
Apelação Cível Nº 5002810-38.2020.4.04.7104/RS
RELATORA: Juíza Federal ANA RAQUEL PINTO DE LIMA
RELATÓRIO
Trata-se de apelação interposta pelo INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS contra sentença proferida nos autos do Procedimento Comum nº 50028103820204047104, a qual julgou parcialmente procedentes os pedidos da parte autora, nos seguintes termos:
DISPOSITIVO
Em face do exposto, resolvo o mérito com base no art. 487, I, do CPC, julgando parcialmente procedente o pedido autoral, para os fins de:
a) reconhecer e computar em favor da parte autora os períodos de 01/08/1991 a 15/08/1996, de 18/08/1997 a 30/06/2012 e de 01/07/2012 a 08/08/2019, como laborados em condições especiais;
b) condenar a parte requerida a conceder, em favor da parte requerente, o benefício da aposentadoria especial, desde a data de entrada do requerimento administrativo (30/10/2019), ficando ciente a parte autora da vedação do seu retorno, após a implantação efetiva do benefício, a qualquer atividade laborativa que a exponha aos agentes prejudiciais à saúde ou à integridade física (Tema 709 do STF):
Dados para o cumprimento
| (x) CONCESSÃO () RESTABELECIMENTO ( ) REVISÃO |
NB | 192.933.494-7 |
ESPÉCIE | aposentadoria especial |
DIB | 30/10/2019 |
DIP | 01/11/2020 |
DCB | - |
RMI | a apurar |
c) facultar a parte autora a opção pela aposentadoria por tempo de contribuição, também requerida e para a qual preencheu os requisitos, a contar da DER, nos termos da fundamentação acima;
c) condenar o INSS ao pagamento das prestações vencidas e vincendas, corrigidas e acrescidas de juros de mora, nos termos da fundamentação.
Sem custas, na forma do art. 4º, I, da Lei nº 9.289/96.
Condeno, ainda, a parte ré ao pagamento de honorários advocatícios sucumbenciais, tendo por base de cálculo o valor devido à parte autora até a data da sentença, bem como eventual montante declarado inexigível (Súmulas 111 do STJ e 76 do TRF4), nos termos da fundamentação.
Sentença sem remessa necessária, tendo em vista que a condenação é inferior a 1.000 (mil) salários mínimos (CPC, art. 496, § 3º).
Havendo interposição de recurso, intime-se a parte contrária para apresentação de contrarrazões, nos termos do artigo 1.010, § 1º, do CPC.
Juntadas as respectivas contrarrazões e não havendo sido suscitadas as questões referidas no §1º do artigo 1.009 do CPC, remetam-se os autos ao Tribunal Regional Federal da 4ª Região.
Caso suscitada alguma das questões referidas no §1º do artigo 1.009 do CPC, intime-se o recorrente para manifestar-se, no prazo previsto no §2º do mesmo dispositivo.
Intimem-se.
Em suas razões, a parte apelante argumenta, em síntese, que o agente físico frio não é mais considerado como insalubre para fins previdenciários, ainda que na seara trabalhista dê direito a adicionais remuneratórios. Ademais, alega que a exposição ao frio intenso, quando era cabível o enquadramento normativo, deveria ser habitual e permanente, fato que não teria sido comprovado pelo apelado. Portanto, requer o afastamento do reconhecimento da especialidade do período de 01/08/1991 a 15/08/1996. (
).A parte apelada apresentou contrarrazões (
), tendo sido os autos, na sequência, remetidos a este Tribunal.É o relatório.
VOTO
Inicialmente, destaca-se que o presente processo foi redistribuído no âmbito da 11ª Turma em 10-8-2022, por força da Resolução TRF4 nº 208/2022.
Cinge-se a controvérsia a reconhecimento de insalubridade do agente físico frio para fins previdenciários no período de 01/08/1991 a 15/08/1996.
A sentença ora recorrida foi redigida nas seguintes linhas (
):SENTENÇA
RELATÓRIO
A parte autora postula concessão de aposentadoria especial, em 30/10/2019, sob o nº 42/192.933.494-7, mediante o reconhecimento de atividade especial nos períodos de 01/08/1991 a 15/08/1996, 18/08/1997 a 30/06/2012, e de 01/07/2012 a 08/08/2019. Subsidiariamente, requer a concessão de aposentadoria por tempo de contribuição, e a reafirmação da DER, caso não tenha adimplido os requisitos necessários à concessão do benefício na data do requerimento.
Foi recebida a petição inicial, deferido o benefício da justiça gratuita e determinada a citação (E3).
O processo administrativo foi juntado aos autos no evento 8 dos autos.
O INSS apresentou contestação requerendo a improcedência do pedido (E11).
Não houve réplica, tendo a parte autora postulado a produção de novas provas no evento 14.
Tudo cumprido, vieram, os autos, conclusos para sentença (E23).
É o relatório. Decido.
PRELIMINAR
Prejudicial de Mérito - Prescrição
Em relação aos benefícios previdenciários de prestação continuada, consagrou-se, tanto na doutrina quanto na jurisprudência, o entendimento no sentido de que, face o caráter continuativo da dívida, a prescrição não atinge o fundo do direito, mas tão-somente as parcelas vencidas há mais de cinco anos do ajuizamento da demanda, nos termos do parágrafo único do art. 103 da Lei nº 8.213/91.
Assim, considerando a data em que ação foi ajuizada (14/04/2020 14:04:26), estão prescritas as parcelas vencidas anteriores a um lustro desta, nos termos da Súmula 85 STJ. Considerando a DER en 30/10/2019, afasto, portanto, a preliminar alegada.
MÉRITO
Da atividade especial
De acordo com o entendimento jurisprudencial dominante, a análise de tempo especial deve ser realizada de acordo com a legislação vigente a época em que a atividade foi prestada e não quando do pedido de aposentadoria.
Assim, na verificação da atividade especial devem ser considerados os seguintes parâmetros:
1) somente é admissível a conversão de atividade especial em comum, sendo vedada a conversão de atividade comum em especial, nos termos do § 5º do art. 57 da Lei n 8.213/91, eis que a Lei nº 9.032/95 passou a vedar essa conversão. Desde então, o deferimento de aposentadoria especial reclama que todo o período seja especial. Possuindo o segurando tempo de serviço especial e tempo de serviço comum, transforma-se todo o período em comum;
2) até a vigência da Lei 9.032/95 (28.04.1995) é possível a caracterização da atividade especial pela categoria profissional do segurado, existindo a presunção da presença de agentes nocivos. Ou, no caso de presença de agentes nocivos, verificava-se se o agente descrito no formulário da empresa constava dos anexos dos Decretos n° 53.831/64 e 83.080/79. A prova da exposição ao agente nocivo poderá ser realizada por qualquer meio, exceto para ruído e calor quando será necessária a apresentação de laudo técnico, ainda que emitido pela empregadora;
3) após a Lei 9.032/95 (29.04.1995) até 05.03.97 (primeiro dia anterior a vigência do Decreto 2.172/97), exige-se a demonstração efetiva de exposição, de forma permanente, não ocasional nem intermitente, a agentes prejudiciais à saúde ou à integridade física. A prova da exposição poderá ser feita por qualquer meio de prova (exceto ruído e calor), considerando-se suficiente a apresentação de formulário padrão emitido pela empresa, sem exigência de embasamento em laudo técnico;
4) a partir de 06.03.97 (data que entrou em vigor o Decreto 2.172/97), o enquadramento da atividade como especial exige a comprovação da efetiva exposição aos agentes nocivos de forma habitual e permanente, não ocasional nem intermitente, por meio de laudo técnico ou por meio de perícia técnica;
5) é possível a conversão da atividade especial em comum mesmo após a vigência da Lei 9.711/98, em razão da flagrante inconstitucionalidade da não-utilização de critérios diferenciados para o trabalhador exposto a condições notoriamente insalubres, perigosas e penosas. Este, inclusive, é o entendimento aplicado na via administrativa pelo INSS;
6) no que tange ao ruído, devem ser considerados como especiais os períodos em que haja exposição habitual e permanente a níveis superiores a: a) 80 dB(A), até 04/03/1997, nos termos do Decreto nº 53.831/64 e 83.080/79; b) 90 dB(A), de 05/03/1997 a 18/11/2003, nos termos do Decreto nº 2.172/97; c) 85 dB(A), a partir de 19/11/2003, nos termos do Decreto nº 4.882/03;
7) no que concerne à utilização de EPI, o Supremo Tribunal Federal fixou, no julgamento do Recurso Extraordinário com Agravo nº 664335, prolatado em 04/12/2014, com repercussão geral reconhecida, o entendimento de que “(...) se o Equipamento de Proteção Individual (EPI) for realmente capaz de neutralizar a nocividade, não haverá respaldo à concessão constitucional de aposentadoria especial”, exceto no caso do ruído, em que a Corte fixou a tese de que “na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), no sentido da eficácia do Equipamento de Proteção Individual (EPI), não descaracteriza o tempo de serviço especial para a aposentadoria”;
8) em se tratando de agente químico, a avaliação deve ser qualitativa, mostrando-se desnecessário apontar no laudo a sua quantidade (TRF4 5005626-67.2014.404.7115, SEXTA TURMA, Relator (AUXILIO JOÃO BATISTA) JOSÉ LUIS LUVIZETTO TERRA, juntado aos autos em 22/05/2017);
9) no caso da exposição a hidrocarbonetos, deve ser esclarecido que o fornecimento e até mesmo o uso de creme protetor de segurança e luva para proteção contra óleos e graxa são equipamentos destinados apenas à proteção das mãos e dos braços, promovendo tão somente proteção cutânea. O mesmo se diga quanto aos óculos de proteção e guardapó. Ocorre que a exposição do trabalhador a hidrocarbonetos aromáticos causa danos ao organismo que vão além de patologias cutâneas, pois "o contato com esses agentes (graxas, óleos minerais, hidrocarbonetos aromáticos, combustíveis, solventes, inseticidas, etc.) é responsável por frequentes dermatoses profissionais, com potencialidade de ocasionar afecções inflamatórias e até câncer cutâneo em número significativo de pessoas expostas, em razão da ação irritante da pele, com atuação paulatina e cumulativa, bem como irritação e dano nas vias respiratórias quando inalados e até efeitos neurológicos, quando absorvidos e distribuídos através da circulação do sangue no organismo. Isto para não mencionar problemas hepáticos, pulmonares e renais" (TRF4, APELREEX 0002033-15.2009.404.7108, Sexta Turma, Relator Celso Kipper, D.E. 12/07/2011);
10) considerando os diplomas legislativos que tratam da atividade especial, a apreciação será feita em observância dos seguintes marcos: a) Decreto 53.831/64 até 24.01.79; b) Decreto 83.080/79 até 05/03/97; c) Decreto nº 2.172/97 até 05.05.99; d) Decreto nº 3.048/99 a partir de então;
11) os laudos elaborados em empresas de atividade similar somente serão considerados ocorrendo as seguintes hipóteses: a) comprovada a extinção da empresa; b) comprovada a inexistência de laudo elaborado pela empregadora, mesmo que mais recente ao período em que foram realizadas as atividades pela parte autora; e c) impossibilidade ou recusa de fornecimento de laudo pela empregadora;
12) laudo realizado por profissional contratado pela parte autora de forma unilateral não possui força probatória;
13) em se tratando de homem que requereu benefício na vigência da Lei nº 8.213/91, o fator de conversão da atividade especial para comum é 1,4 para homens e 1,2 para mulheres.
Do caso concreto:
Passo à análise da especialidade do labor nos períodos de 01/08/1991 a 15/08/1996, 18/08/1997 a 30/06/2012, e de 01/07/2012 a 08/08/2019 (pedidos descritos na alínea "c" da inicial).
1. Machado e Filipin Ltda (Ofélia M. Machado e Cia Ltda):
O autor laborou na referida empresa o período de 01/08/1991 a 15/08/1996 (Ctps Evento 1, PROCADM8, Página 12).
Segundo o formulário (Evento 8, PROCADM1, Página 29), no citado período o autor desenvolveu a função de encarregado de expedição, no setor de expedição, executando as seguintes tarefas:
“recepcionam, conferem e armazenam os produtos e materiais no depósito e câmara fria. Distribuem produtos e materiais a serem expedidos. Organizam o depósito para facilitar a movimentação dos itens armazenados e a armazenar, preservando o estoque organizado. Realiza a expedição de materiais e produtos, examinando-os, providenciando os despachos dos mesmos e auxiliam no processo de logística”
O formulário está incompleto, pois sem responsável pelos registros ambientais. Contudo, tal falta resta suprida pela apresentação do laudo da empresa (Evento 8, PROCADM1, Página 31). Segundo o laudo, durante o labor havia a exposição ao agente nocivo frio variável entre zero e 10ºC e -5ºC a 0ºC.
No evento 14, a parte autora postulou a complementação da prova, com a juntada de laudo integral da empresa. Contudo, entendo desnecessária tal diligência, pois suficiente o conjunto probatório produzido até então.
De acordo com a prova produzida, constato que no período acima, o autor estava exposto à temperatura inferior a 12ºC, o que qualifica a atividade como especial.
Especificamente em relação ao agente nocivo frio, o código 1.1.2 do quadro anexo do Decreto 53.831, de 1964, e o código 1.1.2 do Anexo I Decreto 83.080, de 1979, prevêem como especial a atividade sujeita a este agente em níveis prejudiciais à saúde (inferiores a 12ºC, segundo a legislação pertinente).
Destaco que, ainda que não estivesse permanentemente exposto a baixas temperaturas, o mero fato de entrar em câmara fria ao longo da jornada laboral é o bastante para caracterizar o tempo especial, nos termos da jurisprudência da TRU da 4ª Região:
PREVIDENCIÁRIO. TEMPO ESPECIAL. FRIO. HABITUALIDADE E PERMANÊNCIA. CONFIGURAÇÃO MEDIANTE ENTRADA E SAÍDA DE CÂMARA FRIA DURANTE A JORNADA DE TRABALHO. PRECEDENTES DA TRU4. 1. 'A constante entrada e saída do trabalhador de câmaras frias, durante a sua jornada de trabalho, não descaracteriza a permanência exigida para o enquadramento de atividade especial pelo frio, agente agressivo previsto no item 1.1.2 dos Decretos 53.831/64 e 83.080/79. (IUJEF nº 2007.70.95.014769-0, Relatora Juíza Federal Luciane Merlin Cleve Kravetz). 2. Incidente provido. (5016669-80.2013.404.7100, Turma Regional de Uniformização da 4ª Região, Relator p/ Acórdão Antonio Fernando Schenkel do Amaral e Silva, D.E. 07/10/2013)
DIREITO PREVIDENCIÁRIO. RECONHECIMENTO DE TEMPO ESPECIAL. EXPOSIÇÃO AO AGENTE FRIO. NÃO-PERMANÊNCIA. IRRELEVÂNCIA. ENTRADA E SAÍDA DE CÂMARAS FRIAS. COMPROVAÇÃO DA HABITUALIDADE. INCIDENTE DE UNIFORMIZAÇÃO PROVIDO. 1. Na análise do pedido de reconhecimento de labor em condições especiais com base na exposição do segurado ao agente frio, é suficiente a comprovação da habitualidade da exposição, ou seja, que havia a entrada e a saída das câmaras frias todos os dias. Mostra-se irrelevante o fato de o segurado não ficar exposto permanentemente ao referido agente, porque a alternância brusca de temperatura ambiente causa tanto ou ainda mais mal à saúde do que a própria permanência em locais muito frios. 2. Precedente da TRU: IUJEF 2007.70.95.014769-0/PR, julgado em 13-2-2009, relatado pela Juíza Federal Luciane Merlin Clève Kravetz. 3. Incidente de Uniformização provido. (INCIDENTE DE UNIFORMIZAÇÃO JEF Nº 0002713-72.2008.404.7257/SC, Juíza Federal JOANE UNFER CALDERARO, D.E. 17/04/2012)
Por fim, destaca-se que a NR - 15, Anexo IX, prevê a caracterização da insalubridade nas atividades que envolvam acesso a câmaras frias. In verbis:
As atividades ou operações executadas no interior de câmaras frigoríficas, ou em locais que apresentem condições similares, que exponham os trabalhadores ao frio, sem a proteção adequada, serão consideradas insalubres em decorrência de laudo de inspeção realizada no local de trabalho.
Assim, cabível o enquadramento da atividade especial nos intervalos objeto da controvérsia, uma vez que o autor encontrava-se exposto a alternância de temperatura decorrente do trabalho em câmera fria.
2. Frangosul SA Agro Avícola Industrial/JBS Aves LTDA
O autor laborou na referida empresa e sua sucessora, em dois períodos:
2.a) Período de 18/08/1997 a 30/06/2012:
No citado período o autor laborou na emprea Frangosul S/A Agro Avícola Industrial (Evento 1, PROCADM8, Página 12). Segundo o formulário da empresa (Evento 1, PROCADM8, Página 25), no referido período o autor laborou junto ao setor de evisceração IF, na função de auxiliar de inspeção, estando exposto a ruído de 97,68 e calor de 29,2 ºC.
2.b) Período de 01/07/2012 a 08/08/2019:
Segundo o formulário da empresa (Evento 1, PROCADM8, Página 26), no citado período o autor laborou na empresa JBS Aves Ltda, na função de auxiliar de inspeção federal no setor de inspeção federal (01/06/2016 a 30/04/2013), e no setor de sala de cortes-fileteadoras, na função de supervisor de produção (período de 01/05/2013 a 08/08/2019), estando exposto, em ambas funções e setores, a ruído superior a 85 dB(A) e calor.
Verifico, portanto, que nos períodos acima, de 18/08/1997 a 30/06/2012 e de 01/07/2012 a 08/08/2019, o autor laborou com exposição ao agente nocivo ruído, em níveis superiores ao limite legal.
No que pertine ao ruído, cumpre tecer algumas considerações acerca do método NHO 01 da Fundacentro.
Quando o trabalhador, durante uma jornada de 8 horas de trabalho, está exposto a diferentes níveis de pressão sonora, com picos de ruído em alguns momentos, é preciso buscar a dose de exposição diária e, posteriormente, calcular o Nível de Exposição Normalizado (NEN). É o que dispõe o artigo 280 da IN 77, de 21/01/2015.
Art. 280. A exposição ocupacional a ruído dará ensejo à caracterização de atividade exercida em condições especiais quando os níveis de pressão sonora estiverem acima de oitenta dB (A),noventa dB (A) ou 85 (oitenta e cinco) dB (A), conforme o caso,observado o seguinte:
I - até 5 de março de 1997, véspera da publicação do Decretonº 2.172, de 1997, será efetuado o enquadramento quando a exposição for superior a oitenta dB (A), devendo ser informados os valores medidos;
II - de 6 de março de 1997, data da publicação do Decreto nº2.172, de 1997, até 10 de outubro de 2001, véspera da publicação da Instrução Normativa INSS/DC nº 57, de 10 de outubro de 2001, será efetuado o enquadramento quando a exposição for superior a noventadB (A), devendo ser informados os valores medidos;
III - de 11 de outubro de 2001, data da publicação da Instrução Normativa nº 57, de 2001, até 18 de novembro de 2003,véspera da publicação do Decreto nº 4.882, de 18 de novembro de2003, será efetuado o enquadramento quando a exposição for superiora noventa dB (A), devendo ser anexado o histograma ou memória de cálculos; e
IV - a partir de 01 de janeiro de 2004, será efetuado o enquadramento quando o Nível de Exposição Normalizado - NEN se situar acima de 85 (oitenta e cinco) dB (A) ou for ultrapassada a dose unitária, conforme NHO 1 da FUNDACENTRO, sendo facultado à empresa a sua utilização a partir de 19 de novembro de 2003, data da publicação do Decreto nº 4.882, de 2003, aplicando: (grifo nosso)
a) os limites de tolerância definidos no Quadro do Anexo Ida NR-15 do MTE; e
b) as metodologias e os procedimentos definidos nas NHO-01da FUNDACENTRO.
Chamo atenção, contudo, para o fato de que no normativo supra consta "sendo facultado à empresa a sua utilização a partir de 19 de novembro de 2003". Ou seja, a medição conforme NHO 1 da FUNDACENTRO não é obrigatória.
Assim, tenho que no caso concreto, o fato de não constar nos PPPs as medições conforme NHO 1 da FUNDACENTRO não invalida sua utilização para comprovação da exposição a ruído, sendo possível considerar o ruído apontado nos formulários como aquele a que a parte autora esteve efetivamente exposta durante toda a sua jornada de trabalho.
É possível, assim, o reconhecimento da especialidade pela exposição ao ruído nos períodos de 18/08/1997 a 30/06/2012 e de 01/07/2012 a 08/08/2019, porquanto ocorreu exposição a níveis superiores aos limites legais dos períodos, nos termos dos itens "6" e "7" da fundamentação.
Contagem de tempo de contribuição e da aposentadoria especial
Somando-se o tempo especial reconhecido na presente decisão (tabela abaixo), o autor alcança 27 anos e 06 dias de atividade especial até 30/10/2019 (DER), fazendo jus à concessão de aposentadoria especial nos moldes do artigo 57 da Lei 8.213/91, conforme demonstra a tabela abaixo:
Tempo | Comum |
|
|
|
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Nº | Data Inicial | Data Final | Anos | Meses | Dias |
1 | 01/08/1991 | 15/08/1996 | 5 | - | 15 |
2 | 18/08/1997 | 08/08/2019 | 21 | 11 | 21 |
|
| Total | 27 | 0 | 6 |
|
| Total |
|
| 9.726 |
|
| Total Geral (Comum + Especial) |
|
|
|
A renda da aposentadoria especial equivale a 100% do salário-de-benefício, devendo o cálculo ser feito com base na sistemática da Lei n. 9.876, de 26/11/1999, ou seja, com base na média dos 80% maiores salários-de-contribuição de todo o período contributivo, a partir de julho de 1994, não havendo, contudo, a incidência do fator previdenciário.
Da constitucionalidade do art. 57, § 8º, da Lei nº 8.213/1991.
Cumpridas as exigências do artigo 57 da Lei n.º 8.213/91, indaga-se a respeito da constitucionalidade do seu § 8º, que determina o afastamento definitivo do segurado das atividades que o exponham aos agentes prejudiciais à saúde ou à integridade física previstos nos decretos regulamentadores.
A questão, contudo, não merece maiores digressões, uma vez que o STF, por ocasião do julgamento do Tema 709, cujo acórdão foi publicado em 19/08/2020, entendeu pela constitucionalidade do art. 57, § 8º, da Lei nº 8.213/1991, fixando a seguinte tese:
“I) É constitucional a vedação de continuidade da percepção de aposentadoria especial se o beneficiário permanece laborando em atividade especial ou a ela retorna, seja essa atividade especial aquela que ensejou a aposentação precoce ou não.
II) Nas hipóteses em que o segurado solicitar a aposentadoria e continuar a exercer o labor especial, a data de início do benefício será a data de entrada do requerimento, remontando a esse marco, inclusive, os efeitos financeiros. Efetivada, contudo, seja na via administrativa, seja na judicial, a implantação do benefício, uma vez verificado o retorno ao labor nocivo ou sua continuidade, cessará o benefício previdenciário em questão".
Em razão da declaração de constitucionalidade do § 8º do art. 57 da Lei nº 8.213/1991, portanto, fica a parte autora ciente da impossibilidade de manutenção de qualquer atividade laborativa que a exponha aos agentes prejudiciais à saúde ou à integridade física, após a implantação efetiva do benefício, sob pena de cancelamento da aposentadoria especial, o que deverá ser fiscalizado pelo INSS.
Desse modo, em 30/10/2019 (DER), a parte autora tinha direito à aposentadoria integral por tempo de contribuição (CF/88, art. 201, § 7º, inc. I, com redação dada pela EC 20/98). O cálculo do benefício deve ser feito de acordo com a Lei 9.876/99, com a incidência do fator previdenciário, uma vez que a pontuação totalizada é inferior a 96 pontos (Lei 8.213/91, art. 29-C, inc. I, incluído pela Lei 13.183/2015).
Dessa forma, tendo o autor cumprido os requisitos para os dois benefícios, faculta-se a escolha pelo que lhe for mais favorável.
Da correção monetária e dos juros
Em relação à correção monetária, descarto a aplicação da forma de cálculo preconizada pelo art. 1º-F da Lei nº 9.494/97 em razão do entendimento externado pelo STF ao julgar, conjuntamente, as Ações Diretas de Inconstitucionalidade 4357 e 4425, declarando, por maioria, a inconstitucionalidade "em parte, por arrastamento, do art. 1º-F da Lei nº 9.494, com a redação dada pelo art. 5º da Lei nº 11.960, de 29 de junho de 2009". (ADI 4357, Relator(a): Min. AYRES BRITTO, Relator(a) p/ Acórdão: Min. LUIZ FUX, Tribunal Pleno, julgado em 14/03/2013, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-188 DIVULG 25-09-2014 PUBLIC 26-09-2014)
Portanto, tratando-se de relação jurídica previdenciária, tenho por adotar o INPC para a correção monetária das prestações (indexador expressamente previsto nos artigos 29-B e 41-A da Lei nº 8.213/91).
Quanto aos juros, devem incidir a partir da citação válida, a teor da Súmula 204 da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, nos seguintes parâmetros: a) caso a citação válida tenha ocorrido em data anterior a 30/06/2009, até essa data o percentual aplicável será de 12% ao ano, na esteira da Súmula nº 75 do TRF da 4ª. Região ('Os juros moratórios, nas ações previdenciárias, devem ser fixados em 12% ao ano, a contar da citação'); b) a partir de 01/07/2009, data de vigência da Lei 11.960/2009, o percentual aplicável deverá corresponder ao incidente sobre a caderneta de poupança, observado o regramento da Lei 12.703/2012, tendo em vista que o julgamento pelo STF das Ações Diretas de Inconstitucionalidade 4357 e 4425 não declarou inconstitucionais os regramentos relativos a juros constantes no diploma mencionado. Nesse sentido o AgRg no AgRg no REsp 1427514/RS, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 19/03/2015, DJe 27/03/2015.
Os juros de mora devem ser de forma simples (TRU da 4ª Região, 5007958-33.2011.404.7205, D.E. 04/09/2015) (TNU, PEDILEF 50047098620114047201, DOU 27/06/2014).
Dos honorários sucumbenciais
Condeno, ainda, a parte ré ao pagamento de honorários advocatícios sucumbenciais, tendo por base de cálculo o valor devido à parte autora até a data da sentença, bem como eventual montante declarado inexigível (Súmulas 111 do STJ e 76 do TRF4).
O percentual incidente sobre tal base fica estabelecido no valor mínimo previsto em cada um dos incisos do § 3º do artigo 85 do CPC, a ser aferido em fase de cumprimento, a partir do cálculo dos atrasados, conforme o número de salários mínimos a que estes correspondam até a data da sentença (inciso II do § 4º do artigo 85 do CPC).
Esclareço que se o valor devido à parte autora, por ocasião da sentença, não ultrapassar 200 (duzentos) salários mínimos, os honorários serão de 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação ou do proveito econômico obtido; se for superior a 200 (duzentos) e inferior a 2.000 (dois mil) salários mínimos, os percentuais dos honorários serão de 10% (dez por cento) sobre 200 (duzentos) salários mínimos, acrescido de 8% (oito por cento) sobre o que exceder tal montante; e assim sucessivamente.
DISPOSITIVO
Em face do exposto, resolvo o mérito com base no art. 487, I, do CPC, julgando parcialmente procedente o pedido autoral, para os fins de:
a) reconhecer e computar em favor da parte autora os períodos de 01/08/1991 a 15/08/1996, de 18/08/1997 a 30/06/2012 e de 01/07/2012 a 08/08/2019, como laborados em condições especiais;
b) condenar a parte requerida a conceder, em favor da parte requerente, o benefício da aposentadoria especial, desde a data de entrada do requerimento administrativo (30/10/2019), ficando ciente a parte autora da vedação do seu retorno, após a implantação efetiva do benefício, a qualquer atividade laborativa que a exponha aos agentes prejudiciais à saúde ou à integridade física (Tema 709 do STF):
Dados para o cumprimento
| (x ) CONCESSÃO ( ) RESTABELECIMENTO ( ) REVISÃO |
NB | 192.933.494-7 |
ESPÉCIE | aposentadoria especial |
DIB | 30/10/2019 |
DIP | 01/11/2020 |
DCB | - |
RMI | a apurar |
c) facultar a parte autora a opção pela aposentadoria por tempo de contribuição, também requerida e para a qual preencheu os requisitos, a contar da DER, nos termos da fundamentação acima;
c) condenar o INSS ao pagamento das prestações vencidas e vincendas, corrigidas e acrescidas de juros de mora, nos termos da fundamentação.
Sem custas, na forma do art. 4º, I, da Lei nº 9.289/96.
Condeno, ainda, a parte ré ao pagamento de honorários advocatícios sucumbenciais, tendo por base de cálculo o valor devido à parte autora até a data da sentença, bem como eventual montante declarado inexigível (Súmulas 111 do STJ e 76 do TRF4), nos termos da fundamentação.
Sentença sem remessa necessária, tendo em vista que a condenação é inferior a 1.000 (mil) salários mínimos (CPC, art. 496, § 3º).
Havendo interposição de recurso, intime-se a parte contrária para apresentação de contrarrazões, nos termos do artigo 1.010, § 1º, do CPC.
Juntadas as respectivas contrarrazões e não havendo sido suscitadas as questões referidas no §1º do artigo 1.009 do CPC, remetam-se os autos ao Tribunal Regional Federal da 4ª Região.
Caso suscitada alguma das questões referidas no §1º do artigo 1.009 do CPC, intime-se o recorrente para manifestar-se, no prazo previsto no §2º do mesmo dispositivo.
Intimem-se.
I - Mérito
I.1 - Atividade Especial
Com relação ao reconhecimento das atividades exercidas como especiais, cumpre ressaltar que o tempo de serviço é disciplinado pela lei em vigor à época em que efetivamente exercido, passando a integrar, como direito adquirido, o patrimônio jurídico do trabalhador. Desse modo, uma vez prestado o serviço sob a égide de legislação que o ampara, o segurado adquire o direito à contagem como tal, bem como à comprovação das condições de trabalho na forma então exigida, não se aplicando retroativamente uma lei nova que venha a estabelecer restrições à admissão do tempo de serviço especial.
Tal entendimento foi manifestado pelo Superior Tribunal de Justiça em julgamento de recurso repetitivo já transitado em julgado, que estabeleceu também a possibilidade de conversão de tempo de serviço especial em comum, mesmo após 1998 (REsp 1151363/MG, STJ, 3ª Seção, Rel. Min. Jorge Mussi, DJe de 05.04.2011).
Tendo em vista a diversidade de diplomas legais que se sucederam na disciplina da matéria, faz-se necessário inicialmente definir qual a legislação aplicável ao caso concreto, ou seja, qual a legislação vigente quando da prestação da atividade pela parte autora.
Tem-se, então, a seguinte evolução legislativa quanto ao tema sub judice:
a) no período de trabalho até 28.4.1995, quando vigente a Lei n° 3.807/60 (Lei Orgânica da Previdência Social) e suas alterações e, posteriormente, a Lei nº 8.213/91 (Lei de Benefícios) em sua redação original (artigos 57 e 58), é possível o reconhecimento da especialidade do trabalho quando houver a comprovação do exercício de atividade enquadrável como especial nos decretos regulamentadores e/ou na legislação especial, ou quando demonstrada a sujeição do segurado a agentes nocivos por qualquer meio de prova (exceto para ruído e calor/frio, casos em que sempre será necessária a mensuração dos níveis por meio de perícia técnica, carreada aos autos ou noticiada em formulário emitido pela empresa, a fim de se verificar a nocividade ou não desses agentes). Para o enquadramento das categorias profissionais, devem ser considerados os Decretos nº 53.831/64 (Quadro Anexo - 2ª parte), nº 72.771/73 (Quadro II do Anexo) e nº 83.080/79 (Anexo II);
b) de 29.4.1995 e até 5.3.1997 foi definitivamente extinto o enquadramento por categoria profissional, de modo que, no interregno compreendido entre esta data e 5.3.1997 (período em que vigentes as alterações introduzidas pela Lei nº 9.032/95 no artigo 57 da Lei de Benefícios), é necessária a demonstração de exposição, efetiva, habitual e permanente, a agentes prejudiciais à saúde ou à integridade física, por qualquer meio de prova, considerando-se suficiente, para tanto, a apresentação de formulário-padrão preenchido pela empresa, sem a exigência de embasamento em laudo técnico (com a ressalva dos agentes nocivos ruído e calor/frio, cuja comprovação depende de perícia, como já referido). Para o enquadramento dos agentes nocivos, devem ser considerados os Decretos nº 53.831/64 (Quadro Anexo - 1ª parte), nº 72.771/73 (Quadro I do Anexo) e nº 83.080/79 (Anexo I);
c) a partir de 6.3.1997, quando vigente o Decreto nº 2.172/97, que regulamentou as disposições introduzidas no artigo 58 da Lei de Benefícios pela Medida Provisória nº 1.523/96 (convertida na Lei nº 9.528/97), passou-se a exigir, para fins de reconhecimento de tempo de serviço especial, a comprovação da efetiva sujeição do segurado a agentes agressivos por meio da apresentação de formulário-padrão, embasado em laudo técnico, ou por meio de perícia técnica. Para o enquadramento dos agentes nocivos, devem ser considerado os Decretos nº 2.172/97 (Anexo IV) e nº 3.048/99.
d) a partir de 1.1.2004, o Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP) passou a ser documento indispensável para a análise do período cuja especialidade for postulada (artigo 148 da Instrução Normativa nº 99 do INSS, publicada no DOU de 10-12-2003). Tal documento substituiu os antigos formulários (SB-40, DSS-8030, ou DIRBEN-8030) e, desde que devidamente preenchido, inclusive com a indicação dos profissionais responsáveis pelos registros ambientais e pela monitoração biológica, exime a parte da apresentação do laudo técnico em juízo.
e) a partir de 14.11.2019, na vigência da Emenda Constitucional 103/2019, o tempo de trabalho em atividade especial exercido após essa data pode ser reconhecido somente para fins de concessão de aposentadoria especial, estando vedada a sua conversão em comum para outros benefícios, conforme o artigo 25, § 2º, da EC 103/2019.
Intermitência
A habitualidade e permanência do tempo de trabalho em condições especiais prejudiciais à saúde ou à integridade física (referidas no artigo 57, § 3º, da Lei n° 8.213/91) não pressupõem a exposição contínua ao agente nocivo durante toda a jornada de trabalho. Tal exposição deve ser ínsita ao desenvolvimento das atividades cometidas ao trabalhador, integrada à sua rotina de trabalho, e não de ocorrência eventual ou ocasional. Exegese diversa levaria à inutilidade da norma protetiva, pois em raras atividades a sujeição direta ao agente nocivo se dá durante toda a jornada de trabalho e, em muitas delas, a exposição em tal intensidade seria absolutamente impossível (EINF n.º 0003929-54.2008.404.7003, TRF/4ª Região, 3ª Seção, Rel. Des. Federal Rogério Favreto, D.E. 24.10.2011; EINF n.º 2007.71.00.046688-7, TRF/4ª Região, 3ª Seção, Rel. Des. Federal Celso Kipper, D.E. 7.11.2011).
Ademais, conforme o tipo de atividade, a exposição ao respectivo agente nocivo, ainda que não diuturna, configura atividade apta à concessão de aposentadoria especial, tendo em vista que a intermitência na exposição não reduz os danos ou riscos inerentes à atividade, não sendo razoável que se retire do trabalhador o direito à redução do tempo de serviço para a aposentadoria, deixando-lhe apenas os ônus da atividade perigosa ou insalubre (EINF n° 2005.72.10.000389-1, TRF/4ª Região, 3ª Seção, Rel. Des. Federal João Batista Pinto Silveira, D.E. 18.5.2011; EINF n° 2008.71.99.002246-0, TRF/4ª Região, 3ª Seção, Rel. Des. Federal Luís Alberto D'Azevedo Aurvalle, D.E. 8.1.2010).
I.2 - Frio
O agente nocivo frio estava previsto como insalubre no código 1.1.2 dos quadros anexos aos Decretos nº 53.831/64 e 83.080/79, respectivamente, nos seguintes termos:
1.1.2 | FRIO Operações em locais com temperatura excessivamente baixa, capaz de ser nociva à saúde e proveniente de fontes artificiais. | Trabalhos na indústria do frio - operadores de câmaras frigoríficas e outros. | Insalubre | 25 anos | Jornada normal em locais com temperatura inferior a 12º centígrados. Art. 165 e 187, da CLT e Portaria Ministerial 262, de 6-8-62. |
1.1.2 | FRIO | Câmaras frigoríficas e fabricação de gelo. | 25 anos |
Embora não mais previsto expressamente como agente nocivo nos Decretos nºs 2.172/97 e 3.048/99, o enquadramento da atividade pela exposição ao frio insalubre ainda é possível, e dar-se-á sempre pela verificação da especialidade no caso concreto, através de PPP embasado em laudo técnico, ou mediante perícia nos termos da Súmula nº 198 do extinto TFR.
Nesse sentido:
PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL. ATIVIDADE ESPECIAL. EXPOSIÇÃO AO AGENTE NOCIVO FRIO. DECRETOS 2.172/1997 E 3.048/1999. ROL DE ATIVIDADES E AGENTES NOCIVOS. CARÁTER EXEMPLIFICATIVO. RECONHECIMENTO PELAS INSTÂNCIAS ORDINÁRIAS DE QUE O TRABALHADOR ESTAVA SUBMETIDO DE MANEIRA PERMANENTE AO EXERCÍCIO DE ATIVIDADE NOCIVA. RECURSO ESPECIAL DO INSS A QUE SE NEGA PROVIMENTO. 1. A Primeira Seção desta Corte, no julgamento do 1.306.113/SC, representativo da controvérsia, fixou a orientação de que as normas regulamentadoras que estabelecem os casos de agentes e atividades nocivos à saúde do trabalhador são exemplificativas, podendo ser tido como distinto o labor que a técnica médica e a legislação correlata considerarem como prejudiciais ao obreiro, desde que o trabalho seja permanente, não ocasional, nem intermitente, em condições especiais. 2. De fato, o art. 57 da Lei 8.213/1991 assegura expressamente o direito à aposentadoria especial ao Segurado que exerça sua atividade em condições que coloquem em risco a sua saúde ou a sua integridade física, nos termos dos arts. 201, § 1o. e 202, II da Constituição Federal. Assim, o fato de os decretos não mais contemplarem determinados agentes nocivos não significa que não seja mais possível o reconhecimento da especialidade da atividade, já que todo o ordenamento jurídico, hierarquicamente superior, traz a garantia de proteção à integridade física e saúde do trabalhador. 3. Seguindo essa mesma orientação, é possível reconhecer a possibilidade de caracterização da atividade exposta ao agente nocivo frio, desde que comprovada a exposição do trabalhador à atividade nociva, de forma habitual, não ocasional, nem intermitente. (...) (REsp 1429611/RS, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, 1ª T. DJe 08.08.2018)
Este Tribunal fixou o entendimento de que "A exposição a frio, com temperaturas inferiores a 12ºC, enseja o reconhecimento do tempo de serviço como especial." (APELREEX 0000977-33.2011.404.9999, Rel. Des. Federal Celso Kipper, Sexta Turma, D.E. 13/05/2011). Isso porque, "Comprovada a exposição do segurado a agente nocivo, na forma exigida pela legislação previdenciária aplicável à espécie, possível reconhecer-se a especialidade da atividade laboral por ele exercida. (...) Não havendo mais a previsão do frio como agente nocivo nos Decretos 2.172/97 e 3.048/99, o reconhecimento da especialidade das atividades desempenhadas pelo autor deve ter por base a previsão da Súmula 198 do TFR." (APELREEX 5000856-70.2010.404.7212, Rel. Juiz Federal Paulo Paim da Silva, Sexta Turma, D.E. 22.05.2014).
Outrossim, "A especialidade que caracteriza o trabalho exposto ao frio ocorre apenas em decorrência de fontes artificiais (locais com temperatura inferior a 12º centígrados), mas não em virtude da mera exposição ambiental (ao frio)." (TRF4, AC 5003881-14.2016.4.04.7008, TRS/PR, Rel. Des. Federal Luiz Fernando Wowk Penteado, 31.07.2019).
I.3 - Caso concreto
O INSS impugna o reconhecimento da especialidade do período de 01/08/1991 a 15/08/1996.
O formulário profissiográfico informa o seguinte:
O juízo sentenciante reconheceu a especialidade com base nos seguintes fundamentos:
O autor laborou na referida empresa o período de 01/08/1991 a 15/08/1996 (Ctps Evento 1, PROCADM8, Página 12).
Segundo o formulário (Evento 8, PROCADM1, Página 29), no citado período o autor desenvolveu a função de encarregado de expedição, no setor de expedição, executando as seguintes tarefas:
“recepcionam, conferem e armazenam os produtos e materiais no depósito e câmara fria. Distribuem produtos e materiais a serem expedidos. Organizam o depósito para facilitar a movimentação dos itens armazenados e a armazenar, preservando o estoque organizado. Realiza a expedição de materiais e produtos, examinando-os, providenciando os despachos dos mesmos e auxiliam no processo de logística”
O formulário está incompleto, pois sem responsável pelos registros ambientais. Contudo, tal falta resta suprida pela apresentação do laudo da empresa (Evento 8, PROCADM1, Página 31). Segundo o laudo, durante o labor havia a exposição ao agente nocivo frio variável entre zero e 10ºC e -5ºC a 0ºC.
No evento 14, a parte autora postulou a complementação da prova, com a juntada de laudo integral da empresa. Contudo, entendo desnecessária tal diligência, pois suficiente o conjunto probatório produzido até então.
De acordo com a prova produzida, constato que no período acima, o autor estava exposto à temperatura inferior a 12ºC, o que qualifica a atividade como especial.
Especificamente em relação ao agente nocivo frio, o código 1.1.2 do quadro anexo do Decreto 53.831, de 1964, e o código 1.1.2 do Anexo I Decreto 83.080, de 1979, prevêem como especial a atividade sujeita a este agente em níveis prejudiciais à saúde (inferiores a 12ºC, segundo a legislação pertinente).
Destaco que, ainda que não estivesse permanentemente exposto a baixas temperaturas, o mero fato de entrar em câmara fria ao longo da jornada laboral é o bastante para caracterizar o tempo especial, nos termos da jurisprudência da TRU da 4ª Região:
PREVIDENCIÁRIO. TEMPO ESPECIAL. FRIO. HABITUALIDADE E PERMANÊNCIA. CONFIGURAÇÃO MEDIANTE ENTRADA E SAÍDA DE CÂMARA FRIA DURANTE A JORNADA DE TRABALHO. PRECEDENTES DA TRU4. 1. 'A constante entrada e saída do trabalhador de câmaras frias, durante a sua jornada de trabalho, não descaracteriza a permanência exigida para o enquadramento de atividade especial pelo frio, agente agressivo previsto no item 1.1.2 dos Decretos 53.831/64 e 83.080/79. (IUJEF nº 2007.70.95.014769-0, Relatora Juíza Federal Luciane Merlin Cleve Kravetz). 2. Incidente provido. (5016669-80.2013.404.7100, Turma Regional de Uniformização da 4ª Região, Relator p/ Acórdão Antonio Fernando Schenkel do Amaral e Silva, D.E. 07/10/2013)
DIREITO PREVIDENCIÁRIO. RECONHECIMENTO DE TEMPO ESPECIAL. EXPOSIÇÃO AO AGENTE FRIO. NÃO-PERMANÊNCIA. IRRELEVÂNCIA. ENTRADA E SAÍDA DE CÂMARAS FRIAS. COMPROVAÇÃO DA HABITUALIDADE. INCIDENTE DE UNIFORMIZAÇÃO PROVIDO. 1. Na análise do pedido de reconhecimento de labor em condições especiais com base na exposição do segurado ao agente frio, é suficiente a comprovação da habitualidade da exposição, ou seja, que havia a entrada e a saída das câmaras frias todos os dias. Mostra-se irrelevante o fato de o segurado não ficar exposto permanentemente ao referido agente, porque a alternância brusca de temperatura ambiente causa tanto ou ainda mais mal à saúde do que a própria permanência em locais muito frios. 2. Precedente da TRU: IUJEF 2007.70.95.014769-0/PR, julgado em 13-2-2009, relatado pela Juíza Federal Luciane Merlin Clève Kravetz. 3. Incidente de Uniformização provido. (INCIDENTE DE UNIFORMIZAÇÃO JEF Nº 0002713-72.2008.404.7257/SC, Juíza Federal JOANE UNFER CALDERARO, D.E. 17/04/2012)
Por fim, destaca-se que a NR - 15, Anexo IX, prevê a caracterização da insalubridade nas atividades que envolvam acesso a câmaras frias. In verbis:
As atividades ou operações executadas no interior de câmaras frigoríficas, ou em locais que apresentem condições similares, que exponham os trabalhadores ao frio, sem a proteção adequada, serão consideradas insalubres em decorrência de laudo de inspeção realizada no local de trabalho.
Assim, cabível o enquadramento da atividade especial nos intervalos objeto da controvérsia, uma vez que o autor encontrava-se exposto a alternância de temperatura decorrente do trabalho em câmera fria.
Irresignado, o INSS suscita que o agente físico frio não é mais considerado como insalubre para fins previdenciários, ainda que na seara trabalhista dê direito a adicionais remuneratórios. Ademais, alega que a exposição ao frio intenso, quando era cabível o enquadramento normativo, deveria ser habitual e permanente, fato que não teria sido comprovado pelo apelado.
Pois bem.
Todo o período em análise é anterior a 05/03/1997, de modo que o próprio INSS reconhece o agente frio como hábil a caracterizar a especialidade.
No mais, quanto ao período anterior a 28/04/1995, despicienda a análise da habitualidade e permanência da exposição.
Quanto ao período posterior, no que diz respeito à habitualidade e permanência, deve ser considerada também em razão da constante entrada e saída do trabalhador da câmara fria durante a jornada de trabalho, e não apenas da sua permanência na câmara frigorífica, pois "Considera-se habitual e permanente a exposição ao agente nocivo frio nas atividades em que o segurado trabalha entrando e saindo de câmaras frias, não sendo razoável exigir que a atividade seja desempenhada integralmente em temperaturas abaixo de 12ºC." (TRF4, APELREEX nº 2000.72.05.002294-0, Turma Suplementar, Rel. p/Ac. Des. Federal Luís Alberto D'Azevedo Aurvalle, D.E. 29.08.2008).
No caso, segundo o PPP, eis as funções desempenhadas pelo autor como encarregado de expedição:
Portanto, era ínsita às atividades a entrada e saída de câmara fria, de modo que presentes os requisitos da habitualidade e permanência.
Quanto à temperatura, consta no laudo técnico que haviam duas câmaras refrigeradas: câmara fria na faixa de zero a 10ºC e câmara frigorífico de zero graus a -5ºC.
Assim, tratando de temperatura abaixo de 12º C, o reconhecimento da especialidade é medida que se impõe.
Negado provimento ao recurso do INSS.
II - Conclusões
1. Negado provimento ao recurso do INSS.
2. Desprovida a apelação, e observadas as regras do artigo 85, §§2º, 3º e 11, do CPC, elevo em 1% (um por cento) o percentual estabelecido pela sentença para fins de estipulação da verba honorária, devida ao procurador da parte que se viu vencedora na demanda, mantida a respectiva base de cálculo, conforme balizas traçadas pelo STJ (EDcl no AgInt no REsp 1573573).
3. Considerando que há vínculo empregatício ativo (
) e diante da necessidade de afastamento do exercício de atividades nocivas na hipótese de opção pela implantação da aposentadoria especial, deixo de conceder tutela específica.
III - Prequestionamento
Em face do disposto nas Súmulas 282 e 356 do Supremo Tribunal Federal e 98 do Superior Tribunal de Justiça, e a fim de viabilizar o acesso às instâncias superiores, explicito que a presente decisão não contraria nem nega vigência às disposições legais/constitucionais prequestionadas pelas partes.
IV - Dispositivo
Ante o exposto, voto por negar provimento ao recurso, nos termos da fundamentação.
Documento eletrônico assinado por ANA RAQUEL PINTO DE LIMA, Juíza Federal Convocada, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40004685299v10 e do código CRC bd89a30e.Informações adicionais da assinatura:
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Apelação Cível Nº 5002810-38.2020.4.04.7104/RS
RELATORA: Juíza Federal ANA RAQUEL PINTO DE LIMA
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA ESPECIAl. Atividade especial. agentes nocivos. reconhecimento. conversão. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.
1. A lei em vigor quando da prestação dos serviços define a configuração do tempo como especial ou comum, o qual passa a integrar o patrimônio jurídico do trabalhador, como direito adquirido.
2. Até 28.4.1995 é admissível o reconhecimento da especialidade do trabalho por categoria profissional; a partir de 29.4.1995 é necessária a demonstração da efetiva exposição, de forma não ocasional nem intermitente, a agentes prejudiciais à saúde, por qualquer meio de prova; a contar de 06.5.1997 a comprovação deve ser feita por formulário-padrão embasado em laudo técnico ou por perícia técnica.
3. O enquadramento da atividade especial pela exposição do trabalhador ao frio, em temperaturas inferiores a 12ºC, provenientes de fontes artificiais, é possível mediante a comprovação da especialidade no caso concreto, através de PPP embasado em laudo técnico, ou mediante prova pericial nos termos da Súmula nº 198 do extinto TFR.
4. No que diz respeito à habitualidade e permanência, deve ser considerada também em razão da constante entrada e saída do trabalhador da câmara fria durante a jornada de trabalho, e não apenas da sua permanência na câmara frigorífica, pois "Considera-se habitual e permanente a exposição ao agente nocivo frio nas atividades em que o segurado trabalha entrando e saindo de câmaras frias, não sendo razoável exigir que a atividade seja desempenhada integralmente em temperaturas abaixo de 12ºC." (TRF4, APELREEX nº 2000.72.05.002294-0, Turma Suplementar, Rel. p/Ac. Des. Federal Luís Alberto D'Azevedo Aurvalle, D.E. 29.08.2008).
5. Desprovida a apelação, e observadas as regras do artigo 85, §§2º, 3º e 11, do CPC, elevo em 1% (um por cento) o percentual estabelecido pela sentença para fins de estipulação da verba honorária, devida ao procurador da parte que se viu vencedora na demanda, mantida a respectiva base de cálculo, conforme balizas traçadas pelo STJ (EDcl no AgInt no REsp 1573573).
6. Considerando que há vínculo empregatício ativo e diante da necessidade de afastamento do exercício de atividades nocivas na hipótese de opção pela implantação da aposentadoria especial, deixo de conceder tutela específica.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 11ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, negar provimento ao recurso, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Florianópolis, 23 de outubro de 2024.
Documento eletrônico assinado por ANA RAQUEL PINTO DE LIMA, Juíza Federal Convocada, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40004685300v4 e do código CRC 6fbe5f03.Informações adicionais da assinatura:
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 16/10/2024 A 23/10/2024
Apelação Cível Nº 5002810-38.2020.4.04.7104/RS
RELATORA: Juíza Federal ANA RAQUEL PINTO DE LIMA
PRESIDENTE: Desembargadora Federal ANA CRISTINA FERRO BLASI
PROCURADOR(A): MAURICIO GOTARDO GERUM
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 16/10/2024, às 00:00, a 23/10/2024, às 16:00, na sequência 34, disponibilizada no DE de 07/10/2024.
Certifico que a 11ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 11ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO.
RELATORA DO ACÓRDÃO: Juíza Federal ANA RAQUEL PINTO DE LIMA
Votante: Juíza Federal ANA RAQUEL PINTO DE LIMA
Votante: Desembargadora Federal ANA CRISTINA FERRO BLASI
Votante: Desembargadora Federal ELIANA PAGGIARIN MARINHO
LIGIA FUHRMANN GONCALVES DE OLIVEIRA
Secretária
Conferência de autenticidade emitida em 12/12/2024 19:52:19.
Identificações de pessoas físicas foram ocultadas