D.E. Publicado em 25/08/2016 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Décima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação do INSS e à remessa necessária, e dar provimento ao recurso adesivo da parte autora e fixar, de ofício, os consectários legais, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0002248-25.2011.4.03.6113/SP
RELATÓRIO
O Exmo. Desembargador Federal Nelson Porfirio (Relator): Trata-se de pedido de revisão de aposentadoria por tempo de contribuição, pelo qual a parte autora busca aumentar o tempo total de contribuição reconhecido na via administrativa, com as devidos reflexos na renda mensal do benefício.
Contestação do INSS às fls. 70/76, na qual sustenta o não enquadramento das atividades exercidas pela parte autora como sendo de natureza especial, requerendo, ao final, a improcedência total do pedido.
Sentença às fls. 400/405, pela parcial procedência do pedido, para proceder a revisão do benefício a partir do ajuizamento da demanda em 31.08.2011, reconhecendo os períodos de 05.03.1964 a 31.12.1964, 06.04.1966 a 30.03.1967, 01.05.1967 a 30.09.1967, 01.07.1968 a 30.06.1969, 01.08.1968 a 18.01.1970, 01.09.1970 a 2.09.1970, 02.11.1970 a 22.03.1971, 01.04.1971 a 03.05.1971, 01.06.1971 a 20.04.1972, 05.06.1972 a 28.03.1973, 02.04.1973 a 06.06.1973, 10.07.1973 a 29.10.1973, 01.12.1973 a 31.01.1974, 16.071974 a 21.04.1975, 01.07.1975 a 12.05.1976, 14.06.1976 a 30.11.1976, 10.01.1977 a 15.03.1978, 02.05.1978 a 12.07.19780, 01.08.1978 a 25.08.1978, 01.09.1978 a 05.02.1982, 08.02.1982 a 23.02.1982, 09.03.1982 a 28.04.1982, 03.05.1982 a 23.03.1987 como sendo de natureza especial e fixar a sucumbência.
Apelação do INSS às fls. 412/421, requerendo a improcedência total do pedido.
Apelação adesiva da parte autora às fls. 424/427, pelo provimento do recurso, a fim de se alterar a DIB da revisão do benefício para a data da DER, bem como a majoração dos honorários advocatícios.
Sem apresentação de contrarrazões pelas partes, subiram os autos a esta Corte.
É o relatório.
VOTO
O Exmo. Desembargador Federal Nelson Porfirio (Relator): Pretende a parte autora, nascida em 28.08.1948, o reconhecimento do exercício de atividades especiais nos períodos de 05.03.1964 a 05.04.1966, 06.04.1996 a 30.03.1967, 01.05.1967 a 30.09.1967, 01.07.1968 a 30.06.1969, 01.08.1969 a 18.01.1970, 01.09.1970 a 26.09.1970, 02.11.1970 a 22.03.1971, 01.04.1971 a 03.05.1971, 01.06.1971 a 20.04.1972, 05.06.1972 a 28.03.1973, 02.04.01973 a 06.06.1973, 10.07.1973 a 29.10.1973, 01.12.1973 a 31.01.1974, 16.07.1974 a 21.04.1975, 01.07.1975 a 12.05.1976, 14.06.1976 a 30.11.1976, 10.01.1977 a 15.03.1978, 02.05.1978 a 12.07.1978, 01.08.1978 a 25.08.1978, 01.09.1978 a 05.02.1982, 08.02.1982 a 23.02.1982, 09.03.1982 a 28.04.1982, 03.05.1982 a 23.03.1987 e 12.06.2001 a 20.05.2005, e a revisão do benefício aposentadoria por tempo de contribuição, a partir da data de requerimento administrativo (D.E.R 04.11.2005).
Para elucidação da controvérsia, cumpre distinguir a aposentadoria especial, prevista no art. 57 da Lei nº 8.213/91, da aposentadoria por tempo de contribuição, prevista no art. 52 do mesmo diploma legal, pois a primeira pressupõe o exercício de atividade laboral considerada especial, pelo tempo de 15, 20 ou 25 anos, sendo que, cumprido esse requisito, o segurado tem direito à aposentadoria com valor equivalente a 100% do salário-de-benefício (§ 1º do art. 57), não estando submetido à inovação legislativa da EC 20/98, ou seja, inexiste pedágio ou exigência de idade mínima, nem submissão ao fator previdenciário, conforme art. 29, II, da Lei nº 8.213/91. Diferentemente, na aposentadoria por tempo de contribuição pode haver tanto o exercício de atividades especiais como o exercício de atividades comuns, sendo que os períodos de atividade especial sofrem conversão em atividade comum, aumentando assim o tempo de serviço do trabalhador, e, conforme a data em que o segurado preenche os requisitos, deverá se submeter às regras da EC 20/98.
No que se refere à atividade especial, a jurisprudência pacificou-se no sentido de que a legislação aplicável para sua caracterização é a vigente no período em que a atividade a ser avaliada foi efetivamente exercida, devendo, portanto, no caso em tela, ser levada em consideração a disciplina estabelecida pelos Decretos nº 53.831/64 e nº 83.080/79, até 05.03.1997 e, após, pelo Decreto nº 2.172/97, sendo irrelevante que o segurado não tenha completado o tempo mínimo de contribuição para se aposentar à época em que foi editada a Lei nº 9.032/95, como a seguir se verifica.
O art. 58 da Lei nº 8.213/91 dispunha, em sua redação original que "(...) A relação de atividades profissionais prejudiciais à saúde ou à integridade física será objeto de lei específica (...)". Com a edição da Medida Provisória nº 1.523/96, tal dispositivo legal teve sua redação alterada, com a inclusão dos parágrafos 1º, 2º, 3º e 4º, na forma que segue:
Verifica-se, pois, que tanto na redação original do art. 58 da Lei nº 8.213/91 como na estabelecida pela Medida Provisória nº 1.523/96 (reeditada até a MP nº 1.523-13 de 23.10.97 - republicado na MP nº 1.596-14, de 10.11.97 e convertida na Lei nº 9.528, de 10.12.97), não foram relacionados os agentes prejudiciais à saúde, sendo que tal relação foi definida apenas com a edição do Decreto nº 2.172, de 05.03.1997 (art. 66 e Anexo IV).
Ocorre que, em se tratando de matéria reservada à lei, tal disposição somente teve eficácia a partir da edição da Lei nº 9.528, de 10.12.1997, razão pela qual a apresentação de laudo técnico só pode ser exigida a partir dessa ultima data. Nesse sentido é o entendimento majoritário do E. STJ:
Assim, em tese, pode ser considerada especial a atividade desenvolvida até 10.12.1997, mesmo sem a apresentação de laudo técnico, pois, em razão da legislação de regência a ser considerada até então, era suficiente para a caracterização da denominada atividade especial a apresentação dos informativos SB-40 e DSS-8030 (exceto para o agente nocivo ruído, por depender de prova técnica).
Ressalto que os Decretos nº 53.831/64 e nº 83.080/79 vigeram de forma simultânea, não havendo revogação daquela legislação por esta, de forma que, verificando-se divergência entre as duas normas, deverá prevalecer aquela mais favorável ao segurado.
Com relação especificamente ao sapateiro, é entendimento deste Tribunal Regional Federal, e desta Turma, que presume-se a prejudicialidade à saúde do obreiro pela mera presença do agente nocivo no ambiente de trabalho. Senão, veja-se:
Saliento que não se encontra vedada a conversão de tempo especial em comum, exercida em período posterior a 28.05.1998, uma vez que ao ser editada a Lei nº 9.711/98, não foi mantida a redação do art. 28 da Medida Provisória nº 1.663-10, de 28.05.98, que revogava expressamente o parágrafo 5º, do art. 57, da Lei nº 8.213/91, devendo, portanto, prevalecer este último dispositivo legal, nos termos do art. 62 da Constituição da República.
Quanto ao agente nocivo ruído, o Decreto nº 2.172, de 05.03.1997, passou a considerar o nível de ruídos superior a 90 decibéis como prejudicial à saúde. Por tais razões, até ser editado o referido decreto, considerava-se a exposição a ruído superior a 80 decibéis como agente nocivo à saúde.
Com o advento do Decreto nº 4.882, de 18.11.2003, houve nova redução do nível máximo de ruídos tolerável, uma vez que por tal decreto esse nível passou a ser de 85 decibéis (art. 2º, que deu nova redação aos itens 2.01, 3.01 e 4.00 do Anexo IV do Regulamento da Previdência Social, aprovado pelo Decreto nº 3.048/99).
Tendo em vista o dissenso jurisprudencial sobre a possibilidade de se aplicar retroativamente o disposto no Decreto nº 4.882/2003, para se considerar prejudicial, desde 05.03.1997, a exposição a ruídos de 85 decibéis, a questão foi levada ao Colendo Superior Tribunal de Justiça que, no julgamento do Recurso especial 1398260/PR, em 14.05.2014, submetido ao rito do art.543-C do Código de Processo Civil (Recurso especial Repetitivo), fixou entendimento pela impossibilidade de se aplicar de forma retroativa o Decreto nº 4.882/2003, que reduziu o patamar de ruído para 85 decibéis, na forma que segue:
Dessa forma, é de considerar prejudicial até 05.03.1997 a exposição a ruídos superiores a 80 decibéis, de 06.03.1997 a 18.11.2003, a exposição a ruídos de 90 decibéis e, a partir de então, a exposição a ruídos de 85 decibéis.
Conforme acima destacado, está pacificado no E. STJ (Resp 1398260/PR) o entendimento de que a norma que rege o tempo de serviço é aquela vigente no momento da prestação, devendo, assim, ser observado o limite de 90 decibéis no período de 06.03.1997 a 18.11.2003.
De outra parte, o Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP, instituído pelo art. 58, §4º, da Lei nº 9.528/97, é documento que retrata as características do trabalho do segurado, e traz a identificação do engenheiro ou perito responsável pela avaliação das condições de trabalho, sendo apto para comprovar o exercício de atividades em condições especiais, fazendo às vezes do laudo técnico.
E não afasta a validade de suas conclusões o fato de ter sido o PPP ou laudo elaborado posteriormente à prestação do serviço, vez que tal requisito não está previsto em lei, mormente porque a responsabilidade por sua expedição é do empregador, não podendo o empregado arcar com o ônus de eventual desídia daquele e, ademais, a evolução tecnológica tende a propiciar condições ambientais menos agressivas à saúde do obreiro do que aquelas vivenciadas à época da execução dos serviços.
No julgamento do Recurso Extraordinário em Agravo (ARE) 664335, em 04.12.2014, com repercussão geral reconhecida, o E. STF fixou duas teses para a hipótese de reconhecimento de atividade especial com uso de Equipamento de Proteção Individual, sendo que a primeira refere-se à regra geral que deverá nortear a análise de atividade especial, e a segunda refere-se ao caso concreto em discussão no recurso extraordinário em que o segurado esteve exposto a ruído, que podem ser assim sintetizadas: i) tese 1 - regra geral: o direito à aposentadoria especial pressupõe a efetiva exposição do trabalhador a agente nocivo a sua saúde, de modo que se o Equipamento de Proteção Individual (EPI) for realmente capaz de neutralizar a nocividade, não haverá respaldo à concessão constitucional de aposentadoria especial; e ii) tese 2 - agente nocivo ruído: na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), no sentido da eficácia do Equipamento de Proteção Individual (EPI), não descaracteriza o tempo de serviço especial para a aposentadoria especial, tendo em vista que no cenário atual não existe equipamento individual capaz de neutralizar os malefícios do ruído, pois que atinge não só a parte auditiva, mas também óssea e outros órgãos.
No caso dos autos, nos períodos 05.03.1964 a 05.04.1966, 06.04.1996 a 30.03.1967, 01.05.1967 a 30.09.1967, 01.07.1968 a 30.06.1969, 01.08.1969 a 18.01.1970, 01.09.1970 a 26.09.1970, 02.11.1970 a 22.03.1971, 01.04.1971 a 03.05.1971, 01.06.1971 a 20.04.1972, 05.06.1972 a 28.03.1973, 02.04.01973 a 06.06.1973, 10.07.1973 a 29.10.1973, 01.12.1973 a 31.01.1974, 16.07.1974 a 21.04.1975, 01.07.1975 a 12.05.1976, 14.06.1976 a 30.11.1976, 10.01.1977 a 15.03.1978, 02.05.1978 a 12.07.1978, 01.08.1978 a 25.08.1978, 01.09.1978 a 05.02.1982, 08.02.1982 a 23.02.1982, 09.03.1982 a 28.04.1982 e 03.05.1982 a 23.03.1987, a parte autora exerceu as atividades de sapateiro em indústrias de calçados, ficando exposta a agentes químicos como solventes aromáticos e adesivos, a exemplo da cola de sapateiro, como hidrocarbonetos, agente nocivo por enquadramento no item 1.2.11 do Decreto 53.831/64,
Sendo assim, somados todos os períodos comuns e especiais, estes devidamente convertidos, a parte autora conta com mais de 38 anos, de tempo de contribuição até a data do requerimento administrativo, observado o conjunto probatório produzido nos autos e os fundamentos jurídicos explicitados na presente decisão.
Restaram cumpridos pela parte autora, ainda, os requisitos da qualidade de segurado (art. 15 e seguintes da Lei nº 8.213/91) e a carência para a concessão do benefício almejado (art. 24 e seguintes da Lei nº 8.213/91).
Destarte, a parte autora faz jus à revisão da sua aposentadoria por tempo de contribuição, apenas para que o tempo de contribuição total reconhecido seja majorado para 38 anos, 08 meses e 13 dias, na data do requerimento administrativo.
A correção monetária deverá incidir sobre as prestações em atraso desde as respectivas competências e os juros de mora desde a citação, observada eventual prescrição quinquenal, nos termos do Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, aprovado pela Resolução nº 267/2013, do Conselho da Justiça Federal (ou aquele que estiver em vigor na fase de liquidação de sentença). Os juros de mora deverão incidir até a data da expedição do PRECATÓRIO/RPV, conforme entendimento consolidado pela colenda 3ª Seção desta Corte. Após a devida expedição, deverá ser observada a Súmula Vinculante nº 17.
Os honorários advocatícios devem ser fixados em 15% sobre o valor das parcelas vencidas até a sentença de primeiro grau, nos termos da Súmula 111 do E. STJ.
Embora o INSS seja isento do pagamento de custas processuais, deverá reembolsar as despesas judiciais feitas pela parte vencedora e que estejam devidamente comprovadas nos autos (Lei nº 9.289/96, artigo 4º, inciso I e parágrafo único).
Fica mantida a antecipação dos efeitos da tutela concedida em sentença.
Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação do INSS e à remessa necessária, e dar provimento ao recurso adesivo da parte autora, para determinar a revisão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição atualmente implantado (NB 42/138.484.094-7), a partir do requerimento administrativo, em 04.11.2005, observada eventual prescrição quinquenal, e fixo, de ofício, os consectários legais, tudo na forma acima explicitada.
As verbas acessórias e as prestações em atraso também deverão ser calculadas na forma acima estabelecida, em fase de liquidação de sentença.
É como voto.
NELSON PORFIRIO
Desembargador Federal
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