D.E. Publicado em 22/08/2016 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, DAR PROVIMENTO ao recurso de apelação da parte autora (para afastar o reconhecimento da decadência do pleito revisional) e, aplicando o disposto no art. 1.013, § 4º, do Código de Processo Civil, JULGAR IMPROCEDENTE o pedido deduzido nesta demanda, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0037521-86.2007.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
O Senhor Desembargador Federal FAUSTO DE SANCTIS:
Trata-se de apelação interposta pela parte autora (fls. 198/204) em face da r. sentença (fls. 194/196) que extinguiu o feito com resolução de mérito ante o reconhecimento da ocorrência de decadência do pleito revisional (art. 269, IV, do Código de Processo Civil de 1973), fixando verba honorária em R$ 500,00 (quinhentos reais), suspensa em razão do deferimento dos benefícios de Justiça Gratuita. Sustenta a parte autora que não há que se falar em decadência no caso em tela, devendo ser apreciada a revisão pugnada neste feito (de reconhecimento de tempo de labor especial a impactar na aposentadoria de que é titular).
Subiram os autos sem contrarrazões.
É o relatório.
VOTO
O Senhor Desembargador Federal FAUSTO DE SANCTIS:
DA DECADÊNCIA DO PLEITO REVISIONAL
Primeiramente, faz-se necessária a apreciação da tese relativa à ocorrência (ou não) de decadência a fulminar o pedido formulado nesta demanda de revisão do ato de concessão de aposentadoria deferida à parte autora. Com efeito, a controvérsia cinge-se na possibilidade de se estipular prazo decadencial em face de benefícios concedidos antes do advento da Medida Provisória nº 1.523-9/97 (DOU 28/06/1997), posteriormente convertida na Lei nº 9.528/97, uma vez que a instituição de prazo decadencial para se postular revisão do ato concessivo somente veio a lume com a promulgação de tal legislação.
O C. Superior Tribunal de Justiça já teve a oportunidade de se manifestar acerca do assunto, tendo firmado jurisprudência por meio da sistemática dos recursos repetitivos quando do julgamento do REsp 1.309.529/PR (Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 28/11/2012, DJe 04/06/2013) no sentido de que incide o prazo ora em comento (art. 103, da Lei nº 8.213/1991, instituído pela Medida Provisória mencionada anteriormente, posteriormente convertida em Lei) no direito de revisão dos benefícios concedidos ou indeferidos anteriormente a tal preceito normativo, assentando que o termo a quo do prazo extintivo se inicia a contar da vigência da Medida Provisória (vale dizer, em 28/06/1997). Nesse sentido:
Na mesma linha anteriormente exposta, também o E. Supremo Tribunal Federal assentou a possibilidade de incidir prazo decadencial aplicável à hipótese de revisão de ato de concessão de benefício previdenciário deferido antes da previsão legal da decadência, tese esta submetida à sistemática da repercussão geral quando do julgamento do RE 626.489 (Rel. Min. ROBERTO BARROSO, Tribunal Pleno, julgado em 16/10/2013) - nesse sentido:
Desta forma, verifica-se que é possível cogitar da aplicação do instituto da decadência para demandas cujo objeto seja a revisão do ato de concessão de benefício previdenciário deferido antes da previsão do instituto em tela na legislação de regência, cabendo salientar que a sua fluência ocorre a partir da edição da norma que a previu, ou seja, a partir de 28/06/1997. Todavia, no caso dos autos, não há que se falar em decadência, pois, a despeito da aposentadoria a ser revisada ter sido deferida em 20/09/1991 (fls. 13 e 152), não houve o transcurso de mais de 10 (dez) anos entre 28/06/1997 e o momento de ajuizamento desta demanda (19/11/2003 - fls. 02), o que impõe seja reformado o r. provimento judicial guerreado.
Uma vez repelida a ocorrência de decadência do pleito revisional, cumpre agora saber se é possível adentrar ao mérito da demanda nesta quadra processual. E para tanto deve ser invocada a regência do disposto no art. 1.013, § 4º, do Código de Processo Civil, que prescreve que, quando reformada sentença que reconheceu a ocorrência de decadência ou de prescrição, o Tribunal poderá julgar o mérito recursal (se possível tal hipótese), examinando as demais questões, evitando-se, assim, o retorno do processo ao juízo de origem. Nesse diapasão, entendo aplicável ao caso concreto a hipótese descrita no preceito indicado, na justa medida em que o tema central deduzido nesta demanda encontra-se apto a ser enfrentado, uma vez que foi assegurada a aplicação dos princípios do contraditório e da ampla defesa aos litigantes (em respeito ao devido processo legal previsto no Texto Constitucional), bem como não se faz necessária a colheita de provas em audiência (encontrando-se a causa, portanto, madura para julgamento).
Assim, passo ao exame da matéria de fundo, consistente no reconhecimento de labor especial para fins de revisão da aposentadoria deferida à parte autora.
DA APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO/CONTRIBUIÇÃO
A aposentadoria por tempo de serviço foi assegurada no art. 202, da Constituição Federal, que dispunha, em sua redação original:
A regulamentação da matéria sobreveio com a edição da Lei de Benefícios, de 24 de julho de 1991, que tratou em vários artigos da aposentadoria por tempo serviço. Nesse contexto, o benefício em tela será devido, na forma proporcional, ao segurado que completar 25 (vinte e cinco) anos de serviço, se do sexo feminino, ou 30 (trinta) anos de serviço, se do sexo masculino (art. 52, da Lei nº 8.213/91). Comprovado o exercício de mais de 35 (trinta e cinco) anos de serviço, se homem, e 30 (trinta) anos, se mulher, concede-se a aposentadoria em tela na forma integral (art. 53, I e II, da Lei nº 8.213/91).
A Lei nº 8.213/91 estabeleceu período de carência de 180 (cento e oitenta) contribuições, revogando o § 8º do art. 32 da Lei Orgânica da Previdência Social - LOPS (que fixava, para a espécie, período de carência de 60 - sessenta - meses). Destaque-se que a Lei nº 9.032/95, reconhecendo a necessidade de disciplinar a situação dos direitos adquiridos e ainda da expectativa de direito que possuíam os filiados ao regime previdenciário até 24 de julho de 1991 (quando publicada com vigência imediata a Lei nº 8.213/91), estabeleceu regra de transição aplicável à situação desses filiados, prevendo tabela progressiva de períodos de carência mínima para os que viessem a preencher os requisitos necessários às aposentadorias por idade, por tempo de serviço e especial, desde o ano de 1991 (quando necessárias as 60 - sessenta - contribuições fixadas pela LOPS) até o ano de 2.011 (quando se exige 180 - cento e oitenta - contribuições).
A Emenda Constitucional nº 20/1998, que instituiu a reforma da previdência, estabeleceu o requisito de tempo mínimo de contribuição de 35 (trinta e cinco) anos para o segurado e de 30 (trinta) anos para a segurada, extinguindo o direito à aposentadoria proporcional e criando o fator previdenciário (tudo a tornar mais vantajosa a aposentação tardia). Importante ser dito que, para os filiados ao regime até sua publicação e vigência (em 15 de dezembro de 1998), foi assegurada regra de transição, de forma a permitir a aposentadoria proporcional - para tanto, previu-se o requisito de idade mínima de 53 (cinquenta e três) anos para os homens e de 48 (quarenta e oito) anos para as mulheres e um acréscimo de 40% (quarenta por cento) do tempo que faltaria para atingir os 30 (trinta) ou 35 (trinta e cinco) anos necessários nos termos da nova legislação.
Tal Emenda, em seu art. 9º, também previu regra de transição para a aposentadoria integral, estabelecendo idade mínima nos termos acima tratados e percentual de 20% (vinte por cento) do tempo faltante para a aposentação. Contudo, tal regra, opcional, teve seu sentido esvaziado pelo próprio Constituinte derivado, que a formulou de maneira mais gravosa que a regra permanente das aposentadorias integrais (que não exige idade mínima nem tempo adicional).
DO TEMPO EXERCIDO EM CONDIÇÕES ESPECIAIS
O tempo de serviço prestado sob condições especiais poderá ser convertido em tempo de atividade comum independente da época trabalhada (art. 70, § 2º, do Decreto nº 3.048/99). Desta forma, não prevalece mais qualquer tese de limitação temporal de conversão, seja em períodos anteriores à vigência da Lei nº 6.887/80, seja em períodos posteriores à Lei nº 9.711/98, sendo certo que o art. 57, § 5º, da Lei nº 8.213/91, foi elevado à posição de Lei Complementar pelo art. 15, da Emenda Constitucional nº 20/98, de modo que somente por Lei Complementar poderá ser alterado.
Importante ser consignado que, na conversão do tempo especial em comum, aplica-se a legislação vigente à época da prestação laboral; na ausência desta e na potencial agressão à saúde do trabalhador, deve ser dado o mesmo tratamento para aquele que hoje tem direito à concessão da aposentadoria (STF, RE 392.559/RS, Rel. Min. Gilmar Mendes, DJ de 07.02.06).
Cumpre salientar que a conversão do tempo de trabalho em atividades especiais era concedida com base na categoria profissional classificada de acordo com os anexos dos Decretos nº 53.831/64 e 83.080/79, sendo que, a partir da Lei nº 9.032/95, faz-se necessário comprovar o exercício da atividade prejudicial à saúde por meios de formulários ou de laudos. É pacífico o entendimento jurisprudencial de que o rol de atividades consideradas insalubres, perigosas ou penosas é meramente exemplificativo (portanto, não exaustivo), motivo pelo qual a ausência do enquadramento da atividade tida por especial não é óbice à concessão de aposentadoria especial, consoante o entendimento da Súmula 198, do extinto TFR: "Atendidos os demais requisitos, é devida a aposentadoria especial, se perícia judicial constata que a atividade exercida pelo segurado é perigosa, insalubre ou penosa, mesmo não inscrita em Regulamento".
Portanto, o reconhecimento de outras atividades insalubres, penosas e perigosas é admissível, caso exercidas sob ditas condições especiais; porém, tais especialidades não se presumem (como ocorre com aquelas categorias arroladas na legislação pertinente).
A partir de 10 de dezembro de 1997, com a edição da Lei nº 9.528, passou-se a ser necessária a apresentação de laudo técnico para a comprovação de atividade insalubre, documento este que deve demonstrar efetiva exposição do segurado ao agente nocivo, mediante formulário estabelecido pelo Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, com base em laudo técnico do ambiente de trabalho, expedido por médico do trabalho ou por engenheiro de segurança do trabalho, com exceção de ruído (que sempre exigiu a apresentação de referido laudo para caracterizá-lo como agente agressor). Registro, por oportuno, que o Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP substitui o laudo técnico em comento, sendo, assim, documento suficiente para aferição das atividades nocivas a que esteve sujeito o trabalhador.
Destaque-se que a extemporaneidade do documento (formulário, laudo técnico ou Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP) não obsta o reconhecimento de tempo de trabalho sob condições especiais, pois a situação em época remota era pior ou ao menos igual à constatada na data de elaboração de tais documentos (tendo em vista que as condições do ambiente de trabalho somente melhoram com a evolução tecnológica).
Saliente-se que os Decretos nºs 53.831/64 e 83.080/79 têm aplicação simultânea até 05 de março de 1997, de modo que, verificada divergência entre tais diplomas, deve prevalecer a regra mais benéfica (como, por exemplo, ocorre na constatação de insalubridade em razão de ruído com intensidade igual ou superior a 80 dB, que atrai a incidência do Decreto nº 53.831/64).
Especificamente com relação ao agente agressivo ruído, importante ser dito que até 05 de março de 1997 entendia-se insalubre a atividade desempenhada exposta a 80 dB ou mais. Posteriormente, o Decreto nº 2.172/97 revogou os Decretos nºs 53.831/64 e 83.080/79, passando a considerar insalubre o labor desempenhado com nível de ruído superior a 90 dB. Mais tarde, em 18 de novembro de 2003, o Decreto nº 4.882/03 reduziu tal patamar para 85 dB. Ressalte-se que o C. Superior Tribunal de Justiça, quando do julgamento do REsp 1.398.260/PR (representativo da controvérsia - Rel. Min. Herman Benjamin, 1ª Seção, DJe de 05/12/2014), firmou entendimento no sentido da impossibilidade de retroação do limite de 85 dB para alcançar fatos praticados sob a égide do Decreto nº 2.172/97.
O E. Supremo Tribunal Federal, quando do julgamento do Agravo em RE nº 664.335/RS (com repercussão geral da questão constitucional reconhecida), pacificou o entendimento de que, havendo prova da real eficácia do Equipamento de Proteção Individual - EPI (vale dizer, efetiva capacidade de neutralizar a nocividade do labor), não há que se falar em respaldo constitucional à concessão de aposentadoria especial. Todavia, em caso de dúvida em relação à neutralização da nocividade, assentou que a Administração e o Poder Judiciário devem seguir a premissa do reconhecimento do direito ao benefício da aposentadoria especial, pois o uso do EPI, no caso concreto, pode não se afigurar suficiente para descaracterizar completamente a relação nociva a que o empregado se submeteu - destaque-se que se enfatizou, em tal julgamento, que a mera informação da empresa sobre a eficácia do EPI não é suficiente para descaracterizar a especialidade do tempo de serviço para fins de aposentadoria. Ainda em indicado precedente, analisando a questão sob a ótica do agente agressivo ruído, o Supremo estabeleceu que não se pode garantir a eficácia real do EPI em eliminar os efeitos agressivos ao trabalhador, destacando que são inúmeros os fatores que influenciam na sua efetividade, não abrangendo apenas perdas auditivas, pelo que é impassível de controle, seja pelas empresas, seja pelos trabalhadores.
Por fim, no tocante à alegada necessidade de prévia fonte de custeio, em se tratando de empregado, sua filiação ao sistema previdenciário é obrigatória, bem como o recolhimento das contribuições respectivas, cabendo ao empregador vertê-las, nos termos do art. 30, I, da Lei nº 8.212/91. Dentro desse contexto, o trabalhador não pode ser penalizado se tais recolhimentos não foram efetuados corretamente, porquanto a autarquia previdenciária possui meios próprios para receber seus créditos.
DO CONJUNTO PROBATÓRIO DOS AUTOS
Da atividade especial: Pugna a parte autora pelo reconhecimento como especial do labor exercido entre 02/10/1978 e 30/10/1986 e entre 02/12/1986 e 20/09/1991. Com efeito, compulsando os autos, verifica-se, de acordo com o formulário de fls. 123, que a parte autora exercia a função de gerente industrial em ambos os períodos, estando exposta ao agente ruído em intensidade entre 57 e 64 dB (quando na sala do escritório) e entre 72 e 89 dB (quando na indústria).
Diante de tal quadro, não se mostra possível acolher a especialidade vindicada. Isso porque, em primeiro lugar, quando o reconhecimento da especialidade se escora no agente ruído, imprescindível a vinda aos autos de laudo pericial individual (documento inexistente neste feito), ônus que competia à parte autora desempenhar (a teor do art. 333, I, do Código de Processo Civil de 1973, e 373, I, do Código de Processo Civil). Como se não bastasse a ausência de documento necessário ao acolhimento do pleito, o próprio formulado de fls. 123 indica uma exposição intermitente ao agente ruído tendo em vista que as atividades da parte autora tinham um caráter gerencial (o que afasta a exposição habitual, permanente, não ocasional nem intermitente ao barulho que seria prejudicial à sua integridade física) - a divisão entre ruído "de escritório" e "de indústria" corrobora o exposto anteriormente, fazendo com que se deduza que a parte autora também laborava no setor administrativo (atuando de forma estratégica), não estando permanentemente submetida ao agente em tela. Por esses motivos, não reconheço o exercício de atividade especial nos interregnos anteriormente indicados.
DO CASO CONCRETO
Tendo em vista que não houve o reconhecimento da especialidade almejada, o tempo de serviço utilizado para fins de aposentação manteve-se o mesmo daquele atestado pelo Instituto Nacional do Seguro Social - INSS quando do deferimento administrativo do benefício, razão pela qual deve ser afastada a pretensão revisional deduzida nesta demanda.
Sucumbente, a parte autora deve ser condenada ao pagamento de honorários advocatícios de 10% sobre o valor da causa, devendo-se observar o disposto no art. 12, da Lei nº 1.060/50. Nesse sentido é o julgado da E. Suprema Corte:
DISPOSITIVO
Ante o exposto, voto por DAR PROVIMENTO ao recurso de apelação da parte autora, afastando, assim, o reconhecimento da decadência do pleito revisional e, aplicando o disposto no art. 1.013, § 4º, do Código de Processo Civil, JULGO IMPROCEDENTE o pedido deduzido nesta demanda, nos termos anteriormente expendidos.
Fausto De Sanctis
Desembargador Federal
Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
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