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AGRAVO DE INSTRUMENTO. DIREITO À SAÚDE. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO NÃO INCORPORADO AO SUS. LECANEMAB. DOENÇA DE ALZHEIMER. TRF4. 5035645-12.2024.4.04.0000...

Data da publicação: 12/12/2024, 23:24:14

AGRAVO DE INSTRUMENTO. DIREITO À SAÚDE. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO NÃO INCORPORADO AO SUS. LECANEMAB. DOENÇA DE ALZHEIMER. - O Superior Tribunal de Justiça, em julgamento realizado sob a sistemática dos recursos repetitivos, assentou no acórdão dos embargos de declaração no REsp 1657156/RJ (Tema 106 - Rel. Min. Benedito Gonçalves, pub DJe 21/9/2018) entendimento no sentido de que A concessão dos medicamentos não incorporados em atos normativos do SUS exige a presença cumulativa dos seguintes requisitos: i) Comprovação, por meio de laudo médico fundamentado e circunstanciado expedido por médico que assiste o paciente, da imprescindibilidade ou necessidade do medicamento, assim como da ineficácia, para o tratamento da moléstia, dos fármacos fornecidos pelo SUS; ii) incapacidade financeira de arcar com o custo do medicamento prescrito; iii) existência de registro do medicamento na ANVISA, observados os usos autorizados pela agência. - No caso dos autos, quanto à probabilidade do direito alegado, verifica-se que a decisão de primeiro grau não apenas considerou os vetores jurisprudencialmente aceitos para o reconhecimento do direito à entrega de medicamentos, como ponderou o quadro fático demonstrado pela nota técnica desfavorável à concessão do medicamento diante da ausência de elementos técnicos para sustentar a indicação da medicação, tampouco para caracterizar a urgência da solicitação. (TRF4, AG 5035645-12.2024.4.04.0000, 6ª Turma, Relator RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA, julgado em 22/11/2024)

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Rua Otávio Francisco Caruso da Rocha, 300 - Bairro: Praia de Belas - CEP: 90010-395 - Fone: (51) 3213-3000 - www.trf4.jus.br

Agravo de Instrumento Nº 5035645-12.2024.4.04.0000/RS

RELATOR: Desembargador Federal RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA

RELATÓRIO

Trata-se de agravo de instrumento interposto por M. J. R. S. contra decisão que indeferiu a tutela provisória de urgência visando ao fornecimento do medicamento lecanemab para o tratamento de doença de Alzheimer em fase de declínio cognitivo leve (CID10 F06.71).

Requer a parte agravante, em síntese:

a) O recebimento e conhecimento do presente Agravo de Instrumento;

b) A concessão da tutela antecipada de urgência para conceder efeito suspensivo a decisão agravada, bem como seja feita a sua reforma para determinar o fornecimento do medicamento pela Agravada por importação, nos termos da prescrição do Dr. Maurício André Gheller Friedrich, cujo receituário já consta nos autos de origem, ou que seja disponibilizado via SISBAJUD os valores necessários para sua aquisição, sob pena de multa diária.

c) A intimação do agravado para, querendo, responderem ao recurso interposto;

d) Seja o presente recurso totalmente provido.

Liminarmente, foi indeferido o pedido de antecipação da tutela recursal (evento 4, DESPADEC1).

Oportunizadas contrarrazões, vieram os autos para julgamento.

É o relatório.

VOTO

Quando da análise do pedido liminar, foi proferida a seguinte decisão (evento 4, DESPADEC1):

De plano, registre-se que os argumentos e os documentos novos ora colacionados (evento 1, LAUDO2) devem ser primeiramente submetidos ao Juízo a quo, pena de supressão de instância, não se cogitando de efeito preclusivo quanto à prerrogativa de recorrer de decisão que reexamine a questão com base em novos fundamentos.

Considerações gerais sobre o direito à saúde

Há balizas já estabelecidas na jurisprudência dos tribunais superiores no que toca ao direito fundamental à saúde à luz da ordem constitucional vigente, e bem assim ao dever de fornecimento de medicamentos e outras prestações dessa natureza pelo poder público, inclusive através de ações judiciais (STF, STA 175 AgR, Relator Min. Gilmar Mendes, Tribunal Pleno, julgado em 17/03/2010). Os limites da intervenção judicial sobre políticas públicas de saúde efetivamente existentes, porém, ainda suscitam discussão.

Acerca da "reserva do possível", por exemplo, o entendimento é de que ela não justifica, por si só, o descumprimento dos deveres constitucionais impostos ao Poder Público, inclusive no que diz respeito ao direito à saúde. Nesse exato sentido, aliás, a posição do Supremo Tribunal Federal:

Cumpre advertir, desse modo, que a cláusula da "reserva do possível" - ressalvada a ocorrência de justo motivo objetivamente aferível - não pode ser invocada, pelo Estado, com a finalidade de exonerar-se, dolosamente, do cumprimento de suas obrigações constitucionais, notadamente quando, dessa conduta governamental negativa, puder resultar nulificação ou, até mesmo, aniquilação de direitos constitucionais impregnados de um sentido de essencial fundamentalidade.

(...) entre proteger a inviolabilidade do direito à vida e à saúde - que se qualifica como direito subjetivo inalienável a todos assegurado pela própria Constituição da República (art. 5º, "caput", e art. 196) - ou fazer prevalecer, contra essa prerrogativa fundamental, um interesse financeiro e secundário do Estado, entendo, uma vez configurado esse dilema, que razões de ordem ético-jurídica impõem, ao julgador, uma só e possível opção: aquela que privilegia o respeito indeclinável à vida e à saúde humanas.

(...) a missão institucional desta Suprema Corte, como guardiã da superioridade da Constituição da República, impõe, aos seus Juízes, o compromisso de fazer prevalecer os direitos fundamentais da pessoa, dentre os quais avultam, por sua inegável precedência, o direito à vida e o direito à saúde. (STA 175, Rel. Min. Celso de Mello, DJE 30/04/2010)

A alegação de "reserva do possível" apenas é legítima quando se demonstra, mediante elementos concretos e objetivamente aferíveis, a absoluta impossibilidade financeira no que tange ao cumprimento da prestação estatal exigida pela Constituição. Com isso, não há que se falar em impossibilidade de reconhecimento do direito à saúde pleiteado com base na genérica alegação de alto custo do tratamento.

Quanto à dispensação de medicamentos, o Superior Tribunal de Justiça, por outro lado, em julgamento realizado sob a sistemática dos recursos repetitivos, assentou no acórdão dos embargos de declaração no REsp 1657156/RJ (Tema 106 - Rel. Min. Benedito Gonçalves, pub DJe 21/9/2018) entendimento no sentido de que "A concessão dos medicamentos não incorporados em atos normativos do SUS exige a presença cumulativa dos seguintes requisitos:

"i) Comprovação, por meio de laudo médico fundamentado e circunstanciado expedido por médico que assiste o paciente, da imprescindibilidade ou necessidade do medicamento, assim como da ineficácia, para o tratamento da moléstia, dos fármacos fornecidos pelo SUS;

ii) incapacidade financeira de arcar com o custo do medicamento prescrito;

iii) existência de registro do medicamento na ANVISA, observados os usos autorizados pela agência".

A possibilidade de "off label", como visto, foi restringida. O tema, contudo, ainda suscita controvérsias, havendo posição no sentido de que quem deve decidir sobre a concreta adequação do medicamento, mesmo que "off label", é o profissional médico (REsp 1769557/CE, Rel. Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 13/11/2018, DJe 21/11/2018). Além disso, noutra oportunidade, foi apontado que "havendo evidências científicas que respaldem a prescrição, é universalmente admitido e corriqueiro o uso off label de medicamento, por ser fármaco devidamente registrado na Anvisa, aprovado em ensaios clínicos, submetido ao Sistema Nacional de Farmacovigilância e produzido sob controle estatal, apenas não aprovado para determinada terapêutica" (REsp 1729566/SP, Rel. Ministro Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, julgado em 04/10/2018, DJe 30/10/2018).

Por outro lado, nos casos de tratamento do câncer, deve ser ressaltada a existência de sistemática própria, na qual os medicamentos são fornecidos pelos estabelecimentos de saúde habilitados em oncologia (CACON/UNACON) e credenciados pelo SUS. Esses centros oferecem assistência especializada e integral ao paciente, cumprindo observar que são eles que padronizam, adquirem e prescrevem os medicamentos oncológicos.

Em suma, na análise do caso concreto é relevante verificar, dentre outras coisas:

a) se há comprovação cabal da doença e do seu atual estágio, por meio de documentação idônea e atualizada, acompanhada da prescrição da tecnologia com a devida justificativa;

b) se há incapacidade da parte autora de arcar com os custos do seu tratamento;

c) se, em caso de câncer, o tratamento do paciente ocorre junto à rede de saúde credenciada como CACON/ UNACON;

d) se ficou configurado o esgotamento de alternativas de tratamento disponíveis no SUS;

e) se foi demonstrada a eficácia da tecnologia, com realização de estudos científicos idôneos, não se tratando de tecnologia com caráter experimental;

f) se há possibilidade de progressão da doença ou de maior risco de morte em caso de não utilização da tecnologia requerida, sendo demonstrada sua imprescindibilidade; e,

g) se existe Protocolo Clínico e Diretrizes Terapêuticas (PCDT) em relação à doença apresentada.

A perícia médica não é indispensável em todos os todos os processos que tratam do direito à saúde, nem constitui condição para o exame de pedidos que tratam de situações de urgência. O juiz poderá se valer de pareceres médicos e de notas técnicas para a tomada de decisão e, em situações de urgência, terá que decidir com base em verossimilhança, a ser avaliada diante dos documentos de que dispõe.

Ademais, a perícia técnica poder ser substituída por nota técnica. É o que sugere o Enunciado n° 31, da I Jornada de Direito da Saúde: "Recomenda-se ao Juiz a obtenção de informações do Núcleo de Apoio Técnico ou Câmara Técnica e, na sua ausência, de outros serviços de atendimento especializado, tais como instituições universitárias, associações profissionais, etc."

Adicione-se que a circunstância de o medicamento ou tratamento ser prescrito por médico particular não é, por si só, motivo para excluir o paciente da assistência prestada pelo Poder Público (TRF4, AG 5033599-60.2018.4.04.0000, Sexta Turma, Relatora Taís Schilling Ferraz, juntado aos autos em 23/11/2018).

Por fim, não se pode deixar de considerar, em todos os casos, a real condição de saúde daquele que ingressa em juízo e formula o pleito relacionado à tutela do direito fundamental à saúde.

Da Antecipação da Tutela Recursal postulada

Nos termos do art. 1019, I, do CPC, recebido o agravo de instrumento, é possível a atribuição de efeito suspensivo ou antecipação de tutela recursal ao remédio jurídico. Além disso, nos termos do art. 995, parágrafo único, do CPC, "a eficácia da decisão recorrida poderá ser suspensa por decisão do relator, se da imediata produção de seus efeitos houver risco de dano grave, de difícil ou impossível reparação, e ficar demonstrada a probabilidade de provimento do recurso".

Tenho, portanto, que dois requisitos cumulativos devem estar presentes para o deferimento da medida liminar que é buscada nestes autos: (a) demonstração de que o cumprimento da decisão combatida poderá causar um dano grave, de difícil ou impossível reparação e; (b) probabilidade do direito alegado.

No caso dos autos, a decisão agravada, da lavra da Juíza Federal Substituta Graziela Cristine Bündchen, deve por ora ser confirmada pelos próprios fundamentos (processo 5033198-91.2024.4.04.7100/RS, evento 12, DESPADEC1):

Trata-se de ação, com pedido de tutela provisória de urgência antecipada, na qual a parte-autora, ​com diagnóstico clínico e molecular de Doença de Alzheimer em fase de declínio cognitivo leve (CID10 F06.71 -evento 1, LAUDO6), postula a dispensação do medicamento Lecanemabe 200mg, conforme prescrição médica (aplicações endovenosas de 600mg a cada 15 dias, por um período de 12 a 18 meses - evento 2, LAUDO2). Requer, ainda a concessão da gratuidade de justiça.

A inicial foi aditada pela autora (evento 2, ADIT_INIC1).

Atribuído sigilo ao feito e deferido o benefício da gratuidade da justiça, foi requisitada a realização de avaliação técnica ao TelessaúdeRS, na condição de NAT-jus/JFRS (evento 4, DESPADEC1).

Anexada a nota técnica (evento 10, NOTATEC1), vieram conclusos os autos para a apreciação do pedido de tutela provisória de urgência.

Para a concessão da tutela provisória de urgência, a lei exige a concorrência de dois pressupostos - a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo (art. 300 do CPC) -, de forma que a simples ausência de um tem o condão de prejudicar, por inteiro, a concessão da medida.

No caso em apreço, o medicamento pleiteado não se insere entre aqueles disponibilizados pelo SUS para o quadro clínico da parte-autora. Dessa maneira, a determinação do seu fornecimento deve observar os critérios delimitados pelo Supremo Tribunal Federal, conforme a decisão da Suspensão de Tutela Antecipada - STA 175, que reconheceu a pertinência de evidências científicas que justifiquem o fornecimento de medicamento, considerando que "o Sistema Único de Saúde filiou-se à corrente da 'Medicina com base em evidências'" e que ressaltou a necessidade de obediência às políticas públicas e de sujeição do indivíduo aos procedimentos próprios do SUS, sendo possível apenas em caráter excepcional o deferimento judicial de direito prestacional em caráter supletivo às prestações já atendidas pelo Estado, e estabeleceu os parâmetros a serem considerados para tanto: a) inexistência de tratamento/procedimento ou medicamento similar/genérico oferecido gratuitamente pelo SUS para a doença ou, se existente, sua utilização sem êxito pelo postulante ou sua inadequação devido a peculiaridades do paciente; b) adequação e necessidade do tratamento ou do medicamento pleiteado para a doença que acomete o paciente; c) aprovação do medicamento pela ANVISA; e d) não configuração de tratamento experimental.

Da mesma forma, ao apreciar o Tema Repetitivo nº 106 (REsp nº 1657156/RJ), o STJ reputou necessária a presença, de forma cumulativa, dos seguintes requisitos para reconhecer a obrigação do poder público de fornecer medicamentos não incorporados em atos normativos do SUS: 1 - Comprovação, por meio de laudo médico fundamentado e circunstanciado expedido por médico que assiste o paciente, da imprescindibilidade ou necessidade do medicamento, assim como da ineficácia, para o tratamento da moléstia, dos fármacos fornecidos pelo SUS; 2 - Incapacidade financeira do paciente de arcar com o custo do medicamento prescrito; e 3 - Existência de registro do medicamento na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), observados os usos autorizados pela agência. Anoto que este entendimento retrata, também, a jurisprudência majoritária já adotada pelo TRF da 4ª Região.

Quanto ao registro na ANVISA, o Plenário do STF, em 22/05/19, apreciando o tema 500 da repercussão geral (RE 657.718/MG), fixou a seguinte tese:

"1. O Estado não pode ser obrigado a fornecer medicamentos experimentais. 2. A ausência de registro na ANVISA impede, como regra geral, o fornecimento de medicamento por decisão judicial. 3. É possível, excepcionalmente, a concessão judicial de medicamento sem registro sanitário, em caso de mora irrazoável da ANVISA em apreciar o pedido (prazo superior ao previsto na Lei nº 13.411/2016), quando preenchidos três requisitos: (i) a existência de pedido de registro do medicamento no Brasil (salvo no caso de medicamentos órfãos para doenças raras e ultrarraras); (ii) a existência de registro do medicamento em renomadas agências de regulação no exterior; e (iii) a inexistência de substituto terapêutico com registro no Brasil. 4. As ações que demandem fornecimento de medicamentos sem registro na ANVISA deverão necessariamente ser propostas em face da União.”

Observa-se, assim, ante a decisão do STF, que resta autorizado o fornecimento, no âmbito do SUS, de tecnologias de saúde pleiteadas judicialmente sem o registro na ANVISA desde que atendidas as condicionantes fixadas na tese 500 supramencionada. Acrescente-se, ainda, a tese firmada sobre o Tema 1161 da repercussão geral (RE 1165959):

"Cabe ao Estado fornecer, em termos excepcionais, medicamento que, embora não possua registro na ANVISA, tem a sua importação autorizada pela agência de vigilância sanitária, desde que comprovada a incapacidade econômica do paciente, a imprescindibilidade clínica do tratamento, e a impossibilidade de substituição por outro similar constante das listas oficiais de dispensação de medicamentos e os protocolos de intervenção terapêutica do SUS”

Feitas essas considerações, impõe-se a análise do caso.

Inicialmente, no que concerne à insuficiência financeira para fazer frente à aquisição do medicamento pleiteado, observa-se que a autora se encontra aposentada, auferindo benefício previdenciário de R$5.318,92 (evento 1, CHEQ5). Por outro lado, o custo para a aquisição do tratamento postulado, conforme o cálculo apresentado pelo NAT-jus/JFRS, tendo em conta o orçamento apresentado pela parte-autora (evento 2, ORÇAM3) (tendo em conta que o fármaco não é registrado na ANVISA e, portanto, não é comercializado no país, não estando sujeito à regulação de preços) atinge o valor anual de R$274.680,00 (evento 10, NOTATEC1, p. 6). Resta evidenciada, assim, a sua incapacidade financeira para custear o tratamento.

Ultrapassada tal questão, a nota técnica elaborada pelo NAT-jus/JFRS refere, que a parte-autora, "com 78 anos de idade, foi diagnosticada clínica e laboratorialmente com Doença de Alzheimer e encontra-se em "fase de declínio cognitivo leve, bastante preservado cognitivamente, com dificuldade na memória recente desde 2021”. Cabe instar que não são apresentados os resultados dos exames confirmatórios mencionados, tampouco qualquer medida objetiva, como pontuação nas escalas MEEM1 e CDR2 , que permitam inferir sobre o diagnóstico e grau de comprometimento cognitivo apresentado pela parte. O médico assistente relata que a parte autora encontra-se em uso dos tratamentos disponíveis - sem citar quais, em quais doses ou há quanto tempo - porém destaca que estes não evitam a progressão da doença. Nesse contexto, foi prescrito uso do lecanemabe com o objetivo de retardar a progressão da doença e evitar evolução para quadro de demência terminal" (evento 10, NOTATEC1).

A nota técnica menciona que o medicamento não tem registro na ANVISA, que não está previsto em PCDT para a situação clínica da demandante, não está disponível no SUS e que as alternativas disponíveis no sistema público são "inibidores da acetilcolinesterase para o tratamento da DA leve a moderada (donepezila, galantamina, rivastigmina) e antagonista do receptor de NMDA (memantina) para uso associado aos inibidores de acetilcolinesterase no tratamento da DA moderada e em monoterapia para os casos graves [8]". Destaca, como benefício/efeito/resultado esperado da tecnologia: "discreta redução do escore CDR-SB em 18 meses com relação ao placebo; a relação entre a redução do CDR-SB (desfecho substituto) observada nos estudos que avaliaram o lecanemabe e a melhora na cognição dos pacientes (impacto clínico) não foi estabelecida; ainda é incerto o impacto do uso do tratamento em médio e longo prazo" (evento 10, NOTATEC1; p. 6).

Ao final, ​​a manifestação técnica foi desfavorável ao fornecimento do fármaco (evento 10, NOTATEC1), nos seguintes termos:

6.4 Conclusão técnica: desfavorável.

6.5 Justificativa:

Há escassa evidência acerca do uso do lecanemabe no tratamento da doença de Alzheimer. Os dados disponíveis são frágeis e impedem que se façam assunções acerca do impacto da mesma na redução do declínio cognitivo de pacientes com Alzheimer. Além disso, são acentuados os riscos envolvidos com o uso da mesma, haja vista a presença de eventos adversos com potencial letal. Por fim, não existem estudos que tenham comparado o uso do lecanemabe frente às demais terapias disponíveis no sistema público de saúde.

Cabe também salientar que se trata de produto não aprovado pela Anvisa, o que implica em informar que seu uso demanda compra por importação e que seus potenciais riscos não foram avaliados pelo órgão sanitário brasileiro.

Principalmente considerando a fragilidade da evidência disponível, que impede qualquer estimativa de benefício clínico incremental da terapia pleiteada, e ainda considerando a ausência de registro na Anvisa e o fato de que se trata de produto de alto custo, entendemos que se impõe o atual parecer desfavorável.

Nesse contexto, considerando os elementos da nota técnica desfavorável, dentre os quais a escassa evidência até agora demonstrada sobre o potencial benefício do medicamento, a ausência de registro na ANVISA e atentando-se aos parâmetros indicados pelo STF e pelo STJ antes listados, não se verifica a probabilidade do direito a ensejar o acolhimento do pedido de tutela provisória de urgência, em que pese configurado o perigo de dano irreparável decorrente do quadro de saúde diagnosticado.

Ante o exposto, indefiro a tutela provisória requerida.

(...)

Com efeito, no caso dos autos, quanto à probabilidade do direito alegado, verifica-se que a decisão de primeiro grau não apenas considerou os vetores jurisprudencialmente aceitos para o reconhecimento do direito à entrega de medicamentos, como ponderou o quadro fático demonstrado pela nota técnica (processo 5033198-91.2024.4.04.7100/RS, evento 10, NOTATEC1), desfavorável à concessão do medicamento diante da ausência de elementos técnicos para sustentar a indicação da medicação, tampouco para caracterizar a urgência da solicitação.

Veja-se que a parte agravante não apontou por que razões deveria ser desconsiderado o parecer técnico e a decisão agravada, especialmente na parte em que consignam haver (a) pequeno impacto na redução do declínio cognitivo de pacientes com Alzheimer; (b) inexistência de estudos comparativos do LECANEMAB frente a outras terapias amplamente disponíveis; (c) tratar-se de medicamento não aprovado pela ANVISA, de maneira que seus potenciais riscos não foram avaliados pelo nosso órgão regulador; (d) a fragilidade da evidência disponível impede qualquer estimativa de benefício clínico incremental da terapia, sendo considerado medicamento de alto custo.

A propósito, recentíssima decisão da Desa. Federal Taís Schilling Ferraz, em caso assemelhado, cujos fundamentos adoto como razões para decidir (agravo de instrumento nº 5018620-83.2024.4.04.0000/RS - destaques em negrito):

(...)

Assim, embora o caso da autora se enquadre como Doença de Alzheimer de início precoce, com classificação no estágio CDR 1,0 (estágio de leve comprometimento cognitivo), hipótese para a qual a medicação estaria, em tese, indicada, não existem evidências suficientes de benefícios relevantes promovidos pelo fármaco no combate à enfermidade. Conforme nota técnica acima transcrita, as análises atuais não foram capazes de revelar a eficácia e segurança do remédio, se fazendo imprescindível a realização de outros estudos para determinar a possibilidade de uso efetivo da tecnologia.

Logo, entendo que não foi comprovada a probabilidade do direito alegado. A decisão agravada está adequada à prova produzida nos autos até o momento.

(...)

Ante o exposto, indefiro o pedido de antecipação da tutela recursal.

Ausentes novos elementos de fato ou direito, a decisão que resolveu o pedido liminar deve ser mantida, por seus próprios fundamentos.

Prequestionamento

A fim de possibilitar o acesso às instâncias superiores, consideram-se prequestionadas as matérias constitucionais e legais suscitadas no recurso, nos termos dos fundamentos do voto, deixando de aplicar dispositivos constitucionais ou legais não expressamente mencionados e/ou havidos como aptos a fundamentar pronunciamento judicial em sentido diverso do que está declarado.

Dispositivo

Ante o exposto, voto por negar provimento ao agravo de instrumento.



Documento eletrônico assinado por RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40004831825v3 e do código CRC 3b24f7ba.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA
Data e Hora: 25/11/2024, às 14:29:4


5035645-12.2024.4.04.0000
40004831825.V3


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Agravo de Instrumento Nº 5035645-12.2024.4.04.0000/RS

RELATOR: Desembargador Federal RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA

EMENTA

agravo de instrumento. direito à saúde. fornecimento de medicamento não incorporado ao sus. lecanemab. doença de alzheimer.

- O Superior Tribunal de Justiça, em julgamento realizado sob a sistemática dos recursos repetitivos, assentou no acórdão dos embargos de declaração no REsp 1657156/RJ (Tema 106 - Rel. Min. Benedito Gonçalves, pub DJe 21/9/2018) entendimento no sentido de que "A concessão dos medicamentos não incorporados em atos normativos do SUS exige a presença cumulativa dos seguintes requisitos: "i) Comprovação, por meio de laudo médico fundamentado e circunstanciado expedido por médico que assiste o paciente, da imprescindibilidade ou necessidade do medicamento, assim como da ineficácia, para o tratamento da moléstia, dos fármacos fornecidos pelo SUS; ii) incapacidade financeira de arcar com o custo do medicamento prescrito; iii) existência de registro do medicamento na ANVISA, observados os usos autorizados pela agência."

- No caso dos autos, quanto à probabilidade do direito alegado, verifica-se que a decisão de primeiro grau não apenas considerou os vetores jurisprudencialmente aceitos para o reconhecimento do direito à entrega de medicamentos, como ponderou o quadro fático demonstrado pela nota técnica desfavorável à concessão do medicamento diante da ausência de elementos técnicos para sustentar a indicação da medicação, tampouco para caracterizar a urgência da solicitação.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, negar provimento ao agravo de instrumento, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Porto Alegre, 22 de novembro de 2024.



Documento eletrônico assinado por RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40004831826v4 e do código CRC 1165732f.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA
Data e Hora: 25/11/2024, às 14:29:4


5035645-12.2024.4.04.0000
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Tribunal Regional Federal da 4ª Região

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO PRESENCIAL DE 22/11/2024

Agravo de Instrumento Nº 5035645-12.2024.4.04.0000/RS

RELATOR: Desembargador Federal RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA

PRESIDENTE: Desembargador Federal ALTAIR ANTONIO GREGORIO

PROCURADOR(A): FLÁVIO AUGUSTO DE ANDRADE STRAPASON

SUSTENTAÇÃO ORAL POR VIDEOCONFERÊNCIA: MARIA AUGUSTA ANDRADE KREJCI por M. J. R. S.

Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Presencial do dia 22/11/2024, na sequência 136, disponibilizada no DE de 11/11/2024.

Certifico que a 6ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:

A 6ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NEGAR PROVIMENTO AO AGRAVO DE INSTRUMENTO.

RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA

Votante: Desembargador Federal RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA

Votante: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ

Votante: Desembargador Federal ALTAIR ANTONIO GREGORIO

LIDICE PENA THOMAZ

Secretária



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