Processo
ApelRemNec - APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA - 2030434 / SP
0010075-98.2013.4.03.6119
Relator(a)
DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO
Órgão Julgador
SÉTIMA TURMA
Data do Julgamento
07/10/2019
Data da Publicação/Fonte
e-DJF3 Judicial 1 DATA:18/10/2019
Ementa
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE
CONTRIBUIÇÃO. ATIVIDADE ESPECIAL. RUIDO. RECONHECIMENTO PARCIAL. AGENTE
QUÍMICO. UTILIZAÇÃO DE EPI EFICAZ. CONJUNTO PROBATÓRIO INSUFICIENTE.
EMENDA CONSTITUCIONAL Nº 20/98. APOSENTADORIA PROPORCIONAL. REGRAS DE
TRANSIÇÃO. REQUISITOS CUMPRIDOS DE FORMA CUMULATIVA E A QUALQUER
TEMPO. IDADE MÍNIMA E TEMPO ADICIONAL NÃO IMPLEMENTADOS. BENEFÍCIO
INDEFERIDO. REVOGAÇÃO DA TUTELA. DEVOLUÇÃO DOS VALORES. JUÍZO DA
EXECUÇÃO. SUCUMBÊNCIA RECÍPROCA. APELAÇÃO DO INSS E REMESSA
NECESSÁRIA PARCIALMENTE PROVIDAS.
1 - Trata-se de pedido de concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição,
com reconhecimento e cômputo de trabalho desempenhado sob condições especiais nos
períodos de 06/08/1987 a 06/09/1989, 18/09/1989 a 22/07/2002 e 14/04/2003 a 13/08/2012.
2 - Com relação ao reconhecimento da atividade exercida como especial e em obediência ao
aforismo tempus regit actum, uma vez prestado o serviço sob a égide de legislação que o
ampara, o segurado adquire o direito à contagem como tal, bem como à comprovação das
condições de trabalho na forma então exigida, não se aplicando retroativamente lei nova que
venha a estabelecer restrições à admissão do tempo de serviço especial. Precedente do STJ.
3 - Em período anterior ao da edição da Lei nº 9.032/95, a aposentadoria especial e a
conversão do tempo trabalhado em atividades especiais eram concedidas em virtude da
categoria profissional, conforme a classificação inserta no Anexo do Decreto nº 53.831, de 25
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
de março de 1964, e nos Anexos I e II do Decreto nº 83.080, de 24 de janeiro de 1979,
ratificados pelo art. 292 do Decreto nº 611, de 21 de julho de 1992, o qual regulamentou,
inicialmente, a Lei de Benefícios, preconizando a desnecessidade de laudo técnico da efetiva
exposição aos agentes agressivos, exceto para ruído e calor.
4 - A Lei nº 9.032, de 29 de abril de 1995, deu nova redação ao art. 57 da Lei de Benefícios,
alterando substancialmente o seu §4º, passando a exigir a demonstração da efetiva exposição
do segurado aos agentes nocivos, químicos, físicos e biológicos, de forma habitual e
permanente, sendo suficiente a apresentação de formulário-padrão fornecido pela empresa. A
partir de então, retirou-se do ordenamento jurídico a possibilidade do mero enquadramento da
atividade do segurado em categoria profissional considerada especial, mantendo, contudo, a
possibilidade de conversão do tempo de trabalho comum em especial. Precedentes do STJ.
5 - O Decreto nº 53.831/64 foi o primeiro a trazer a lista de atividades especiais para efeitos
previdenciários, tendo como base a atividade profissional ou a exposição do segurado a
agentes nocivos. Já o Decreto nº 83.080/79 estabeleceu nova lista de atividades profissionais,
agentes físicos, químicos e biológicos presumidamente nocivos à saúde, para fins de
aposentadoria especial, sendo que, o Anexo I classificava as atividades de acordo com os
agentes nocivos enquanto que o Anexo II trazia a classificação das atividades segundo os
grupos profissionais.
6 - Em outras palavras, até 28/04/1995, é possível a qualificação da atividade laboral pela
categoria profissional ou pela comprovação da exposição a agente nocivo, por qualquer
modalidade de prova.
7 - Especificamente quanto ao reconhecimento da exposição ao agente nocivo ruído, por
demandar avaliação técnica, nunca prescindiu do laudo de condições ambientais.
8 - Considera-se insalubre a exposição ao agente ruído acima de 80dB, até 05/03/1997; acima
de 90dB, no período de 06/03/1997 a 18/11/2003; e superior a 85 dB, a partir de 19/11/2003.
9 - O Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), instituído pela Lei nº 9.528/97, emitido com
base nos registros ambientais e com referência ao responsável técnico por sua aferição,
substitui, para todos os efeitos, o laudo pericial técnico, quanto à comprovação de tempo
laborado em condições especiais.
10 - Saliente-se ser desnecessário que o laudo técnico seja contemporâneo ao período em que
exercida a atividade insalubre. Precedentes deste E. TRF 3º Região.
11 - A desqualificação em decorrência do uso de EPI vincula-se à prova da efetiva
neutralização do agente, sendo que a mera redução de riscos e a dúvida sobre a eficácia do
equipamento não infirmam o cômputo diferenciado. Cabe ressaltar, também, que a tese
consagrada pelo C. STF excepcionou o tratamento conferido ao agente agressivo ruído, que,
ainda que integralmente neutralizado, evidencia o trabalho em condições especiais.
12 - Saliente-se que, conforme declinado alhures, a apresentação de laudos técnicos de forma
extemporânea não impede o reconhecimento da especialidade, eis que de se supor que, com o
passar do tempo, a evolução da tecnologia tem aptidão de redução das condições agressivas.
Portanto, se constatado nível de ruído acima do permitido, em períodos posteriores ao laborado
pela parte autora, forçoso concluir que, nos anos anteriores, referido nível era superior.
13 - É possível a conversão do tempo especial em comum, independentemente da data do
exercício da atividade especial, consoante o disposto nos arts. 28 da Lei nº 9.711/98 e 57, § 5º,
da Lei nº 8.213/91.
14 - O fator de conversão a ser aplicado é o 1,40, nos termos do art. 70 do Decreto nº 3.048/99,
conforme orientação sedimentada no E. Superior Tribunal de Justiça.
15 - A autarquia previdenciária reconheceu, por ocasião do requerimento formulado em sede
administrativa, a especialidade do labor desempenhado nos períodos de 06/08/1987 a
06/09/1989 e 18/09/1989 a 03/12/1998 ("resumo de documentos para cálculo de tempo de
contribuição"), motivo pelo qual referidos lapsos devem ser tidos, na verdade, como
incontroversos.
16 - Quanto ao período de 04/12/1998 a 22/07/2002, laborado junto à empresa "Borlem S/A
Empreendimentos Industriais", o Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP indica que o autor,
ao desempenhar a função de "Operador de Máquina de Produção I", esteve exposto a ruído de
94,6 dB(A).
17 - No tocante ao período de 14/04/2003 a 13/08/2012, trabalhado junto à empresa
"Newpower Sistema de Energia S/A", o autor instruiu a presente demanda com o Perfil
Profissiográfico Previdenciário - PPP e com o Laudo Técnico Pericial Individual, os quais
apontam a submissão ao agente agressivo ruído, nas intensidades de 80, 80,3 e 81,5dB(A), e
ao agente químico chumbo ao desempenhar as funções de "Ajudante Geral", "Meio Oficial
Masseiro" e "Operador de Empastadeira".
18 - Inviável o reconhecimento do interstício em questão, tendo em vista que o nível de pressão
sonora indicado nos documentos é inferior ao limite de tolerância vigente à época, não sendo
possível também a configuração da especialidade pela exposição ao agente químico chumbo,
considerando que havia uso de EPI eficaz, cuja relevância se denota para o período de
15/12/1998 em diante.
19 - Relativamente ao tema, cumpre realçar que o art. 58, §§ 1º e 2º, da Lei nº 8.213/91 sofreu
alteração por meio da Lei nº 9.732/98, publicada em 14/12/1998, exigindo-se, no bojo do laudo
técnico, informação acerca da existência de tecnologia de proteção - quer coletiva, quer
individual - passível de atenuar a intensidade de agentes nocivos a limites toleráveis, apartando
a insalubridade da atividade desempenhada.
20 - Portanto, a partir de 15/12/1998, nos períodos em que está comprovada a utilização de
equipamentos individuais de proteção eficazes, como no caso em apreço, fica afastada a
insalubridade. Precedente.
21 - Enquadrado como especial o período de 04/12/1998 a 22/07/2002.
22 - Com o advento da Emenda Constitucional nº 20, de 15 de dezembro de 1998, extinguiu-se
a aposentadoria proporcional para os segurados que se filiaram ao RGPS a partir de então,
assegurada, no entanto, essa modalidade de benefício para aqueles já ingressos no sistema,
desde que preencham o tempo de contribuição, idade mínima e tempo adicional nela previstos.
23 - O atendimento às denominadas "regras de transição" deve se dar de forma cumulativa e a
qualquer tempo, bastando ao segurado, para tanto, ser filiado ao sistema por ocasião da
alteração legislativa em comento.
24 - Somando-se a atividade especial reconhecida nesta demanda aos demais períodos de
atividade comum e especial incontroversos, constantes do "resumo de documentos para cálculo
de tempo de contribuição", verifica-se que o autor, na data do requerimento administrativo
(13/08/2012), perfazia 33 anos, 06 meses e 05 dias de serviço, insuficientes para a concessão
da aposentadoria por tempo de contribuição, mesmo que na modalidade proporcional com base
nas regras transitórias estabelecidas pela Emenda Constitucional nº 20/98, considerando o
descumprimento das exigências referentes à idade mínima e ao tempo adicional ("pedágio").
25 - Dessa forma, não prospera o pedido de concessão de benefício previdenciário. Por outro
lado, merece acolhida, em parte, o pedido do autor, a fim de que a autarquia previdenciária seja
compelida a reconhecer como tempo de serviço trabalhado em regime especial, sujeito a
conversão em tempo comum, o período de 04/12/1998 a 22/07/2002.
26 - A controvérsia acerca da eventual devolução dos valores recebidos por força de tutela
provisória deferida neste feito, ora revogada, deverá ser apreciada pelo juízo da execução, de
acordo com a futura deliberação do tema pelo E. STJ, por ser matéria inerente à liquidação e
cumprimento do julgado, conforme disposição dos artigos 297, parágrafo único e 520, II, ambos
do CPC. Observância da garantia constitucional da duração razoável do processo.
27 - Verba honorária compensada entre as partes, ante a sucumbência recíproca (art. 21 do
CPC/73).
28 - Apelação do INSS e remessa necessária parcialmente providas.
Acórdao
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima
Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento à
apelação do INSS e à remessa necessária, para restringir o reconhecimento da especialidade
do labor ao período de 04/12/1998 a 22/07/2002, e para julgar improcedente o pedido de
concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, com revogação da tutela
anteriormente concedida, observando-se o acima expendido quanto à devolução dos valores
recebidos a esse título, bem como fixando a sucumbência recíproca, nos termos do relatório e
voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA.
