Processo
Ap - APELAÇÃO CÍVEL - 1895764 / SP
0001074-44.2012.4.03.6113
Relator(a)
DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO
Órgão Julgador
SÉTIMA TURMA
Data do Julgamento
29/04/2019
Data da Publicação/Fonte
e-DJF3 Judicial 1 DATA:09/05/2019
Ementa
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE
CONTRIBUIÇÃO. LEI Nº 8.213/1991. SENTENÇA ILÍQUIDA. AGRAVO RETIDO NÃO
REITERADO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. CARÁTER PERSONALÍSSIMO.
CONHECIMENTO PARCIAL DO APELO. CUSTAS. FALTA DE INTERESSE DO INSS.
ATIVIDADE ESPECIAL. ENQUADRAMENTO PROFISSIONAL. PREPARAÇÃO DE COURO.
RUÍDO. TEMPO INSUFICIENTE PARA O BENEFÍCIO INTEGRAL. EC Nº 20/1998.
REQUISITO ETÁRIO E "PEDÁGIO" CUMPRIDOS. APOSENTADORIA POR TEMPO DE
CONTRIBUIÇÃO CONCEDIDA. APELAÇÃO DA PARTE AUTORA PARCIALMENTE
CONHECIDA E PROVIDA. APELAÇÃO DO INSS PARCIALMENTE CONEHCIDA E
PARCIALMENTE PROVIDA. REMESSA NECESSÁRIA PARCIALMENTE PROVIDA. AGRAVO
RETIDO NÃO CONHECIDO.
1 - O INSS foi condenado a reconhecer labor especial, além de implantar em favor do autor o
benefício de aposentadoria por tempo de contribuição. Assim, não havendo como se apurar o
valor da condenação, trata-se de sentença ilíquida e sujeita ao reexame necessário, nos termos
do inciso I, do artigo 475 do CPC/73 e da Súmula 490 do STJ.
2 - Não conhecido o agravo retido interposto pela parte autora, eis que não reiterado em
preliminar de apelação, conforme exigido pelo art. 523, CPC/73.
3 - A verba honorária (tanto a contratual como a sucumbencial) possui caráter personalíssimo,
detendo seu titular, exclusivamente, a legitimidade para pleiteá-los, vedado à parte fazê-lo, na
medida em que a decisão não lhe trouxe prejuízo. Em outras palavras, não tendo a parte autora
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
experimentado qualquer sucumbência com a prolação da decisão impugnada, ressente-se,
nitidamente, de interesse recursal. Apelo não conhecido nesse particular.
4 - Não conhecido o apelo da autarquia previdenciária na parte em que pugna pela concessão
da isenção de custas, posto que esta foi deferida na sentença, ao fixar custas na forma da lei.
Logo, carece o INSS de interesse recursal neste tocante.
5 - Com relação ao reconhecimento da atividade exercida como especial e em obediência ao
aforismo tempus regit actum, uma vez prestado o serviço sob a égide de legislação que o
ampara, o segurado adquire o direito à contagem como tal, bem como à comprovação das
condições de trabalho na forma então exigida, não se aplicando retroativamente lei nova que
venha a estabelecer restrições à admissão do tempo de serviço especial.
6 - Em período anterior ao da edição da Lei nº 9.032/95, a aposentadoria especial e a
conversão do tempo trabalhado em atividades especiais eram concedidas em virtude da
categoria profissional, conforme a classificação inserta no Anexo do Decreto nº 53.831, de 25
de março de 1964, e nos Anexos I e II do Decreto nº 83.080, de 24 de janeiro de 1979,
ratificados pelo art. 292 do Decreto nº 611, de 21 de julho de 1992, o qual regulamentou,
inicialmente, a Lei de Benefícios, preconizando a desnecessidade de laudo técnico da efetiva
exposição aos agentes agressivos, exceto para ruído e calor.
7 - A Lei nº 9.032, de 29 de abril de 1995, deu nova redação ao art. 57 da Lei de Benefícios,
alterando substancialmente o seu §4º, passando a exigir a demonstração da efetiva exposição
do segurado aos agentes nocivos, químicos, físicos e biológicos, de forma habitual e
permanente, sendo suficiente a apresentação de formulário-padrão fornecido pela empresa. A
partir de então, retirou-se do ordenamento jurídico a possibilidade do mero enquadramento da
atividade do segurado em categoria profissional considerada especial, mantendo, contudo, a
possibilidade de conversão do tempo de trabalho comum em especial. Precedentes do STJ.
8 - O Decreto nº 53.831/64 foi o primeiro a trazer a lista de atividades especiais para efeitos
previdenciários, tendo como base a atividade profissional ou a exposição do segurado a
agentes nocivos. Já o Decreto nº 83.080/79 estabeleceu nova lista de atividades profissionais,
agentes físicos, químicos e biológicos presumidamente nocivos à saúde, para fins de
aposentadoria especial, sendo que, o Anexo I classificava as atividades de acordo com os
agentes nocivos enquanto que o Anexo II trazia a classificação das atividades segundo os
grupos profissionais.
9 - Em outras palavras, até 28/04/1995, é possível a qualificação da atividade laboral pela
categoria profissional ou pela comprovação da exposição a agente nocivo, por qualquer
modalidade de prova.
10 - Especificamente quanto ao reconhecimento da exposição ao agente nocivo ruído, por
demandar avaliação técnica, nunca prescindiu do laudo de condições ambientais.
11 - Considera-se insalubre a exposição ao agente ruído acima de 80dB, até 05/03/1997; acima
de 90dB, no período de 06/03/1997 a 18/11/2003; e superior a 85 dB, a partir de 19/11/2003.
12 - O Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), instituído pela Lei nº 9.528/97, emitido com
base nos registros ambientais e com referência ao responsável técnico por sua aferição,
substitui, para todos os efeitos, o laudo pericial técnico, quanto à comprovação de tempo
laborado em condições especiais.
13 - Saliente-se ser desnecessário que o laudo técnico seja contemporâneo ao período em que
exercida a atividade insalubre. Precedentes deste E. TRF 3º Região.
14 - A desqualificação em decorrência do uso de EPI vincula-se à prova da efetiva
neutralização do agente, sendo que a mera redução de riscos e a dúvida sobre a eficácia do
equipamento não infirmam o cômputo diferenciado. Cabe ressaltar, também, que a tese
consagrada pelo C. STF excepcionou o tratamento conferido ao agente agressivo ruído, que,
ainda que integralmente neutralizado, evidencia o trabalho em condições especiais.
15 - Vale frisar que a apresentação de laudos técnicos de forma extemporânea não impede o
reconhecimento da especialidade, eis que de se supor que, com o passar do tempo, a evolução
da tecnologia tem aptidão de redução das condições agressivas. Portanto, se constatado nível
de ruído acima do permitido, em períodos posteriores ao laborado pela parte autora, forçoso
concluir que, nos anos anteriores, referido nível era superior.
16 - É possível a conversão do tempo especial em comum, independentemente da data do
exercício da atividade especial, conforme se extrai da conjugação das regras dos arts. 28 da Lei
nº 9.711/98 e 57, § 5º, da Lei nº 8.213/91.
17 - O fator de conversão a ser aplicado é o 1,40, nos termos do art. 70 do Decreto nº 3.048/99,
conforme orientação sedimentada no E. Superior Tribunal de Justiça.
18 - Em sentença, foi reconhecida a especialidade dos lapsos de 28/05/1979 a 13/05/1987,
24/05/1991 a 18/11/1993, 28/10/1994 a 09/09/1997, 03/08/1998 a 09/10/2002, 01/04/2003 a
16/05/2003, 04/12/2003 a 31/01/2006 e 01/02/2006 a 07/10/2009.
19 - De plano, verifica-se que a especialidade dos períodos de 28/05/1979 a 13/05/1987 e
24/05/1991 a 18/11/1993 foi reconhecida administrativamente pelo INSS, conforme se extrai do
documento de fl. 27. Logo, dispensado maiores debates acerca do labor em condições
especiais nos referidos interregnos.
20 - Quanto ao período de 28/10/1994 a 09/09/1997, consta dos autos PPP de fls. 33/35, o qual
corrobora a informação da CTPS (fl. 19), de que o autor trabalhou como auxiliar de produção
em curtume. A saber, a atividade de preparação de couro é elencada no item 2.5.7 do anexo II
do Decreto n.º 83.080/79, ensejando o reconhecimento da especialidade pela categoria
profissional. No caso, observa-se, pela nomenclatura do cargo, que o requerente
desempenhava atividade-fim na manufatura de couro, subsumindo-se à hipótese acima descrita
do decreto.
21 - Relativamente ao lapso de 03/08/1998 a 09/10/2002, trabalhado em prol da "Indústria e
Comércio de Palmilhas Palm Sola Ltda", como auxiliar de acabamento, verifica-se que não
consta a identificação do responsável pelos registros ambientais no PPP (fls. 36/37) relativo ao
vínculo. Assim, o documento se mostra inválido como meio de prova do trabalho em condições
agressivas. Não há, tampouco, qualquer outra prova apta comprovar a especialidade do labor
no ínterim. O PPP de flS. 38/38-verso, referente ao período de 01/04/2003 a 16/05/2003,
igualmente não identifica o responsável pelos registros ambientais. Logo, também é inapto
como meio de prova.
22 - Pelo interregno entre 04/12/2003 e 31/01/2006, cujos registros ambientais constam dos
PPP de fls. 42/49, constata-se que o autor trabalhou submetido à intensidade sonora de 88dB,
superior ao limite de tolerância do período.
23 - No que concerne ao labor na empresa "Saulo Donega Silva - EPP", de 01/02/2006 a
07/10/2009, os PPP (fls. 50/55) informam que o autor não estava submetido a qualquer risco de
01/02/2006 a 31/05/2009 e trabalhou exposto ao ruído de 84dB, de 01/06/2009 a 01/06/2010,
inferior ao limite admitido no período, portanto. Logo, não trabalhou em condições especiais.
24 - Assim sendo, à vista do conjunto probatório juntado aos autos, reputa-se enquadrados
como especiais os períodos de 28/05/1979 a 13/05/1987, 24/05/1991 a 18/11/1993, 28/10/1994
a 09/09/1997 e 04/12/2003 e 31/01/2006.
25 - Somando-se os períodos comuns aos especiais, reconhecidos nesta demanda, convertidos
em comuns, verifica-se que o autor alcançou 33 anos, 6 meses e 16 dias de serviço na data do
requerimento administrativo (07/10/2009). Desta forma, à época havia completado o requisito
etário (53 anos) e o "pedágio" (32 anos, 10 meses e 17 dias), fazendo jus à aposentadoria
proporcional por tempo de contribuição, conforme disposição do art. 9º, §1º, da Emenda
Constitucional nº 20/98.
26 - Correção monetária dos valores em atraso calculada de acordo com o Manual de
Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal vigente quando da
elaboração da conta, com aplicação do IPCA-E nos moldes do julgamento proferido pelo C.
STF, sob a sistemática da repercussão geral (Tema nº 810 e RE nº 870.947/SE) e com efeitos
prospectivos.
27 - Juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, fixados de acordo com o
Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, por refletir as
determinações legais e a jurisprudência dominante.
28 - No tocante aos honorários advocatícios, a referida verba deve, por imposição legal, ser
fixada moderadamente - conforme, aliás, preconizava o §4º, do art. 20 do CPC/73, vigente à
época do julgado recorrido - o que restou perfeitamente atendido com o percentual de 10% (dez
por cento), fixado na sentença, todavia, deve o mesmo incidir sobre o valor das parcelas
vencidas até a data da prolação da sentença, consoante o verbete da Súmula 111 do Superior
Tribunal de Justiça.
29 - Agravo retido do autor não conhecido. Apelação do autor parcialmente conhecida e
provida. Apelação do INSS parcialmente conhecida e parcialmente provida. Remessa
necessária, tida por interposta, parcialmente provida.
Acórdao
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima
Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, não conhecer do agravo
retido da parte autora, conhecer parcialmente da apelação por ela interposta e, na parte
conhecida, dar-lhe provimento, para fixar o termo inicial do benefício na data do requerimento
administrativo (07/10/2009); conhecer em parte da apelação do INSS e, na parte conhecida,
dar-lhe parcial provimento, para afastar a especialidade dos períodos de 03/08/1998 a
09/10/2002, 01/04/2003 a 16/05/2003 e 01/02/2006 a 07/10/2009 e converter a aposentadoria
integral, concedida na origem, em aposentadoria proporcional por tempo de contribuição; e, em
maior extensão, dar parcial provimento à remessa necessária, tida por interposta, para
estabelecer que os valores em atraso sejam corrigidos monetariamente e acrescidos de juros
de mora na forma da fundamentação, bem como para fixar os honorários advocatícios até a
data da prolação da sentença, mantendo, no mais, a r. decisão de 1º grau, nos termos do
relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA.
