D.E. Publicado em 12/07/2018 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Décima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargadora Federal
Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
Signatário (a): | MARIA LUCIA LENCASTRE URSAIA:10063 |
Nº de Série do Certificado: | 1B1C8410F7039C36 |
Data e Hora: | 03/07/2018 18:08:32 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0010597-52.2018.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
A Senhora Desembargadora Federal LUCIA URSAIA (Relatora): Proposta ação de conhecimento de natureza previdenciária, objetivando a condenação do INSS ao pagamento da aposentadoria por idade híbrida, mediante o reconhecimento de atividade rural e urbana, sobreveio sentença que reconheceu a atividade urbana no período de 06/1967 a 12/1977, a atividade urbana lançada no CNIS, mas julgou improcedência do pedido de concessão de aposentadoria, pela não comprovação do período de carência de 15 anos, condenando a parte autora ao pagamento das verbas de sucumbência, ressalvada a gratuidade da justiça.
Inconformada, a parte autora interpôs recurso de apelação, requerendo a reforma da sentença para que seja reconhecida a atividade rural nos termos da inicial, com a concessão do benefício requerido. Alega que o período reconhecido na sentença, embora não declarado, totaliza 14 anos e 7 meses, e que somadas as contribuições posteriores totaliza mais de 15 anos, suficientes à aposentação.
Sem as contrarrazões, os autos foram remetidos a este Tribunal.
É o relatório.
VOTO
A Senhora Desembargadora Federal LUCIA URSAIA (Relatora): Inicialmente, recebo o recurso de apelação da parte autora, haja vista que tempestivo, nos termos do artigo 1.010 do novo Código de Processo Civil.
Objetiva a parte autora, a condenação do INSS ao pagamento do benefício de aposentadoria por idade, alegando que trabalhou na atividade rural em regime de economia familiar de 1962 até 1976, bem como na atividade urbana em período posterior, totalizando 15 anos de contribuição.
O artigo 48 da Lei nº 8.213/91, com a redação dada pela Lei n.º 11.718 de 20/06/2008, dispõe que:
A referida alteração legislativa possibilitou aos segurados que tenham completado 65 (sessenta e cinco) anos, se homem, e 60 (sessenta) anos, se mulher, a soma de períodos de trabalho rural efetivamente comprovados, mesmo que anteriores a novembro de 1991, a períodos de contribuição sob outras categorias de segurado, para fins de concessão do benefício de aposentadoria por idade.
Nesse sentido, já decidiu esta Turma:
Assim, para a concessão do benefício de aposentadoria por idade na forma do artigo 48, §3º, da Lei n.º 8.213/91, são requisitos: o implemento do requisito etário acima especificado e o cumprimento da carência, a qual pode ser comprovada mediante o reconhecimento do exercício de atividade rural e considerando períodos de contribuição do segurado sob outras categorias.
Tendo a autora nascido em 19/06/1952, implementou o requisito idade (60 anos) em 19/06/2012, sendo necessária a comprovação da carência 180 (cento e oitenta) contribuições mensais, nos termos do artigo 25, inciso II, da Lei nº 8.213/91.
Nos termos do artigo 55, §3º, da Lei nº 8.213/91 e do entendimento jurisprudencial consubstanciado na Sumula 149 do Superior Tribunal de Justiça, para a comprovação do trabalho rural é necessária a apresentação ao menos de início de prova material, corroborável por prova testemunhal. Ressalta-se que o início de prova material, exigido pelo §3º do artigo 55 da Lei n.º 8.213/91, não significa que o segurado deverá demonstrar mês a mês, ano a ano, por intermédio de documentos, o exercício de atividade na condição de rurícola, pois isto importaria em se exigir que todo o período de trabalho fosse comprovado documentalmente, sendo de nenhuma utilidade à prova testemunhal para demonstração do labor rural.
Início de prova material, conforme a própria expressão o diz, não indica completude, mas sim começo de prova, princípio de prova, elemento indicativo que permita o reconhecimento da situação jurídica questionada, desde que associada a outros dados probatórios.
No que toca ao argumento da produção de provas, assiste razão à parte autora, uma vez que o início de prova material, inserto no art. 55, §3º, da Lei nº 8.213/91, foi produzido com a juntada aos autos das declarações de rendimentos em nome de (Antônio Sabadin Filho), pai da requerente, relativas aos exercícios de 71/72, 72/73, 73/74, 74/75, 75/76 (fls. 23/55), nas quais ele se encontra qualificado como "agricultor", notas fiscais de produtor rural emitidas em 1972/1975, também em nome do pai da demandante (fls. 57/61), carnes de contribuições ao fundo de assistência ao trabalhador rural referentes aos anos de 1975/1976, também em nome de Antônio Sabadini Filho, pai da autora (fls. 62/63), em obediência ao art. 106, deste mesmo diploma legal.
O Superior Tribunal de Justiça, sensível à realidade social do trabalhador rural, pacificou o entendimento de ser extensível aos filhos a qualificação de trabalhador rural apresentada pelo genitor, constante de documento, conforme revela a ementa de julgado:
Por outro lado, as testemunhas ouvidas complementaram plenamente esse início de prova documental ao asseverarem, perante o juízo de primeiro grau, sob o crivo do contraditório, da ampla defesa e do devido processo legal, sem contraditas, que a autora exerceu atividade rural no período declinado na petição inicial, inclusive, que após o casamento, a autora e o marido continuaram trabalhando em regime de economia familiar (mídia digital - fl. 168).
A Primeira Seção do STJ, no julgamento do REsp 1.304.479/SP submetido à sistemática dos recursos repetitivos de relatoria do Ministro Herman Benjamim, julgado em 10/10/2012 (Dj de19/12/2012), consignou que o trabalho urbano de um dos membros do grupo familiar não descaracteriza, por si só, os demais integrantes como segurados especiais, devendo ser averiguada, a dispensabilidade do trabalho rural para a subsistência do grupo familiar.
Contudo, é de se ressaltar que a autora nasceu em 19/06/1952 e pleiteia o reconhecimento de atividade rural, em regime de economia familiar, a partir do ano de 1962, quando contava com 10 (dez) anos de idade. Em que pese sabermos que o trabalhador que nasce na zona rural inicia muito cedo na atividade laborativa, principalmente aqueles que trabalham em regime de economia familiar, a prova dos autos não autoriza o reconhecimento da atividade rural a partir dessa data. Ademais, a Constituição Federal de 1946, art. 157, inciso IX, proibia qualquer trabalho aos menores de 14 (quatorze) anos.
Posteriormente, com a Constituição Federal de 1967, proibiu-se o trabalho de menores de 12 (doze) anos, nos termos do inciso X do artigo 165, de forma que se deve tomar como parâmetro para a admissão do trabalho rural tal limitação.
Portanto, a norma acima não pode ser flexibilizada a ponto de ser reconhecida atividade laboral à criança, pois se o autor quando ainda contava com 10 (dez) anos de idade, acompanhando seus pais na execução de algumas tarefas, isto não o caracteriza como trabalhador rural ou empregado, tampouco caracteriza trabalho rural em regime de economia familiar, pois seria banalização do comando constitucional. Assim, devemos tomar como base a idade de 12 (doze) anos, início da adolescência, pois caso contrário se estaria a reconhecer judicialmente a exploração do trabalho infantil.
Além disso, não é factível que um menor de 12 (doze) anos, ainda na infância, portanto, possua vigor físico suficiente para o exercício pleno da atividade rural, sendo sua participação nas lides rurais de caráter limitado, secundário, não se podendo conceber o seu eventual auxílio como período de efetivo labor rural.
Sendo assim, é possível o cômputo do tempo de atividade rural do menor para fins previdenciários quando comprovado o trabalho, a partir dos seus 12 anos, em regime de economia familiar, pois, conforme a jurisprudência consolidada, a legislação, ao vedar o trabalho infantil do menor de 14 anos, salvo na condição de aprendiz, teve por escopo a sua proteção, tendo sido estabelecida a proibição em benefício do menor e não em seu prejuízo, aplicando-se o princípio da universalidade da cobertura da Seguridade Social.
Assim, nos termos do artigo 55, § 3.º, da Lei n.º 8.213/91, e em estrita observância à Súmula 149 do Superior Tribunal de Justiça, deve ser reconhecido o exercício de trabalho rural, sem registro em CTPS, no período compreendido entre 19/01/1964 a 31/12/1976.
Verifica-se, ainda, que a autora esteve filiada à Previdência Social, na qualidade de empregada, de 01/03/2005 a 16/04/2009, e como contribuinte individual, em atividades urbanas, de 01/08/2017 a 30/04/2018, conforme as anotações da CTPS e os dados do Cadastro Nacional de Informações Sociais - CNIS (fls. 82/84, 93/96, 174/179).
Entendo que o período em que a parte autora esteve em gozo do benefício previdenciário de auxílio-doença, devidamente intercalado com períodos de atividade, deve ser contado tanto para fins de tempo de serviço e como carência, eis que o § 5º do art. 29 da Lei 8.213/91, assim dispõe:
Por sua vez, o art. 55, inciso II, da Lei 8.213/91, dispõe que:
Nesse sentido é a jurisprudência do Egrégio Superior Tribunal de Justiça (REsp 1422.081/SC, Relator Ministro Mauro Campbell, 2ª Turma, DJe: 02/05/2014).
No mesmo sentido, é a orientação da Décima Turma desta E. Corte:
Verifica-se que a autora esteve em gozo de auxílio-doença no período de 06/07/2007 a 21/09/2007 (fls. 82/84). Razão pela qual o período intercalado em que a parte autora recebeu benefício de auxílio-doença, no período anterior ao requerimento administrativo, deve ser adotado para compor o período de carência exigido para o benefício requerido (tabela do art. 142 da Lei 8.213/1991).
Computando-se o tempo de atividade rural sem registro em CTPS, ora reconhecido, de 19/01/1964 a 31/12/1976, com tempo em que parte autora esteve filiada à Previdência Social, como empregada, de 01/03/2005 a 16/04/2009, bem como o período de gozo de auxílio-doença de 06/07/2007 a 21/09/2007, perfazem mais de 180 contribuições, portanto, restou comprovada a carência de 180 (cento e oitenta) contribuições prevista no art. 142 da Lei 8.213/91, referente à data do implemento da idade de 60 anos em 2012.
Portanto, atendidos os requisitos legais, a parte autora faz jus à aposentadoria por idade, nos termos dos § 3º do artigo 48 da Lei nº 8.213/91.
Havendo prova do requerimento administrativo, o termo inicial do benefício deve ser fixado nessa data, nos termos do art. 49, "b", da Lei nº 8.213/91 (fls. 16 - 29/05/2017).
Os juros de mora e a correção monetária deverão observar o decidido pelo Plenário do C. STF, no julgamento do RE 870.947/SE, em Repercussão Geral, em 20/09/2017, Rel. Min. Luiz Fux, adotando-se no tocante à fixação dos juros moratórios o índice de remuneração da caderneta de poupança, nos termos do art. 1º-F da Lei nº 9.494/97 com a redação dada pela Lei nº 11.960/09, e quanto à atualização monetária, o Índice de Preços ao Consumidor Amplo Especial (IPCA-E).
Honorários advocatícios a cargo do INSS, fixados nos termos do artigo 85, § 3º, do Novo Código de Processo Civil/2015 e da Súmula 111 do STJ.
Por fim, a autarquia previdenciária está isenta do pagamento de custas e emolumentos, nos termos do art. 4º, inciso I, da Lei nº 9.289/96, do art. 24-A da Lei nº 9.028/95 (dispositivo acrescentado pela Medida Provisória nº 2.180-35/01) e do art. 8º, § 1º, da Lei nº 8.620/93, o que não inclui as despesas processuais. Todavia, a isenção de que goza a autarquia não obsta a obrigação de reembolsar as custas suportadas pela parte autora, quando esta é vencedora na lide. Entretanto, no presente caso, não há falar em custas ou despesas processuais, por ser a autora beneficiária da assistência judiciária gratuita.
Diante do exposto, DOU PARCIAL PROVIMENTO À APELAÇÃO DA PARTE AUTORA para condenar o INSS a conceder-lhe o benefício de aposentadoria por idade, nos termos do artigo 48, §§3º e 4º, da Lei 8.213/91, a partir da data do requerimento administrativo, com correção monetária, juros de mora e honorários advocatícios, na forma da fundamentação.
Independentemente do trânsito em julgado, determino seja expedido ofício ao INSS, instruído com os documentos de MARIA APARECIDA SABADINI, a fim de que se adotem as providências cabíveis à imediata implantação do benefício de aposentadoria por idade, com data de início - DIB em 29/05/2017 (fls. 16), e renda mensal inicial - RMI a ser calculada pelo INSS, com fundamento no artigo 497 do CPC. O aludido ofício poderá ser substituído por e-mail.
É o voto.
LUCIA URSAIA
Desembargadora Federal
Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
Signatário (a): | MARIA LUCIA LENCASTRE URSAIA:10063 |
Nº de Série do Certificado: | 1B1C8410F7039C36 |
Data e Hora: | 03/07/2018 18:07:53 |