D.E. Publicado em 25/08/2016 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Décima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, rejeitar a preliminar arguida pela parte autora e, no mérito, dar parcial provimento ao seu recurso adesivo e negar provimento à apelação do réu e à remessa oficial tida por interposta, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal Relator
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0012812-06.2015.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
O Exmo. Sr. Desembargador Federal Sérgio Nascimento (Relator): Trata-se de apelação e recurso adesivo de sentença que julgou parcialmente procedente o pedido formulado em ação revisional para reconhecer o exercício de atividade especial nos períodos de 01.04.1982 a 30.10.1984 e de 04.04.1994 a 04.03.1997, por exposição a agentes insalubres. Consequentemente, condenou o réu a conceder à autora o benefício de aposentadoria integral por tempo de contribuição, com a manutenção do fator previdenciário, devendo pagar os valores em atraso desde a data citação. Os valores em atraso serão acrescidos de juros e correção monetária de acordo com o artigo 1º-F da Lei 9.494/1997, com a redação dada pela Lei 11.960/2009. Ante a sucumbência recíproca, as custas, despesas processuais, bem como os honorários advocatícios fixados em 15% (quinze por cento) sobre o valor da condenação, serão divididos igualmente entre as partes, observado o disposto no artigo 12 da Lei 1.060/1950, em razão de a autora ser beneficiária da justiça gratuita.
Em sua apelação, alega o réu, em síntese, que a autora não logrou êxito em comprovar o exercício de atividade especial nos períodos reconhecidos pela sentença, considerando que não havia exposição a agentes nocivos e que as funções desempenhadas por ela não estão previstas nos decretos regulamentares que autorizam o enquadramento por categoria profissional. Aduz, ainda, que a utilização de EPI eficaz neutraliza os efeitos dos agentes nocivos a que a autora supostamente estaria exposta, sendo que não houve apresentação de laudo técnico contemporâneo às atividades exercidas. Prequestiona a matéria para acesso às instâncias recursais superiores.
Em seu recurso adesivo, busca a autora a reforma do julgado requerendo, preliminarmente, a nulidade da sentença por cerceamento de defesa, tendo em vista que não lhe foi dada oportunidade para produzir prova pericial, a fim de comprovar o exercício de atividade especial. No mérito, salienta que faz jus ao reconhecimento da especialidade de todos os períodos indicados na inicial, vez que trabalhou em empresas frigoríficas, estando exposta a frio e outros agentes nocivos. Requer, ainda, a exclusão do fator previdenciário.
Com a apresentação de contrarrazões (fls. 96/120), vieram os autos a esta Corte.
Em cumprimento ao despacho de fls. 124, foram acostados aos autos os documentos enviados pelas empresas Frigorífico Avícola Votuporanga Ltda. (fls. 134/139) e Frigorífico 4 Rios S.A. (fls. 158/159).
Às fls. 157, o INSS impugna os documentos juntados às fls. 134/139, ressaltando que o PPP e o laudo técnico são extemporâneos.
Por fim, a parte autora trouxe aos autos novo PPP referente ao período em que laborou para a empresa Frigorífico 4 Rios Ltda., conforme peticionado às fls. 160/164.
É o relatório.
SERGIO NASCIMENTO
Desembargador Federal Relator
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0012812-06.2015.4.03.9999/SP
VOTO
Da remessa oficial tida por interposta
Aplica-se ao presente caso o Enunciado da Súmula 490 do E. STJ, que assim dispõe: A dispensa de reexame necessário, quando o valor da condenação ou do direito controvertido for inferior a sessenta salários mínimos, não se aplica às sentenças ilíquidas.
Da preliminar de cerceamento de defesa
Há de ser rejeitado o argumento da parte autora no sentido de que a sentença merece ser anulada por cerceamento de defesa, uma vez que os documentos constantes nos autos, sobretudo os Perfis Profissiográficos Previdenciários e laudo técnico constantes dos autos, são suficientes à apreciação do exercício de atividade especial que se quer comprovar.
Do mérito
Na petição inicial, busca a autora, nascida em 29.01.1963, titular do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição (NB 42/163.758.528-1 - DIB: 21.10.2013; carta de concessão às fls. 25), o reconhecimento de atividade especial nos períodos de 01.04.1982 a 30.10.1984 e de 04.04.1994 a 21.10.2013. Consequentemente, requer a revisão do seu benefício, com o pagamento das diferenças vencidas desde a data do requerimento administrativo (21.10.2013) e, sucessivamente, a exclusão do fator previdenciário.
No que tange à atividade especial, a jurisprudência pacificou-se no sentido de que a legislação aplicável para sua caracterização é a vigente no período em que a atividade a ser avaliada foi efetivamente exercida, devendo, portanto, no caso em tela, ser levada em consideração a disciplina estabelecida pelos Decretos 83.080/79 e 53.831/64, até 05.03.1997, e após pelo Decreto nº 2.172/97, sendo irrelevante que o segurado não tenha completado o tempo mínimo de serviço para se aposentar à época em que foi editada a Lei nº 9.032/95 como a seguir se verifica.
O artigo 58 da Lei nº 8.213/91 dispunha, em sua redação original:
Com a edição da Medida Provisória nº 1.523/96 o dispositivo legal supra transcrito passou a ter a redação abaixo transcrita, com a inclusão dos parágrafos 1º, 2º, 3º e 4º:
Verifica-se, pois, que tanto na redação original do art. 58 da Lei nº 8.213/91 como na estabelecida pela Medida Provisória nº 1.523/96 (reeditada até a MP nº 1.523-13 de 23.10.97 - republicado na MP nº 1.596-14, de 10.11.97 e convertida na Lei nº 9.528, de 10.12.97), não foram relacionados os agentes prejudiciais à saúde, sendo que tal relação somente foi definida com a edição do Decreto nº 2.172, de 05.03.1997 (art. 66 e Anexo IV).
Ocorre que, em se tratando de matéria reservada à lei, tal decreto somente teve eficácia a partir da edição da Lei nº 9.528, de 10.12.1997, razão pela qual apenas para atividades exercidas a partir de então é exigível a apresentação de laudo técnico. Neste sentido, confira-se a jurisprudência:
Pode, então, em tese, ser considerada especial a atividade desenvolvida até 10.12.1997, mesmo sem a apresentação de laudo técnico, pois em razão da legislação de regência a ser considerada até então, era suficiente para a caracterização da denominada atividade especial a apresentação dos informativos SB-40, DSS-8030 ou CTPS.
Ressalto que os Decretos n. 53.831/64 e 83.080/79 vigeram de forma simultânea, não havendo revogação daquela legislação por esta, de forma que, verificando-se divergência entre as duas normas, deverá prevalecer aquela mais favorável ao segurado.
O Decreto n. 2.172, de 05.03.1997, que revogou os dois outros decretos anteriormente citados, passou a considerar o nível de ruídos superior 90 decibéis como prejudicial à saúde. Por tais razões, até ser editado o Decreto n. 2.172, de 05.03.1997, considerava-se a exposição a ruído superior a 80 dB como agente nocivo à saúde.
Com o advento do Decreto n. 4.882, de 18.11.2003, houve nova redução do nível máximo de ruídos tolerável, uma vez que por tal decreto esse nível passou a ser de 85 decibéis (art. 2º do Decreto n. 4.882/2003, que deu nova redação aos itens 2.01, 3.01 e 4.00 do Anexo IV do Regulamento da Previdência Social, aprovado pelo Decreto n. 3.048/99).
Tendo em vista o dissenso jurisprudencial sobre a possibilidade de se aplicar retroativamente o disposto no Decreto 4.882/2003, para se considerar prejudicial, desde 05.03.1997, a exposição a ruídos de 85 decibéis, a questão foi levada ao Colendo STJ que, no julgamento do Recurso Especial 1398260/PR, em 14.05.2014, submetido ao rito do artigo 1.036 do Novo Código de Processo Civil de 2015, Recurso Especial Repetitivo, fixou entendimento pela impossibilidade de se aplicar de forma retroativa o Decreto 4.882/2003, que reduziu o patamar de ruído para 85 decibéis, conforme ementa a seguir transcrita:
Conforme acima destacado, está pacificado no E. STJ (Resp 1398260/PR) o entendimento de que a norma que rege o tempo de serviço é aquela vigente no momento da prestação, devendo, assim, ser observado o limite de 90 decibéis no período de 06.03.1997 a 18.11.2003.
Assim, mantidos os termos da sentença que reconheceu a especialidade dos períodos de 01.04.1982 a 30.10.1984, pois a autora, na função de operária, exercia suas atividades no setor de matança, realizando limpeza de carnes, exposta, portanto, a dejetos e sangue de animais, conforme PPP de fls. 162/163, agentes nocivos previstos no código 1.3.1 do Decreto 53.831/1964; e de 04.04.1994 a 04.03.1997, por exposição a ruído de 86 decibéis, conforme PPP e laudo técnico de fls. 134/139, agente nocivo previsto no código 1.1.6 do Decreto 53.831/1964.
Ressalte-se que, embora o PPP emitido pela empresa Frigorífico 4 Rios S.A. (fls. 162/163) não conste o nome e número de registro do profissional responsável pela avaliação, o referido documento é prova suficiente da exposição a agentes biológicos, fazendo as vezes do DSS 8030 (antigo SB-40), tendo em vista que se refere ao período anterior a 10.12.1997, advento da Lei 9.528/97, que passou a exigir prova técnica.
Outrossim, devem ser tidos por especiais o dia 05.03.1997 e o período de 19.11.2003 a 21.10.2013, por exposição a ruído de 86 decibéis, conforme PPP e laudo técnico às fls. 134/139, agente nocivo previsto nos códigos 1.1.6 do Decreto 53.831/1964 e 2.0.1 do Decreto 3.048/1999 (Anexo IV).
Por outro lado, não há possibilidade de se reconhecer o exercício de atividade especial no período de 06.03.1997 a 18.11.2003, uma vez que a autora esteve exposta a ruído de 86 decibéis, conforme PPP e laudo técnico de fls. 134/139, nível inferior ao patamar de 90 decibéis estabelecido pela legislação em vigor à época da prestação do serviço, não havendo a presença de qualquer outro agente nocivo que justificasse o reconhecimento da especialidade pretendida.
Cumpre observar que as funções da autora não aproveitaria o enquadramento pela categoria profissional, haja vista que referidas atividades não encontram previsão nos Decretos nºs 53.831/64, 83.080/79 e 2.172/97. Contudo, houve comprovação de exposição a agentes nocivos nos períodos acima referidos.
Importa anotar que o fato de o laudo técnico/PPP terem sido elaborados posteriormente à prestação do serviço não afasta a validade de suas conclusões, vez que tal requisito não está previsto em lei e, ademais, a evolução tecnológica propicia condições ambientais menos agressivas à saúde do obreiro do que aquelas vivenciadas à época da execução dos serviços.
No julgamento do Recurso Extraordinário em Agravo (ARE) 664335, em 04.12.2014, com repercussão geral reconhecida, o E. STF fixou duas teses para a hipótese de reconhecimento de atividade especial com uso de Equipamento de Proteção Individual, sendo que a primeira refere-se à regra geral que deverá nortear a análise de atividade especial, e a segunda refere-se ao caso concreto em discussão no recurso extraordinário em que o segurado esteve exposto a ruído, que podem ser assim sintetizadas:
Tese 1 - regra geral: O direito à aposentadoria especial pressupõe a efetiva exposição do trabalhador a agente nocivo a sua saúde, de modo que se o Equipamento de Proteção Individual (EPI) for realmente capaz de neutralizar a nocividade, não haverá respaldo à concessão constitucional de aposentadoria especial.
Tese 2 - agente nocivo ruído: Na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), no sentido da eficácia do Equipamento de Proteção Individual (EPI), não descaracteriza o tempo de serviço especial para a aposentadoria especial, tendo em vista que no cenário atual não existe equipamento individual capaz de neutralizar os malefícios do ruído, pois que atinge não só a parte auditiva, mas também óssea e outros órgãos.
No referido julgado o Egrégio Supremo Tribunal Federal expressamente se manifestou no sentido de que caberá ao Judiciário verificar, no caso concreto, se a utilização do EPI descaracterizou (neutralizou) a nocividade da exposição ao alegado agente nocivo (químico, biológico, etc.), ressaltando, inclusive, que havendo divergência ou dúvida sobre a real eficácia do Equipamento de Proteção Individual, a decisão deveria ser pelo reconhecimento do direito ao benefício de aposentadoria especial.
Além disso, a discussão quanto à utilização do EPI, no caso em apreço, é despicienda, porquanto a autora também esteve exposta ao agente nocivo ruído, cujos efeitos agressivos não são neutralizados pelos tipos de equipamentos de proteção individual atualmente disponíveis.
Convertidos os períodos de especial ora reconhecidos aos demais períodos comuns, inclusive aqueles anotados em CTPS (fls. 28/44), a autora totaliza 17 anos, 05 meses e 11 dias de tempo de serviço até 15.12.1998 e 34 anos, 03 meses e 12 dias de tempo de serviço até 21.10.2013, data do requerimento administrativo, conforme planilha anexa, parte integrante da presente decisão.
Insta ressaltar que o art. 201, §7º, inciso I, da Constituição da República de 1988, com redação dada pela Emenda Constitucional nº 20/98, garante o direito à aposentadoria integral, independentemente de idade mínima, àquela que completou 30 anos de tempo de serviço.
Destarte, a autora faz jus à revisão de sua aposentadoria por tempo de contribuição com acréscimo de atividade especial, convertida em comum, com consequente majoração da renda mensal inicial, calculada nos termos do art.29, I, da Lei 8.213/91, na redação dada pela Lei 9.876/99, tendo em vista que cumpriu os requisitos necessários à jubilação após o advento da E.C. nº20/98 e Lei 9.876/99.
Mantidos os termos da sentença que determinou que os juros de mora e a correção monetária deverão observar o disposto na Lei nº 11.960/09 (STF, Repercussão Geral no Recurso Extraordinário 870.947, 16.04.2015, Rel. Min. Luiz Fux).
Ante a ausência de impugnação específica da autora, mantidos os termos da sentença que fixou o termo inicial da revisão do benefício na data da citação (27.07.2014 - fl. 58), por ter restado incontroverso.
Tendo em vista a sucumbência mínima da parte autora, fixo os honorários advocatícios em 15% (quinze por cento) sobre o valor das diferenças vencidas até a data da sentença, nos termos da Súmula 111 do E. STJ, a teor do disposto no Enunciado 7 das diretrizes para aplicação do Novo CPC aos processos em trâmite, elaboradas pelo STJ na sessão plenária de 09.03.2016.
As autarquias são isentas das custas processuais (artigo 4º, inciso I da Lei 9.289/96), porém devem reembolsar, quando vencidas, as despesas judiciais feitas pela parte vencedora (artigo 4º, parágrafo único).
Diante do exposto, rejeito a preliminar arguida pela autora e, no mérito, dou parcial provimento ao seu recurso adesivo para reconhecer a especialidade do dia 05.03.1997 e do período de 18.11.2003 a 21.10.2013, totalizando 17 anos, 05 meses e 11 dias de tempo de serviço até 15.12.1998 e 34 anos, 03 meses e 12 dias de tempo de serviço até 21.10.2013, fazendo jus à revisão do seu benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, com o pagamento das diferenças vencidas desde a data da citação (27.07.2014), e nego provimento à apelação do réu e à remessa oficial tida por interposta. Honorários advocatícios fixados em 15% sobre o valor das diferenças vencidas até a data da sentença. As diferenças em atraso serão resolvidas em fase de liquidação de sentença.
Independentemente do trânsito em julgado, expeça-se e-mail ao INSS, devidamente instruído com os documentos da parte autora MARIA DE FÁTIMA BERARAMO CARNEIRO, a fim de que sejam adotadas as medidas cabíveis para que seja imediatamente revisado o benefício de APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO (NB 42/163.758.528-1), com DIB em 21.10.2013, cuja renda mensal inicial será calculada pelo INSS, tendo em vista o caput do artigo 497 do Novo CPC.
É como voto.
SERGIO NASCIMENTO
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Data e Hora: | 16/08/2016 16:21:32 |