comprovada a
dependência econômica, os pais e o irmão não emancipado, de qualquer condição, menor de 21
(vinte e um) anos ou inválido.
De acordo com o § 2º do supramencionado artigo, o enteado e o menor tutelado são equiparados
aos filhos mediante declaração do segurado e desde que comprovem a dependência econômica.
DO CASO DOS AUTOS
O óbito de Luiz Mariano da Silva, ocorrido em 26 de outubro de 2012, foi comprovado pela
respectiva Certidão (id 32188750 – p. 1).
Também restou superado o requisito da qualidade de segurado. Conforme se depreende das
informações constantes nos extratos do CNIS, seu último vínculo empregatício havia sido
estabelecido desde 22 de junho de 2012, cuja cessação, em 26 de outubro de 2012, decorreu de
seu falecimento (id 124799587 – p. 9).
Das anotações lançadas em sua CTPS, constata-se que, por ocasião do falecimento, Luiz
Mariano da Silva estava a laborar na empresa Pavidez Engenharia Ltda., sediada no município de
Muzambinho – MG (id 124799583 – p. 1).
Na Certidão de Óbito restou consignado que, por ocasião do falecimento, o segurado contava 42
anos de idade, era solteiro e tinha por endereço a Avenida Liberdade, s/nº, em Caconde – SP.
A ação foi ajuizada na Comarca de Muzambinho – MG e, durante seu trâmite, foi remetida ao
Juízo de Direito da Comarca de Caconde – SP, por força do disposto no art. 50 do CPC/2015.
Conforme se depreende dos extratos do Sistema Único de Benefício – DATAPREV, na seara
administrativa, o benefício de pensão por morte foi instituído em favor dos filhos menores, havidos
de outro relacionamento (id 124799606 – p. 6/7).
Os titulares da pensão foram citados e integraram a lide, em litisconsórcio passivo necessário e
contestaram o pedido.
A controvérsia cinge-se, portanto, à comprovação da suposta união estável mantida entre a
autora Leonor de Fátima Moreira e o segurado Luiz Mariano da Silva.
Com o desiderato de comprovar o vínculo marital, a parte autora instruiu os autos com a
Declaração firmada pela enfermeira responsável pelo Posto de Saúde Amadeu de Almeida Lima
de Muzambinho – MG, com data de 09 de novembro de 2012, no sentido de que a parte autora e
Luiz Mariano da Silva estavam relacionados no mesmo prontuário médico, registrado com o
número 475.
É de se observar, no entanto, que no referido prontuário, enquanto constam diversos
atendimentos à parte autora, realizados entre 2002 e 2012, no tocante ao paciente Luiz Mariano
da Silva observa-se uma única consulta, realizada em 08 de julho de 2011 (id 124799583 – p. 3 e
124799589 – p. 3/10).
Também consta a DANFE – Documento de Auxílio à Nota Fiscal, emitido pela empresa Tuka
Motos, em nome de Luiz Mariano da Silva, na qual consta seu endereço situado na Rua Operário
João Nadalete, nº 67, em Muzambinho – SP (id 124799583 – p. 4/5).
Tal documento não se presta ao fim colimado, por ter sido emitido em 01 de novembro de 2012,
vale dizer, quase uma semana após seu sepultamento.
Na nota fiscal emitida em 31 de agosto de 2012 consta o endereço da postulante situado na Rua
Domingos Armelin, nº 115, em Muzambinho – SP, tal documento, no entanto, foi preenchido de
forma manual e se encontra rasurado (id 124799583 – p. 6).
É certo que, de acordo com a Súmula nº 382 do Supremo Tribunal Federal, "a vida em comum
sob o mesmo teto, "more uxório", não é indispensável à caracterização do concubinato", sendo,
ademais, suficiente a prova testemunhal à comprovação da união estável, conforme precedentes:
STJ, 6ª Turma, RESP nº 783697, Rel. Min. Nilson Naves, j. 20/06/2006, DJU 20/06/2006; AR nº
3.905/PE, 3ª Seção, Rel. Min. Campos Marques, DJe 01/08/2013.
Em audiência realizada em 26 de julho de 2018, foram inquiridas pelo Juízo de Direito da
Comarca de Muzambinho – MG as testemunhas arroladas pela parte autora (Odete Aparecida de
Macedo Francisco, Sandra Mara Diniz Magalhães e Marli Aparecida Bueno de Lelis), além de
uma testemunha arrolada pelos corréus (Claudinei Sebastião de Araújo).
A testemunhas Odete de Macedo Francisco afirmou conhecer a parte autora, desde quando
moravam no Bairro Alto do Anjo, em Muzambinho – MG. Cerca de seis meses anteriormente ao
falecimento do segurado, eles se tornaram vizinhos da depoente. Até então, a conhecia apenas
de vista. Admitiu não saber por quanto tempo eles teriam estado juntos. Esclareceu que a esse
tempo, a parte autora se encontrava separada de seu marido, com quem teve dois filhos. Afirmou
que, no período em que foram vizinhas, a parte autora ficava um período na casa onde morava
com o companheiro e, em outro período, quando ele se encontrava trabalhando, ela voltava para
a casa onde ficavam os filhos.
A depoente Sandra Mara Diniz Magalhães afirmou conhecer a parte autora do posto de saúde
onde trabalha, esclarecendo que o atendimento era feito por prontuário familiar, recordando-se
que, em determinado ocasião, o segurado se valeu do prontuário de Leonor, a fim de receber
atendimento médico. Esclareceu que não havia qualquer formalidade para a constatação de que
as pessoas integravam o mesmo núcleo familiar, bastando a apresentação dos documentos
pessoais e a declaração de que eram conviventes.
A testemunha Marli Aparecida Bueno asseverou conhecer a parte autora há cerca de vinte anos e
ser moradora vizinha da residência de seus filhos, situada na Rua João Nadalete. Esclareceu que
o casal morou, inicialmente, nesta residência e, na sequência, estavam morando em outro imóvel
reservado apenas para os dois. Admitiu não saber por quanto tempo eles ficaram juntos, porque o
segurado trabalhava na empresa Pavidez e, frequentemente, se ausentava e demorava a
retornar. Nestes períodos, a parte autora retornava para a casa onde moravam os filhos.
O depoente Claudinei Sebastião Caruzo, no entanto, esclareceu que a parte autora era apenas
namorada do segurado, já que ela mantinha sua família constituída no município de Caconde –
SP. Esclareceu ter conhecido o segurado porque mantinham a mesma profissão (pedreiro), tendo
vivenciado que, por ocasião de seu falecimento, Luiz Mariano estava a laborar na empresa
Pavidez. Quanto ao relacionamento mantido com a parte autora, esclareceu que o segurado lhe
houvera confidenciado que ela era apenas sua namorada, dentre várias mulheres com quem ele
se relacionava. Que Luiz se ausentava por vários dias, enquanto trabalhava e, quando retornava
ficava na casa alugada por ele e localizada na Rua Domingos Armelim. Asseverou que, quando
ele estava em Muzambinho, visitava-o frequentemente e nunca se deparou com a parte autora no
local. Esclareceu que conhecia Luiz Mariano, desde o ano 2000 e que, ao tempo do falecimento,
ele ainda estava vinculado à sua família de Caconde – SP, tanto que, mensalmente ia visitar os
filhos.
Em audiência realizada em 11 de outubro de 2018, foram inquiridos pelo Juízo de Direito da
Comarca de Caconde – SP as testemunhas André Moreira de Souza e Luiz Carlos Firmino, cujos
depoimentos transcrevo na sequência.
O depoente André Luiz Moreira afirmou que o segurado inicialmente foi casado com Ana, com
quem teve dois filhos. Após a separação, Luiz Mariano manteve alguns rápidos relacionamentos,
inclusive com a ex-esposa. Os encontros afetivos com Ana eram frequentes e aconteciam quando
ele visitava os filhos. Afirmou que o falecido morava sozinho. Nunca presenciou Luiz Mariano
acompanhado da autora Leonor e desconhece a existência de namoro entre eles. Destacou que
as informações sobre questões pessoais do falecido eram repassadas por ele próprio nas
oportunidades em que conversavam.
A testemunha Luiz Carlos Firmino informou que a autora é ex-esposa de seu primo e o Luiz
Mariano seu amigo. Indagado, confirmou que Leonor e o falecido namoraram. Porém, registrou
que, concomitantemente, Luiz Mariano mantinha outros relacionamentos amorosos. Na época ele
saía com a autora e com a ex-mulher de um policial. Destacou que o Luiz Mariano mantinha
relacionamento concomitantemente com várias mulheres. Eram frequentes as visitas do falecido
aos filhos. Revelou que o desejo do amigo era reatar a união com Ana, tanto é que, durante as
visitas aos filhos, ele e a ex-companheira tinham um rápido relacionamento.
Dentro deste quadro, além da ausência de prova material a indicar a suposta união estável, os
depoimentos das testemunhas arroladas pela parte autora se relevaram frágeis e contraditórios.
Além disso, restaram demovidos pelos depoimentos das testemunhas arroladas pelos corréus,
dos quais se extrai que o relacionamento mantido entre a autora e o de cujus tinha característica
de namoro.
A relação afetiva que ostente somente contornos de namoro, ainda que duradouro, em que o
relacionamento do casal não atende aos requisitos doa rt. 1.723 do Código Civil, não caracteriza
união estável.
Confira-se o seguinte julgado proferido por esta Egrégia Corte:
“PREVIDENCIÁRIO. PRELIMINAR DE CERCEAMENTO DE DEFESA REJEITADA. PENSÃO
POR MORTE. L. 8.213/91, ART 74. COMPANHEIRA. DEPENDÊNCIA ECONÔMICA. UNIÃO
ESTÁVEL NÃO COMPROVADA. APELAÇÃO DO INSS PROVIDA. TUTELA REVOGADA.
DESNECESSIDADE DE DEVOLUÇÃO DE VALORES.
(...)
- A ocorrência do evento morte, em 01/02/2012, encontra-se devidamente comprovada pela
certidão de óbito.
- A qualidade de segurado do falecido na data do passamento restou demonstrada, nos termos
do artigo 15, II, da Lei n. 8.213/91.
- Todavia, no caso, da análise dos documentos apresentados não se infere a existência da
aludida união estável.
- Não há um único documento contemporâneo à época do passamento que estabeleça um liame
entre a autora e o falecido, conforme pretendido.
- As declarações acostadas aos autos, noticiando a existência de união estável, equivalem a
meros depoimentos reduzidos a termo, sem o crivo do contraditório, conforme entendimento já
pacificado no âmbito desta Corte.
- As fotografias nada permitem concluir quanto às pessoas, períodos e circunstâncias nela
retratados.
- A ficha cadastral do CNIS, em nome da autora e do falecido, a despeito de apontar domicílio em
comum, não lhe aproveita, pois se trata de documento particular, passível de alteração a qualquer
momento.
- Há que se diferenciar relacionamento amoroso de união estável. Não é crível que um casal que
desfrute de vida em comum, com animus de tornar a relação definitiva, não tivesse um único
comprovante de domicílio em comum, de encargos financeiros compartilhados, de registro em
associação de qualquer natureza, ou de outros documentos arrolados no artigo 22 do Decreto
3.048/99.
- À mingua do início de prova material, a prova testemunhal, não se mostrou suficientemente
robusta a comprovar a união estável.
- Apelação do INSS provida.
- Sentença reformada. Tutela revogada. Dispensada a devolução de valores.”
(ApCiv 0017685-44.2018.4.03.9999, DESEMBARGADOR FEDERAL DAVID DANTAS, TRF3 -
OITAVA TURMA, e-DJF3 Judicial 1 DATA:24/09/2018.)
Acerca dos requisitos necessários à caracterização da união estável, assim já se pronunciou o
Colendo Superior Tribunal de Justiça:
"CIVIL. PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. UNIÃO ESTÁVEL. RECONHECIMENTO.
DEMONSTRAÇÃO. AUSÊNCIA.
1. A configuração da união estável é ditada pela confluência dos parâmetros expressamente
declinados, hoje, no art. 1.723 do CC-02, que tem elementos objetivos descritos na norma:
convivência pública, sua continuidade e razoável duração, e um elemento subjetivo: o desejo de
constituição de família.
2. A congruência de todos os fatores objetivos descritos na norma não levam, necessariamente, à
conclusão sobre a existência de união estável, mas tão somente informam a existência de um
relacionamento entre as partes.
3. O desejo de constituir uma família, por seu turno, é essencial para a caracterização da união
estável, pois distingue um relacionamento, dando-lhe a marca da união estável, ante outros
tantos que, embora públicos, duradouros e não raras vezes com prole, não têm o escopo de
serem família, porque assim não quiseram seus atores principais.
4. A demanda declaratória de união estável não pode prescindir de um diligente perscrutar sobre
o "querer constituir família", desejo anímico, que deve ser nutrido por ambos os conviventes, e a
falta dessa conclusão impede o reconhecimento da união estável.
Recurso provido".
(STJ, 3ª Turma, RESP nº 1263015/RN, Relatora Ministra Nancy Andrighi, DJe 26/06/2012, p.
155).
Nesse contexto, ausente a comprovação da união estável, se torna inviável o acolhimento do
pedido, porquanto não preenchido o requisito da dependência econômica da autora em relação
ao falecido segurado, sendo de rigor a manutenção do decreto de improcedência do pleito.
Em razão da sucumbência recursal, majoro em 100 % os honorários fixados em sentença,
observando-se o limite máximo de 20% sobre o valor da causa, a teor dos §§ 2º e 11 do art. 85
do CPC/2015, ficando suspensa sua execução, em razão de ser beneficiário da Justiça Gratuita,
enquanto persistir sua condição de miserabilidade.
DISPOSITIVO
Ante o exposto, nego provimento à apelação da parte autora e, em razão da sucumbência
recursal, majoro em 100% os honorários fixados em sentença, observando-se o limite máximo de
20% sobre o valor da causa, a teor dos §§ 2º e 11 do art. 85 do CPC/2015.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. ÓBITO EM 2012, NA VIGÊNCIA DA LEI Nº
8.213/91. QUALIDADE DE SEGURADO. VÍNCULO EMPREGATÍCIO AO TEMPO DO
FALECIMENTO. PENSÃO POR MORTE DEFERIDA EXCLUSIVAMENTE AOS FILHOS
HAVIDOS DE OUTRO RELACIONAMENTO. LITISCONSÓRCIO PASSIVO NECESSÁRIO.
UNIÃO ESTÁVEL. AUSÊNCIA DE PROVA DOCUMENTAL. DEPOIMENTOS INCONSISTENTES
E CONTRADITÓRIOS. RELACIONAMENTO AMOROSO SEM O PROPÓSITO DE CONSTITUIR
FAMÍLIA. UNIÃO ESTÁVEL NÃO CARACTERIZADA.
- O óbito de Luiz Mariano da Silva, ocorrido em 26 de outubro de 2012, foi comprovado pela
respectiva Certidão.
- Também restou superado o requisito da qualidade de segurado. Conforme se depreende das
informações constantes nos extratos do CNIS, seu último vínculo empregatício havia sido
estabelecido desde 22 de junho de 2012, cuja cessação, em 26 de outubro de 2012, decorreu de
seu falecimento.
- Na Certidão de Óbito restou consignado que, por ocasião do falecimento, o segurado contava
42 anos de idade, era solteiro e tinha por endereço a Avenida Liberdade, s/nº, em Caconde – SP.
- A ação foi ajuizada na Comarca de Muzambinho – MG e, durante seu trâmite, foi remetida ao
Juízo de Direito da Comarca de Caconde – SP, por força do disposto no art. 50 do CPC/2015.
- Conforme se depreende dos extratos do Sistema Único de Benefício – DATAPREV, na seara
administrativa, o benefício de pensão por morte foi instituído em favor dos filhos menores, havidos
de outro relacionamento. Os titulares da pensão foram citados e integraram a lide, em
litisconsórcio passivo necessário e contestaram o pedido.
- A controvérsia cinge-se, portanto, à comprovação da suposta união estável mantida entre a
autora Leonor de Fátima Moreira e o segurado Luiz Mariano da Silva.
- Com o desiderato de comprovar o vínculo marital, a parte autora instruiu os autos com a
Declaração firmada pela enfermeira responsável pelo Posto de Saúde Amadeu de Almeida Lima
de Muzambinho – MG, com data de 09 de novembro de 2012, no sentido de que a parte autora e
Luiz Mariano da Silva estavam relacionados no mesmo prontuário médico, registrado com o
número 475.
- É de se observar, no entanto, que no referido prontuário, enquanto constam diversos
atendimentos à parte autora, realizados entre 2002 e 2012, no tocante ao paciente Luiz Mariano
da Silva observa-se uma única consulta, realizada em 08 de julho de 2011.
- Também consta a DANFE – Documento de Auxílio à Nota Fiscal, emitido pela empresa Tuka
Motos, em nome de Luiz Mariano da Silva, na qual consta seu endereço situado na Rua Operário
João Nadalete, nº 67, em Muzambinho – SP.
- Tal documento não se presta ao fim colimado, por ter sido emitido em 01 de novembro de 2012,
vale dizer, quase uma semana após o sepultamento do segurado.
- Na nota fiscal emitida em 31 de agosto de 2012 consta o endereço da postulante situado na Rua
Domingos Armelin, nº 115, em Muzambinho – SP, tal documento, no entanto, foi preenchido de
forma manual e se encontra rasurado.
- É certo que, de acordo com a Súmula nº 382 do Supremo Tribunal Federal, "a vida em comum
sob o mesmo teto, "more uxório", não é indispensável à caracterização do concubinato", sendo,
ademais, suficiente a prova testemunhal à comprovação da união estável, conforme precedentes:
STJ, 6ª Turma, RESP nº 783697, Rel. Min. Nilson Naves, j. 20/06/2006, DJU 20/06/2006; AR nº
3.905/PE, 3ª Seção, Rel. Min. Campos Marques, DJe 01/08/2013.
- Não obstante, os depoimentos colhidos nos autos se revelaram inconsistentes e contraditórios,
omitindo deliberadamente acerca de ponto relevante à solução da lide. Conquanto as
testemunhas arroladas pela parte autora afirmem que, ao tempo do falecimento, os viam como
casados, admitiram não saber por quanto tempo eles estiveram juntos e não narraram quaisquer
fatos que pudessem caracterizar união estável.
- Dos depoimentos prestados pelas testemunhas arroladas pelos corréus, infere-se que a parte
autora e o falecido segurado mantiveram relacionamento afetivo com contornos de namoro o qual
não preenche os requisitos necessários à caracterização da união estável.
- A relação afetiva que ostente somente contornos de namoro, ainda que duradouro, como no
caso em apreço, em que o relacionamento do casal não atendeu aos requisitos doa rt. 1.723 do
Código Civil, não caracteriza união estável. Precedentes.
- Em razão da sucumbência recursal, os honorários são majorados em 100%, observando-se o
limite máximo de 20% sobre o valor da causa, a teor dos §§ 2º e 11 do art. 85 do CPC/2015,
ficando suspensa sua execução, em razão de o autor ser beneficiário da Justiça Gratuita,
enquanto persistir sua condição de miserabilidade.
- Apelação da parte autora a qual se nega provimento.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Nona Turma, por
unanimidade, decidiu negar provimento à apelação da parte autora, nos termos do relatório e voto
que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA