D.E. Publicado em 13/12/2017 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Nona Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, conhecer da apelação da parte autora e lhe dar provimento, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Juiz Federal Convocado
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0003990-53.2015.4.03.6143/SP
RELATÓRIO
O Exmo. Sr. Juiz Federal Convocado Rodrigo Zacharias: Trata-se de ação de conhecimento proposta em face do INSS, na qual a parte autora pleiteia o reconhecimento de tempo de serviço especial, com vistas à concessão de aposentadoria especial ou por tempo de contribuição.
A r. sentença julgou parcialmente procedente o pedido para: (i) reconhecer o exercício da atividade especial no tocante ao período de 1º/3/1978 a 30/4/1981; (ii) fixar a sucumbência recíproca; (iii) antecipar os efeitos da tutela jurídica.
Inconformada, a parte autora interpôs apelação, na qual exora a procedência integral dos pedidos arrolados na inicial.
Sem contrarrazões, os autos vieram a este Egrégio Tribunal.
É o relatório.
VOTO
O Exmo. Sr. Juiz Federal Convocado Rodrigo Zacharias: Conheço do recurso, em razão da satisfação de seus requisitos.
Passo à análise das questões trazidas a julgamento.
Do enquadramento de período especial
Editado em 3 de setembro de 2003, o Decreto n. 4.827 alterou o artigo 70 do Regulamento da Previdência Social, aprovado pelo Decreto n. 3.048, de 6 de maio de 1999, o qual passou a ter a seguinte redação:
Por conseguinte, o tempo de trabalho sob condições especiais poderá ser convertido em comum, observada a legislação aplicada à época na qual o trabalho foi prestado. Além disso, os trabalhadores assim enquadrados poderão fazer a conversão dos anos trabalhados a "qualquer tempo", independentemente do preenchimento dos requisitos necessários à concessão da aposentadoria.
Ademais, em razão do novo regramento, encontram-se superadas a limitação temporal, prevista no artigo 28 da Lei n. 9.711/98, e qualquer alegação quanto à impossibilidade de enquadramento e conversão dos lapsos anteriores à vigência da Lei n. 6.887/80.
Nesse sentido, reporto-me à jurisprudência firmada pelo Colendo STJ:
Cumpre observar que antes da entrada em vigor do Decreto n. 2.172, de 5 de março de 1997, regulamentador da Lei n. 9.032/95, de 28 de abril de 1995, não se exigia (exceto em algumas hipóteses) a apresentação de laudo técnico para a comprovação do tempo de serviço especial, pois bastava o formulário preenchido pelo empregador (SB40 ou DSS8030) para atestar a existência das condições prejudiciais.
Nesse particular, ressalto que vinha adotando a posição de que o enquadramento pela categoria profissional no rol dos Decretos n. 53.831/64 e 83.080/79 também era possível até a entrada em vigor do referido Decreto n. 2.172/97. Entretanto, verifico que a jurisprudência majoritária, a qual passo a adotar, tanto nesta Corte quanto no e. STJ, assentou-se no sentido de que o enquadramento apenas pela categoria profissional é possível tão-somente até 28/4/1995 (Lei n. 9.032/95). Nesse sentido: STJ, AgInt no AREsp 894.266/SP, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 06/10/2016, DJe 17/10/2016.
Contudo, tem-se que, para a demonstração do exercício de atividade especial cujo agente agressivo seja o ruído, sempre houve a necessidade da apresentação de laudo pericial, independentemente da época de prestação do serviço.
Nesse contexto, a exposição superior a 80 decibéis era considerada atividade insalubre até a edição do Decreto n. 2.172/97, que majorou o nível para 90 decibéis. Isso porque os Decretos n. 83.080/79 e n. 53.831/64 vigoraram concomitantemente até o advento do Decreto n. 2.172/97.
Com a edição do Decreto n. 4.882, de 18/11/2003, o limite mínimo de ruído para reconhecimento da atividade especial foi reduzido para 85 decibéis (art. 2º do Decreto n. 4.882/2003, que deu nova redação aos itens 2.0.1, 3.0.1 e 4.0.0 do Anexo IV do Regulamento da Previdência Social, aprovado pelo Decreto n. 3.048/99).
Quanto a esse ponto, à míngua de expressa previsão legal, não há como conferir efeito retroativo à norma regulamentadora que reduziu o limite de exposição para 85 dB(A) a partir de novembro de 2003.
Sobre essa questão, o STJ, ao apreciar o Recurso Especial n. 1.398.260, sob o regime do art. 543-C do CPC, consolidou entendimento acerca da inviabilidade da aplicação retroativa do decreto que reduziu o limite de ruído no ambiente de trabalho (de 90 para 85 dB) para configuração do tempo de serviço especial (julgamento em 14/05/2014).
Com a edição da Medida Provisória n. 1.729/98 (convertida na Lei n. 9.732/98), foi inserida na legislação previdenciária a exigência de informação, no laudo técnico de condições ambientais do trabalho, quanto à utilização do Equipamento de Proteção Individual (EPI).
Desde então, com base na informação sobre a eficácia do EPI, a autarquia deixou de promover o enquadramento especial das atividades desenvolvidas posteriormente a 3/12/1998.
Sobre a questão, entretanto, o C. Supremo Tribunal Federal, ao apreciar o ARE n. 664.335, em regime de repercussão geral, decidiu que: (i) se o EPI for realmente capaz de neutralizar a nocividade, não haverá respaldo ao enquadramento especial; (ii) havendo, no caso concreto, divergência ou dúvida sobre a real eficácia do EPI para descaracterizar completamente a nocividade, deve-se optar pelo reconhecimento da especialidade; (iii) na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites de tolerância, a utilização do EPI não afasta a nocividade do agente.
Quanto a esses aspectos, sublinhe-se o fato de que o campo "EPI Eficaz (S/N)" constante no Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP) é preenchido pelo empregador considerando-se, tão somente, se houve ou não atenuação dos fatores de risco, consoante determinam as respectivas instruções de preenchimento previstas nas normas regulamentares. Vale dizer: essa informação não se refere à real eficácia do EPI para descaracterizar a nocividade do agente.
In casu, no tocante aos intervalos controversos, de 1º/3/1978 a 30/4/1981, de 19/5/1981 a 26/5/1981, de 20/11/1981 a 9/5/1982, de 1º/12/1982 a 18/5/1983, de 22/12/1983 a 15/5/1984 e de 25/9/1984 a 10/4/1985, constam perfis profissiográficos e formulário, os quais apontam a exposição, habitual e permanente, a níveis de ruído superiores aos limites de tolerância estabelecidos na norma em comento (códigos 1.1.6 do anexo do Decreto n. 53.831/64 e 1.1.5 do anexo do Decreto n. 83.080/79).
Especificamente aos lapsos de 27/5/1981 a 19/11/1981, de 10/5/1982 a 30/11/1982, de 19/5/1983 a 21/12/1983, de 16/5/1984 a 24/9/1984, de 18/1/1988 a 31/12/1988 e de 1º/1/1989 a 7/2/2006, a parte autora logrou demonstrar, via PPP e laudo pericial, a exposição habitual e permanente a agentes químicos deletérios (tais como: níquel, molibdênio, ferro, cromo, óleo diesel, graxas minerais, óleos lubrificantes e óleo para motor, etc.); situação que possibilita a contagem diferenciada desses períodos, conforme os códigos 1.2.5, 1.2.9 e 1.2.11 do anexo do Decreto n. 53.831/64; 1.2.5, 1.2.10 e 1.2.11 do anexo do Decreto n. 83.080/79; os itens 1.0.3, 1.0.10, 1.0.16 e 1.0.17 dos anexos dos Decretos n. 2.172/97 e 3.048/99 e aqueles descritos no Anexo 13, da NR-15 (Portaria n. 3.214/78).
Com efeito, os riscos ocupacionais gerados pela exposição a hidrocarbonetos não requerem análise quantitativa e sim qualitativa.
Nesse diapasão, é a iterativa jurisprudência das cortes federais do País (g.n.):
Insta registrar, ainda, que em recente decisão exarada nos autos n. 5004737-08.2012.4.04.7108, a Turma Nacional de Uniformização dos Juizados Especiais Federais (TNU) firmou a tese de que a análise do caráter degradante do ofício em decorrência da exposição a agentes químicos previstos no Anexo XIII da NR 15, como os hidrocarbonetos aromáticos, é qualitativa e não se sujeita a limites de tolerância, independentemente do período de prestação do labor (cf. notícia veiculada em 27/7/2016 extraída do site do Conselho da Justiça Federal - http://www.cjf.jus.br/cjf/noticias/2016-1/julho/analise-da-exposicao-de-trabalhador-a-agentes-quimicos-deve-ser-qualitativa-e-nao-sujeita-a-limites-de-tolerancia).
Ademais, diante das circunstâncias da prestação laboral descritas no PPP, concluo que, na hipótese, o EPI não é realmente capaz de neutralizar a nocividade dos agentes.
Por outro vértice, não subsiste a tese da extemporaneidade do laudo técnico.
Nesse aspecto, não se pode estabelecer rigor absoluto à exigência de contemporaneidade do laudo técnico em relação às condições laborais do autor, sob pena de inviabilização da comprovação do próprio direito material pretendido.
Nesse sentido:
Outrossim, a falta de contemporaneidade das aferições do ruído não tem o condão de afastá-los, pois elas identificam as condições ambientais de trabalho e registram os valores da pressão sonora. É certo, ainda, que em razão dos muitos avanços tecnológicos e da intensa fiscalização trabalhista, as circunstâncias em que o labor era prestado não se agravariam com o decorrer do tempo.
Insta ressaltar que já houve enquadramento administrativo dos intervalos de 11/11/1985 a 19/12/1986 e de 25/5/1987 a 14/11/1987.
Destarte, os lapsos acima citados devem ser considerados como especiais.
Dessa forma, a parte autora conta 25 (vinte e cinco) anos de trabalho em atividade especial. Por conseguinte, viável a concessão do benefício em aposentadoria especial, por se fazer presente o requisito temporal insculpido no artigo 57 da Lei n. 8.213/91 (conforme planilha anexa).
Passo à análise dos consectários
O termo inicial do benefício é a data do requerimento na via administrativa (DER 7/2/2006), pois toda documentação relativa aos períodos discutidos nestes autos foi submetida à apreciação autárquica durante a tramitação administrativa.
Na hipótese, não há de se falar em prescrição quinquenal, isso porque entre o término do procedimento administrativo, cujo último andamento noticiado data de 13/12/2012 (fl. 150-verso) e o ajuizamento desta ação - 9/11/2015 - não decorreu prazo superior a cinco anos.
Quanto à correção monetária, esta deve ser aplicada nos termos da Lei n. 6.899/81 e da legislação superveniente, bem como do Manual de Orientação de Procedimentos para os cálculos na Justiça Federal, aplicando-se o IPCA-E (Repercussão Geral no RE n. 870.947, em 20/9/2017, Rel. Min. Luiz Fux).
Com relação aos juros moratórios, estes são fixados em 0,5% (meio por cento) ao mês, contados da citação, por força dos artigos 1.062 do CC/1916 e 240 do CPC/2015, até a vigência do CC/2002 (11/1/2003), quando esse percentual foi elevado a 1% (um por cento) ao mês, nos termos dos artigos 406 do CC/2002 e 161, § 1º, do CTN, devendo, a partir de julho de 2009, ser utilizada a taxa de juro aplicável à remuneração da caderneta de poupança, consoante alterações introduzidas no art. 1º-F da Lei n. 9.494/97 pelo art. 5º da Lei n. 11.960/09 (Repercussão Geral no RE n. 870.947, em 20/9/2017, Rel. Min. Luiz Fux).
Em relação às parcelas vencidas antes da citação, os juros são devidos desde então de forma global e, para as vencidas depois da citação, a partir dos respectivos vencimentos, de forma decrescente, observada, quanto ao termo final de sua incidência, a tese firmada em Repercussão Geral no RE n. 579.431, em 19/4/2017, Rel. Min. Marco Aurélio.
Invertida a sucumbência, condeno o INSS a pagar honorários de advogado, arbitrados em 12% (doze por cento) sobre a condenação, computando-se o valor das parcelas vencidas até a data deste acórdão, consoante critérios do artigo 85, §§ 1º, 2º, 3º, I, e 11, do Novo CPC e súmula nº 111 do Superior Tribunal de Justiça, já computada a majoração decorrente da fase recursal.
Todavia, na fase de execução, o percentual deverá ser reduzido, se o caso, na hipótese do artigo 85, § 4º, II, do mesmo código, se a condenação ou o proveito econômico ultrapassar duzentos salários mínimos.
Referentemente às custas processuais, no Estado de São Paulo, delas está isenta a Autarquia Previdenciária, a teor do disposto nas Leis Federais n. 6.032/74, 8.620/93 e 9.289/96, bem como nas Leis Estaduais n. 4.952/85 e 11.608/03. Contudo, tal isenção não exime a Autarquia Previdenciária do pagamento das custas e despesas processuais em restituição à parte autora, por força da sucumbência, na hipótese de pagamento prévio.
Possíveis valores recebidos na esfera administrativa deverão ser compensados por ocasião da liquidação do julgado.
Diante do exposto, conheço da apelação da parte autora e lhe dou provimento para, nos termos da fundamentação, (i) também enquadrar como especiais os interstícios de 19/5/1981 a 26/5/1981, de 27/5/1981 a 19/11/1981, de 20/11/1981 a 10/4/1985, de 18/1/1988 a 31/12/1988 e de 1º/1/1989 a 7/2/2006; (ii) determinar a concessão do benefício de aposentadoria especial desde a DER 7/2/2006; (iii) discriminar, por consequência, os critérios de incidência dos consectários.
É o voto.
Juiz Federal Convocado
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