
| D.E. Publicado em 02/06/2017 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, em consonância com o art. 1.013, §§ 1° e 3°, do CPC/2015, DAR PARCIAL PROVIMENTO à Apelação da parte autora, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0004035-76.2008.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
O Senhor Desembargador Federal Fausto De Sanctis:
Trata-se de Apelação interposta pelo autor Diego Carlos Cardoso dos Santos (fls. 95-101) em face da r. Sentença (fl. 92) que julgou extinto o processo, sem resolução do mérito, com fundamento no art. 267, IX, do CPC/1973.
Em seu recurso, a parte autora pugna, preliminarmente, pela anulação da r. sentença, sob alegação de que a morte do titular da ação autoriza a suspensão do processo a fim de se proceder a substituição processual pelo espólio ou pelo sucessores, destacando o teor dos artigos 43 e 265, ambos do CPC/1973. No mérito, requer a reforma da r. Sentença, sob fundamento de que de que os documentos juntados aos autos e a análise das condições clínicas e sociais da parte autora comprovam a incapacidade laborativa para fazer jus ao benefício de aposentadoria por invalidez, ressaltando a ocorrência do óbito em razão da patologia apontada na exordial, bem como destacando a comprovação da qualidade de segurado especial, em virtude do trabalho rural desde a infância.
Subiram os autos a esta Eg. Corte, com as contrarrazões (fls. 106-110).
Pedido de habilitação da sucessora do autor originário, às fls. 102-104 e 120-122, sem manifestação do INSS, embora devidamente intimado (fls. 113, 115 e 124-126).
É o relatório.
VOTO
O Senhor Desembargador Federal Fausto De Sanctis:
Inicialmente, cabe analisar o pedido de habilitação da sucessora processual do autor originário, nos termos do art. 689 do CPC/2015.
Tendo em vista que se cuida de habilitação promovida pela genitora, herdeira necessária, considerada dependente do segurado falecido (art. 16 da Lei nº 8.213/91), dispensa-se a ação autônoma de habilitação, consoante dispõe o art. 1.060, I, do CPC/1973 (art. 689 do CPC/2015) e art. 112 da Lei nº 8.213/91.
Diante do exposto, HOMOLOGO, para que produza seus efeitos legais e jurídicos, o pedido de habilitação formulado às fls. 102-104, 113 e 120-122.
Preliminarmente, mesmo considerando que a percepção de benefício previdenciário tem caráter personalíssimo, entendo que os valores a que fazia jus o titular e que não foram recebidos em vida integraram seu patrimônio, de modo a tornar possível a sua transmissão aos herdeiros, remanescendo o legítimo interesse dos seus sucessores em pleitear o crédito respectivo, motivo pelo qual devem ser habilitados, integrando o polo ativo da lide.
Vale ressaltar que o que não pode ser transferido é o direito à percepção mensal do benefício, pois a morte do beneficiário coloca um termo final em seu pagamento. De outra parte, permanece a pretensão dos sucessores ao recebimento dos valores atrasados eventualmente devidos.
Nesse sentido, precedente do C. STJ:
Destarte, merece reparo a sentença proferida pelo órgão judicante singular, pois frustrada a concretização da habilitação requerida, autorizada na legislação vigente (arts. 43 e 265, ambos do CPC/1973 - arts. 110 e 313, I e §§ 1° e 2° do CPC/2015, artigo 112 da Lei n.º 8.213/1991 e artigo 16, da Lei n.º 8.213/1991), de maneira que se impõe a anulação da mencionada sentença, a fim de restabelecer a ordem processual e assegurar os direitos/garantias constitucionalmente previstos.
Dessa forma, acolho a preliminar suscitada pela parte autora.
Observa-se a aplicabilidade, à hipótese, do art. 515, § 3º, do CPC/1973 (art. 1.013, § 3° do CPC/2015), uma vez que há condições de imediato julgamento da causa, considerando a realização da instrução processual, bem como da perícia judicial, pelo que passo à análise do mérito.
Cumpre, primeiramente, apresentar o embasamento legal relativo aos benefícios previdenciários concedidos em decorrência de incapacidade para o trabalho.
Nos casos em que está configurada uma incapacidade laboral de índole total e permanente, o segurado faz jus à percepção da aposentadoria por invalidez. Trata-se de benefício previsto nos artigos 42 a 47, todos da Lei nº 8.213, de 24 de julho de 1991. Além da incapacidade plena e definitiva, os dispositivos em questão exigem o cumprimento de outros requisitos, quais sejam: a) cumprimento da carência mínima de doze meses para obtenção do benefício, à exceção das hipóteses previstas no artigo 151 da lei em epígrafe; b) qualidade de segurado da Previdência Social à época do início da incapacidade ou, então, a demonstração de que deixou de contribuir ao RGPS em decorrência dos problemas de saúde que o incapacitaram.
É possível, outrossim, que a incapacidade verificada seja de índole temporária e/ou parcial, hipóteses em que descabe a concessão da aposentadoria por invalidez, mas permite seja o autor beneficiado com o auxílio-doença (artigos 59 a 62, todos da Lei nº 8.213/1991). A fruição do benefício em questão perdurará enquanto se mantiver referido quadro incapacitante ou até que o segurado seja reabilitado para exercer outra atividade profissional.
Destacados os artigos que disciplinam os benefícios em epígrafe, passo a analisar a questão dos requisitos mencionados, no caso concreto.
A parte autora requereu o benefício de auxílio doença ou aposentadoria por invalidez, alegando exercer atividade rural, como boia fria, devendo comprovar o exercício de atividade rural no período de carência, qual seja, nos doze meses imediatamente anteriores ao requerimento do benefício, ainda que de modo descontínuo, nos termos do art. 39, I, da Lei n° 8.213/91, de forma equiparada ao trabalhador rural em regime de economia familiar (segurado especial).
Neste ponto, cabe ressaltar que o trabalhador rural está dispensado do cumprimento da carência, nos termos do art. 26, III, da Lei n° 8.213/91, mas deve comprovar o exercício de atividade rural referente ao período de carência, conforme já mencionado, consoante teor do art. 39, I, da Lei n° 8.213/91.
O Colendo Superior Tribunal de Justiça consolidou o entendimento de que a comprovação da atividade rural requer a existência de início de prova material, a qual poderá ser corroborada com a prova testemunhal, conforme entendimento cristalizado na Súmula 149, que assim dispõe: "A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeito da obtenção do benefício previdenciário."
Por outro lado, o próprio Superior Tribunal de Justiça entende não ser imprescindível que a prova material abranja todo o período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, desde que a prova testemunhal amplie a sua eficácia, permitindo sua vinculação ao tempo de carência.
Nesse sentido:
Para a comprovação do efetivo trabalho agrícola, no período estabelecido por lei, o autor apresentou a cópia da CTPS (fls. 13-14), que indica vínculo empregatício em estabelecimento de exploração agrícola, na função de trabalhador rural (braçal), no período de 01.03.2005 a 05.04.2005 (CNIS).
A despeito do entendimento sedimentado no STJ, no julgamento do REsp n° 1.321.493-PR, recebido pela C. Corte STJ como recurso representativo de controvérsia em relação ao trabalhador rural, na modalidade boia fria, no qual se firmou a possibilidade da flexibilização na análise dos documentos a serem considerados como início de prova material em relação ao referido trabalhador, observo que não aplicável ao presente caso, considerando que não houve comprovação de trabalho rural pela parte autora no interregno da carência, devendo ser salientado que a prova testemunhal não se prestou a comprovar o exercício de atividade rural pelo requerente no período controverso, conforme se verá a seguir.
Vale destacar que a parte autora, nascido em 20.05.1986, possuía a idade de 18 anos na data da propositura da ação (14.04.2005 - contracapa), alegando trabalho rural desde criança.
Neste ponto, cabe ressaltar que a Constituição da República de 1988 fixa a idade mínima para o ingresso no mercado de trabalho, como se extrai do que prevê o seu artigo 7º, XXXIII, em 16 anos, à exceção do aprendiz, que pode começar a trabalhar a partir dos 14 anos. A Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) em seu artigo 403 ratifica a ordem constitucional, sendo este o entendimento firmado por esse julgador.
Ademais, observo que na perícia judicial realizada em 12.05.2006 (fl. 74) restou demonstrado que o autor possui diagnóstico firmado de diabético insulino dependente desde 2000, ou seja, quando possuía a idade de 14 anos, sendo atendido em Pronto Socorro em diversas ocasiões, conforme relato do jurisperito (fl. 74), e em consonância com os documentos juntados aos autos (fls. 18-25), que demonstram as diversas intercorrências em relação à patologia da parte autora, desde pelo menos 10.2003 (fls. 18, 22 e 24), com a idade de 17 anos, inclusive com necessidade de internação (fls. 18 e 25).
Acrescente-se que a prova testemunhal produzida foi contraditória, não convincente, e não comprova o alegado pela parte autora, sendo verificadas várias incongruências, conforme se verá a seguir.
Cabe salientar que na audiência realizada em 31.03.2006 (fl. 65), a testemunha Gumercindo Firmino Gonçalves (fl. 66) afirma que há cerca de dois anos (ou seja, em 2004, quando o autor possuía a idade de 18 anos) o requerente trabalhou por cerca de 03 dias cortando ramas de mandioca e não teve condições de prosseguir porque ao se expor ao sol fica trêmulo, bem como que fora o problema de ficar trêmulo no sol não sabe se ele tem outro problema. Frise-se, conforme documentos juntados aos autos, que no ano de 2004 a parte autora evidenciou diversas intercorrências em relação à patologia da qual é portador (fls. 18-21 e 23-25), inclusive com internação (fls. 18 e 25).
A testemunha Luis Antonio Baliera (fl. 67) afirma que o autor começou a trabalhar com quinze ou dezesseis anos na roça, e que o requerente trabalhou junto ao depoente desde os 16 anos, normalmente, sendo a última vez na Usina Rio Vermelho, tendo apresentado tremedeira. Vale destacar que não há precisão de datas, nem das atividades desenvolvidas pelo autor.
Por fim, na audiência realizada em 28.02.2007 (fl. 87), a testemunha Adilson Gonçalves dos Santos (fl. 88) afirma que conhece a parte autora desde pequeno, trabalhando na roça no cultivo de tomate, cana de açúcar e algodão. Assevera que o autor trabalhou desde os 13 anos até dois anos atrás, quando adoeceu (ou seja, em 2005, quando o autor possuía aproximadamente, 18 ou 19 anos). Contudo, a despeito de confirmar que trabalhou junto com o autor ate dois anos atrás, afirma não saber o nome de qualquer propriedade que ele tenha trabalhado.
Ressalte-se ainda que a parte autora gozou do benefício de Amparo Social a Pessoa Portadora de Deficiência, no interregno de 06.09.2006 a 04.11.2006 (data do óbito - fl. 91 e CNIS), constando a profissão de empregado doméstico no histórico da perícia médica administrativa relativo ao referido benefício (pesquisa HISMED - sistema Plenus).
Dessa forma, entendo que as provas exibidas não constituem um conjunto harmônico de molde a formar a convicção deste julgador no sentido de que a parte autora tenha exercido atividades no campo no período exigido em lei.
O fato de o INSS ter concedido o benefício de pensão por morte à genitora do autor falecido (DER em 02.06.2015 e DIB em 04.11.2006 - CNIS e Plenus) não gera presunção absoluta quanto à qualidade de segurado especial e/ou comprovação do exercício de atividade rural no período de carência, que não restou minimamente comprovada nos autos. Ao Poder Judiciário cabe a função de analisar a legalidade dos casos concretos que lhe são apresentados.
Assim, o conjunto probatório dos autos não é suficiente para demonstrar que o autor faz jus ao benefício pleiteado, visto que não comprovada a qualidade de segurado especial, exercendo atividade rural, na qualidade de diarista/boia fria, no período controverso, restando não preenchidos os requisitos legais.
Reputo dispensável a análise dos demais requisitos, já que a ausência de apenas um deles impede a concessão do benefício pleiteado.
Por fim, encaminhem-se os autos à UFOR para as devidas anotações no tocante à sucessão processual nos presentes autos (fls. 102-104, 113 e 120-122).
Posto isto, em consonância com o art. 1.013, § 1°, do CPC/2015, voto por DAR PARCIAL PROVIMENTO à Apelação da parte autora, nos termos expendidos na fundamentação.
É o voto.
Fausto De Sanctis
Desembargador Federal
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| Data e Hora: | 24/05/2017 11:31:29 |
