
D.E. Publicado em 29/06/2018 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, em juízo de retratação negativo manter o v. acórdão recorrido, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargadora Federal
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0047512-13.2012.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL INÊS VIRGÍNIA (Relatora): Trata-se de julgamento de eventual juízo de retratação decorrente da interposição de recursos excepcionais contra acórdão prolatado pela Eg. Sétima Turma desta Corte Regional que, por unanimidade, negou provimento ao recurso do autor que objetivava a concessão de aposentadoria por invalidez rural ou a concessão do benefício de assistência social previsto no artigo 203, inciso V, da CF.
O julgado está assim ementado:
Vieram os autos para juízo de retratação (por decisão colegiada) do v. Acórdão, com fundamento no art. 1.040, inciso II, do CPC/2015, considerando a decisão proferida pelo E. Superior Tribunal de Justiça, no recurso especial nº 1.112.557/MG, realizado segundo a sistemática de recurso representativo de controvérsia, no sentido de que o dispositivo legal do art. 20, §3º, da Lei 8.742/1993 deve ser interpretado de modo a amparar o cidadão vulnerável, não podendo a renda per capita prevista na LOAS ser tida como único meio de prova da condição de miserabilidade do beneficiado.
É o relatório.
VOTO
EXMA DESEMBARGADORA FEDERAL DRA. INÊS VIRGÍNIA (Relatora): O Benefício Assistencial requerido está previsto no artigo 203, inciso V, da Constituição Federal, regulamentado pelas atuais disposições contidas nos artigos 20, 21 e 21-A, todos da Lei nº 8.742/1993.
Em resumo, o Benefício da Prestação Continuada (BPC) é a garantia de um salário mínimo mensal ao idoso com 65 anos ou mais ou pessoa com deficiência de qualquer idade com impedimentos de natureza física, mental, intelectual ou sensorial de longo prazo (que produza efeitos pelo prazo mínimo de 2 anos), que o impossibilite de participar, em igualdade de condições, com as demais pessoas da vida em sociedade de forma plena e efetiva. Tratando-se de benefício assistencial, não há período de carência, tampouco é necessário que o requerente seja segurado do INSS ou desenvolva alguma atividade laboral, sendo imprescindível, porém, a comprovação da hipossuficiência própria e/ou familiar.
O artigo 203, inciso V, da Constituição Federal garante o benefício em comento às pessoas portadoras de deficiência que não possuam meios de prover à sua própria manutenção ou de tê-la provida por sua família.
O §2º do artigo 20 da Lei 8742/1993, atualmente, define o conceito de pessoa com deficiência como aquela que tem impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas.
Vale ressaltar que a atual legislação, na redação da Lei 13.146/2015 - que ampliou ainda mais o conceito de pessoa com deficiência, ao preceituar que as barreiras limitadoras não precisam ser "diversas", bastando "uma" -, está em harmonia com o conceito adotado pela ONU na Convenção Sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, a qual foi ratificada pelo Brasil e promulgada pelo Decreto nº 6.949/2009.
Verifica-se que as limitações de que trata a lei atual vão além de um conceito simplista de incapacidade pura e simples para o trabalho e para a vida independente, eis que devem ser considerados, também, para uma perfeita análise da situação de vulnerabilidade do requerente, fatores sociais e o meio em que a pessoa com deficiência vive, isto é, um conjunto de circunstâncias capazes de impedir a integração justa, plena e igualitária na sociedade daquele que necessita de proteção social.
Nesse sentido, as avaliações de que trata o §6º do artigo 20, que sujeita a concessão do benefício às avaliações médica e social, devendo a primeira considerar as deficiências nas funções e nas estruturas do corpo do requerente, e, a segunda, os fatores ambientais, sociais e pessoais a que está sujeito.
Insta saliente, ainda, que o fato de a incapacidade ser temporária não impede a concessão do benefício, nos termos da Súmula 48 da TNU:
"A incapacidade não precisa ser permanente para fins de concessão do benefício assistencial de prestação continuada."
No que diz respeito ao requisito socioeconômico, o §3º, do artigo 20, da Lei 8742/1993, em linhas gerais, considera como hipossuficiente para consecução deste benefício, pessoa cuja renda por pessoa do grupo familiar seja inferior a ¼ (um quarto) do salário-mínimo.
Andou bem o legislador, ao incluir o §11, no artigo 20, com a publicação da Lei 13.146/2015, normatizando expressamente que a comprovação da miserabilidade do grupo familiar e da situação de vulnerabilidade do requerente possa ser comprovada por outros elementos probatórios, além da limitação da renda per capita familiar.
Com efeito, cabe ao julgador avaliar o estado de necessidade daquele que pleiteia o benefício, consideradas suas especificidades, não devendo se ater à presunção absoluta de miserabilidade que a renda per capita sugere (AGARESP 201301166404, NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, STJ - PRIMEIRA TURMA, DJE DATA: 03/02/2017; AGRESP 201500259775, HERMAN BENJAMIN, STJ - SEGUNDA TURMA, DJE DATA:24/05/2016; RESP 200800142128, MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, STJ - SEXTA TURMA, DJE DATA:29/09/2008).
Para efeitos da mensuração da renda per capita, o Decreto nº 6.214/2007, em seu artigo 4º, regulamentou o que se entende por Grupo Familiar, assim dispondo:
Por fim, cabe uma última ponderação, que é a consideração feita ao artigo 19, mencionado no inciso VI, do artigo supra citado:
De acordo com esse artigo, se algum dos membros do Grupo Familiar receber igual benefício assistencial, referido benefício deve ser excluído da renda per capita familiar.
O Eg. STJ, em sede de Recurso Repetitivo já sedimentou o entendimento de que a mesma regra deve ser aplicada, por analogia, também para quando houver benefício previdenciário recebido por idoso, no valor de um salário mínimo.
Vejamos:
Nesse sentido, os julgados desta C. Corte Regional (TRF3ª Região, AC 30993.55.2015.04.03.9999, Des Fed Carlos Delgado, DJ 24/10/2016; TRF3ª Região, AC 2014.03.00.013459-1, Des. Fed. Toru Yamamoto, DJ 27/04/2017; APELREEX 00015662120134036139, DESEMBARGADORA FEDERAL TANIA MARANGONI, TRF3 - OITAVA TURMA, e-DJF3 Judicial 1 DATA:04/09/2017).
CASO CONCRETO
No caso dos autos, a despeito da condição clínica do autor (doenças degenerativas, evolutivas, dependendo de cirurgia para hérnia inguinal no sistema público de saúde, não se podendo olvidar das dificuldades e tempo dispendido para se marcar uma cirurgia no referido sistema) e as condições sociais (66 anos, 4ª série do ensino fundamental), que comprovam a sua incapacidade laborativa o conjunto probatório, não ficou comprovada a qualidade de segurado especial, exercendo atividade rural, na qualidade de diarista/boia fria. Logo, não preenchidos os requisitos legais, não se reconheceu ao autor o direito ao benefício de aposentadoria por invalidez, remanescendo a análise dos requisitos para a concessão do amparo social, objeto do presente juízo de retratação.
Por sua vez, o estudo social realizado em 14/01/2015 constatou que o grupo familiar é composto por pelo autor (63 anos, desempregado), sua esposa (63 anos - aposentada, renda mensal de R$ 788,00), sua filha (33 anos, doméstica, renda mensal de R$ 788,00) e seu neto, 15 anos, estudante, sem renda). Portanto, o casal vive com a filha e o neto. Contudo, possuem outros três filhos casados, residentes neste município. O imóvel em que residem é alugado e composto de dois quartos, sala, cozinha e banheiro, sem necessidade de reparos urgentes. Conta com todos os móveis e eletrodomésticos necessários, em boas condições de uso, inclusive um computador.
No que tange à situação socioeconômica, assevera que a renda provém da aposentadoria da esposa do autor, a qual sofre um desconto de cerca de R$300,00 mensais referentes a pagamento de um empréstimo, acrescido de uma pequena contribuição da filha. Os demais filhos não oferecem apoio, ao contrário, o casal cuida de uma neta durante o dia, sem qualquer contrapartida financeira. Os gastos mensais são de R$400,00 com alimentação; R$ 150,00 com água e energia e R$ 500,00 com aluguel. Não estão inseridos em programas sociais e não contam com a ajuda de terceiros ( laudo social acostado à fl. 159).
Verifica-se que a família, composta por quatro pessoas, possui um rendimento de dois salários mínimos, sendo a renda per capita maior que o mínimo previsto em lei.
Enfim, não obstante o apertado orçamento doméstico, a modesta vida familiar, as dificuldades e preocupações que a doença do autor ocasiona, fato é que não houve comprovação de que se encontrava em estado de vulnerabilidade social ou extrema pobreza.
Observa-se, assim, que o julgado em questão está de acordo com o decidido no recurso representativo de controvérsia REsp nº 1.112.557/MG, não sendo o caso de se proceder a um juízo positivo de retratação.
Ante o exposto, em juízo de retratação negativo, mantenho o v.acórdão reexaminado, nos termos da fundamentação supra.
Posteriormente, com as cautelas de praxe, encaminhem-se os autos à E. Vice-Presidência para as providências que entender cabíveis.
É o voto.
INÊS VIRGÍNIA
Desembargadora Federal
Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
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Data e Hora: | 21/06/2018 13:09:03 |