Apelação Cível Nº 5000485-67.2022.4.04.9999/SC
RELATOR: Desembargador Federal CELSO KIPPER
APELANTE: SANDRA ISIDORO
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RELATÓRIO
Cuida-se de apelação contra sentença, publicada em 14-12-2021, na qual o magistrado a quo julgou improcedentes os pedido de restabelecimento do benefício de aposentadoria por invalidez e de concessão de auxílio-doença, condenando a parte autora ao pagamento de custas processuais e de honorários advocatícios, os quais restaram suspensos em razão do benefício da assistência judiciária gratuita.
Em suas razões, a autora alega, em síntese, que se encontra total e permanentemente incapacitada para o trabalho, em razão de ser portadora de graves enfermidades. Assevera que houve a indevida cessação de seu benefício de aposentadoria por invalidez, uma vez que a documentação médica acostada aos autos comprova a manutenção do quadro incapacitante. Por tais razões, requer o restabelecimento do benefício de aposentadoria por invalidez, a contar de janeiro de 2019 quando iniciado o cancelamento progressivo.
Oportunizadas as contrarrazões, vieram os autos a esta Corte para julgamento.
É o relatório.
VOTO
Qualidade de segurada e carência mínima
A qualidade de segurada e a carência mínima exigidas para a concessão do benefício não foram questionadas nos autos. Além disso, no âmbito administrativo, o INSS reconheceu o preenchimento de tais requisitos ao conceder à parte autora o benefício de auxílio-doença (NB 31/537.618.356-0) no período de 09-09-2009 a 14-04-2011 e, posteriormente, de aposentadoria por invalidez (NB 32/546.606.068-9) no período de 15-04-2011 a 18-12-2019, conforme extrai-se de consulta ao Portal CNIS e do extrato previdenciário juntado aos autos (evento 7 - CERT1). Tenho-os, assim, por incontroversos.
Incapacidade laboral
Resta, pois, averiguar a existência de incapacidade laboral que justifique a concessão dos benefícios postulados.
A perícia médica judicial, nas ações que envolvem a pretensão de concessão de benefício por incapacidade para o trabalho, exerce importante influência na formação do convencimento do magistrado. Todavia, tal prova não se reveste de valor absoluto, sendo possível afastá-la, fundamentadamente, se uma das partes apresentar elementos probatórios consistentes que conduzam a juízo de convicção diverso da conclusão do perito judicial ou se, apesar da conclusão final deste, a própria perícia trouxer elementos que a contradigam.
No caso concreto, a autora possui 53 anos e narra ter desempenhado a atividade profissional de comerciante. Foram realizadas 02 (duas) perícias médicas judiciais. A primeira por especialista em ortopedia e traumatologia em 24-06-2020 (evento 46 - OUT1). A segunda por especialista em psiquiatria em 04-11-2021 (evento 119 - VIDEO1).
Na primeira ocasião, respondendo aos quesitos formulados, o perito judicial manifestou-se no sentido de que a autora apresenta redução parcial e temporária da capacidade laborativa, em razão de lesão do ligamento cruzado no joelho direito. Quanto às demais patologias identificadas e não relacionadas à área ortopédica, o expert informou que a autora necessitaria realizar nova perícia com especialista em neurologia.
Já na segunda ocasião, o expert concluiu que a parte autora, embora apresente sequelas decorrentes da patologia neurológica de que é portadora e não tenha perspectiva de cura, está apta ao exercício das atividades laborativas, em razão da estabilidade do quadro.
É sabido que o perito judicial é o profissional de confiança do juízo, cujo compromisso é examinar a parte com imparcialidade. Contudo, o julgador não está adstrito às conclusões do auxiliar do juízo, devendo valorar a prova técnica em cotejo com o restante conjunto probatório.
Não obstante as conclusões do expert, analisando o conjunto probatório, parece-me improvável que a demandante reunisse à época condições de retornar a exercer seu labor habitual.
A vasta documentação médica acostada aos autos evidencia a necessidade de afastamento definitivo da atividade laborativa habitual (evento 1 - ANEXO4; evento 3 - ATESTMED2; evento 12 - ANEXO2; evento 41 - ANEXO2; evento 117 - ATESTMED2; e evento 146 - ANEXO2).
Nesse sentido, atestados médicos datados de 08-06-2018, 22-02-2019, 07-06-2019, 24-09-2019, 12-05-2020 e 15-02-2022 informam de forma taxativa a necessidade de afastamento das atividades laborativas através da aposentadoria da autora (evento 1 - ANEXO4 - fls. 04 e 05; evento 3 - ATESTMED2 - fl. 01; evento 12 - ANEXO2 - fl. 03; evento 41 - ANEXO2 - fl. 01; e evento 146 - ANEXO2 - fl. 01).
Houve a seguinte informação quanto à evolução da doença e ao quadro de saúde da demandante no ano de 2019 (evento 3 - ATESTMED2 - fl. 01):
Atesto para os devidos fins e efeitos legais que o(a) Sr(a). Sandra Isidoro, operada de tumor cerebral, responsável por perda visual direita e insuficiência hipofisária, apresenta lesão residual tumoral importante. Está permanentemente incapacitada para o trabalho. Sugiro aposentadoria.
Em novo atestado datado de 19-10-2021 (evento 117 - ATESTMED2), informou-se que a autora é portadora de lesão expansiva cerebral com prognóstico reservado. O atestado mais recente, emitido em 15-02-2022, concluiu mais uma vez que a autora não possui condições de realizar atividades laborativas.
Outrossim, destaca-se que a demandante apresenta sintomas incapacitantes em razão da mesma patologia desde o ano de 2009 quando passou a perceber o benefício de auxílio-doença, ou seja, aproximadamente 13 (treze) anos, o que demonstra que não houve a recuperação da capacidade laborativa após a cessação do benefício de aposentadoria por invalidez.
Logo, tendo o conjunto probatório apontado a existência de incapacidade laboral total e definitiva desde a época do cancelamento administrativo (18-12-2019), o benefício de aposentadoria por invalidez é devido desde então, devendo o INSS pagar à parte autora as respectivas parcelas, bem como os valores que foram descontados progressivamente enquanto percebeu mensalidade de recuperação.
Por tais razões, dou provimento à apelação da parte autora.
Correção monetária e juros moratórios
A atualização monetária das parcelas vencidas deve observar o INPC no que se refere ao período posterior à vigência da Lei n. 11.430/2006, que incluiu o art. 41-A na Lei n. 8.213/91, conforme deliberação do STJ no julgamento do Tema 905 (REsp 1.495.146 - MG, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, DE 02-03-2018), o qual resta inalterado após a conclusão do julgamento, pelo Plenário do STF, em 03-10-2019, de todos os EDs opostos ao RE 870.947 (Tema STF 810), pois rejeitada a modulação dos efeitos da decisão de mérito.
Quanto aos juros de mora, até 29-06-2009, devem ser fixados à taxa de 1% ao mês, a contar da citação, com base no art. 3º do Decreto-Lei n. 2.322/1987, aplicável, analogicamente, aos benefícios pagos com atraso, tendo em vista o seu caráter alimentar, consoante firme entendimento consagrado na jurisprudência do STJ e na Súmula 75 desta Corte. A partir de 30-06-2009, por força da Lei n. 11.960, de 29-06-2009, que alterou o art. 1º-F da Lei n. 9.494/97, para fins de apuração dos juros de mora haverá a incidência, uma única vez, até o efetivo pagamento, do índice oficial aplicado à caderneta de poupança, conforme decidido pelo Pretório Excelso no RE 870.947 (Tema STF 810).
Honorários advocatícios
Considerando que a sentença foi publicada após 18-03-2016, data definida pelo Plenário do STJ para início da vigência do NCPC (Enunciado Administrativo nº 1-STJ), bem como o Enunciado Administrativo n. 7 - STJ (Somente nos recursos interpostos contra decisão publicada a partir de 18 de março de 2016, será possível o arbitramento de honorários sucumbenciais recursais, na forma do art. 85, § 11, do novo CPC), aplica-se ao caso a sistemática de honorários advocatícios ora vigente.
Desse modo, os honorários advocatícios devem ser fixados em 10% sobre o valor das parcelas vencidas até a data do presente julgamento, a teor das Súmulas 111 do STJ e 76 desta Corte, ressaltando ser incabível, no caso, a majoração dos honorários prevista no § 11 do art. 85 do NCPC, a teor do posicionamento que vem sendo adotado pelo STJ (v.g. AgIntno AREsp 829.107/RJ, Relator p/ Acórdão Ministro MARCO BUZZI, Quarta Turma, DJe 06-02-2017 e AgInt nos EDcl no REsp1357561/MG, Relator Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, Terceira Turma, DJe 19-04-2017).
Honorários periciais
Sucumbente, deve o INSS suportar o pagamento do valor fixado a título de honorários periciais.
Custas
O INSS é isento do pagamento das custas judiciais na Justiça Federal, nos termos do art. 4º, I, da Lei n. 9.289/96, e na Justiça Estadual de Santa Catarina, a teor do que preceitua o art. 33, § 1º, da Lei Complementar Estadual n. 156/97, com a redação dada pela Lei Complementar Estadual n. 729/2018.
Tutela específica
Na vigência do Código de Processo Civil de 1973, a Terceira Seção desta Corte, buscando dar efetividade ao disposto no art. 461, que dispunha acerca da tutela específica, firmou o entendimento de que o acórdão que concedesse benefício previdenciário e sujeito apenas a recurso especial e/ou extraordinário, em princípio, sem efeito suspensivo, ensejava o cumprimento imediato da determinação de implantar o benefício, independentemente do trânsito em julgado ou de requerimento específico da parte, em virtude da eficácia mandamental dos provimentos fundados no referido artigo (TRF4, 3ª Seção, Questão de Ordem na AC n. 2002.71.00.050349-7/RS, de minha Relatoria, julgado em 09-08-2007).
Nesses termos, entendeu o Órgão Julgador que a parte correspondente à obrigação de fazer ensejava o cumprimento desde logo, enquanto a obrigação de pagar ficaria postergada para a fase executória.
O art. 497 do novo CPC, buscando dar efetividade ao processo, dispôs de forma similar à prevista no Código de 1973, razão pela qual o entendimento firmado pela Terceira Seção deste Tribunal, no julgamento da Questão de Ordem acima referida, mantém-se íntegro e atual.
Portanto, com fulcro no art. 497 do CPC, determino o cumprimento imediato do acórdão no tocante ao restabelecimento do benefício de aposentadoria por invalidez da parte autora (CPF 019.259.599-70), a ser efetivada em 45 dias. Na hipótese de a parte autora já se encontrar em gozo de benefício previdenciário, deve o INSS implantar o benefício deferido judicialmente apenas se o valor de sua renda mensal atual for superior ao daquele.
Dados para cumprimento
1. ( ) Averbação ( ) Concessão ( X ) Restabelecimento ( ) Revisão
2. NB: 546.606.068-9
3. Espécie: aposentadoria por invalidez (32)
4. DIB: 18-12-2019 (DCB da aposentadoria por invalidez)
5. DIP: conforme previsão legal, atentando-se à DIB.
6. DCB: não se aplica.
7. RMI: a apurar conforme previsão legal e os comandos da decisão judicial.
Requisite a Secretaria da Turma Regional Suplementar de Santa Catarina o cumprimento da decisão à CEAB - Central Especializada de Análise de Benefícios.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por dar provimento à apelação da parte autora e determinar o cumprimento imediato do acórdão no tocante à implantação do benefício via CEAB - Central Especializada de Análise de Benefícios.
Documento eletrônico assinado por CELSO KIPPER, Desembargador Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40003129532v11 e do código CRC f102b968.Informações adicionais da assinatura:
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Apelação Cível Nº 5000485-67.2022.4.04.9999/SC
RELATOR: Desembargador Federal CELSO KIPPER
APELANTE: SANDRA ISIDORO
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO CÍVEL. BENEFÍCIO POR INCAPACIDADE LABORAL. PROVA PERICIAL. AUSÊNCIA DE VALOR ABSOLUTO. FORMAÇÃO DE CONVICÇÃO EM SENTIDO DIVERSO DO EXPERT. POSSIBILIDADE SE EXISTENTE PROVA CONSISTENTE EM SENTIDO CONTRÁRIO OU SE O PRÓPRIO LAUDO CONTIVER ELEMENTOS QUE CONTRADIGAM A CONCLUSÃO DO PERITO. SITUAÇÃO PRESENTE NO CASO CONCRETO. JUÍZO DE IMPROCEDÊNCIA. SENTENÇA REFORMADA. TUTELA ESPECÍFICA.
1. A perícia médica judicial, nas ações que envolvem a pretensão de concessão de benefício por incapacidade para o trabalho, exerce importante influência na formação do convencimento do magistrado. Todavia, tal prova não se reveste de valor absoluto, sendo possível afastá-la, fundamentadamente, se uma das partes apresentar elementos probatórios consistentes que conduzam a juízo de convicção diverso da conclusão do perito judicial ou se, apesar da conclusão final deste, a própria perícia trouxer elementos que a contradigam.
2. No caso concreto, havendo nos autos prova robusta produzida pela segurada que indica a permanência do seu estado incapacitante após o cancelamento administrativo do benefício e, desse modo, apta a infirmar o entendimento técnico externado pelo expert, reforma-se a sentença de improcedência.
3. Considerando as conclusões extraídas da análise do conjunto probatório no sentido de que a parte autora está total e definitivamente incapacitada para o exercício de atividades laborativas desde a época da cessação administrativa, é devido o restabelecimento do benefício de aposentadoria por invalidez.
4. Considerando a eficácia mandamental dos provimentos fundados no art. 497, caput, do CPC/2015, e tendo em vista que a presente decisão não está sujeita, em princípio, a recurso com efeito suspensivo, determina-se o cumprimento imediato do acórdão no tocante à implantação do benefício, a ser efetivada em 45 dias.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia Turma Regional Suplementar de Santa Catarina do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, dar provimento à apelação da parte autora e determinar o cumprimento imediato do acórdão no tocante à implantação do benefício via CEAB - Central Especializada de Análise de Benefícios, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Florianópolis, 17 de maio de 2022.
Documento eletrônico assinado por CELSO KIPPER, Desembargador Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40003129533v3 e do código CRC 0e416152.Informações adicionais da assinatura:
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 10/05/2022 A 17/05/2022
Apelação Cível Nº 5000485-67.2022.4.04.9999/SC
RELATOR: Desembargador Federal CELSO KIPPER
PRESIDENTE: Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ
PROCURADOR(A): WALDIR ALVES
APELANTE: SANDRA ISIDORO
ADVOGADO: EVANDRO ALBERTON ASCARI (OAB SC017561)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 10/05/2022, às 00:00, a 17/05/2022, às 16:00, na sequência 759, disponibilizada no DE de 29/04/2022.
Certifico que a Turma Regional suplementar de Santa Catarina, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DE SANTA CATARINA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DA PARTE AUTORA E DETERMINAR O CUMPRIMENTO IMEDIATO DO ACÓRDÃO NO TOCANTE À IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO VIA CEAB - CENTRAL ESPECIALIZADA DE ANÁLISE DE BENEFÍCIOS.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal CELSO KIPPER
Votante: Desembargador Federal CELSO KIPPER
Votante: Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ
Votante: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
ALEXSANDRA FERNANDES DE MACEDO
Secretária
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