
Apelação Cível Nº 5005387-40.2016.4.04.7003/PR
RELATOR: Desembargador Federal JOÃO PEDRO GEBRAN NETO
RELATÓRIO
Trata-se de apelações cíveis interpostas pela União e por S. H. Y. nos autos do procedimento comum nº 50053874020164047003, ajuizado pelo autor objetivando a anulação de ato administrativo que considerou prescritas suas férias, reparação de danos materiais, morais e estéticos em razão da incapacidade parcial do autor, decorrente de acidente de trabalho.
Os pedidos iniciais foram julgados parcialmente procedentes, sob este dispositivo (
):"(...)
3. Dispositivo
Ante o exposto, julgo parcialmente procedente a demanda, declarando extinto o processo, com resolução do mérito (art. 487, I, NCPC), para condenar a União a:
a) a conceder ao autor 22 dias de férias relativos ao período aquisitivo de 2012;
b) pagar ao autor a quantia de R$ 15.000,00, a título de indenização por danos morais, corrigida monetariamente a partir desta data (momento em que se torna líquida a condenação) pelo IPCA-E (no RE 870947, o STF declarou a inconstitucionalidade da TR), mais juros de mora simples equivalentes aos aplicáveis aos depósitos de poupança, incidentes desde o evento danoso.
Custas iniciais pela parte autora e finais pela União, a qual é isenta do pagamento de custas (art. 4º, I, Lei n.º 9.289/96).
(...)"
A União apela no
, sustentando que (a) em que pesem as afirmações da parte autora e os eventuais transtornos decorrentes do não recebimento das férias, tais alegações jamais podem ser suficientes para a configuração do dano moral; (b) não houve qualquer ilícito na conduta da ré; (b) não restou comprovada nenhuma lesão que demonstre o abalo sofrido pelo autor, inexistindo, então, justa causa ao pretenso pagamento de indenização por dano moral.Apela o autor S. H. Y. no
, requerendo (a) seja majorado o valor arbitrado à título de danos morais, tendo em vista as condições pessoais do ofendido e do ofensor, a intensidade do dolo ou grau de culpa, a extensão do dano moral e gravidade dos efeitos, o caráter de amenizar a dor sofrida pela vítima e que a indenização não pode ser de valor ínfimo a ponto de estimular o ofensor a não tomar as precauções necessários para evitar futuras reincidências; (b) o pagamento de indenização por danos morais referente ao indeferimento da concessão de férias; (c) indenização por danos estéticos, considerando a comprovação nos autos originários de que houve perda de 20% da capacidade laborativa do apelante, as sequelas são permanentes, houve perda de movimento, cicatriz e limitação para corrida, pulos e agachamentos.Com contrarrazões, subiram os autos a esta Corte.
É o relatório.
VOTO
1. Ao proferir a sentença ora recorrida, o juízo de primeiro grau assim se manifestou sobre as questões relevantes a este recurso e que resolvem a causa (
):(...)
2. Fundamentação
2.1. Férias não gozadas
Em relação ao pedido de fruição de férias não gozadas em razão do acidente, o autor sustentou que: (ii) havia agendado a última parte de suas férias, referente ao ano aquisitivo de 2012, para o período de 29/11/2013 a 20/12/2013, totalizando 22 dias; (ii) no dia 23/11/2013, participava de uma grande operação de repressão ao contrabando e descaminho, quando sofreu acidente automobilístico em viatura oficial, estando em serviço; (iii) o acidente resultou em grave fratura da tíbia do pé esquerdo, sendo submetido a cirurgias, tendo ficado com várias sequelas; (iv) foi instaurada sindicância interna quanto ao acidente, não tendo havido responsabilização dos servidores envolvidos; (v) para justificar sua ausência no serviço, o autor apresentou licenças médicas no setor administrativo responsável da Receita Federal, as quais foram devidamente homologadas pela junta médica oficial, tendo recebido seu subsídio regularmente; (vi) enquanto ainda estava em licença, o setor de recursos humanos da Receita Federal lhe informou que o direito aos 22 dias de férias estava prescrito; (vii) requereu administrativamente o direito à fruição das referidas férias, tendo sido negado seu pedido com fundamento no art. 77 da Lei 8.112/90 e art. 5º da Orientação Normativa nº 2 da SRH/MP do MPOG; (viii) o autor esteve afastado de suas atividades (licença médica) em razão de acidente de trabalho; (ix) o direito às férias é constitucionalmente garantido; (x) o art. 77 da lei 8.112/90 visa preservar a saúde do agente público ao impedir a acumulação de mais de dois períodos de férias e não tutelar interesse da Administração; (xi) a regra da necessidade do serviço e acúmulo de férias deve observar os princípios da razoabilidade e proporcionalidade, não podendo justificar a perda do direito às férias; (xii) a ausência de fruição das férias sem a respectiva compensação pecuniária do trabalhador causa enriquecimento sem causa da Administração; (xiii) a interpretação do art. 77 da Lei 8.112/91 não pode ser feita de forma desfavorável à quem procurou proteger (trabalhador); (xiv) o afastamento para tratamento da saúde é considerado como efetivo exercício da atividade, conforme previsto no art. 102, VIII, "b" da Lei 8.112/91, não podendo o autor ser prejudicado; (xv) o acúmulo de férias ocorreu em razão de exercer seu direito de afastamento para tratar da própria saúde.
O autor, portanto, pretende a declaração do direito à fruição do saldo de 22 dias de férias relativos ao período aquisitivo de 2012.
A administração negou na via administrativa o pedido de fruição das férias, ao entendimento de que, nos termos do artigo 77 da Lei 8.112/90 e do artigo 5º, § 1º, da Portaria Normativa SRH nº 02, do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão, é vedada a acumulação das férias para o exercício seguinte em decorrência do afastamento por licença médica .
Entretanto, revela-se contrária à ordem constitucional a negativa ao gozo de férias, sob a motivação de impossibilidade de cumulação dos períodos, pautada em portaria e em legislação infraconstitucional, a qual prevê especificamente o impedimento apenas na hipótese de necessidade de serviço.
A Constituição Federal dispõe sobre o direito de férias do servidor público:
Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social:
(...)
XVII - gozo de férias anuais remuneradas com, pelo menos, um terço a mais do que o salário normal;
Art. 39.
§ 3º Aplica-se aos servidores ocupantes de cargo público o disposto no art. 7º, IV, VII, VIII, IX, XII, XIII, XV, XVI, XVII, XVIII, XIX, XX, XXII e XXX, podendo a lei estabelecer requisitos diferenciados de admissão quando a natureza do cargo o exigir.
Percebe-se que a Carta Magna não trouxe limitação ao gozo de férias, sequer por disciplina infraconstitucional, estabelecendo o direito à fruição simples e pura.
Por sua vez, a Lei 8.112/90 assim dispõe:
Lei 8.112/90
(...)
Art. 77. O servidor fará jus a trinta dias de férias, que podem ser acumuladas, até o máximo de dois períodos, no caso de necessidade do serviço, ressalvadas as hipóteses em que haja legislação específica.
No caso dos autos, a parte autora não pode gozar férias, ocorrendo a cumulação dos períodos, porque estava afastada por licença-saúde.
Dessa forma, nítida a ausência da "necessidade do serviço", veiculada no dispositivo legal acima transcrito, para limitar o acúmulo das férias por no máximo dois períodos e, também no aspecto infraconstitucional, desarrazoado o indeferimento do gozo de férias pela Administração.
De mais a mais, o afastamento em virtude de licença para tratamento de saúde, até o limite de vinte e quatro meses, é considerado como efetivo tempo de serviço público, a gerar o direito aquisitivo às férias e, consequentemente, o direito à fruição destas.
Lei 8.112/90
Art. 102. Além das ausências ao serviço previstas no art. 97, são considerados como de efetivo exercício os afastamentos em virtude de:
(...)
VIII - licença:
(...)
b) para tratamento da própria saúde, até o limite de vinte e quatro meses, cumulativo ao longo do tempo de serviço público prestado à União, em cargo de provimento efetivo; (Redação dada pela Lei nº 9.527, de 10.12.97)
Os Tribunais Regionais Federais vem se posicionando pelo direito do servidor à fruição de férias, em momento posterior ao gozo de licença-saúde, a qual não tem o condão de obstar ou nulificar o direito constitucional às férias.
Confira-se os seguintes precedentes:
ADMINISTRATIVO. SERVIDOR. FÉRIAS. LICENÇA-SAÚDE. O direito às férias do servidor é assegurado pela Constituição Federal e também pela Lei nº 8.112/90. Assim, não pode a Administração subtrair o direito de férias de servidor que esteve de licença saúde e não pode fruí-las. (TRF4 5002159-82.2015.4.04.7200, QUARTA TURMA, Relator CÂNDIDO ALFREDO SILVA LEAL JUNIOR, juntado aos autos em 10/07/2015)
ADMINISTRATIVO. SERVIDOR. FÉRIAS. LICENÇA-SAÚDE. REMARCAÇÃO. DESCONTO INDEVIDO. BOA-FÉ. VERBA ALIMENTAR. - A marcação de férias para período durante o qual o servidor esteja afastado em razão de licença para tratamento de saúde não lhe retira o direito de usufruí-las em data posterior, ainda que atos normativos disciplinem essa possibilidade apenas tendo por motivação a necessidade de serviço. Precedentes desta Corte. - A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é no sentido de serem indevidos os descontos nos vencimentos do servidor quando recebidos erroneamente, em virtude de equívoco da Administração Pública, se não constatada a má-fé do beneficiado. (TRF4, AC 5056425-42.2012.4.04.7000, QUARTA TURMA, Relator LUÍS ALBERTO D'AZEVEDO AURVALLE, juntado aos autos em 20/05/2015)
ADMINISTRATIVO. FÉRIAS REPROGRAMADAS. LICENÇA-SAÚDE. O servidor que teve suas férias reprogramas por necessidade de serviço e não pôde gozá-las por estar em licença-saúde, não perde o direito às férias, podendo ser acumuladas com o próximo período. Descabe neste caso também a exigência de restituição dos valores pagos relativos ao adicional de férias. (TRF4, REOAC 2008.71.00.003849-3, TERCEIRA TURMA, Relator FERNANDO QUADROS DA SILVA, D.E. 21/07/2010)
ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. SERVIDOR PÚBLICO. PERDA DO DIREITO DE FÉRIAS. LICENÇA MÉDICA. CONVERSÃO EM PECÚNIA. IMPOSSIBILIDADE. (...). É ilegal o ato da autoridade coatora consistente em negar à servidora pública impetrante o direito a férias em virtude de afastamento do serviço público por concessão de licença médica para tratamento de saúde. A pretensão de ver indenizadas as férias não usufruídas pela servidora esbarra na literalidade do disposto no §3º da Lei 8.112/90, com redação dada pela Lei nº 8216, de 13.08.1991, segundo a qual apenas farão jus à indenização os servidores exonerados do cargo efetivo ou do cargo em comissão. Apelação parcialmente provida. (AMS 00090021720144036100, DESEMBARGADOR FEDERAL COTRIM GUIMARÃES, TRF3 - SEGUNDA TURMA, e-DJF3 Judicial 1 DATA:21/07/2016 ..FONTE_REPUBLICACAO:.)
ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. MANDADO DE SEGURANÇA. SERVIDOR. FÉRIAS. LICENÇA PARA TRATAMENTO DE SAÚDE. DIREITO AO GOZO. SEGURANÇA CONCEDIDA. 1. "O direito a férias vem assegurado no art. 7º, XVII, da Constituição Federal, como um direito fundamental do trabalhador, expressamente estendido aos servidores públicos por força do art. 39, § 3º, também da Constituição Federal." (AMS 0000556-34.2010.4.01.3800 / MG, Rel. JUIZ FEDERAL RÉGIS DE SOUZA ARAÚJO, PRIMEIRA TURMA, e-DJF1 p.539 de 28/01/2016) 2. Assim é que, nos termos do art. 102,VIII, "b", da Lei nº 8.112/90, o período de afastamento, por prazo inferior a 24 (vinte e quatro) meses, em virtude de licença para tratamento da própria saúde é tido como de efetivo exercício, não há que se falar em recebimento indevido de valores. Ademais, o argumento sustentado pela Ré, pertinente à previsão de portaria que impede a acumulação do período de férias por licença-médica, representa sobreposição de norma hierarquicamente inferior, uma vez que não existe tal previsão no âmbito da lei 8.112/90. De mais a mais, este tribunal já decidiu em matéria semelhante pela inocorrência do perecimento do direito ao gozo das férias: CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. SERVIDOR PÚBLICO MILITAR. FÉRIAS. AFASTAMENTO EM RAZÃO DE LICENÇA PARA TRATAMENTO DA PRÓPRIA SAÚDE. PERECIMENTO DO DIREITO. INOCORRÊNCIA. 1. O direito a férias é constitucionalmente assegurado, cuidando-se de direito fundamental do trabalhador, consoante o disposto no art. 7º, XVII, da Constituição Federal, inclusive dos servidores públicos, conforme dispõe o art. 39, § 3º, da Carta Magna. 2. Uma Portaria não pode se sobrepor à Constituição, para suprimir o direito da impetrante, sob a justificativa de que não poderia haver acumulação de férias não usufruídas em razão de afastamento por motivo de licença, ocorrendo o perecimento do seu direito. 3. Remessa oficial não provida.(REOMS 0026012-22.2010.4.01.3400 / DF, Rel. JUIZ FEDERAL RENATO MARTINS PRATES (CONV.), SEGUNDA TURMA, e-DJF1 p.68 de 22/10/2013) (...) 5. Apelação da União e remessa oficial, tida por interposta, não providas. Apelação adesiva da parte Autora provida para majorar os honorários advocatícios no importe de 10% sobre o valor da condenação. (APELAÇÃO 00155233920094013600, JUIZ FEDERAL AILTON SCHRAMM DE ROCHA, TRF1 - PRIMEIRA TURMA, e-DJF1 DATA: 23/06/2016 PAGINA:.)
Anoto, por oportuno, o pronunciamento do TRF - 2ª Região, de que a previsão legal (Lei 8.112/90) da impossibilidade de cumulação de dois períodos de férias representa regra de proteção ao servidor, para que não fique tolhido ao gozo do benefício, em virtude da necessidade de serviço afirmada pela Administração, e não regra para suprimir as férias, quando houver a cumulação dos períodos. Confira-se a ementa:
DIREITO ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. SERVIDOR PÚBLICO. AFASTAMENTO EM RAZÃO DE LICENÇA PARA TRATAMENTO DA PRÓPRIA SAÚDE. ACÚMULO DE FÉRIAS POR MAIS DE DOIS PERÍODOS. POSSIBILIDADE. CONCESSÃO DA SEGURANÇA. 1 - O direito ao gozo de férias é garantido aos servidores públicos constitucionalmente, não se admitindo que seja restringido por norma infraconstitucional. (...) 3 - A exegese do art. 77 da Lei 8.112/90, que proíbe o acúmulo de férias por mais de dois períodos, é no sentido de proteger o servidor público, não sendo possível que a Administração a interprete para suprimir este direito. 4 - Concedida parcialmente a segurança. (MS- 00081907620084020000, GUILHERME CALMON NOGUEIRA DA GAMA, TRF2.)
Em caso análogo, o Colendo Superior Tribunal de Justiça afirmou que o afastamento do servidor não lhe retira o direito constitucional e social às férias:
EMEN: ADMINISTRATIVO. PROFESSOR UNIVERSITÁRIO. AFASTAMENTO PARA PARTICIPAÇÃO EM CURSO DE DOUTORADO. DIREITO A FÉRIAS E 1/3. 1. Trata-se, na origem, de mandado de segurança em que se objetiva assegurar o direito à percepção das férias com as consequentes vantagens pecuniárias, enquanto permanecer afastado para participação em curso de pós-graduação stricto sensu no país, na modalidade doutorado. 2. O STJ, em tema idêntico, decidiu que faz jus o servidor às férias nos períodos correspondentes ao afastamento para participação em programa de pós-graduação stricto sensu no país ou de licença para capacitação, até porque tais períodos são considerados como de efetivo exercício, nos termos do art. 102, IV e VIII, e, da Lei n. 8.112/90. 3. Não cabe ao regulamento, ou a qualquer norma infralegal, criar restrições ao gozo dos direitos sociais, mediante interpretação que afronte a razoabilidade e resulte na redução da intelecção conferida ao termo "efetivo exercício". (REsp 1370581/AL, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 11/4/2013, DJe 9/5/2013) 4. É parte legítima para integrar o pólo passivo de mandado de segurança a autoridade que efetivamente pratica o ato apontado como ilegal. Agravo regimental improvido. ..EMEN:(AGRESP 201301007285, HUMBERTO MARTINS, STJ - SEGUNDA TURMA, DJE DATA:28/06/2013 ..DTPB:.)
Logo, a parte autora faz jus à fruição de férias decorrentes dos períodos em que esteve afastada por licença-saúde.
2.2. Da Responsabilidade Civil do Estado
A responsabilidade civil das pessoas jurídicas de direito público e das pessoas jurídicas de direito privado prestadoras de serviços públicos pelos danos causados por seus agentes é disciplinada nos seguintes termos pelo art. 37, §6º, da Constituição da República:
As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa.
A responsabilidade é, pois, objetiva com base na teoria do risco administrativo.
Noutras palavras, a responsabilização independe da presença de culpa, manifestada no agir imprudente, imperito ou negligente em relação a um dever objetivo de cuidado, sendo suficiente a constatação (i) da ação administrativa, (ii) do nexo de causalidade e (iii) do dano.
Contudo, na hipótese de uma omissão por parte da administração, a despeito de notórias divergências no âmbito doutrinário, a jurisprudência, a partir da interpretação da teoria francesa da faute du service, se consolidou no sentido de que a responsabilidade é subjetiva, hipótese em, além daqueles elementos, a responsabilização da administração exigirá, ainda, o reconhecimento do agir negligente. Nesse sentido:
PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. VIOLAÇÃO DOS ARTIGOS 131, 165 e 458, II, DO CPC CONFIGURADA. APLICAÇÃO DA TEORIA DA RESPONSABILIDADE CIVIL SUBJETIVA. OMISSÃO DO PODER PÚBLICO. PLEITO DE DANOS MATERIAIS E MORAIS. MORTE DE FUNCIONÁRIO EM HOSPITAL PÚBLICO. FATO PRESUMÍVEL. ONUS PROBANDI. 1.É cediço no Tribunal que: "ADMINISTRATIVO - RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO - ATO OMISSIVO - MORTE DE PORTADOR DE DEFICIÊNCIA MENTAL INTERNADO EM HOSPITAL PSIQUIÁTRICO DO ESTADO. 1. A responsabilidade civil que se imputa ao Estado por ato danoso de seus prepostos é objetiva (art. 37, § 6º, CF), impondo-lhe o dever de indenizar se se verificar dano ao patrimônio de outrem e nexo causal entre o dano e o comportamento do preposto. 2. Somente se afasta a responsabilidade se o evento danoso resultar de caso fortuito ou força maior ou decorrer de culpa da vítima. 3. Em se tratando de ato omissivo, embora esteja a doutrina dividida entre as correntes dos adeptos da responsabilidade objetiva e aqueles que adotam a responsabilidade subjetiva, prevalece na jurisprudência a teoria subjetiva do ato omissivo, de modo a só ser possível indenização quando houver culpa do preposto. 4. Falta no dever de vigilância em hospital psiquiátrico, com fuga e suicídio posterior do paciente. 5. Incidência de indenização por danos morais. 6. Recurso especial provido. (REsp 602102/RS; Relatora Ministra ELIANA CALMON DJ 21.02.2005 ); "RECURSO ESPECIAL. ASSALTO À INSTITUIÇÃO BANCÁRIA. MORTE DA VÍTIMA. INDENIZAÇÃO. NÃO-CONFIGURAÇÃO DE CASO FORTUITO OU DE FORÇA MAIOR. PREVISIBILIDADE. RECURSO ESPECIAL PROVIDO. 1. Cuida-se de recurso especial (fls. 351/357) interposto por FÁTIMA TERESINHA SEMELER e OUTROS com fulcro no art. 105, III, alínea "c", da Constituição Federal de 1988, em face de acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul que, em sede de apelação, por unanimidade de votos, restou assim ementado (fl. 337): "Apelação cível. Reexame necessário. Responsabilidade civil. Ação indenizatória por dano moral. Assalto à mão armada. Agência bancária. Falecimento do esposo/pai dos autores. Primeiro apelo. Ausência de nexo de causalidade entre o evento danoso e a conduta do réu, considerando que o roubo à mão armada corresponde à força maior, excludente de responsabilidade. Ao exame do caso concreto, verifica-se que não houve falha de segurança, sendo questão de fato que não restou comprovada, sendo esse ônus dos autores, que alegaram o fato. Segundo apelo, para majorar o valor da indenização, que resta prejudicado, em face da improcedência do pedido. Primeiro apelo provido. Segundo apelo prejudicado. sentença modificada em reexame necessário." 2. Em sede de recurso especial alega-se a necessidade de reforma do acórdão e restabelecimento da sentença, pois, conforme o entendimento deste STJ, é obrigação da instituição bancária no caso de morte por assalto, devendo ser afastada a afirmativa de caso fortuito e de força maior. 3. Restando incontroverso nos autos a ocorrência de assalto em agência bancária, que resultou na morte do genitor dos autores da ação indenizatória e, evidente a total ausência de oferecimento, pela instituição Financeira, das mínimas condições de segurança aos seus clientes, afigura-se inafastável o dever de indenizar pelo Estado do Rio Grande do Sul (sucessor da extinta Caixa Econômica Estadual). In casu, o único guarda armado omitiu-se no cumprimento do dever que lhe era afeto, correndo a esconder-se no banheiro enquanto que o Gerente fugia pela porta dos fundos, deixando seus subordinados e os clientes completamente entregues à própria sorte. 4. Descabido, ainda, o argumento de que houve força maior a ensejar a exclusão da responsabilidade do recorrente. Em diversos precedentes deste Pretório, restou assentada a orientação de que, em razão da previsibilidade, o roubo não caracteriza hipótese de força maior,capaz de elidir o nexo de causalidade, indispensável à configuração do dever indenizatório. 5. Recurso especial provido."(REsp 787124 / RS ; Relator Ministro JOSÉ DELGADO DJ 22.05.2006 ). 2. In casu, restou incontroverso que o referido estabelecimento hospitalar restou invadido em outras ocasiões com morte de 7 (sete)pessoas, caracterizando-se a culpa ensejadora da responsabilidade por omissão. 3. Recurso provido para acolher o pedido inicial. (STJ. Resp. 738833/RJ. 1ª Turma. Rel. Min. Luiz Fux. DJ 08/08/2006).
ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. VIOLAÇÃO DO ART. 535 DO CPC. ALEGAÇÃO GENÉRICA. SÚMULA 284/STF. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. OMISSÃO. NEXO DE CAUSALIDADE. DANOS MORAIS E MATERIAIS. REEXAME DE FATOS E PROVAS. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA 7/STJ. 1. A alegação genérica de violação do artigo 535 do Código de Processo Civil, sem explicitar os pontos em que teria sido omisso o acórdão recorrido, atrai a aplicação do disposto na Súmula 284/STF. 2. Nos termos da jurisprudência do STJ, a responsabilidade civil do estado por condutas omissivas é subjetiva, sendo necessário, dessa forma, comprovar a negligência na atuação estatal, o dano e o nexo causal entre ambos. 3. O Tribunal de origem, com base no conjunto fático probatório dos autos, expressamente consignou que "restou evidente o nexo de causalidade entre a omissão do ente municipal e o evento danoso". 4. Dessa forma, não há como modificar a premissa fática, pois para tal é indispensável o reexame do contexto fático-probatório dos autos, o que é vedado por esta Corte, pelo óbice da Súmula 7/STJ. Agravo regimental improvido. (AgRg no AREsp 501507/RJ, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA, julgado em 27/05/2014, DJe 02/06/2014)
Importa, ainda, analisar a responsabilidade civil do Estado perante os seus servidores nos casos de acidente em serviço, se seria ela objetiva ou subjetiva.
Entendo que a melhor interpretação é a de que não há razão para excluir a responsabilidade objetiva (art. 37, § 6º) nas hipóteses de acidente de trabalho, para reparação do dano sofrido por servidor público estatutário, da mesma forma que ela é aplicada aos danos sofridos por terceiros, mesmo que aquele esteja garantido pelo regime previdenciário próprio nas questões relativas ao afastamento remunerado e aposentadoria por invalidez, devendo ser indenizados os danos extrapatrimonais e aqueles não abarcados na cobertura previdenciária.
Tal interpretação encontra guarida em precedente do Supremo Tribunal Federal, que expressamente aplica o art. 37, § 6º, da Constituição também aos danos sofridos por servidores:
CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. ACIDENTE DE TRÂNSITO. AGENTE E VÍTIMA: SERVIDORES PÚBLICOS. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO ESTADO: CF, art. 37, § 6º. I. - O entendimento do Supremo Tribunal Federal é no sentido de que descabe ao intérprete fazer distinções quanto ao vocábulo "terceiro" contido no § 6º do art. 37 da Constituição Federal, devendo o Estado responder pelos danos causados por seus agentes qualquer que seja a vítima, servidor público ou não. Precedente. II. - Agravo não provido. (AI 473381 AgR, Relator(a): Min. CARLOS VELLOSO, Segunda Turma, julgado em 20/09/2005, DJ 28-10-2005 PP-00051 EMENT VOL-02211-04 PP-00741) (grifei)
O TRF 4ª Região também já decidiu nesse sentido:
ADMINISTRATIVO. RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA DO ESTADO. INCRA. ACIDENTE EM SERVIÇO SOFRIDO POR SERVIDOR PÚBLICO. DANOS MORAIS E MATERIAIS INDENIZÁVEIS. - A Carta de 1988, seguindo a linha de sua antecessora, estabeleceu como baliza principiológica a responsabilidade objetiva do Estado, adotando a teoria do risco administrativo. Consequência da opção do constituinte pode-se dizer que, de regra os pressupostos dar responsabilidade civil do Estado são: a) ação ou omissão humana; b) dano injusto ou antijurídico sofrido por terceiro; c) nexo de causalidade entre a ação ou omissão e o dano experimentado por terceiro. - Em se tratando de comportamento omissivo, a situação merece enfoque diferenciado. Decorrendo o dano diretamente de conduta omissiva atribuída a agente público, pode-se falar em responsabilidade objetiva. Decorrendo o dano, todavia, de ato de terceiro ou mesmo de evento natural, a responsabilidade do Estado de regra, assume natureza subjetiva, a depender de comprovação de culpa, ao menos anônima, atribuível ao aparelho estatal. De fato, nessas condições, se o Estado não agiu, e o dano não emerge diretamente deste não agir, de rigor não foi, em princípio, seja natural, seja normativamente, o causador do dano. - Não cabe ao intérprete fazer distinções quanto ao vocábulo "terceiro" contido no § 6º do art. 37 da Constituição Federal, devendo o Estado responder pelos danos causados por seus agentes qualquer que seja a vítima, servidor público ou não. Precedente do STF. - Hipótese na qual estão presentes todos os pressupostos necessários para imputar ao INCRA a responsabilidade civil objetiva pela reparação dos danos - materiais e morais - causados ao autor. - No que toca à indenização por danos morais, o quantum indenizatório deve ser definido atendendo critérios de moderação, prudência e às peculiaridades do caso, inclusive à repercussão econômica da indenização, que deve apenas reparar o dano e não representar enriquecimento sem causa ao lesado. (TRF4, APELREEX 5039366-95.2013.404.7100, Terceira Turma, Relator p/ Acórdão Ricardo Teixeira do Valle Pereira, juntado aos autos em 16/10/2015) (grifei)
Portanto, o presente caso deve ser analisa sob o enfoque da responsabilidade objetiva do Estado.
Não obstante, faz-se necessário que a responsabilidade, mesmo objetivada, tenha como pressuposto um dano que seja consequência direta e imediata da ação ou omissão administrativa, conforme a teoria do dano direto e imediato, adotada no art. 403 do CC/02.
In casu, não há dúvida de que os danos alegados pelo autor estão diretamente relacionados ao acidente de trabalho, uma vez que o perito judicial concluiu que a limitação física do autor é decorrente do alegado acidente de trabalho, conforme excerto do laudo abaixo transcrito (Evento 107, LAUDO1):
2.3. Dano Moral
A indenização por dano moral, assegurada pela Constituição de 1988, é aquela que representa uma compensação, ainda que pequena, pela tristeza e dor injustamente infligidas à pessoa contra quem foi cometido o ato ilícito. E, para evitar abusos, conforme recomenda o civilista paranaense Clayton Reis, só se deve reputar como dano moral a "lesão que atinge os valores físicos e espirituais, a honra, nossas ideologias, a paz íntima, a vida nos seus múltiplos aspectos, a personalidade da pessoa, enfim, aquela que afeta de forma profunda não os bens patrimoniais, mas que causa fissuras no âmago do ser, perturbando a paz de que todos nós necessitamos para nos conduzir de forma equilibrada nos tortuosos caminhos da existência".
O dano moral é subespécie da espécie denominada dano extrapatrimonial. O tratamento do dano moral, em nosso ordenamento, é dado, entre outros, pelos artigos 1º, I, e 5º, V e X, da Constituição Federal; artigo 6º, VI e VII, da Lei nº 8.078/90; e pelo artigo 17 c.c. artigo 201, V, VIII e IX, da Lei nº 8.069/90. E a natureza do dano moral pode ser tanto objetiva, quando o dano afeta a dimensão moral da pessoa no ambiente social em que vive (imagem), como subjetiva, quando diz respeito ao sofrimento psíquico da vítima.
No caso dos autos, o dano moral restou evidenciado, pois o autor sofreu ferimentos de razoável gravidade, com necessidade de internamento e realização de cirurgias, o que ocasionou o afastamento do trabalho por 07 meses, fatos que certamente geraram grande tensão e transtornos no dia a dia do autor, ultrapassando a barreira do mero dissabor.
Ademais, o dano moral decorrente do abalo gerado pelos transtornos e lesões decorrentes do acidente automobilístico é considerado in re ipsa, não necessitando da prova do prejuízo, que é presumido e decorre do próprio fato. Nesse sentido:
ADMINISTRATIVO. CIVIL. RESPONSABILIDADE CIVIL. ACIDENTE DE TRÂNSITO EM RODOVIA FEDERAL. LEGITIMIDADE DO DNIT. DESCABIMENTO DA DENUNCIAÇÃO DA EMPREITEIRA QUE FAZIA CONSERVAÇÃO DA RODOVIA. RESPONSABILIDADE SUBJETIVA. OBRAS NA PISTA. CONDIÇÕES PRECÁRIAS. INSUFICIÊNCIA DE SINALIZAÇÃO. culpa concorrente. DANOS MATERIAIS E MORAIS CONFIGURADOS. 1. A jurisprudência pátria tem assentado a possibilidade jurídica do pagamento de indenização decorrente de acidente de trânsito ocorrido em rodovia federal quando demonstrada a ação ou omissão imputável ao ente público no tocante à conservação e sinalização da rodovia, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa (nos termos do art. 37, §6º, CF/88). 2. Possue legitimidade, tanto o Departamento Nacional de Infra-Estrutura de Transportes - DNIT (responsável pela conservação das rodovias federais e pelos danos causados a terceiros, em razão de sua má conservação), como a União Federal, para figurar no pólo passivo da demanda onde se postula indenização por danos decorrentes de acidente automobilístico causado pela presença de animal na pista de rolamento. 3. Desnecessária para a garantia da lide de regresso a admissão da empreiteira que faz a manutenção da rodovia, 4. O pedido de indenização sofrido em virtude de acidente na rodovia federal não pode ser analisado sob o prisma da responsabilidade objetiva do Estado, pois não imputada a prática de uma ação por parte dos entes estatais. Tendo em vista a alegada omissão da união (DNIT) em promover a devida sinalização da rodovia, o feito deve ser julgado segundo a teoria da responsabilidade subjetiva, sendo imprescindível a comprovação da culpa no evento danoso. 5. Hipótese em que verificada a culpa concorrente: do DNIT por deficiência de sinalização e do motorista por imperícia. 6. Quanto ao dano extrapatrimonial, presumível o abalo moral sofrido pelo apelante pela situação vivida, cujas consequências vão além de meros transtornos, uma vez que, além de ter passado por momento de tensão, teve transtornos no seu dia a dia em decorrência do acidente. 7. Na quantificação do dano moral devem ser sopesadas as circunstâncias e peculiaridades do caso, as cond ições econômicas das partes, a menor ou maior compreensão do ilícito, a repercussão do fato e a eventual participação do ofendido para configuração do evento danoso. A indenização deve ser arbitrada em valor que se revele suficiente a desestimular a prática reiterada da prestação de serviço defeituosa e ainda evitar o enriquecimento sem causa da parte que sofre o dano. 8. Firma-se, por ora, o direito à incidência de juros e correção monetária, postergando-se para o processo de execução a definição dos índices aplicáveis, estabelecendo-se, apenas, que o percentual de juros e o índice de correção monetária para o caso sub judice deverão ser aqueles constantes da legislação em vigor em cada período em que ocorreu a mora da fazenda pública. 9. Sucumbência recíproca. (TRF4, AC 5003864-89.2013.4.04.7005, QUARTA TURMA, Relator LUÍS ALBERTO D'AZEVEDO AURVALLE, juntado aos autos em 30/09/2015)
ADMINISTRATIVO. ACIDENTE DE TRÂNSITO. RESPONSABILIDADE POR OMISSÃO DO DNIT E DA EMPRESA CONTRATADA PELO PODER PÚBLICO, DENUNCIADA À LIDE. DANOS MATERIAIS. DANOS MORAIS. DANOS ESTÉTICOS. 1. Discute-se, nesta ação ordinária, a responsabilização do DNIT e do Consórcio Restaura Rodovias pelos danos causados ao autor, após acidente automobilístico em rodovia federal, supostamente ocasionado por defeito na pista, acompanhado de sinalização deficiente. 2. A teor do art. 70, III, do CPC, é cabível a denunciação à lide daquele que estiver obrigado, pela lei ou pelo contrato, a indenizar, em ação regressiva, o prejuízo do que perder a demanda, como em indenização por acidente de trânsito ocorrido em função de ato de negligência ou imperícia da empresa contratada pelo Poder Público e que opera nesta condição. Nesse passo, a empresa Consórcio Restaura Rodovia, denunciada à lide, foi contratada pelo DNIT para conservação e preservação da Rodovia BR116/RS e BR253 no segmento da ação, o que já justifica a procedência da denunciação à lide e, via de conseqüência, a responsabilidade da empresa pela conservação da estrada. 3. Adotou-se, no Brasil, no que concerne às entidades de direito público, a responsabilidade objetiva com fulcro na teoria do risco administrativo, sem, todavia, adotar a posição extremada dos adeptos da teoria do risco integral, em que o ente público responderia sempre, mesmo presentes as excludentes da obrigação de indenizar, como a culpa exclusiva da vítima ou de terceiro e o caso fortuito e a força maior. De acordo com esta teoria, para que haja o dever de indenizar é irrelevante a culpa na conduta do agente, bastando o nexo de causalidade entre fato e dano. Contudo, nos casos de ato omissivo da Administração, doutrina e jurisprudência têm defendido que a responsabilidade civil do Estado passa a ser subjetiva, sendo necessária, assim, a presença também do elemento subjetivo (dolo ou culpa) para sua caracterização, em uma de suas três vertentes - a negligência, a imperícia ou a imprudência - não sendo, entretanto, necessário individualizá-la, dado que pode ser atribuída ao serviço público, de forma genérica, a falta do serviço. Assim, a responsabilidade do Estado por condutas omissivas encontra fundamento na teoria da falta do serviço (faute du service), segundo a qual o ente estatal só deve ser responsabilizado, em casos de omissão, quando o serviço público não funciona, funciona mal ou funciona tardiamente. 4. O dano moral decorrente do abalo gerado pelos transtornos e das lesões decorrentes do acidente é considerado in re ipsa, isto é, não se faz necessária a prova do prejuízo, que é presumido e decorre do próprio fato. 5. No que diz respeito à quantificação dos danos morais, a indenização deve levar em consideração as circunstâncias e peculiaridades do caso, as condições econômicas das partes, a menor ou maior compreensão do ilícito, a repercussão do fato e a eventual participação do ofendido para configuração do evento danoso. Assume, ainda, o caráter pedagógico, devendo ser arbitrada em valor que represente punição ao infrator, suficiente a desestimulá-lo à prática de novas condutas ilícitas. Por outro lado, deve observar certa moderação, a fim de evitar a perspectiva de lucro fácil. Nesse sentido, para o arbitramento da indenização advinda do dano moral, o julgador deve se valer do bom senso e da razoabilidade, atendendo às peculiaridades do caso, não podendo ser fixado quantum que torne irrisória a condenação e nem tampouco valor demasiado que traduza o enriquecimento ilícito. Deve-se, então, agir com cautela, fazem o com que o valor, de certa forma, amenize as nefastas conseqüências sofridas pela vítima, punindo na medida certa aquele responsável pelo dano. 6. Quanto ao dano estético, vale transcrever o teor da Súmula 387 do STJ: "É lícita a cumulação das indenizações de dano estético e dano moral". (TRF4, AC 5002347-21.2014.4.04.7100, TERCEIRA TURMA, Relatora SALISE MONTEIRO SANCHOTENE, juntado aos autos em 14/05/2015)
Por outro lado, considero não caracterizado o dano moral em razão do indeferimento das férias.
Entendo que não houve qualquer ilícito na conduta União, que indeferiu o requerimento administrativo por considerar, com arrimo em norma legal (observância do princípio da legalidade), não ser possível a acumulação das férias para o exercício seguinte em decorrência do afastamento por licença médica.
A Administração Pública é norteada pelos princípios da legalidade, impessoalidade, publicidade e eficiência, e, desde que não viole esses princípios, tem o poder-dever de rever seus atos e anulá-los acaso entenda eivados de irregularidades.
O simples indeferimento administrativo (prerrogativa da Administração Pública), não é suficiente, de per si, para caracterizar o evento danoso neste ponto, não restando comprovada nenhuma lesão que demonstre o abalo sofrido pelo autor, inexistindo justa causa ao pretenso pagamento de indenização por dano moral em razão do indeferimento das férias.
Do valor da indenização
O Código Civil prevê, em seu artigo 944, que a indenização mede-se pela extensão do dano.
Uma vez comprovado o dano moral, sua fixação deve ser analisada pelo magistrado levando-se conta a individualidade do caso em concreto, observando-se o princípio da razoabilidade, sem exageros, a fim de evitar, por um lado, o empobrecimento desproporcional do causador do dano e, de outro, o enriquecimento sem causa da respectiva vítima.
Assim, adoto como critérios: a) condições pessoais do ofendido e do ofensor; b) intensidade do dolo ou grau de culpa; c) intensidade, extensão do dano moral e gravidade dos efeitos; d) caráter de amenizar a dor sofrida pela vítima; e) eventual ocorrência de culpa recíproca; f) imposição de gravame ao ofensor que o eduque para que não mais repita a agressão; g) impedir que a indenização pelo dano moral transforme o Poder Judiciário em "indústria do enriquecimento pela indenização".
No caso, a extensão dos danos morais sofridos pelo autor em consequência do evento danoso foram moderadas. Assim, tendo em vista as circunstâncias em que o dano ocorreu, a situação patrimonial do autor, entendo que ele não faz jus à importância pretendida na inicial (R$50.000,00).
Em virtude dessas razões, considerando o grau de lesividade dos danos sofridos pelos autores, fixo o valor da indenização em R$ 15.000,00.
Entendo que esse valor é justo, razoável e suficiente para indenizar os autores pelo abalo de sua honra subjetiva, nos quadrantes do caso concreto, sem dar causa a um enriquecimento indevido, mas com força significativa para penalizar o réu, prevenindo a reiteração da conduta em situações semelhantes.
O valor da condenação por danos morais deve ser corrigido monetariamente, a partir desta data (momento em que se torna líquida a condenação) pelo IPCA-E (no RE 870947, o STF declarou a inconstitucionalidade da TR), mais juros de mora simples equivalentes aos aplicáveis aos depósitos de poupança, incidentes desde o evento danoso.
2.4. Dano estético
Requer o autor indenização pelos danos estéticos decorrentes do acidente.
Primeiramente, registre-se que eventuais questionamentos acerca da possibilidade da cumulação entre dano moral e dano estético foram superadas com a edição da Súmula 387 pelo STJ:
É lícita a cumulação das indenizações de dano estético e dano moral.
Feita essa consideração, passo à apreciação do pedido.
Embora não haja óbice à cumulação do pedido de indenização dos danos morais com danos estéticos, cumpre destacar que estes últimos devem se referir ao prejuízo decorrente da perda, deformação ou diminuição funcional dos órgãos ou membros em virtude de lesão corporal ao indivíduo.
Para que seja indenizado o dano estético, é imprescindível a ocorrência de deformidade aparente e aferível de imediato, de modo a causar constrangimento que influencie negativamente na convivência social da vítima.
No caso em específico, a parte autora ficou com algumas cicatrizes no tornozelo esquerdo, decorrentes do procedimento cirúrgico para estabilização das fraturas, as quais, entretanto, conforme se verifica das fotos juntadas aos autos (Evento 29, FOTO2), não são esteticamente exageradas ou repugnantes, muito menos capazes de causar constrangimentos negativos à convivência social do autor, mesmo porque sua atividade laboral não está relacionada à exposição da imagem do próprio corpo.
Pedido improcedente.
(...)
2.6. Danos materiais
Pretende o autor, ainda, a condenação da União a pagar as despesas com futuro e indispensável tratamento médico.
Tal pretensão envolve, evidentemente, reparação por dano material, o qual deve ser efetivamente comprovado, sendo impossível estabelecer condenação com base em danos que a parte possa a vir experimentar futuramente.
De qualquer modo, observo que o autor já foi reabilitado para o trabalho, sendo as respectivas despesas médicas custeadas União, mediante assistência médica indireta, a qual o autor faz jus na condição de servidor público federal.
Pedido improcedente.
(...)
Pois bem.
2. A parte autora requer seja majorado o valor arbitrado à título de danos morais, bem como o pagamento de indenização referente ao indeferimento da concessão de férias e danos estéticos.
No que concerne à quantificação dos danos morais, cabe destacar que a lei não fixa parâmetros exatos para a valoração do quantum indenizatório, razão pela qual o juízo deve se valer do seu "prudente arbítrio", guiado pelos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, em análise caso a caso, com base no artigo 944 do Código Civil:
Art. 944. A indenização mede-se pela extensão do dano.
Parágrafo único. Se houver excessiva desproporção entre a gravidade da culpa e o dano, poderá o juiz reduzir, eqüitativamente, a indenização.
Nesse sentido, para a individualização do valor indenizatório, são consideradas normalmente as circunstâncias do caso concreto, levando em conta fatores pessoais como o meio em que vive, as consequências sociais advindas do fato e a intensidade da lesão psíquica suportada.
O valor fixado pelo juízo de origem levou em conta o grau de lesividade dos danos sofridos e a situação patrimonial do autor.
Cabe ressaltar que o laudo pericial (
) realizado no processo de origem estipulou incapacidade parcial permanente de 20%:ESTABELECIMENTO DE INCAPACIDADE
Ficam estipuladas como sequelas do traumatismo e da fratura a existência de osteoartrose pós-traumática, com consequente dor e limitação parcial da mobilidade do tornozelo e pé.
As sequelas apresentadas têm caráter permanente, sem possibilidade de cura com tratamento médico.
Há quadro de incapacidade parcial devido às sequelas existente. A porcentagem de incapacidade deve levar em consideração a condição física do autor, a profissão exercida e sua demanda física, a perda de mobilidade e dor existente.
A tabela SUSEP, referência para definição de incapacidade acidentária, premia em 20% a anquilose do tornozelo, condição na qual há perda total da mobilidade articular.
No caso do autor há perda de menos de 50% da mobilidade do tornozelo. Entretanto, há perda de 50% da mobilidade subtalar, ou seja, do pé.
Portanto, devido à perda de mobilidade de duas articulações fica estipulada incapacidade parcial permanente de 20%.
Ainda, em resposta aos quesitos da reclamada, assim constou do referido laudo:
3. A lesão acarretou incapacidade total ou parcial, para o trabalho ou outras atividades? Quais atividades?
R: há diminuição parcial da capacidade laborativa, com limitação para corrida, pular, agachar
Tendo em vista a situação econômica do servidor, a extensão do dano sofrido, bem como a possibilidade do autor permanecer no exercício de seu ofício, sem consequências financeiras, não vislumbro a necessidade de majoração do montante fixado pelo juízo de origem.
2.1. Do mesmo modo, quanto ao pedido de indenização por danos estéticos, entendo correta a negativa do juízo de origem, haja vista que, conforme bem pontuado, a indenização por danos estéticos ocorre na presença de deformidade aparente e aferível de imediato, de modo a causar constrangimento que influencie negativamente na convivência social da vítima.
Conforme documentos acostados ao processo originário, o autor não sofreu lesão que caracterize as condições acima citadas.
2.2. Ainda, quanto ao indeferimento do pedido de concessão de férias, também não vislumbro comprovação de abalo sofrido pelo autor que configure a indenização por danos morais, de forma que a Administração Pública indeferiu o pedido em observância ao princípio da legalidade, com respaldo em norma legal na qual está abarcada.
3. A União, por sua vez, sustenta que inexiste justa causa ao pretenso pagamento de indenização por dano moral, tendo em vista que não houve ilícito na conduta da ré e não restou comprovada nenhuma lesão que demonstre o abalo sofrido pelo autor.
Com efeito, malgrado o infortúnio sofrido pelo autor da ação, entendo não restou configurado o dano moral in re ipsa. Em análise dos documentos acostados no processo de origem, não vislumbro anormalidades no procedimento de recuperação do autor que justifiquem a indenização.
Outrossim, o servidor, agente público, permaneceu afastado de suas atividades em decorrência de cirurgia e recuperação, para tanto custeado pelo Estado. Portanto, não se verifica conduta omissiva ou comissiva da União capaz de gerar indenização por danos morais ao autor.
Assim, não verifico dano excepcional que justifique a indenização por danos morais, merecendo provimento o apelo da União.
4. Honorários Advocatícios
O juízo de origem condenou a parte autora ao pagamento de honorários de sucumbência fixados em 10% sobre R$ 67.000,00 (equivalente, aproximadamente, à parte improcedente do pedido), bem como condenou a União ao pagamento de honorários de sucumbência arbitrados em 10% sobre o valor da condenação.
Tendo em vista o provimento da apelação da União, verifica-se a total sucumbência do autor na ação de origem. Assim, afasto os honorários arbitrados à União e fixo os honorários de sucumbência da parte autora no valor de 10% sobre o valor da causa, os quais devem ser majorados em 20%, em razão do improvimento da apelação interposta pela parte autora.
Ante o exposto, voto por dar provimento à apelação da União e negar provimento à apelação do autor.
Documento eletrônico assinado por JOÃO PEDRO GEBRAN NETO, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40004654242v32 e do código CRC 8203b5e9.Informações adicionais da assinatura:
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Apelação Cível Nº 5005387-40.2016.4.04.7003/PR
RELATOR: Desembargador Federal JOÃO PEDRO GEBRAN NETO
EMENTA
APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO FEDERAL. ACIDENTE DE TRABALHO. majoração indevida. danos ESTÉTICOS. não configurado. indeferimento de pedido de férias. danos morais indevidos.
1. A lei não fixa parâmetros exatos para a valoração do quantum indenizatório, razão pela qual o juízo deve se valer do seu "prudente arbítrio", guiado pelos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, em análise caso a caso, com base no artigo 944 do Código Civil:
2. Hipótese em que não há necessidade de majoração do montante indenizatório fixado pelo juízo de origem, tendo em vista a situação econômica do servidor, a extensão do dano sofrido, bem como a possibilidade do autor permanecer no exercício de seu ofício, sem consequências financeiras.
3. Correta a negativa do juízo de origem quanto ao pedido de indenização por danos estéticos, haja vista que a indenização por danos estéticos ocorre na presença de deformidade aparente e aferível de imediato, de modo a causar constrangimento que influencie negativamente na convivência social da vítima, não sendo o caso dos autos.
4. Hipótese em que não se vislumbra a comprovação de abalo sofrido pelo autor que configure a indenização por danos morais em virtude do indeferimento do pedido de concessão de férias. A Administração Pública indeferiu o pedido em observância ao princípio da legalidade, com respaldo em norma legal na qual está abarcada.
5. Hipótese em que o servidor, agente público, permaneceu afastado de suas atividades em decorrência de cirurgia e recuperação, para tanto custeado pelo Estado. Não se verifica conduta omissiva ou comissiva da União capaz de gerar indenização por danos morais ao autor.
6. Apelação cível da União provida e apelação do autor desprovida.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 12ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, dar provimento à apelação da União e negar provimento à apelação do autor, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Curitiba, 18 de setembro de 2024.
Documento eletrônico assinado por JOÃO PEDRO GEBRAN NETO, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40004654243v6 e do código CRC 66e685e3.Informações adicionais da assinatura:
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO PRESENCIAL DE 18/09/2024
Apelação Cível Nº 5005387-40.2016.4.04.7003/PR
RELATOR: Desembargador Federal JOÃO PEDRO GEBRAN NETO
PRESIDENTE: Desembargador Federal LUIZ ANTONIO BONAT
PROCURADOR(A): MAURICIO GOTARDO GERUM
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Presencial do dia 18/09/2024, na sequência 58, disponibilizada no DE de 09/09/2024.
Certifico que a 12ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 12ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DA UNIÃO E NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DO AUTOR.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal JOÃO PEDRO GEBRAN NETO
Votante: Desembargador Federal JOÃO PEDRO GEBRAN NETO
Votante: Desembargador Federal LUIZ ANTONIO BONAT
Votante: Juíza Federal ANA BEATRIZ VIEIRA DA LUZ PALUMBO
SUZANA ROESSING
Secretária
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