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PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA ESPECIAL. INTERESSE RECURSAL. MÉRITO. ATIVIDADE ESPECIAL. AGENTES NOCIVOS. RECONHECIMENTO. CONVERSÃO. RECURSO DA PARTE AUTORA N...

Data da publicação: 12/12/2024, 22:24:21

PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA ESPECIAL. INTERESSE RECURSAL. MÉRITO. ATIVIDADE ESPECIAL. AGENTES NOCIVOS. RECONHECIMENTO. CONVERSÃO. RECURSO DA PARTE AUTORA NÃO CONHECIDO. RECURSO DO INSS CONHECIDO E DESPROVIDO. 1. Ausente interesse recursal, ainda que por agente nocivo diverso, o pedido de reconhecimento da especialidade dos período de 05/04/1992 a 04/05/2017, eis que já reconhecido na sentença. Recurso da parte autora não conhecido. 2. A lei em vigor quando da prestação dos serviços define a configuração do tempo como especial ou comum, o qual passa a integrar o patrimônio jurídico do trabalhador, como direito adquirido. 3. Até 28.4.1995 é admissível o reconhecimento da especialidade do trabalho por categoria profissional; a partir de 29.4.1995 é necessária a demonstração da efetiva exposição, de forma não ocasional nem intermitente, a agentes prejudiciais à saúde, por qualquer meio de prova; a contar de 06.5.1997 a comprovação deve ser feita por formulário-padrão embasado em laudo técnico ou por perícia técnica. 4. Considera-se como especial a atividade em que o segurado esteve exposto a ruídos superiores a 80 decibéis até a data de 5.3.1997, por conta do enquadramento previsto nos Decretos 53.831/64 e 83.080/79. Com a edição do Decreto 2.172/97, o limite passou a ser 90 decibéis, sendo reduzido para 85 decibéis, a contar de 19.11.2003, consoante previsto no Decreto 4.882/2003. O Supremo Tribunal Federal, no julgamento do ARE 664.335, fixou o entendimento de que: 1) o direito à aposentadoria especial pressupõe a efetiva exposição do trabalhador a agente nocivo à sua saúde, de modo que, se o EPI for realmente capaz de neutralizar a nocividade não haverá respaldo constitucional à aposentadoria especial; 2) na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador, no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), no sentido da eficácia do Equipamento de Proteção Individual (EPI), não descaracteriza o tempo de serviço especial para aposentadoria. 5. Na aferição do agente ruído, deve-se aceitar também a metodologia prevista na NR-15 e não somente a da NHO-01, quando aquela indica exposição acima dos limites legais, pois, comparativamente, a NHO-01 é mais benéfica ao trabalhador. Ademais, o nível de ruído foi aferido pela técnica da dosimetria, de modo que é resultado de exposições habituais e permanentes, que já projeta a média ponderada para uma jornada de 08 horas diárias de labor. 6. A partir de 03.12.1998 as disposições trabalhistas concernentes à caracterização de atividades ou operações insalubres (NR-15) - com os respectivos conceitos de 'limites de tolerância', 'concentração', 'natureza' e 'tempo de exposição ao agente' passam a influir na caracterização da natureza da atividade (se especial ou comum). Conforme o Anexo nº 5 da NR nº 15 do MTE, Nas atividades ou operações onde trabalhadores possam ser expostos a radiações ionizantes, os limites de tolerância (...) são os constantes da Norma CNEN-NE-3.01. A Norma CNEN-NE-3.01, referente a diretrizes básicas de proteção radiológica, da Comissão Nacional de Energia Nuclear, estabelece limites de doses anuais máximos de exposição anual para indivíduo ocupacionalmente exposto (e não mínimos, de tolerância). A Norma Regulamentadora nº 32, de segurança e saúde no trabalho em serviços de saúde, orienta os trabalhadores, quanto às radiações ionizantes, à permanência no menor tempo possível para a realização de procedimentos, bem como estar sob monitoração individual de dose de radiação ionizante. Cuidando-se de agente nocivo cancerígeno para humanos, a prova da exposição ao agente (qualitativa) dá ensejo ao reconhecimento da atividade especial, qualquer que seja o nível de concentração no ambiente de trabalho do segurado. 7. Desprovida a apelação do INSS, e observadas as regras do artigo 85, §§2º, 3º e 11, do CPC, elevo em 1% (um por cento) o percentual estabelecido pela sentença para fins de estipulação da verba honorária, devida ao procurador da parte que se viu vencedora na demanda, mantida a respectiva base de cálculo, conforme balizas traçadas pelo STJ (EDcl no AgInt no REsp 1573573). 8. Determinada a imediata implantação do benefício, valendo-se da tutela específica da obrigação de fazer prevista no artigo 461 do Código de Processo Civil de 1973, bem como nos artigos 497, 536 e parágrafos e 537, do Código de Processo Civil de 2015, independentemente de requerimento expresso por parte do segurado ou beneficiário. (TRF4, AC 5000011-36.2018.4.04.7025, 11ª Turma, Relator ANA RAQUEL PINTO DE LIMA, julgado em 23/10/2024)

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5000011-36.2018.4.04.7025/PR

RELATORA: Juíza Federal ANA RAQUEL PINTO DE LIMA

RELATÓRIO

Trata-se de apelação interposta por J. C. L. e INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS contra sentença proferida nos autos do Procedimento Comum nº 50000113620184047025, a qual julgou procedentes os pedidos da parte autora, nos seguintes termos:

III - Dispositivo

Ante o exposto, julgo procedentes os pedidos, resolvendo o mérito, nos termos do artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil, para declarar incidentalmente a inconstitucionalidade do §8º do art. 57 da Lei nº 8.213/1991 e, reconhecendo o direito, condenar o Instituto Nacional do Seguro Social a:

a) averbar em favor da parte autora o período de atividade especial de 05/04/1992 a 04/05/2017;

b) conceder à parte autora o benefício de aposentadoria especial, com DIB em 04/05/2017 (DER);

c) pagar em favor da parte autora as prestações vencidas, a contar da data de entrada requerimento administrativo (04/05/2017), acrescidas de correção monetária a partir do vencimento de cada prestação e de juros de mora, a contar da citação, nos termos da fundamentação da sentença.

Condeno o INSS ao pagamento dos honorários advocatícios, os quais fixo em 10% sobre o valor da condenação, nos termos do §3º do artigo 85 do Código de Processo Civil, observado o disposto no §4º, inciso II, deste mesmo diploma, consideradas as parcelas vencidas até a data da prolação desta sentença (Súmula 111 do STJ).

Sem custa ao INSS, em face da isenção legal prevista no artigo 4º, inciso I, da Lei 9.289/1996.

Sentença não sujeita ao reexame necessário, observado o disposto no artigo 496, §3º, inciso I, do Código de Processo Civil.

Havendo interposição de recurso de apelação, intime-se a parte adversa para contrarrazões no prazo legal. Em seguida, remetam-se os autos ao Egrégio Tribunal Regional Federal da 4ª Região, observado o disposto no artigo 1.010, §3º, do Código de Processo Civil.

Transitada em julgada a presente decisão, intime-se a AADJ para averbar o período de atividade especial reconhecido na sentença e implantar o benefício em favor da parte autora no prazo de 20 (vinte) dias (itens "a" e "b" do dispositivo). Sem prejuízo, intime-se o Setor de Cálculos do INSS para que, no prazo de 30 (trinta) dias, apresente os cálculos referentes à concessão, nos termos do item "b" do dispositivo. Por fim, intimada a parte autora dos cálculos, cumpra-se o item "c" também do dispositivo da sentença.

Publicada e registrada eletronicamente. Intimem-se.

Em suas razões, o INSS impugna o reconhecimento da especialidade dos períodos de 05/04/1992 a 04/05/2017, por exposição à periculosidade potencial e radiação ionizante, e no período de 19/11/2003 a 04/05/2017, por exposição a ruído. Sustenta que a periculosidade não pode ser enquadrada como agente caracterizador de especialidade, que não é possível o enquadramento por radiação não ionizante a partir de 06/03/1997, que o PPP não informa níveis de exposição e que não foi utilizada a metodologia NEN para a aferição de ruído. (evento 68, APELAÇÃO1)

Em suas razões, a parte autora sustenta que deve ser reconhecida a especialidade do período de 05/04/1992 a 04/05/2017 também pela exposição ao inflamável Gás Liquefeito de Petróleo (GLP). (evento 69, APELAÇÃO1)

A parte autora apresentou contrarrazões (evento 76, CONTRAZAP1), tendo sido os autos, na sequência, remetidos a este Tribunal.

É o relatório.

VOTO

Inicialmente, destaca-se que o presente processo foi redistribuído no âmbito da 11ª Turma em 10-8-2022, por força da Resolução TRF4 nº 208/2022.

Cinge-se a controvérsia a reconhecimento de especialidade.

A sentença ora recorrida foi redigida nas seguintes linhas (evento 55, SENT1):

I - Relatório

Trata-se de ação ordinária ajuizada por J. C. L. , em que postula a concessão de aposentadoria especial, com o reconhecimento de período laborado em condições prejudiciais à saúde, de 05/04/1992 a 04/05/2017. Sucessivamente, caso não acolhido o pedido de concessão de aposentadoria especial, o autor requer a conversão da atividade especial em comum aplicando-se o fator multiplicador 1,4, com a concessão da jubilação por tempo de contribuição. Nas duas situações pede a refirmação da DER, se necessário. Requer, ainda, no caso de concessão de aposentadoria especial, a declaração de inconstitucionalidade do §8º do artigo 57 da Lei 8.213/1991.

Emenda à inicial ao evento 3.

Juntado laudo pericial pelo autor ao evento 6.

Esclarecimentos prestados pela empresa com a juntada de laudos ao evento 13.

Juntados processos administrativos com os extratos de contagem ao evento 19.

Ao contestar a pretensão inicial, a autarquia previdenciária alegou que o pedido do autor não se encontra amparado em provas contundentes do exercício de atividade especial, não havendo ainda no PPP informação quanto à técnica utilizada (evento 24).

Impugnação à contestação no evento 27, em que foram corroboradas as alegações dispostas na exordial.

Juntado novo laudo pericial pelo autor ao evento 32.

Novos esclarecimentos prestados pela empregadora ao evento 41.

Novo laudo pericial juntado pelo autor ao evento 47.

Ao evento 51 o INSS sustentou a impossibilidade de utilização das perícias realizadas em reclamatórias trabalhistas, destacando a sua não participação em referidos processos judiciais.

É o relatório. Decido.

II - Fundamentação

II.a) Da atividade especial

1. A aposentadoria especial, disciplinada nos artigos 57 e 58 da Lei 8.213/1991, é espécie de aposentadoria por tempo de serviço, com redução deste, diante das condições diferenciadas sob as quais o trabalho é prestado, expondo os segurados a agentes nocivos à sua saúde ou a riscos à sua integridade física. Presume a lei a impossibilidade do desempenho de tais atividades pelo mesmo período das outras atividades profissionais.

Possibilita-se, assim, àqueles que tenham laborado em atividades especiais e em atividades comuns, a conversão do tempo de serviço especial para o comum, mesmo se relativo a períodos posteriores a 28/05/1998.

Acerca da questão, no julgamento do Recurso Especial 956.110-SP (Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, DJ 22/10/2007 p. 367), a Quinta Turma do STJ assentou que a norma infraconstitucional não pode estabelecer limite temporal ao direito assegurado expressamente no art. 201, § 1.º, da Constituição Federal aos trabalhadores que laboraram sujeitos a condições nocivas à saúde ou à integridade física.

Atualmente, o próprio Regulamento da Previdência Social, no art. 70 do Decreto 3.048/1999, alterado pelo Decreto 4.827, de 3 de setembro de 2003, admite a conversão do tempo de serviço especial para comum em qualquer período, havendo também a Turma Nacional de Uniformização dos Juizados Especiais Federais, em sessão realizada no dia 27/03/2009, revogado o enunciado 16 de sua súmula, que vedava a conversão do período de atividade especial em comum em período posterior a 28/05/1998 (processo 2004.61.84.00.5712-5).

A orientação do Supremo Tribunal Federal, manifestada no RE 174.150-3-RJ no sentido de que "pela lei vigente à época de sua prestação, qualifica-se o tempo de serviço do funcionário público, sem a aplicação retroativa de norma ulterior que nesse sentido não haja disposto" (rel. Min. Octávio Gallotti, DJ 18/08/2000), implica o resguardo da segurança e da confiança daqueles que tinham o direito à aposentadoria especial por se enquadrarem em determinada categoria. É o princípio do tempus regit actum, adotado nesta decisão.

2. Cabe, ainda, analisar a maneira de comprovação da exposição aos agentes nocivos, tendo em vista a mudança na legislação.

De acordo com a legislação vigente até 28/04/1995 (Lei 9.032/1995), bastava que a atividade exercida pelo segurado estivesse enquadrada legalmente como especial, sem a necessidade de comprovação por meio de laudos periciais ou formulários padrão. Paralelamente, nos casos em que a atividade não estivesse elencada no rol legal, era permitida a conversão do tempo de serviço laborado sob condições especiais ou mesmo a aposentadoria por tempo de serviço especial, desde que a atividade fosse comprovada por laudo pericial idôneo. Nesse sentido a Súmula 198 do antigo Tribunal Federal de Recursos: "Atendidos os demais requisitos, é devida aposentadoria especial se perícia judicial constata que a atividade exercida pelo segurado é perigosa, insalubre ou penosa, mesmo não inscrita em Regulamento".

Essas regras vigoraram até a edição da Lei 9.032, que, alterando os artigos supracitados, passou a exigir, além da previsão legal da atividade, a demonstração da efetiva exposição a agentes nocivos químicos, físicos e biológicos, de forma habitual e permanente.

Posteriormente, adveio nova alteração legislativa, com a edição da Medida Provisória 1.523, de 13/10/1996, convertida na Lei 9.528/1997, que, inovando a redação do art. 58 da Lei 8.213/1991, acrescentou a exigência de laudo técnico pericial para a elaboração de formulário DSS 8030 (antiga SB 40), a fim de comprovar a condição nociva da atividade. Todavia, restou pacificado pelo Superior Tribunal de Justiça que somente é exigida a comprovação da atividade especial por laudo técnico a partir da regulamentação da Medida Provisória 1.523/1996, que ocorreu pelo Decreto 2.172 de 05.03.1997 (Resp. 518.554, 5ª Turma, Rel. Min. Gilson Dipp, DJ 24.11.2003).

A partir de então, os Laudos Técnicos das Condições Ambientais do Trabalho - LTCAT ou Programas de Prevenção de Riscos Ambientais - PPRA são os instrumentos adequados a demonstrar as condições de trabalho vivenciadas pelos trabalhadores, ainda que sejam extemporâneos aos períodos controvertidos, conforme entendimento consolidado na súmula 68 da TNU (O laudo pericial não contemporâneo ao período trabalhado é apto à comprovação da atividade especial do segurado).

De fato, se, apesar das inovações tecnológicas e da maior rigidez quanto à medicina e segurança do trabalho, houve a exposição a agentes nocivos, é possível concluir que no período anterior a exposição dava-se ao menos no mesmo nível (ou até em maior intensidade). Nesse sentido:

PREVIDENCIÁRIO. ATIVIDADE ESPECIAL. CONVERSÃO DO TEMPO ESPECIAL EM COMUM. PERÍCIA POR SIMILARIDADE. LAUDO EXTEMPORÂNEO. MAJORAÇÃO DE RMI DE APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO.
1. Uma vez exercida atividade enquadrável como especial, sob a égide da legislação que a ampara, o segurado adquire o direito ao reconhecimento como tal e ao acréscimo decorrente da sua conversão em comum.
2. Constando dos autos a prova necessária a demonstrar o exercício de atividade sujeita a condições especiais, conforme a legislação vigente na data da prestação do trabalho, deve ser reconhecido o respectivo tempo de serviço e majorada a aposentadoria por tempo de contribuição proporcional do segurado, para aposentadoria integral - regras permanentes.
3. A perícia técnica deve ser realizada de forma indireta, em empresa similar àquela em que laborou o segurado, quando não há meio de reconstituir as condições físicas do local de trabalho em face do encerramento das suas atividades.
4. Se em data posterior ao labor despendido foi constatada a presença de agentes nocivos, mesmo com as inovações tecnológicas e de medicina e segurança do trabalho que advieram com o passar do tempo, depreende-se que, na época do labor, a agressão dos agentes era ao menos igual, senão maior, em razão da escassez de recursos materiais existentes até então para atenuar sua nocividade e a evolução dos equipamentos utilizados no desempenho de suas tarefas.
(TRF4, APELREEX 5066304-98.2011.404.7100, Sexta turma, Relator p/ Acórdão João Batista Pinto Silveira, juntado aos autos em 22/03/2012, grifou-se)

Ressalte-se que a ausência de qualquer informação no PPP sobre mudanças nas condições gerais de trabalho da empresa já é prova suficiente de que elas não existiram ou não foram substanciais, consoante entendimento uniformizado pela TRU da 4º Região: "...não se pode afastar a validade do laudo pericial existente para comprovar a insalubridade tanto de período pretérito como de período futuro, até a data da realização de novo laudo, presumindo-se a manutenção das condições gerais de trabalho da empresa no caso de ausência de informação expressa no formulário acerca de mudanças significativas no lay out ou no maquinário, o que, todavia, admite prova em contrário a cargo do INSS" (Incidente de Uniformização JEF Nº 5006405-44.2012.404.7001/PR).

Cumpre salientar, ademais, que, havendo contradição entre as informações presentes nos elementos de prova carreados aos autos, como são os laudos técnicos os responsáveis por instruir o preenchimento dos formulários previdenciários, e não o contrário, apenas aqueles estão aptos a definir se nos períodos controvertidos foi, ou não, desenvolvida atividade prejudicial à saúde.

3. No que diz respeito ao uso de equipamento de proteção individual ou coletiva pelo segurado, a legislação do trabalho prevê que sua a utilização visa a evitar o risco de acidentes ou de doenças profissionais ou do trabalho.

Neste ponto, dispõem os artigos 190 e 191 da CLT acerca das atividades e operações insalubres e das normas sobre os critérios de caracterização da insalubridade, os limites de tolerância aos agentes agressivos, meios de proteção e o tempo máximo de exposição do empregado a esses agentes. Também sobre a eliminação ou a neutralização da insalubridade com a adoção de medidas que conservem o ambiente de trabalho dentro dos limites de tolerância, e com a utilização de equipamentos de proteção individual ao trabalhador, que diminuam a intensidade do agente agressivo a limites de tolerância.

O ordenamento jurídico deve ser entendido como um sistema de normas não-contraditórias e que devem ser harmonizadas pelo intérprete, no intuito de se obter soluções igualitárias. Assim, quando ocorre de ramos distintos do Direito (como o Direito Previdenciário e o Direito do Trabalho) lidarem com a mesma problemática, deve o aplicador do direito enfrentar a questão da influência recíproca no tratamento legislativo dos temas e das soluções.

Há de se entender, portanto, que se o Direito do Trabalho preconiza a neutralização da insalubridade, tendo esta (a neutralização) por caracterizada quando adotadas medidas que conservem o ambiente de trabalho dentro dos limites de tolerância, ou ainda quando houver a utilização de equipamentos de proteção individual ao trabalhador, que diminuam a intensidade do agente agressivo a limites de tolerância, não há razão para não se aceitar isso no âmbito do Direito Previdenciário.

Sobre o tema, o Supremo Tribunal Federal, no julgamento do Recurso Extraordinário 664335/SC, em que se discutia a natureza especial da atividade quando utilizado equipamento de proteção individual, decidiu que o direito à aposentadoria precoce pressupõe a efetiva exposição do trabalhador a agente nocivo. Asseverou a Suprema Corte que se o equipamento de proteção individual é eficaz para neutralizar, eliminar ou reduzir a nocividade para níveis inferiores aos limites de tolerância, o tempo de atividade não se caracteriza como especial.

De todo modo, tem-se que apenas a partir de 03/12/1998, data da publicação da MP nº 1.729/98, convertida na Lei nº 9.732/98, a utilização do equipamento de proteção que efetivamente elimine a nocividade afasta a especialidade da atividade, tal como, aliás, previsto no art. 238, § 6º, da IN nº 45/2010 do INSS.

Ainda, necessário assinalar que o Tribunal Regional Federal da 4ª Região, no julgamento do processo 5054341-77.2016.4.04.0000/SC, admitiu o incidente de resolução de demandas repetitivas (Tema 15) relacionado à seguinte controvérsia:

Discute-se se a comprovação da eficácia do EPI, e consequente neutralização dos agentes nocivos, deve ser demonstrada somente pelo PPP (Perfil Profissiográfico Previdenciário) ou requer dilação probatória pericial, especialmente a descrição do tipo de equipamento utilizado, intensidade de proteção proporcionada ao trabalhador, treinamento, uso efetivo do equipamento e a fiscalização pelo empregador.

O referido incidente foi decidido em 11 de dezembro de 2017, da seguinte forma:

PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. INCIDENTE DE RESOLUÇÃO DE DEMANDAS REPETITIVAS. EPI. NEUTRALIZAÇÃO DOS AGENTES NOCIVOS. PROVA. PPP. PERÍCIA. 1. O fato de serem preenchidos os específicos campos do PPP com a resposta 'S' (sim) não é, por si só, condição suficiente para se reputar que houve uso de EPI eficaz e afastar a aposentadoria especial. 2. Deve ser propiciado ao segurado a possibilidade de discutir o afastamento da especialidade por conta do uso do EPI, como garantia do direito constitucional à participação do contraditório. 3. Quando o LTCAT e o PPP informam não ser eficaz o EPI, não há mais discussão, isso é, há a especialidade do período de atividade. 4. No entanto, quando a situação é inversa, ou seja, a empresa informa no PPP a existência de EPI e sua eficácia, deve se possibilitar que tanto a empresa quanto o segurado, possam questionar - no movimento probatório processual - a prova técnica da eficácia do EPI. 5. O segurado pode realizar o questionamento probatório para afastar a especialidade da eficácia do EPI de diferentes formas: A primeira (e mais difícil via) é a juntada de uma perícia (laudo) particular que demonstre a falta de prova técnica da eficácia do EPI - estudo técnico-científico considerado razoável acerca da existência de dúvida científica sobre a comprovação empírica da proteção material do equipamento de segurança. Outra possibilidade é a juntada de uma prova judicial emprestada, por exemplo, de processo trabalhista onde tal ponto foi questionado. 5. Entende-se que essas duas primeiras vias sejam difíceis para o segurado, pois sobre ele está todo o ônus de apresentar um estudo técnico razoável que aponte a dúvida científica sobre a comprovação empírica da eficácia do EPI. 6. Uma terceira possibilidade será a prova judicial solicitada pelo segurado (após analisar o LTCAT e o PPP apresentados pela empresa ou INSS) e determinada pelo juiz com o objetivo de requisitar elementos probatórios à empresa que comprovem a eficácia do EPI e a efetiva entrega ao segurado. 7. O juízo, se entender necessário, poderá determinar a realização de perícia judicial, a fim de demonstrar a existência de estudo técnico prévio ou contemporâneo encomendado pela empresa ou pelo INSS acerca da inexistência razoável de dúvida científica sobre a eficácia do EPI. Também poderá se socorrer de eventuais perícias existentes nas bases de dados da Justiça Federal e Justiça do Trabalho. 8. Não se pode olvidar que determinada situações fáticas, nos termos do voto, dispensam a realização de perícia, porque presumida a ineficácia dos EPI´s.

Portanto, restou pacificado que 'a mera juntada do PPP referindo a eficácia do EPI não elide o direito do interessado em produzir prova em sentido contrário'.

4. No que se refere ao ruído, importa registrar porém que é irrelevante se a utilização de equipamento de proteção individual - EPI pelo segurado eliminava ou neutralizava o agente nocivo ao sistema auditivo, fato que não descaracteriza o tempo de serviço especial prestado, porque subsiste a vibração como agente insalubre.

Nesse sentido, é reiterada a jurisprudência dos Tribunais Federais e também da Turma Nacional de Uniformização dos Julgados dos Juizados Especiais Federais, que editou a Súmula 9, in verbis: "O uso de Equipamento de Proteção Individual (EPI), ainda que elimine a insalubridade, no caso de exposição a ruído, não descaracteriza o tempo de serviço especial prestado".

Destaque-se que no Pedido de Uniformização de Jurisprudência 2007.72.55.00.7170-3, a Turma Nacional reiterou, em 08.02.2010, o entendimento supra citado do enunciado, mesmo diante as alterações do Regulamento da Previdência Social promovidas pelo Decreto 4.882/2003, que acrescentou ao artigo 68, § 3º, o respeito à legislação trabalhista que cuida do uso de equipamento de proteção individual. Para a Turma, essa "compreensão, porém, não afasta a aplicação dos princípios e da jurisprudência específica do direito previdenciário. Deve-se entender que a extensão da remissão abrange estritamente os aspectos técnicos e práticos do uso do equipamento de proteção, não se revestindo do caráter de juízo de valor negativo sobre a especialidade decorrente do serviço exposto a agentes nocivos." (Juiz Relator Derivaldo de Figueiredo Bezerra Filho).

Sobre a vibração causada pelo ruído e seus efeitos deletérios ao organismo, este Juízo seguiu a recomendação da procuradoria do INSS e foi explorar, sobre o assunto, os estudos publicados pelo engenheiro Samir N. Y. Gerges (http://www.lari.ufsc.br/publicacoes.php).

Ocorre que dentre os estudos publicados pelo profissional não há nenhum que conclua que a vibração do ruído não seja danosa à saúde do trabalhador, como afirma o INSS. O que o profissional afirma no estudo intitulado "Protetores Auditivos" é que a transmissão do ruído através dos ossos, tecidos humanos e pés para o sistema auditivo pode ser ignorada. Porém, que fique claro, o expert não conclui que essa mesma transmissão deva ser ignorada em relação aos demais órgãos do corpo humano.

E são justamente esses efeitos extra-auditivos do ruído, não explorados pelo engenheiro Samir N.Y. Gerges, que recomendam a manutenção do entendimento consolidado pelo Enunciado 9 da TNU. A esse respeito, oportuna a transcrição de trecho do parecer do médico do trabalho José Marcelo de Oliveira Penteado, citado pela 1.ª Turma Recursal no julgamento do processo 2008.70.50.024094-3:

Vários estudos já vêm demonstrando os efeitos extra-auditivos do ruído. Não podemos então pensar apenas em ruído e perda auditiva, mas também com relação aos efeitos deletérios no organismo como um todo. Podemos descrever sucintamente alguns destes efeitos que vem sendo estudado por diversos autores, tais como distúrbios do sono, vertigens, distúrbios da marcha, dilatação das pupilas, tremores nos olhos, tremores nas mãos, mudanças no humor, dores de cabeça, impotência sexual, estresse, ansiedade, distúrbios digestivos, vasoconstricção periférica, hipertensão arterial, sobrecarga cardíaca, alterações hormonais com elevação do cortisol e dos índices de adrenalina, entre outros.

Nesse sentido a decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal no Recurso Extraordinário com Agravo nº 664.335, com repercussão geral reconhecida, na qual firmado que o uso de EPI, ainda que elimine a insalubridade, no caso de exposição a ruído, não descaracteriza o tempo de serviço especial prestado, conforme se extrai do seguinte trecho: "Na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário [PPP], no sentido da eficácia do Equipamento de Proteção Individual [EPI], não descaracteriza o tempo de serviço especial para a aposentadoria".

5. Em relação ao âmbito tributário, ao contrário do que vem sustentando a autarquia, não há ofensa ao art. 195, § 5.º, da Constituição, pois o financiamento do benefício foi apenas agregado com a instituição do adicional de que trata o art. 22, II, da Lei 8.212/1991. O benefício que, de todo modo, é apenas uma aposentadoria sob condições especiais, existia antes mesmo dessa fonte específica de custeio.

Assim, a eventual falta de contribuição específica pelo empregador não pode ser empecilho ao reconhecimento da especialidade das atividades desenvolvidas pelo segurado.

A este respeito, oportuna a citação da jurisprudência do TRF da 4ª Região, que afasta a alegação de que o reconhecimento de tempo de serviço especial demanda a identificação da fonte de custeio:

PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA ESPECIAL. ATIVIDADE ESPECIAL. AGENTES NOCIVOS BIOLÓGICOS E RADIAÇÃO IONIZANTE. HABITUALIDADE E PERMANÊNCIA. CONTRIBUINTE INDIVIDUAL.FONTE DE CUSTEIO. (...) 7. O tempo de serviço sujeito a condições nocivas à saúde, prestado pela parte autora na condição de contribuinte individual, deve ser reconhecido como especial, tendo em vista que: (a) a Lei de Benefícios da Previdência Social, ao instituir, nos artigos 57 e 58, a aposentadoria especial e a conversão de tempo especial em comum, não excepcionou o contribuinte individual; (b) o Regulamento da Previdência Social, ao não possibilitar o reconhecimento, como especial, do tempo de serviço prestado pelo segurado contribuinte individual que não seja cooperado, filiado a cooperativa de trabalho ou de produção, estabeleceu diferença não consignada em lei para o exercício de direito de segurados que se encontram em situações idênticas, razão pela qual extrapola os limites da lei e deve ser considerado nulo nesse tocante; (c) para a concessão de aposentadoria especial, prevista nos artigos 57 e 58 da Lei de Benefícios, existe específica indicação legislativa de fonte de custeio (parágrafo 6º do mesmo art. 57 supracitado, combinado com o art. 22, inc. II, da Lei n. 8.212/91); (d) sequer haveria, no caso, necessidade de específica indicação legislativa da fonte decusteio, uma vez que se trata de benefício previdenciário previsto pela própria Constituição Federal (art. 201, § 1º c/c art. 15 da EC n. 20/98), hipótese em que sua concessão independe de identificação da fonte de custeio, consoante precedentes do STF. 8. Implementados mais de 25 anos de tempo de atividade sob condições nocivas e cumprida a carência mínima, é devida a concessão do benefício de aposentadoria especial, a contar da data do requerimento administrativo, nos termos do § 2º do art. 57 c/c art. 49, II, da Lei n. 8.213/91. (TRF4, APELREEX 0016584-18.2013.404.9999, Sexta Turma, Relator Celso Kipper, D.E. 05/03/2015)

PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO/CONTRIBUIÇÃO. ATIVIDADE ESPECIAL. AGENTES NOCIVOS HIDROCARBONETOS E RUÍDO. EQUIPAMENTOS DE PROTEÇÃO INDIVIDUAL. FONTE DE CUSTEIO. TEMPO ESPECIAL - CONVERSÃO EM TEMPO COMUM DEPOIS DE 28/05/1998. CONCESSÃO. (...) 5. Para a concessão de aposentadoria especial ou conversão de tempo exercido sob condições especiais em tempo de trabalho comum, previstas nos artigos 57 e 58 da Lei de benefícios, existe específica indicação legislativa de fonte de custeio: o parágrafo 6º do mesmo art. 57 supracitado, combinado com o art. 22, inc. II, da Lei n. 8.212/91. Não há óbice, ademais, que se aponte como fonte do financiamento da aposentadoria especial e da conversão de tempo especial em comum as contribuições a cargo da empresa - não apenas previdenciárias -, pois o art. 195, caput e incisos, da Constituição Federal, dispõe que a seguridade social será financiada por toda a sociedade, de forma direta e indireta, nos termos da lei, mediante recursos provenientes dos orçamentos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, e, dentre outras ali elencadas, das contribuições sociais do empregador, da empresa e da entidade a ela equiparada na forma da lei. Incidência do princípio da solidariedade. 6. Comprovada a exposição do segurado a agente nocivo, na forma exigida pela legislação previdenciária aplicável à espécie, possível reconhecer-se a especialidade do tempo de labor correspondente. 7. O trabalhador que tenha exercido atividades em condições especiais, mesmo que posteriores a maio de 1998, tem direito adquirido, protegido constitucionalmente, à conversão do tempo de serviço, de forma majorada, para fins de aposentadoria comum (Precedentes desta Corte e do STJ). 8. Preenchidos os requisitos legais, tem o segurado direito à obtenção de aposentadoria por tempo de contribuição integral. (TRF4, APELREEX 5023740-41.2010.404.7100, Quinta Turma, Relator p/ Acórdão (auxílio Lugon) Taís Schilling Ferraz, juntado aos autos em 04/02/2015)

6. Ainda no tocante ao agente ruído, cumpre destacar que já se encontra consolidado na jurisprudência o entendimento no sentido de se aplicar a norma previdenciária vigente ao tempo da prestação do labor para fins de verificação da superação dos limites de tolerância ao ruído. Referido entendimento firmou-se no âmbito do STJ, o que inclusive ensejou o cancelamento da Súmula nº 32 da TNU. Assim, é considerada especial a atividade exercida com exposição a ruídos superiores a 80 decibéis até a edição do Decreto 2.172/1997 (até 05/03/1997). Após essa data, o nível de ruído considerado prejudicial é o superior a 90 decibéis (06/03/1997 a 18/11/2003). Com a entrada em vigor do Decreto 4.882, de 18.11.2003 (vigência a partir de 19.11.2003), o limite de tolerância ao agente físico ruído foi reduzido para 85 decibéis.

Ressalte-se que o entendimento acima referido restou firmado em recursos repetitivos no STJ, sendo de observância obrigatória por este juízo, à luz do disposto no art. 927, III, do CPC:

ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. MATÉRIA REPETITIVA. ART. 543-C DOCPC E RESOLUÇÃO STJ 8/2008. RECURSO REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA.PREVIDENCIÁRIO. REGIME GERAL DE PREVIDÊNCIA SOCIAL. TEMPO ESPECIAL.RUÍDO. LIMITE DE 90DB NO PERÍODO DE 6.3.1997 A 18.11.2003. DECRETO4.882/2003. LIMITE DE 85 DB. RETROAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. APLICAÇÃODA LEI VIGENTE À ÉPOCA DA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO. Controvérsia submetida ao rito do art. 543-C do CPC1. Está pacificado no STJ o entendimento de que a lei que rege o tempo de serviço é aquela vigente no momento da prestação do labor. Nessa mesma linha: REsp 1.151.363/MG, Rel. Ministro Jorge Mussi,Terceira Seção, DJe 5.4.2011; REsp 1.310.034/PR, Rel. Ministro Herman Benjamin, Primeira Seção, DJe 19.12.2012, ambos julgados sob o regime do art. 543-C do CPC. 2. O limite de tolerância para configuração da especialidade do tempo de serviço para o agenteruído deve ser de 90 dB no período de 6.3.1997 a 18.11.2003, conforme Anexo IV do decreto 2.172/1997 e Anexo IV do decreto 3.048/1999, sendo impossível aplicação retroativa do decreto 4.882/2003, que reduziu o patamar para 85 dB,sob pena de ofensa ao art. 6º da LINDB (ex-LICC). Precedentes do STJ. Caso concreto 3. Na hipótese dos autos, a redução do tempo de serviço decorrente da supressão do acréscimo da especialidade do período controvertido não prejudica a concessão da aposentadoria integral. 4. Recurso Especial parcialmente provido. Acórdão submetido ao regime do art. 543-C do CPC e da Resolução STJ 8/2008.

(REsp 1398260 / PR, Relator Ministro Herman Benjamin, julgado em 14/05/2014 pela Primeira Seção do STJ)

De outra parte, havendo variação do nível de ruído durante a jornada de trabalho, firmou-se orientação na Turma Nacional de Uniformização de Jurisprudência que o cálculo da média ponderada é o melhor critério para avaliar a possibilidade de enquadramento do período como especial. Caso não seja possível o cálculo da média ponderada, deve, para fim de aferição da atividade especial, ser calculada a média aritmética simples. Válido colacionar ementa de decisão daquele órgão:

PEDIDO DE UNIFORMIZAÇÃO DE INTERPRETAÇÃO DE LEI FEDERAL. PREVIDENCIÁRIO. ENQUADRAMENTO POR CATEGORIA - AJUDANTE DE MOTORISTA. AGENTE NOCIVO RUÍDO COM NÍVEIS VARIADOS. AGRAVO NÃO PROVIDO. 1. A parte autora interpôs pedido de uniformização de interpretação de lei federal em face de acórdão proferido pela Turma Recursal da Seção Judiciária Federal de Santa Catarina, que reformou sentença, reconhecendo como especial período inferior ao pretendido pelo requerente. Alega que a decisão valorou documentos em desacordo com a jurisprudência dominante do Superior Tribunal de Justiça que, no entender da recorrente, considera como especial a atividade de ajudante de caminhoneiro. 2. O recurso foi inadmitido pelo presidente da Turma Recursal de origem sob o fundamento de que o acórdão apontado como paradigma trata de matéria sem similitude com a versada no acórdão atacado, não havendo prova da divergência, bem como porque a pretensão do recorrente implicaria reexame de prova, o que é inviável neste incidente. A decisão foi objeto de agravo. 3. Conforme se depreende da leitura da sentença e do acórdão recorrido, ao contrário do que alega a parte autora, a Turma Recursal reconheceu como especial o período de 01.05.1984 - 01.02.1986, entendendo que, nas anotações da CTPS do autor, consta alteração da função para ajudante de motorista de caminhão - enquadramento por categoria profissional (código 2.4.4, do Anexo do Decreto n° 53.831/64). No entanto, não considerou comprovada a atividade de motorista no período anterior, onde consta, na própria CTPS do autor, a função de auxiliar de remessa. 4. O incidente de uniformização de jurisprudência, no âmbito dos juizados especiais, é destinado apenas à uniformização de divergências surgidas sobre questões de direito decorrentes de fatos admitidos pelas instâncias ordinárias. A Turma Nacional de Uniformização de Jurisprudência não constitui instância revisora da análise da prova. Se o exame da pretensão do requerente depender do reconhecimento de fatos não declarados no texto do acórdão ou sentença, não é possível o conhecimento do incidente. Súmula 42 da TNU ("Não se conhece de incidente de uniformização que implique reexame de matéria de fato"). A pretensão da recorrente não é uniformizar jurisprudência, mas rediscutir matéria de fato, objetivando o reexame da prova, o que não é cabível em sede de uniformização de jurisprudência. 5. A parte ré também interpôs pedido de uniformização nacional, sustentando, em síntese, que havendo variação do nível de ruído no ambiente de trabalho, o nível a ser considerado, para fins de reconhecimento da especialidade da atividade, é aquele resultante da média aritmética ponderada, conforme tem entendido a Turma Recursal de Minas Gerais (Autos nº 877739120054013). 6. Sustenta o INSS que no período de 29.05.1998 a 30.11.1998 o autor estaria exposto ao agente ruído em limite inferior ao legal, já que a aferição do ruído restou limitado entre 88dB(A) - 91 dB(A) e fazendo-se a média aritmética, restaria valor inferior a 90 dB(A). 7. Esta Turma Nacional já uniformizou o entendimento de que, para fins de enquadramento da atividade especial pela exposição a agente nocivo ruído com níveis variados durante a jornada de trabalho do segurado, a técnica ideal a ser considerada é a média ponderada. Não sendo possível a adoção de tal técnica pelo laudo pericial, deve ser realizada média aritmética simples entre as medições de ruído encontradas pela prova pericial, afastando-se a técnica de "picos de ruído", na qual se considera apenas o nível de ruído máximo, desconsiderando-se os valores mínimos(Pedilef nº 2010.72.55.003655-6, Rel. Juiz Federal Adel Américo de Oliveira, DJ 27-6-2012). 8. No entanto, essa Turma Nacional de Uniformização alterou a redação do Enunciado nº 32 de sua súmula de jurisprudência e sedimentou o entendimento de que o limite de tolerância ao ruído no período posterior à edição do Decreto nº 2.172 de 1997 é de 85 decibéis(A), e não de 90 decibéis(A), em virtude do reconhecimento da prejudicialidade da exposição ao índice mais baixo pelo Decreto n.4.882, de novembro de 2003. Desse modo, a aplicação da técnica preconizada pelo demandado não teria o condão de modificar o resultado do julgamento, vez que ainda superaria o patamar limite. 9. Aplicação do que restou decidido na Questão de Ordem nº 13: "Não cabe Pedido de Uniformização, quando a jurisprudência da Turma Nacional de Uniformização de Jurisprudência dos Juizados Especiais Federais se firmou no mesmo sentido do acórdão recorrido." (DJ 28/04/2005, p. 471). 10. Incidente de uniformização de jurisprudência não conhecido.Acordam os membros da Turma Nacional de Uniformização dos Juizados Especiais Federais em não conhecer os pedidos de uniformização, nos termos do voto-ementa do relator. (PEDILEF 50139542420114047201, Juiz Federal André Carvalho Monteiro, DOU 26/04/2013) [grifou-se]

Importante salientar também que é desnecessária a demonstração do nível médio de pressão sonora com relação aos períodos anteriores à Lei 9.032/1995, uma vez que não era exigida a exposição permanente ao agente nocivo à época, conforme jurisprudência da TNU:

ATIVIDADE ESPECIAL. RUÍDO. LAUDO QUE REGISTRA NÍVEIS VARIÁVEIS DE 72 A 84 DB. JURISPRUDÊNCIA DO STJ NO SENTIDO DA IRRETROATIVIDADE DA EXIGÊNCIA DE EXPOSIÇÃO A AGENTES NOCIVOS DE FORMA HABITUAL E PERMANENTE, EM RELAÇÃO AOS PERÍODOS ANTERIORES À EDIÇÃO DA LEI 9.032/95. ACÓRDÃO DE ORIGEM QUE CONSIDEROU A MÉDIA ENTRE OS LIMITES MÍNIMO E MÁXIMO. INCIDENTE CONHECIDO E PROVIDO'. Voto condutor: 'Tendo em vista que, nos termos dos precedentes do E. STJ, somente após a edição da Lei 9.032/95 é que passou a ser exigida a comprovação da exposição a agentes nocivos ou prejudiciais, de forma habitual e permanente, descabida a exigência de especificação do nível médio de pressão sonora média a que estava submetido (o que equivaleria à exigência de exposição permanente), ou que a média entre os limites mínimo e máximo seja superior ao limite legal (80 dB). O autor comprovou a exposição a ruídos superiores a 80 db - quanto basta ao reconhecimento da atividade como especial. Se havia exposição a patamares inferiores a 80 db (mínimo aferido de 72 db), isso se coaduna com a desnecessidade de permanência da exposição'. (TNU, PU 2007.72.51.008595-8, rel. José Eduardo do Nascimento, DJ 13.05.2011)

Ademais, a ausência da técnica ou metologia utilizada na avaliação do ruído constante no Perfil Profissiográfico Previdenciário ou o laudo técnico não constitui erro capaz de invalidar a adoção desses documentos como prova das condições de trabalho. Ressalte-se que não se pode impor ao segurado ônus sobre elementos de prova sobre os quais não tem controle. Cabe à autarquia previdenciária, detectada a irregularidade, determinar ao empregador a retificação das informações, uma vez que possui prerrogativas que lhe outorgam agir dessa maneira e fiscalizar o cumprimento dessas obrigações.

7. Com relação à parcial duração da exposição a agentes agressivos, é de se ressaltar a conotação que termos tais como "trabalho habitual e permanente, não eventual nem intermitente" assumem em direito previdenciário. Com efeito, os precedentes abaixo são elucidativos a respeito do tema:

PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO. ATIVIDADE RURAL EM REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. INÍCIO DE PROVA MATERIAL. TEMPO DE SERVIÇO ESPECIAL. HABITUALIDADE E PERMANÊNCIA. INTERMITÊNCIA.

(...)

3. Os requisitos da habitualidade e da permanência devem ser entendidos como não-eventualidade e efetividade da função insalutífera, continuidade e não-interrupção da exposição ao agente nocivo. A intermitência refere-se ao exercício da atividade em local insalubre de modo descontínuo, ou seja, somente em determinadas ocasiões.

4. Se o trabalhador desempenha diuturnamente suas funções em locais insalubres, mesmo que apenas em metade de sua jornada de trabalho, tem direito ao cômputo do tempo de serviço especial, porque estava exposto ao agente agressivo de modo constante, efetivo, habitual e permanente. (TRF4. Sexta Turma. Apelação Cível 2000.04.01.073799-6/PR. DJ 09/05/2001. Rel. Luiz Carlos de Castro Lugon)

A habitualidade e permanência do tempo de trabalho em condições especiais prejudiciais à saúde ou à integridade física referidas no artigo 57, § 3º, da Lei 8.213/91 não pressupõem a exposição contínua ao agente nocivo durante toda a jornada de trabalho, devendo ser interpretada no sentido de que tal exposição deve ser ínsita ao desenvolvimento das atividades cometidas ao trabalhador, integrada à sua rotina de trabalho, e não de ocorrência eventual, ocasional.

Exegese diversa levaria à inutilidade da norma protetiva, pois em raras atividades a sujeição direta ao agente nocivo se dá durante toda a jornada de trabalho, e em muitas delas a exposição em tal intensidade seria absolutamente impossível. A propósito do tema, vejam-se os seguintes precedentes da Terceira Seção deste Tribunal: EINF n.º 0003929-54.2008.404.7003, de minha relatoria, D.E. 24/10/2011; EINF n.º 2007.71.00.046688-7, Terceira Seção, Relator Celso Kipper, D.E. 07/11/2011.

Ademais, conforme o tipo de atividade, a exposição ao respectivo agente nocivo, ainda que não diuturna, configura atividade apta à concessão de aposentadoria especial, tendo em vista que a intermitência na exposição não reduz os danos ou riscos inerentes à atividade, não sendo razoável que se retire do trabalhador o direito à redução do tempo de serviço para a aposentadoria, deixando-lhe apenas os ônus da atividade perigosa ou insalubre (TRF4, EINF 2005.72.10.000389-1, Terceira Seção, Relator João Batista Pinto Silveira, D.E. 18/05/2011; TRF4, EINF 2008.71.99.002246-0, Terceira Seção, Relator Luís Alberto D"Azevedo Aurvalle, D.E. 08.01.2010). (Trecho do voto do relator na APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 5001529-66.2010.404.7211/SC, julgado pelo TRF da 4ª Região em 19/11/2014)

Registre-se, também, que o fato de o formulário não mencionar se a exposição é habitual e permanente não pode prejudicar o trabalhador. Isto porque referido formulário foi criado pelo próprio INSS e não mais dispõe de campo para que a empresa informe explicitamente se a exposição a determinado agente nocivo era habitual e permanente.

8. Por fim, quanto à necessidade de apresentação de laudo técnico, a Turma Regional de Uniformização da 4ª Região já estabeleceu hipóteses em que ela é dispensável:

INCIDENTE DE UNIFORMIZAÇÃO. PREVIDENCIÁRIO. TEMPO ESPECIAL. COMPROVAÇÃO PERFIL PROFISSIOGRÁFICO PREVIDENCIÁRIO - PPP. PRESCINDIBILIDADE DA APRESENTAÇÃO DE LAUDO TÉCNICO.

O Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP, devidamente preenchido, com base em laudo técnico e contendo a indicação dos responsáveis técnicos legalmente habilitados, por período, pelos registros ambientais e resultados de monitoração biológica, é documento suficiente e dispensa a apresentação do laudo técnico para a comprovação da especialidade da atividade exercida após 01.01.2004, ou, sendo a atividade exercida até 31.12.2003, quando assinado por profissional habilitado ou ainda, quando, mesmo que assinado pelo representante legal da empresa, contiver períodos trabalhados antes e depois de 01.01.2004, sem solução de continuidade.

Incidente conhecido e provido.

(IUJEF 2008.70.53.000459-9/PR, Relatora Luísa Hickel Gamba, D.E. 07/04/2011).

À luz dos fundamentos acima, passa-se à análise do período de tempo especial pleiteado pela parte autora.

- Análise do Caso Concreto

Períodos

05/04/1992 a 04/05/2017

Empresa

B.O. Paper Brasil Indústria de Papéis Ltda (Inpacel - Ind. de Papel Arapoti S/A)

Função

05/04/92 a 10/05/93 (Tec. instrumentista II)

11/05/93 a 04/11/94 (Tec. instrumentista PL/Turno)

05/11/94 a 31/03/96 (Tec. instrumentista/SR Turno)

01/04/96 a 31/12/98 (Tec. instrumentista sênior)

01/01/99 a 01/11/00 (Tec. instrumentista sênior)

02/11/00 a 31/10/01 (Tec. instrumentação sênior)

01/11/01 a 31/10/07 (Tec. instrumentação SR)

01/11/07 a 31/12/09 (Tec. instrumentação SR/Turno)

01/01/10 a 04/05/17 (Tec. em instrumentação)

Agentes Nocivos

Ruído

Periculosidade (Radiação ionizante)

Enquadramento Legal

Ruído: código 2.0.1 do anexo IV aos Decretos nº 2.172/1997 e 3.048/1999

Periculosidade (Radiação Ionizante): código 1.1.4 do Quadro Anexo ao Decreto nº 53.381/64, código 1.1.3 do Quadro Anexo I ao Decreto nº 83.080/79, e código 2.0.3, alínea "e", do anexo IV aos Decretos 2.172/97 e 3.048/1999, Anexo da NR 16

Prova

PPP (evento 13, PPP2)
Laudos (evento 13, LAUDO5)
Laudos periciais (evento 6, LAUDO9, evento 32, LAUDO2 e evento 47, LAUDO47)

Conclusão

Acerca do ruído o PPP traz as seguintes aferições:

a) 05/04/92 a 31/12/02: 79,7 dB.

b) 01/01/03 a 31/12/06: 88,7 dB.

c) 01/01/07 a 31/12/07: 88,7 dB.

d) 01/01/08 a 12/01/14: 88,7 dB.

e) 13/01/14 a 04/05/17: 90,2 dB

No campo das observações consta que o PPP foi preenchido com base nos seguintes documentos: LTCAT de 1996 e PPRA de 2003, 2005, 2006, 2007, 2008/2009, 2009/2010, 2011, 2012, 2014, 2015, 2016 e 2017/2018.
Laudo de 1996 confirma a dosimetria de 79,7 dB para a função de instrumentista, com menção à dose de 45,4 para jornada de oito horas (evento 13, LAUDO5, p. 3).
Laudos de 2003 e 2006, para a função de instrumentação SR, confirmam a exposição a ruído contínuo de 88,7 dB (evento 13, LAUDO5, p. 6 e 12).
Laudos de 2007, 2008, 2009/2010, 2011, para a função de tec. instrumentação (Sr), confirmam a dosimetria de ruído de 88,7 dB (Leq), com espécie de exposição contínua (evento 13, LAUDO5, p. 15, 18, 21 e 24).
Laudos de 2012/2013, para a função de técnico de instrumentação, confirma a exposição permanente a ruído de 88,7 dB (evento 13, LAUDO5, p. 27).
Laudo de 13/01/2014, para a função de técnico em instrumentação, confirma a exposição permanente a ruído de 90,2 dB (evento 13, LAUDO5, p. 30).
Laudos de 2015, 2016 e 2017, confirmam a exposição a ruído de 90,2 dB, com menção ao NEN de 92,2 e à dose de 2,07 (evento 13, LAUDO5, p. 40, 48 e 56).
Os ruídos não superam os limites de tolerância de 80 e 90 dB vigentes entre 05/04/1992 e 18/11/2003, mas superam o limite de tolerância de 85 dB a partir de 19/11/2003.
Para o período de 05/04/1992 a 18/11/2003, resta analisar a sujeição a outros agentes agressivos.
O PPP informa exposição a radiação ionizante desde 05/04/1992.

As radiações ionizantes são consideradas nocivas pela legislação previdenciária nos código 1.1.4 do Quadro Anexo ao Decreto nº 53.381/64, código 1.1.3 do Quadro Anexo I ao Decreto nº 83.080/79, e código 2.0.3, alínea "e", do anexo IV aos Decretos 2.172/97 e 3.048/1999.

Tratando da relação entre concentração de agentes nocivos e insalubridade, cumpre registrar que a partir da vigência da MP 1.729/1998, convertida na Lei 9.732/1998, a qual alterou o § 1º, do art. 57, Lei 8.213/1991, as disposições trabalhistas concernentes à caracterização de atividade ou operações insalubres (NR-15), tais como os conceitos de "limites de tolerância", "concentração", "natureza", "uso de equipamentos de proteção individual" e "tempo de exposição ao agente", passaram a influir na caracterização da natureza de uma atividade, se especial ou comum (IUJEF 0000844-24.2010.404.7251, Turma Regional de Uniformização da 4ª Região, Relator p/ Acórdão José Antônio Savaris, D.E. 29/09/2011).

A NR 15, Anexo 5, do MTE prevê que, nas atividades ou operações onde trabalhadores possam ser expostos a radiações ionizantes, os limites de tolerância, os princípios, as obrigações e controles básicos para a proteção do homem e do seu meio ambiente contra possíveis efeitos indevidos causados pela radiação, são os constantes da Norma CNEN-NE-3.01: "Diretrizes Básicas de Radioproteção", aprovada pela Resolução CNEN n.º 12/88, ou daquela que venha a substituí-la.

A Comissão Nacional de Energia Nuclear - CNEN, por meio do CNEN-NN-3.01 - Diretrizes Básicas de Proteção Radiológica, aborda, no item 5.4.2.1, o limite de dose individual.

Aqueles que trabalham expostos à radiação ionizante são denominados IOE (indivíduo ocupacionalmente exposto - indivíduo sujeito à exposição ocupacional). A exposição ocupacional consiste na exposição normal ou potencial de um indivíduo em decorrência de seu trabalho ou treinamento em práticas autorizadas ou intervenções, excluindo-se a radiação natural do local.

Para o IOE, a referida norma prevê limite de tolerância de 20 mSv por ano (período de janeiro a dezembro).

Instada a se manifestar em um primeiro momento sobre a exposição a fontes radioativas, a empresa declarou que o autor permanece exposto de forma eventual às fontes radioativas quando realiza manutenção, calibração e aferição dos equipamentos de medição e monitoração radiométricas pertencentes à instalação (evento 13, CARTINTIM4, p. 1).

Intimada novamente para informar a frequência com que ocorria a exposição a fontes radioativas, declarou a empregadora que o bloqueio do sistema de medidor nuclear de densidade e nível (Césio 137) se dava duas vezes por mês, com duração de trinta minutos, enquanto a limpeza da cabeça de frame - medidor nuclear de gramatura (Promécio 147), era diariamente acionado uma ou duas vezes ao dia, com duração de cinco minutos (evento 41, RESPOSTA3, p. 1-2).


Dos laudos que foram juntados, os de 2008, 2009/2010, 2011, 2012/2013, 2014, 2015, 2016 e 2017 retratam a exposição a radiação ionizante, informando os três primeiros e o quinto ser ela intermitente, o quarto que é eventual, e os três últimos que é habitual e intermitente, sendo que nenhum deles apresentou as doses a que o funcionário estaria submetido.

Três laudos periciais feitos para funcionários diversos que exerceram a mesma função do autor, juntados no decorrer do processo, também não avaliaram a intensidade da exposição, a despeito de tratar da condição de periculosidade.


Não se pode olvidar, contudo, que as radiações ionizantes integram a Lista Nacional de Agentes Cancerígenos para Humanos, publicada através da Portaria Interministerial MTE/MS/MPS nº 9, de 07/10/2014, constando no Grupo 1 da referida lista, que elenca os agentes confirmados como carcinogênicos para humanos.

Acerca da questão, atente-se que com a edição do Decreto nº 8.123/2013, o art. 68, § 4º, do Decreto nº 3.048-99, passou a vigorar com a seguinte redação:

Art. 68. A relação dos agentes nocivos químicos, físicos, biológicos ou associação de agentes prejudiciais à saúde ou à integridade física, considerados para fins de concessão de aposentadoria especial, consta do Anexo IV.§

(...)

4o A presença no ambiente de trabalho, com possibilidade de exposição a ser apurada na forma dos §§ 2o e 3o, de agentes nocivos reconhecidamente cancerígenos em humanos, listados pelo Ministério do Trabalho e Emprego, será suficiente para a comprovação de efetiva exposição do trabalhador. (grifou-se)

Destarte, tratando de agente nocivo reconhecidamente cancerígeno e que consta no Anexo IV do Decreto nº 3.048-99, a sua mera presença no ambiente de trabalho basta à comprovação da exposição efetiva do trabalhador, sendo suficiente a avaliação qualitativa (qualquer que seja portanto o nível de concentração no ambiente de trabalho do segurado) e irrelevante, para fins de contagem especial, a utilização de EPI eficaz.

Frise-se que não se sustenta a tese de que a contagem de atividade especial pelo agente cancerígeno deve ocorrer apenas a partir da publicação da Portaria Interministerial MTE/MS/MPS nº 09, publicada em 08/10/2014, pois o agente sempre foi cancerígeno, ainda que tenha sido reconhecido administrativamente como tal apenas em data recente. O efeito nocivo do agente sempre existiu, o que autoriza o reconhecimento da atividade especial antes mesmo da Portaria mencionada.

Portanto, exposta a parte autora a radiações ionizantes diariamente no exercício do seu labor, deve ser reconhecida a especialidade do período em que trabalhou como técnico instrumentista (instrumentação).

Não fosse isso, cumpre ainda observar que as atividades do autor foram consideradas perigosas pelos três laudos periciais referidos, constando do anexo da NR 16, pelo exercício habitual de atividades de manutenção e calibração de equipamentos dotados de fontes radioativas seladas.

Especificamente no que tange à possibilidade da periculosidade ser elemento ensejador da concessão da aposentadoria antecipada, verifica-se que algumas profissões já eram relacionadas nos Decretos 53.831/1964 e 83.080/1979 como especiais.

Referidos regulamentos estavam em consonância com a Lei de regência vigente àquela época, a Lei Orgânica da Previdência Social, que contemplava expressamente a periculosidade como elemento motivador da concessão de aposentadoria especial.

Em relação às atividades previstas em regulamento, permitia-se reconhecer a especialidade pelo enquadramento profissional de categoria, com presunção absoluta de nocividade até o advento da Lei 9.032/1995. Isso porque, a partir dessa lei, passou-se a exigir do segurado, além da previsão legal da atividade, a demonstração da efetiva submissão a agentes nocivos químicos, físicos e biológicos, de forma habitual e permanente durante sua jornada de trabalho.

Em suma, exatamente a partir do início da vigência Lei 9.032/1995, que trouxe profundas alterações para o reconhecimento do exercício de atividade prejudicial à saúde, a especialidade por periculosidade foi colocada sob dúvida, em razão da ausência de previsão legislativa.

Sem embargo, a jurisprudência tem admitido a caracterização da especialidade pela periculosidade, até mesmo depois do advento da Lei 9.032/1995. O fundamento utilizado é o de que a legislação reguladora do exercício de atividade especial não seria exaustiva na definição das hipóteses ensejadoras da contagem diferenciada de tempo de contribuição, a qual também estaria a abranger as atividades perigosas.

Nesse sentido, há precedente da Turma Nacional de Uniformização de Jurisprudência, fundamentado em 2 (dois) outros acórdãos do Superior Tribunal de Justiça, em que o Juiz Federal Bruno Leonardo Câmara Carrá, relator no julgamento do pedido de uniformização de lei federal autuado sob o número 5001238-34.2012.4.04.7102, com decisão publicada no Diário Oficial da União em 26.09.2014, sustentou que:

(...)

Ao que tudo leva a crer, o Superior Tribunal de Justiça teve como firme, foi que a nova redação dada pela Lei nº 9.032/95 ao art. 57 da Lei de Benefícios da Previdência Social não limitou a considerar como tempo de serviço especial apenas aqueles que fossem previsto em Lei ou Regulamento da previdência e sim todos aqueles resultantes da ação efetiva de "agentes nocivos, químicos, físicos, biológicos ou associação de agentes prejudiciais à saúde ou a integridade física"(...)

muito mais importante para fins de aplicação das nóveis disposições da Lei nº 9.528/97 é saber se um agente nocivo/prejudicial (qualificação que, por sinal, pode muito bem ser interpretada como aglutinadora de formas de periculosidade) é capaz de deteriorar/expor a saúde/integridade física do trabalhador. É a prova disso que transforma o tempo de comum para especial na lógica da novel legislação. Por isso, não é de se estranhar que o STJ continue a falar em periculosidade mesmo após a edição do Decreto nº 2.171/97. E, segundo penso, está certo mesmo em falar, pois, como dito, os agentes nocivos/prejudiciais à saúde/integridade física podem muito bem aludir a certas formas de perigo. A exposição à eletricidade, não sendo enquadrada propriamente como atividade insalubre, termina comprometendo sobretudo a integridade física do trabalhador que passa a conviver com níveis exagerados de cautela, risco, stress, etc. Logo, insisto, não é a apriorística qualificação doutrinária que determinará a possibilidade ou não apreensão de uma atividade como especial e sim a efetiva demonstração deletéria considerada em numerus apertus pela legislação em vigor.

(...)

Por essas razoes, conheço e dou provimento ao Pedido de Uniformização de Interpretação de Lei Federal para reformar o Acórdão recorrido e restabelecer a sentença de 1.º Grau, que reconheceu como especial o período trabalhado pelo recorrente, exposto de forma habitual e permanente ao agente nocivo nas atividades com energia elétrica.

Igualmente, a orientação da Turma Regional de Uniformização da 4ª Região:

INCIDENTE DE UNIFORMIZAÇÃO. PREVIDENCIÁRIO. TEMPO ESPECIAL. ELETRICIDADE. ATIVIDADE EXERCIDA APÓS 05.03.1997, DATA DE EDIÇÃO DO DECRETO 2.172/97. POSSIBILIDADE DE RECONHECIMENTO. SÚMULA 198 DO EXTINTO TFR. PERICULOSIDADE. MANUTENÇÃO DO CRITÉRIO PARA A CONCESSÃO DE APOSENTADORIA ESPECIAL, EM FACE DA PROTEÇÃO CONSTITUCIONAL À INTEGRIDADE FÍSICA DO TRABALHADOR. 1. A atividade na qual haja a efetiva exposição ao agente nocivo eletricidade em tensões elevadas pode ser reconhecida como especial mesmo após 05.03.1997. 2. Mesmo não constando mais das relações de agentes nocivos, desde a edição do Decreto 2.172/97, a eletricidade em altas tensões pode ensejar o reconhecimento de especialidade e a concessão de aposentadoria especial ou a conversão de tempo especial em comum, em face do disposto na Lei 7.369/85 ou mediante aplicação da súmula 198 do extinto TFR.3. Nem a Constituição Federal nem a lei previdenciária vedam a aposentadoria especial por periculosidade, porquanto ambas referem proteção do trabalhador contra agentes nocivos à integridade física. 4. Recurso conhecido e desprovido. Alteração de uniformização. (IUJEF 0003372-14.2008.404.7053, Turma Regional de Uniformização da 4ª Região, Relatora Luísa Hickel Gamba, D.E. 29/08/2011, grifou-se)

Destarte, na esteira do entendimento jurisprudencial, pertinente o reconhecimento do exercício de atividade perigosa como especial, mesmo após o advento da Lei 9.032/1995 ou do Decreto 2.172/1997.

Sobre a definição de atividades perigosas, "não há diferença entre o direito do trabalho e o previdenciário" (1ª Turma Recursal do Paraná, processo 2007.70.50.015951-5, julgado em 23/03/2010).

Para a legislação trabalhista as atividades de "produção, utilização, processamento, transporte, guarda, estocagem, e manuseio de materiais radioativos, selados e não selados, de estado físico e forma química quaisquer, naturais ou artificiais" são perigosas.

Assim, também porque são perigosas as atividades desenvolvidas pela parte autora, de acordo com os critérios estabelecidos na NR 16, deve ser reconhecida a especialidade das funções exercidas entre 05/04/1992 a 04/05/2017.

Para uma análise anterior à Portaria GM 518/2003, importa dizer que a atividade encontra enquadramento também nos decretos regulamentares.

Importa destacar que a utilização de EPI não afasta a nocividade à saúde, porque não se trata de possibilidade de perda gradual da saúde do trabalhador, em que o EPI eficaz tem o condão de neutralizar os efeitos dos agentes nocivos, mas sim da possibilidade da ocorrência de acidente fatal, não afastada pelo uso de EPI.

Em suma, ainda que se afastasse a especialidade por não ter sido superado o limite de tolerância de 20 mSv por ano - tese esta não acolhida nesta sentença - , é o caso de reconhecer a especialidade em razão da periculosidade ou simplesmente por exposição à radiação ionizante, reconhecidamente cancerígena.


Tem-se, portanto, como cabível o reconhecimento da especialidade, por desenvolver atividade perigosa ou por exposição a radiação ionizante, no período de 05/04/1992 a 04/05/2017 e, ainda, por exposição a ruído, no período de 19/11/2003 a 04/05/2017.

II.b) Da aposentadoria especial

A aposentadoria especial, assim entendida como aquela em que o segurado pode se aposentar com tempo de serviço ou de contribuição inferior ao limite legal, foi prevista como direito constitucional na redação original do art. 202, inciso II, da Constituição Federal, que dispunha:

Art. 202. É assegurada aposentadoria, nos termos da lei, calculando-se o benefício sobre a média dos trinta e seis últimos salários de contribuição, corrigidos monetariamente mês a mês, e comprovada a regularidade dos reajustes dos salários de contribuição de modo a preservar seus valores reais e obedecidas as seguintes condições:

[...]

II - após trinta e cinco anos de trabalho, ao homem, e, após trinta, à mulher, ou em tempo inferior, se sujeitos a trabalho sob condições especiais, que prejudiquem a saúde ou a integridade física, definidas em lei.

Com a Emenda Constitucional 20, de 15 de dezembro de 1998, a aposentadoria especial foi mantida como direito constitucional do segurado, estando prevista no art. 201, § 1.º, com a seguinte redação:

§1º - É vedada a adoção de requisitos e critérios diferenciados para a concessão de aposentadoria aos beneficiários do regime geral de previdência social, ressalvados os casos de atividades exercidas sob condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, definidos em lei complementar.

Por fim, a Emenda Constitucional 47, de 05 de julho de 2005, novamente alterou a redação do texto do § 1.º do art. 201 da Constitucional, desta vez para incluir o direito dos portadores de deficiência, ao lado dos segurados que trabalharam expostos a agentes nocivos à saúde ou à integridade física, de se aposentarem com tempo de contribuição inferior ao limite previsto para a aposentadoria por tempo de contribuição:

1º É vedada a adoção de requisitos e critérios diferenciados para a concessão de aposentadoria aos beneficiários do regime geral de previdência social, ressalvados os casos de atividades exercidas sob condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física e quando se tratar de segurados portadores de deficiência, nos termos definidos em lei complementar.

Pois bem, dispõe o art. 57 da Lei 8.213/1991, na redação dada pela Lei 9.032/1995, que a aposentadoria especial será devida, uma vez cumprida a carência exigida, ao segurado que tiver trabalhado sujeito a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos.

Resta, portanto, analisar se o segurado cumpre o requisito temporal exigido para concessão do benefício de aposentadoria especial:

Data de Nascimento:

06/07/1969

Sexo:

Masculino

DER:

04/05/2017

Nome / Anotações

Início

Fim

Fator

Tempo

Carência

1

Especial

05/04/1992

04/05/2017

1.00

25 anos, 1 meses e 0 dias

0

* Não há períodos concomitantes.

Marco Temporal

Tempo de contribuição

Carência

Idade

Até 16/12/1998 (EC 20/1998)

6 anos, 8 meses e 12 dias

0

29 anos, 5 meses e 10 dias

Até 28/11/1999 (Lei 9.876/99)

7 anos, 7 meses e 24 dias

0

30 anos, 4 meses e 22 dias

Até 04/05/2017 (DER)

25 anos, 1 meses e 0 dias

0

47 anos, 9 meses e 28 dias

Com o período reconhecido especial em Juízo, na data da DER, possuía o autor 25 anos e 1 mês de tempo especial, o que lhe outorga direito à aposentadoria especial.

II.c) Cálculos e valores devidos

A renda mensal inicial (RMI) do benefício deve ser obtida mediante aplicação da legislação vigente à época do preenchimento dos requisitos à sua concessão ou da DER, o que lhe for mais vantajoso.

A renda mensal atual (RMA) deve ser obtida mediante evolução do valor da renda mensal inicial (RMI), com aplicação dos índices legais de reajustamento.

O montante devido pelo INSS corresponde às parcelas devidas, mês a mês, a partir da data de início do benefício - DIB.

No que pertine à correção monetária e aos juros de mora, nos termos do art. 927, III, do CPC, devem ser observados os critérios fixados pelo Superior Tribunal de Justiça no julgamento dos Recursos Especiais nº 1.492.221, nº 1.495.144 e nº 1.495.146, em 22/02/2018, submetidos ao regime dos recursos repetitivos.

Consoante se verifica do referido julgado, afastada pelo STF a possibilidade de recomposição inflacionária pelos índices de correção monetária das cadernetas de poupança (ADIs 4357/DF e 4425/DF), restou fixado que nas condenações impostas à Fazenda Pública de natureza previdenciária deve incidir o INPC a partir da vigência da Lei 11.430/06, que incluiu o artigo 41-A na Lei 8.213/91. No período anterior à vigência da referida lei, devem ser aplicados os índices previstos no Manual de Cálculos da Justiça Federal. Quanto aos juros de mora, no período posterior à vigência da Lei 11.960/2009 incidem segundo a remuneração oficial da caderneta de poupança (artigo 1º-F da Lei 9.494/97, com redação dada pela Lei 11.960/09, reconhecido constitucional no ponto pelo STF no RE 870.947). Veja-se a ementa da referida decisão:

PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. SUBMISSÃO À REGRA PREVISTA NO ENUNCIADO ADMINISTRATIVO 02/STJ. DISCUSSÃO SOBRE A APLICAÇÃO DO ART. 1º-F DA LEI 9.494/97 (COM REDAÇÃO DADA PELA LEI 11.960/2009) ÀS CONDENAÇÕES IMPOSTAS À FAZENDA PÚBLICA. CASO CONCRETO QUE É RELATIVO A CONDENAÇÃO JUDICIAL DE NATUREZA PREVIDENCIÁRIA. • TESES JURÍDICAS FIXADAS. 1. Correção monetária: o art. 1º-F da Lei 9.494/97 (com redação dada pela Lei 11.960/2009), para fins de correção monetária, não é aplicável nas condenações judiciais impostas à Fazenda Pública, independentemente de sua natureza. 1.1 Impossibilidade de fixação apriorística da taxa de correção monetária. No presente julgamento, o estabelecimento de índices que devem ser aplicados a título de correção monetária não implica pré-fixação (ou fixação apriorística) de taxa de atualização monetária. Do contrário, a decisão baseia-se em índices que, atualmente, refletem a correção monetária ocorrida no período correspondente. Nesse contexto, em relação às situações futuras, a aplicação dos índices em comento, sobretudo o INPC e o IPCA-E, é legítima enquanto tais índices sejam capazes de captar o fenômeno inflacionário. 1.2 Não cabimento de modulação dos efeitos da decisão. A modulação dos efeitos da decisão que declarou inconstitucional a atualização monetária dos débitos da Fazenda Pública com base no índice oficial de remuneração da caderneta de poupança, no âmbito do Supremo Tribunal Federal, objetivou reconhecer a validade dos precatórios expedidos ou pagos até 25 de março de 2015, impedindo, desse modo, a rediscussão do débito baseada na aplicação de índices diversos. Assim, mostra-se descabida a modulação em relação aos casos em que não ocorreu expedição ou pagamento de precatório. 2. Juros de mora: o art. 1º-F da Lei 9.494/97 (com redação dada pela Lei 11.960/2009), na parte em que estabelece a incidência de juros de mora nos débitos da Fazenda Pública com base no índice oficial de remuneração da caderneta de poupança, aplica-se às condenações impostas à Fazenda Pública, excepcionadas as condenações oriundas de relação jurídico-tributária. 3. Índices aplicáveis a depender da natureza da condenação.(...) 3.2 Condenações judiciais de natureza previdenciária. As condenações impostas à Fazenda Pública de natureza previdenciária sujeitam-se à incidência do INPC, para fins de correção monetária, no que se refere ao período posterior à vigência da Lei 11.430/2006, que incluiu o art. 41-A na Lei 8.213/91. Quanto aos juros de mora, incidem segundo a remuneração oficial da caderneta de poupança (art. 1º-F da Lei 9.494/97, com redação dada pela Lei n. 11.960/2009).(...) 4. Preservação da coisa julgada. Não obstante os índices estabelecidos para atualização monetária e compensação da mora, de acordo com a natureza da condenação imposta à Fazenda Pública, cumpre ressalvar eventual coisa julgada que tenha determinado a aplicação de índices diversos, cuja constitucionalidade/legalidade há de ser aferida no caso concreto.(...) (grifou-se)

Esse precedente é atual, não foi superado, e é reflexo do dever de uniformizar, manter estável, íntegra e coerente a jurisprudência dos Tribunais. Também não há peculiaridades, ou fatores de distinção, capazes de impedir sua aplicação ao caso concreto. Nos termos do inciso VI do § 1º do art. 489 e do inciso III do artigo 927 do Código de Processo Civil, o conteúdo dessa decisão tem força vinculante.

Frise-se que a sistemática desse tipo de decisão e, junto com ela, toda a doutrina que envolve os precedentes foram desenvolvidas com o objetivo não apenas de racionalizar e desafogar as cortes superiores, mas também de pacificar as discussões no âmbito do Poder Judiciário, garantindo a segurança jurídica.

Decidir diferente da orientação das cortes superiores é desconsiderar suas funções de guardiãs da Lei e da Constituição. É também negar a força normativa da Constituição, que lhes atribuiu papel de uniformização.

Destarte, em face da conclusão apresentada pelo STJ, a correção monetária incidirá desde as respectivas datas em que as prestações vencidas se tornaram devidas, segundo a variação do Índice Nacional de Preços ao Consumidor - INPC a partir da vigência da Lei 11.430/06 e observando os índices previstos no Manual de Cálculos da Justiça Federal para o período anterior.

Os juros de mora incidirão a partir da data da citação, sendo aplicadas as taxas de juros que remuneram as cadernetas de poupança (art. 1º-F da Lei 9.494/1997, com redação dada pela Lei 11.960/2009).​

II.d) Da Inconstitucionalidade do §8º do art. 57 da Lei nº 8.213/91

Defende o autor a desnecessidade de afastamento das atividades laborais de cunho prejudicial para que o segurado possa receber a aposentadoria especial, em conformidade com o §8º do art. 57 da Lei de Benefícios, que assim dispõe:

§ 8º Aplica-se o disposto no art. 46 ao segurado aposentado nos termos deste artigo que continuar no exercício de atividade ou operação que o sujeite aos agentes nocivos constantes da relação referida no art. 58 desta Lei.

Esse dispositivo faz remissão ao art. 46 da mesma Lei, de seguinte teor:

Art. 46. O aposentado por invalidez que retornar voluntariamente à atividade terá sua aposentadoria automaticamente cancelada, a partir da data do retorno.

A questão já foi julgada pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região, que por sua Corte Especial reconheceu a inconstitucionalidade do dispositivo apontado:

PREVIDENCIÁRIO. CONSTITUCIONAL. ARGUIÇÃO DE INCONSTUCIONALIDADE. § 8º DO ARTIGO 57 DA LEI Nº 8.213/91. APOSENTADORIA ESPECIAL. VEDAÇÃO DE PERCEPÇÃO POR TRABALHADOR QUE CONTINUA NA ATIVA, DESEMPENHANDO ATIVIDADE EM CONDIÇÕES ESPECIAIS. 1. Comprovado o exercício de atividade especial por mais de 25 anos, o segurado faz jus à concessão da aposentadoria especial, nos termos do artigo 57 e § 1º da Lei 8.213, de 24-07-1991, observado, ainda, o disposto no art. 18, I, "d" c/c 29, II, da LB, a contar da data do requerimento administrativo. 2. O § 8º do artigo 57 da Lei nº 8.213/91 veda a percepção de aposentadoria especial por parte do trabalhador que continuar exercendo atividade especial. 3. A restrição à continuidade do desempenho da atividade por parte do trabalhador que obtém aposentadoria especial cerceia, sem que haja autorização constitucional para tanto (pois a constituição somente permite restrição relacionada à qualificação profissional), o desempenho de atividade profissional, e veda o acesso à previdência social ao segurado que implementou os requisitos estabelecidos na legislação de regência. 4. A regra em questão não possui caráter protetivo, pois não veda o trabalho especial, ou mesmo sua continuidade, impedindo apenas o pagamento da aposentadoria. Nada obsta que o segurado permaneça trabalhando em atividades que impliquem exposição a agentes nocivos sem requerer aposentadoria especial; ou que aguarde para se aposentar por tempo de contribuição, a fim de poder cumular o benefício com a remuneração da atividade, caso mantenha o vínculo; como nada impede que se aposentando sem a consideração do tempo especial, peça, quando do afastamento definitivo do trabalho, a conversão da aposentadoria por tempo de contribuição em aposentadoria especial. A regra, portanto, não tem por escopo a proteção do trabalhador, ostentando mero caráter fiscal e cerceando de forma indevida o desempenho de atividade profissional. 4. A interpretação conforme a constituição não tem cabimento quando conduz a entendimento que contrarie sentido expresso da lei. 5. Reconhecimento da inconstitucionalidade do § 8º do artigo 57 da Lei nº 8.213/91. (Arguição De Inconstitucionalidade 5001401-77.2012.404.0000, Rel. Des. Federal Ricardo Teixeira Do Valle Pereira) [Destacou-se]

Destarte, em atenção ao disposto no art. 927, V, do CPC, que prevê a observância pelos juízes das decisões do órgão especial a que vinculados, reconheço incidentalmente a inconstitucionalidade do §8º do art. 57 da Lei de Benefícios.

III - Dispositivo

Ante o exposto, julgo procedentes os pedidos, resolvendo o mérito, nos termos do artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil, para declarar incidentalmente a inconstitucionalidade do §8º do art. 57 da Lei nº 8.213/1991 e, reconhecendo o direito, condenar o Instituto Nacional do Seguro Social a:

a) averbar em favor da parte autora o período de atividade especial de 05/04/1992 a 04/05/2017;

b) conceder à parte autora o benefício de aposentadoria especial, com DIB em 04/05/2017 (DER);

c) pagar em favor da parte autora as prestações vencidas, a contar da data de entrada requerimento administrativo (04/05/2017), acrescidas de correção monetária a partir do vencimento de cada prestação e de juros de mora, a contar da citação, nos termos da fundamentação da sentença.

Condeno o INSS ao pagamento dos honorários advocatícios, os quais fixo em 10% sobre o valor da condenação, nos termos do §3º do artigo 85 do Código de Processo Civil, observado o disposto no §4º, inciso II, deste mesmo diploma, consideradas as parcelas vencidas até a data da prolação desta sentença (Súmula 111 do STJ).

Sem custa ao INSS, em face da isenção legal prevista no artigo 4º, inciso I, da Lei 9.289/1996.

Sentença não sujeita ao reexame necessário, observado o disposto no artigo 496, §3º, inciso I, do Código de Processo Civil.

Havendo interposição de recurso de apelação, intime-se a parte adversa para contrarrazões no prazo legal. Em seguida, remetam-se os autos ao Egrégio Tribunal Regional Federal da 4ª Região, observado o disposto no artigo 1.010, §3º, do Código de Processo Civil.

Transitada em julgada a presente decisão, intime-se a AADJ para averbar o período de atividade especial reconhecido na sentença e implantar o benefício em favor da parte autora no prazo de 20 (vinte) dias (itens "a" e "b" do dispositivo). Sem prejuízo, intime-se o Setor de Cálculos do INSS para que, no prazo de 30 (trinta) dias, apresente os cálculos referentes à concessão, nos termos do item "b" do dispositivo. Por fim, intimada a parte autora dos cálculos, cumpra-se o item "c" também do dispositivo da sentença.

Publicada e registrada eletronicamente. Intimem-se.

I - Juízo de admissibilidade: recurso interposto pelo autor

Ausente interesse recursal, ainda que por agente nocivo diverso, o pedido de reconhecimento da especialidade dos período de 05/04/1992 a 04/05/2017, eis que já reconhecido na sentença.

Recurso da parte autora não conhecido.

II - Mérito

II.1 - Atividade Especial

Com relação ao reconhecimento das atividades exercidas como especiais, cumpre ressaltar que o tempo de serviço é disciplinado pela lei em vigor à época em que efetivamente exercido, passando a integrar, como direito adquirido, o patrimônio jurídico do trabalhador. Desse modo, uma vez prestado o serviço sob a égide de legislação que o ampara, o segurado adquire o direito à contagem como tal, bem como à comprovação das condições de trabalho na forma então exigida, não se aplicando retroativamente uma lei nova que venha a estabelecer restrições à admissão do tempo de serviço especial.

Tal entendimento foi manifestado pelo Superior Tribunal de Justiça em julgamento de recurso repetitivo já transitado em julgado, que estabeleceu também a possibilidade de conversão de tempo de serviço especial em comum, mesmo após 1998 (REsp 1151363/MG, STJ, 3ª Seção, Rel. Min. Jorge Mussi, DJe de 05.04.2011).

Tendo em vista a diversidade de diplomas legais que se sucederam na disciplina da matéria, faz-se necessário inicialmente definir qual a legislação aplicável ao caso concreto, ou seja, qual a legislação vigente quando da prestação da atividade pela parte autora.

Tem-se, então, a seguinte evolução legislativa quanto ao tema sub judice:

a) no período de trabalho até 28.4.1995, quando vigente a Lei n° 3.807/60 (Lei Orgânica da Previdência Social) e suas alterações e, posteriormente, a Lei nº 8.213/91 (Lei de Benefícios) em sua redação original (artigos 57 e 58), é possível o reconhecimento da especialidade do trabalho quando houver a comprovação do exercício de atividade enquadrável como especial nos decretos regulamentadores e/ou na legislação especial, ou quando demonstrada a sujeição do segurado a agentes nocivos por qualquer meio de prova (exceto para ruído e calor/frio, casos em que sempre será necessária a mensuração dos níveis por meio de perícia técnica, carreada aos autos ou noticiada em formulário emitido pela empresa, a fim de se verificar a nocividade ou não desses agentes). Para o enquadramento das categorias profissionais, devem ser considerados os Decretos nº 53.831/64 (Quadro Anexo - 2ª parte), nº 72.771/73 (Quadro II do Anexo) e nº 83.080/79 (Anexo II);

b) de 29.4.1995 e até 5.3.1997 foi definitivamente extinto o enquadramento por categoria profissional, de modo que, no interregno compreendido entre esta data e 5.3.1997 (período em que vigentes as alterações introduzidas pela Lei nº 9.032/95 no artigo 57 da Lei de Benefícios), é necessária a demonstração de exposição, efetiva, habitual e permanente, a agentes prejudiciais à saúde ou à integridade física, por qualquer meio de prova, considerando-se suficiente, para tanto, a apresentação de formulário-padrão preenchido pela empresa, sem a exigência de embasamento em laudo técnico (com a ressalva dos agentes nocivos ruído e calor/frio, cuja comprovação depende de perícia, como já referido). Para o enquadramento dos agentes nocivos, devem ser considerados os Decretos nº 53.831/64 (Quadro Anexo - 1ª parte), nº 72.771/73 (Quadro I do Anexo) e nº 83.080/79 (Anexo I);

c) a partir de 6.3.1997, quando vigente o Decreto nº 2.172/97, que regulamentou as disposições introduzidas no artigo 58 da Lei de Benefícios pela Medida Provisória nº 1.523/96 (convertida na Lei nº 9.528/97), passou-se a exigir, para fins de reconhecimento de tempo de serviço especial, a comprovação da efetiva sujeição do segurado a agentes agressivos por meio da apresentação de formulário-padrão, embasado em laudo técnico, ou por meio de perícia técnica. Para o enquadramento dos agentes nocivos, devem ser considerado os Decretos nº 2.172/97 (Anexo IV) e nº 3.048/99.

d) a partir de 1.1.2004, o Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP) passou a ser documento indispensável para a análise do período cuja especialidade for postulada (artigo 148 da Instrução Normativa nº 99 do INSS, publicada no DOU de 10-12-2003). Tal documento substituiu os antigos formulários (SB-40, DSS-8030, ou DIRBEN-8030) e, desde que devidamente preenchido, inclusive com a indicação dos profissionais responsáveis pelos registros ambientais e pela monitoração biológica, exime a parte da apresentação do laudo técnico em juízo.

e) a partir de 14.11.2019, na vigência da Emenda Constitucional 103/2019, o tempo de trabalho em atividade especial exercido após essa data pode ser reconhecido somente para fins de concessão de aposentadoria especial, estando vedada a sua conversão em comum para outros benefícios, conforme o artigo 25, § 2º, da EC 103/2019.

Intermitência

A habitualidade e permanência do tempo de trabalho em condições especiais prejudiciais à saúde ou à integridade física (referidas no artigo 57, § 3º, da Lei n° 8.213/91) não pressupõem a exposição contínua ao agente nocivo durante toda a jornada de trabalho. Tal exposição deve ser ínsita ao desenvolvimento das atividades cometidas ao trabalhador, integrada à sua rotina de trabalho, e não de ocorrência eventual ou ocasional. Exegese diversa levaria à inutilidade da norma protetiva, pois em raras atividades a sujeição direta ao agente nocivo se dá durante toda a jornada de trabalho e, em muitas delas, a exposição em tal intensidade seria absolutamente impossível (EINF n.º 0003929-54.2008.404.7003, TRF/4ª Região, 3ª Seção, Rel. Des. Federal Rogério Favreto, D.E. 24.10.2011; EINF n.º 2007.71.00.046688-7, TRF/4ª Região, 3ª Seção, Rel. Des. Federal Celso Kipper, D.E. 7.11.2011).

Ademais, conforme o tipo de atividade, a exposição ao respectivo agente nocivo, ainda que não diuturna, configura atividade apta à concessão de aposentadoria especial, tendo em vista que a intermitência na exposição não reduz os danos ou riscos inerentes à atividade, não sendo razoável que se retire do trabalhador o direito à redução do tempo de serviço para a aposentadoria, deixando-lhe apenas os ônus da atividade perigosa ou insalubre (EINF n° 2005.72.10.000389-1, TRF/4ª Região, 3ª Seção, Rel. Des. Federal João Batista Pinto Silveira, D.E. 18.5.2011; EINF n° 2008.71.99.002246-0, TRF/4ª Região, 3ª Seção, Rel. Des. Federal Luís Alberto D'Azevedo Aurvalle, D.E. 8.1.2010).

II.2 - Agente Nocivo Ruído

Quanto ao ruído exige-se a demonstração da efetiva exposição, mediante aferição do nível de decibéis (dB) por meio de parecer técnico.

O Quadro Anexo do Decreto n° 53.831/1964, o Anexo I do Decreto n° 83.080/1979, o Anexo IV do Decreto n° 2.172/1997, e o Anexo IV do Decreto nº 3.048/1999 (alterado pelo Decreto n° 4.882/2003) consideram insalubres as atividades que expõem o segurado a níveis de pressão sonora superiores a 80, 85 e 90 decibéis, consoante Códigos 1.1.6, 1.1.5, 2.0.1 e 2.0.1, como demonstra o resumo a seguir, de acordo com o período trabalhado:

- Até 5-3-1997: Anexo do Decreto nº 53.831/64 (superior a 80dB) e Anexo I do Decreto nº 83.080/79 (superior a 90dB)

- De 6-3-1997 a 6-5-1999: Anexo IV do Decreto nº 2.172/97 (superior a 90 dB)

- De 7-5-1999 a 18-11-2003: Anexo IV do Decreto n.º 3.048/99, em sua redação original (superior a 90 dB)

- A partir de 19-11-2003: Anexo IV do Decreto n.º 3.048/99, alterado pelo Decreto n.º 4.882/2003 (superior a 85 dB)

A questão foi tema da análise pelo Superior Tribunal de Justiça em sede de recurso repetitivo com trânsito em julgado, estabelecendo o seguinte entendimento:

ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. MATÉRIA REPETITIVA. ART. 543-C DO CPC E RESOLUÇÃO STJ 8/2008. RECURSO REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. PREVIDENCIÁRIO. REGIME GERAL DE PREVIDÊNCIA SOCIAL. TEMPO ESPECIAL. RUÍDO. LIMITE DE 90DB NO PERÍODO DE 6.3.1997 A 18.11.2003. DECRETO 4.882/2003. LIMITE DE 85 DB. RETROAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. APLICAÇÃO DA LEI VIGENTE À ÉPOCA DA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO. Controvérsia submetida ao rito do art. 543-C do CPC 1. Está pacificado no STJ o entendimento de que a lei que rege o tempo de serviço é aquela vigente no momento da prestação do labor. Nessa mesma linha: REsp 1.151.363/MG, Rel. Ministro Jorge Mussi, Terceira Seção, DJe 5.4.2011; REsp 1.310.034/PR, Rel. Ministro Herman Benjamin, Primeira Seção, DJe 19.12.2012, ambos julgados sob o regime do art. 543-C do CPC. 2. O limite de tolerância para configuração da especialidade do tempo de serviço para o agente ruído deve ser de 90 dB no período de 6.3.1997 a 18.11.2003, conforme Anexo IV do Decreto 2.172/1997 e Anexo IV do Decreto 3.048/1999, sendo impossível aplicação retroativa do Decreto 4.882/2003, que reduziu o patamar para 85 dB, sob pena de ofensa ao art. 6º da LINDB (ex-LICC). Precedentes do STJ. Caso concreto 3. Na hipótese dos autos, a redução do tempo de serviço decorrente da supressão do acréscimo da especialidade do período controvertido não prejudica a concessão da aposentadoria integral. 4. Recurso Especial parcialmente provido. Acórdão submetido ao regime do art. 543-C do CPC e da Resolução STJ 8/2008. (REsp n° 1398260/PR, STJ, 1ª Seção, Rel. Min. Herman Benjamin, DJe 5-12-2014)

Em suma: o limite de tolerância para ruído é:

- de 80 dB(A) até 5-3-1997;

- de 90 dB(A) de 6-3-1997 a 18-11-2003; e

- de 85 dB(A) a partir de 19-11-2003.

Quando demonstrada a exposição a níveis de ruído acima dos limites de tolerância, independentemente da neutralização dos agentes nocivos pelo uso de equipamentos de proteção individual, está caracterizada a atividade como especial.

Sobre a neutralização do agente nocivo ruído pelo uso de EPIs, o Supremo Tribunal Federal manifestou-se em sede de repercussão geral (Tema STF nº 555):

RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. DIREITO CONSTITUCIONAL PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA ESPECIAL. ART. 201, § 1º, DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. REQUISITOS DE CARACTERIZAÇÃO. TEMPO DE SERVIÇO PRESTADO SOB CONDIÇÕES NOCIVAS. FORNECIMENTO DE EQUIPAMENTO DE PROTEÇÃO INDIVIDUAL - EPI. TEMA COM REPERCUSSÃO GERAL RECONHECIDA PELO PLENÁRIO VIRTUAL. EFETIVA EXPOSIÇÃO A AGENTES NOCIVOS À SAÚDE. NEUTRALIZAÇÃO DA RELAÇÃO NOCIVA ENTRE O AGENTE INSALUBRE E O TRABALHADOR. COMPROVAÇÃO NO PERFIL PROFISSIOGRÁFICO PREVIDENCIÁRIO PPP OU SIMILAR. NÃO CARACTERIZAÇÃO DOS PRESSUPOSTOS HÁBEIS À CONCESSÃO DE APOSENTADORIA ESPECIAL. CASO CONCRETO. AGENTE NOCIVO RUÍDO. UTILIZAÇÃO DE EPI. EFICÁCIA. REDUÇÃO DA NOCIVIDADE. CENÁRIO ATUAL. IMPOSSIBILIDADE DE NEUTRALIZAÇÃO. NÃO DESCARACTERIZAÇÃO DAS CONDIÇÕES PREJUDICIAIS. BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO DEVIDO. AGRAVO CONHECIDO PARA NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. 1. Conduz à admissibilidade do Recurso Extraordinário a densidade constitucional, no aresto recorrido, do direito fundamental à previdência social (art. 201, CRFB/88), com reflexos mediatos nos cânones constitucionais do direito à vida (art. 5º, caput, CRFB/88), à saúde (arts. 3º, 5º e 196, CRFB/88), à dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, CRFB/88) e ao meio ambiente de trabalho equilibrado (arts. 193 e 225, CRFB/88). 2. A eliminação das atividades laborais nocivas deve ser a meta maior da Sociedade - Estado, empresariado, trabalhadores e representantes sindicais -, que devem voltar-se incessantemente para com a defesa da saúde dos trabalhadores, como enuncia a Constituição da República, ao erigir como pilares do Estado Democrático de Direito a dignidade humana (art. 1º, III, CRFB/88), a valorização social do trabalho, a preservação da vida e da saúde (art. 3º, 5º, e 196, CRFB/88), e o meio ambiente de trabalho equilibrado (art. 193, e 225, CRFB/88). 3. A aposentadoria especial prevista no artigo 201, § 1º, da Constituição da República, significa que poderão ser adotados, para concessão de aposentadorias aos beneficiários do regime geral de previdência social, requisitos e critérios diferenciados nos "casos de atividades exercidas sob condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, e quando se tratar de segurados portadores de deficiência, nos termos definidos em lei complementar". 4. A aposentadoria especial possui nítido caráter preventivo e impõe-se para aqueles trabalhadores que laboram expostos a agentes prejudiciais à saúde e a fortiori possuem um desgaste naturalmente maior, por que não se lhes pode exigir o cumprimento do mesmo tempo de contribuição que aqueles empregados que não se encontram expostos a nenhum agente nocivo. 5. A norma inscrita no art. 195, § 5º, CRFB/88, veda a criação, majoração ou extensão de benefício sem a correspondente fonte de custeio, disposição dirigida ao legislador ordinário, sendo inexigível quando se tratar de benefício criado diretamente pela Constituição. Deveras, o direito à aposentadoria especial foi outorgado aos seus destinatários por norma constitucional (em sua origem o art. 202, e atualmente o art. 201, § 1º, CRFB/88). Precedentes: RE 151.106 AgR/SP, Rel. Min. Celso de Mello, julgamento em 28/09/1993, Primeira Turma, DJ de 26/11/93; RE 220.742, Rel. Min. Néri da Silveira, julgamento em 03/03/98, Segunda Turma, DJ de 04/09/1998. 6. Existência de fonte de custeio para o direito à aposentadoria especial antes, através dos instrumentos tradicionais de financiamento da previdência social mencionados no art. 195, da CRFB/88, e depois da Medida Provisória nº 1.729/98, posteriormente convertida na Lei nº 9.732, de 11 de dezembro de 1998. Legislação que, ao reformular o seu modelo de financiamento, inseriu os §§ 6º e 7º no art. 57 da Lei n.º 8.213/91, e estabeleceu que este benefício será financiado com recursos provenientes da contribuição de que trata o inciso II do art. 22 da Lei nº 8.212/91, cujas alíquotas serão acrescidas de doze, nove ou seis pontos percentuais, conforme a atividade exercida pelo segurado a serviço da empresa permita a concessão de aposentadoria especial após quinze, vinte ou vinte e cinco anos de contribuição, respectivamente. 7. Por outro lado, o art. 10 da Lei nº 10.666/2003, ao criar o Fator Acidentário de Prevenção-FAP, concedeu redução de até 50% do valor desta contribuição em favor das empresas que disponibilizem aos seus empregados equipamentos de proteção declarados eficazes nos formulários previstos na legislação, o qual funciona como incentivo para que as empresas continuem a cumprir a sua função social, proporcionando um ambiente de trabalho hígido a seus trabalhadores. 8. O risco social aplicável ao benefício previdenciário da aposentadoria especial é o exercício de atividade em condições prejudiciais à saúde ou à integridade física (CRFB/88, art. 201, § 1º), de forma que torna indispensável que o indivíduo trabalhe exposto a uma nocividade notadamente capaz de ensejar o referido dano, porquanto a tutela legal considera a exposição do segurado pelo risco presumido presente na relação entre agente nocivo e o trabalhador. 9. A interpretação do instituto da aposentadoria especial mais consentânea com o texto constitucional é aquela que conduz a uma proteção efetiva do trabalhador, considerando o benefício da aposentadoria especial excepcional, destinado ao segurado que efetivamente exerceu suas atividades laborativas em "condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física". 10. Consectariamente, a primeira tese objetiva que se firma é: o direito à aposentadoria especial pressupõe a efetiva exposição do trabalhador a agente nocivo à sua saúde, de modo que, se o EPI for realmente capaz de neutralizar a nocividade não haverá respaldo constitucional à aposentadoria especial. 11. A Administração poderá, no exercício da fiscalização, aferir as informações prestadas pela empresa, sem prejuízo do inafastável judicial review. Em caso de divergência ou dúvida sobre a real eficácia do Equipamento de Proteção Individual, a premissa a nortear a Administração e o Judiciário é pelo reconhecimento do direito ao benefício da aposentadoria especial. Isto porque o uso de EPI, no caso concreto, pode não se afigurar suficiente para descaracterizar completamente a relação nociva a que o empregado se submete. 12. In casu, tratando-se especificamente do agente nocivo ruído, desde que em limites acima do limite legal, constata-se que, apesar do uso de Equipamento de Proteção Individual (protetor auricular) reduzir a agressividade do ruído a um nível tolerável, até no mesmo patamar da normalidade, a potência do som em tais ambientes causa danos ao organismo que vão muito além daqueles relacionados à perda das funções auditivas. O benefício previsto neste artigo será financiado com os recursos provenientes da contribuição de que trata o inciso II do art. 22 da Lei no 8.212, de 24 de julho de 1991, cujas alíquotas serão acrescidas de doze, nove ou seis pontos percentuais, conforme a atividade exercida pelo segurado a serviço da empresa permita a concessão de aposentadoria especial após quinze, vinte ou vinte e cinco anos de contribuição, respectivamente. O benefício previsto neste artigo será financiado com os recursos provenientes da contribuição de que trata o inciso II do art. 22 da Lei no 8.212, de 24 de julho de 1991, cujas alíquotas serão acrescidas de doze, nove ou seis pontos percentuais, conforme a atividade exercida pelo segurado a serviço da empresa permita a concessão de aposentadoria especial após quinze, vinte ou vinte e cinco anos de contribuição, respectivamente. 13. Ainda que se pudesse aceitar que o problema causado pela exposição ao ruído relacionasse apenas à perda das funções auditivas, o que indubitavelmente não é o caso, é certo que não se pode garantir uma eficácia real na eliminação dos efeitos do agente nocivo ruído com a simples utilização de EPI, pois são inúmeros os fatores que influenciam na sua efetividade, dentro dos quais muitos são impassíveis de um controle efetivo, tanto pelas empresas, quanto pelos trabalhadores. 14. Desse modo, a segunda tese fixada neste Recurso Extraordinário é a seguinte: na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador, no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), no sentido da eficácia do Equipamento de Proteção Individual - EPI, não descaracteriza o tempo de serviço especial para aposentadoria. 15. Agravo conhecido para negar provimento ao Recurso Extraordinário. (ARE 664335, Rel.Min. LUIZ FUX, Tribunal Pleno, j. 4.12.2014, Repercussão Geral - Mérito DJe 12.2.2015)

Ainda, a teor do que se extrai do precedente citado, afasta-se a tese de inexistência de fonte de custeio.

No que se refere à retroação do limite de 85 dB, previsto no Decreto nº 4.882/2003, a questão submete-se ao Tema STJ nº 694: O limite de tolerância para configuração da especialidade do tempo de serviço para o agente ruído deve ser de 90 dB no período de 6.3.1997 a 18.11.2003, conforme Anexo IV do Decreto 2.172/1997 e Anexo IV do Decreto 3.048/1999, sendo impossível aplicação retroativa do Decreto 4.882/2003, que reduziu o patamar para 85 dB, sob pena de ofensa ao art. 6º da LINDB (ex-LICC).

Portanto, tais matérias não comportam maiores digressões, estando definitivamente decididas em precedentes de observância obrigatória (art. 927 do CPC).

Outrossim, a jurisprudência tem admitido a utilização de provas periciais extemporâneas, posteriores ao labor, por conta da presunção de redução da nocividade com o passar dos anos, mas não o contrário (utilização dos laudos para comprovação de tempo futuro):

PREVIDENCIÁRIO. TEMPO ESPECIAL. AGENTES NOCIVOS. RUÍDO. AGENTES BIOLÓGICOS. TÓXICOS INORGÂNICOS. HIDROCARBONETOS AROMÁTICOS. HABITUALIDADE E PERMANÊNCIA NA EXPOSIÇÃO AOS AGENTES NOCIVOS. PERÍCIA EM DATA POSTERIOR AO LABOR. CONVERSÃO EM TEMPO COMUM DEPOIS DE 28/05/1998. POSSIBILIDADE. REQUISITOS IMPLEMENTADOS PARA APOSENTADORIA EM MAIS DE UM REGIME JURÍDICO POSSÍVEL - DIREITO AO MELHOR BENEFÍCIO. CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS DE MORA. FASE DE CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. DIFERIMENTO. 1. O reconhecimento da especialidade e o enquadramento da atividade exercida sob condições nocivas são disciplinados pela lei em vigor à época em que efetivamente exercidos, passando a integrar, como direito adquirido, o patrimônio jurídico do trabalhador. 2. Até 28-04-1995 é admissível o reconhecimento da especialidade por categoria profissional ou por sujeição a agentes nocivos, admitindo-se qualquer meio de prova (exceto para ruído e calor); a partir de 29-04-1995 não mais é possível o enquadramento por categoria profissional, sendo necessária a comprovação da exposição do segurado a agentes nocivos por qualquer meio de prova até 05-03-1997 e, a partir de então, através de formulário embasado em laudo técnico, ou por meio de perícia técnica. 3. Nos limites em que comprovada a exposição do segurado a agente nocivo, na forma exigida pela legislação previdenciária aplicável à espécie, possível reconhecer-se a especialidade do tempo de labor correspondente. 4. A habitualidade e permanência do tempo de trabalho em condições especiais prejudiciais à saúde ou à integridade física referidas no artigo 57, § 3º, da Lei 8.213/91 não pressupõem a submissão contínua ao agente nocivo durante toda a jornada de trabalho. Não se interpreta como ocasional, eventual ou intermitente a exposição ínsita ao desenvolvimento das atividades cometidas ao trabalhador, integrada à sua rotina de trabalho. Precedentes desta Corte. 5. Se a prova pericial, realizada na empresa constata a existência de agentes nocivos em data posterior ao labor, razão não há para se deduzir que as agressões ao trabalhador fossem menores ou inexistissem na época da prestação do serviço, até porque a evolução tecnológica e da segurança do trabalho tendem a causar a redução e não o aumento da nocividade com o passar dos anos. (...) (TRF4 5068522-02.2011.404.7100, 5ª T., Rel. Juíza Federal Taís Schilling Ferraz, 22.6.2017)

DIREITO PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. RECONHECIMENTO DE LABOR INSALUTÍFERO. AGENTE NOCIVO RUÍDO. EPI. LAUDO EXTEMPORÂNEO. FONTE DE CUSTEIO. MANTIDA A CONCESSÃO DO BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. REQUISITOS LEGAIS ATENDIDOS. CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS DE MORA. DIFERIMENTO. TUTELA ESPECÍFICA. 1. Comprovado o exercício de atividade especial, conforme os critérios estabelecidos na lei vigente à época do exercício, o segurado tem direito adquirido ao cômputo do tempo de serviço como tal. 2. Considera-se especial a atividade desenvolvida com exposição a ruído superior a 80 dB até 05.3.1997; superior a 90 dB entre 06.3.1997 a 18.11.2003 e superior a 85 dB a partir de 19.11.2003 (REsp 1.398.260). 3. O uso de EPI's (equipamentos de proteção), por si só, não basta para afastar o caráter especial das atividades desenvolvidas pelo segurado. Seria necessária uma efetiva demonstração da elisão das consequências nocivas, além de prova da fiscalização do empregador sobre o uso permanente dos dispositivos protetores da saúde do obreiro durante toda a jornada de trabalho. 4. Não havendo indícios de alteração significativa no layout da empresa, não há óbice à utilização de laudo extemporâneo como prova da especialidade das atividades, uma vez que não há razão para se deduzir que as agressões ao trabalhador fossem menores ou inexistissem em época anterior, até porque a evolução tecnológica e da segurança do trabalho tendem a causar a redução e não o aumento da nocividade com o passar dos anos. 5. O direito do trabalhador à proteção de sua saúde no ambiente do trabalho emana da realidade das coisas vis a vis a legislação protetiva - compreendida desde uma perspectiva constitucional atenta à eficácia vinculante dos direitos fundamentais sociais. Deve-se, aqui também, prestigiar a realidade e a necessidade da proteção social correlata, de modo que suposta omissão ou inércia do legislador, quanto à necessidade de uma contribuição específica, não implica a conclusão de que a proteção social, plenamente justificável, estaria a violar o princípio constitucional da precedência do custeio. (...) (TRF4, AC 5003363-94.2011.404.7009, 5ª T.,, Relator Des. Federal Roger Raupp Rios, 14.6.2017)

Por fim, no que se refere à metodologia de medição do ruído, o Superior Tribunal de Justiça, sob a sistemática dos recursos especiais repetitivos (REsp 1.886.795/RS), fixou no Tema 1083 a seguinte tese:

"O reconhecimento do exercício de atividade sob condições especiais pela exposição ao agente nocivo ruído, quando constatados diferentes níveis de efeitos sonoros, deve ser aferido por meio do Nível de Exposição Normalizado (NEN). Ausente essa informação, deverá ser adotado como critério o nível máximo de ruído (pico de ruído), desde que perícia técnica judicial comprove a habitualidade e a permanência da exposição ao agente nocivo na produção do bem ou na prestação do serviço.

O acórdão foi assim ementado:

PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA. APOSENTADORIA ESPECIAL. AGENTE NOCIVO RUÍDO. NÍVEL DE INTENSIDADE VARIÁVEL. HABITUALIDADE E PERMANÊNCIA. METODOLOGIA DO NÍVEL DE EXPOSIÇÃO NORMALIZADO - NEN. REGRA. CRITÉRIO DO NÍVEL MÁXIMO DE RUÍDO (PICO DE RUÍDO). AUSÊNCIA DO NEN. ADOÇÃO. 1. A Lei de Benefícios da Previdência Social, em seu art. 57, § 3º, disciplina que a aposentadoria especial será devida, uma vez cumprida a carência, ao segurado que comprovar tempo de trabalho permanente, não ocasional nem intermitente, em condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, durante o período mínimo fixado em lei, sendo certo que a exigência legal de habitualidade e permanência não pressupõe a exposição contínua ao agente nocivo durante toda a jornada de trabalho. 2. A questão central objeto deste recurso versa acerca da possibilidade de reconhecimento do exercício de atividade sob condições especiais pela exposição ao agente ruído, quando constatados diferentes níveis de efeitos sonoros, considerando-se apenas o nível máximo aferido (critério "pico de ruído"), a média aritmética simples ou o Nível de Exposição Normalizado (NEN). 3. A Lei n. 8.213/1991, no § 1º do art. 58, estabelece que a comprovação da efetiva exposição do segurado aos agentes nocivos será feita por formulário com base em Laudo Técnico de Condições Ambientais do Trabalho - LTCAT nos termos da legislação trabalhista. 4. A partir do Decreto n. 4.882/2003, é que se tornou exigível, no LTCAT e no Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), a referência ao critério Nível de Exposição Normalizado - NEN (também chamado de média ponderada) em nível superior à pressão sonora de 85 dB, a fim de permitir que a atividade seja computada como especial. 5. Para os períodos de tempo de serviço especial anteriores à edição do referido Decreto, que alterou o Regulamento da Previdência Social, não há que se requerer a demonstração do NEN, visto que a comprovação do tempo de serviço especial deve observar o regramento legal em vigor por ocasião do desempenho das atividades. 6. Descabe aferir a especialidade do labor mediante adoção do cálculo pela média aritmética simples dos diferentes níveis de pressão sonora, pois esse critério não leva em consideração o tempo de exposição ao agente nocivo durante a jornada de trabalho. 7. Se a atividade especial somente for reconhecida na via judicial, e não houver indicação do NEN no PPP, ou no LTCAT, caberá ao julgador solver a controvérsia com base na perícia técnica realizada em juízo, conforme disposto no art. 369 do CPC/2015 e na jurisprudência pátria, consolidada na Súmula 198 do extinto Tribunal Federal de Recursos, observado o critério do pico de ruído. 8. Para os fins do art. 1.039, CPC/2015, firma-se a seguinte tese: "O reconhecimento do exercício de atividade sob condições especiais pela exposição ao agente nocivo ruído, quando constatados diferentes níveis de efeitos sonoros, deve ser aferido por meio do Nível de Exposição Normalizado (NEN). Ausente essa informação, deverá ser adotado como critério o nível máximo de ruído (pico de ruído), desde que perícia técnica judicial comprove a habitualidade e a permanência da exposição ao agente nocivo na produção do bem ou na prestação do serviço." 9. In casu, o acórdão do Tribunal de origem manteve a sentença que concedeu ao segurado a aposentadoria especial, consignando ser possível o reconhecimento do labor especial por exposição a ruído variável baseado nos picos de maior intensidade, quando não houver informação da média de ruído apurada segundo a metodologia da FUNDACENTRO, motivo pelo qual merece ser mantido. 10. Recurso da autarquia desprovido. (REsp 1886795/RS, Rel. Ministro GURGEL DE FARIA, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 18/11/2021, DJe 25/11/2021)

Como se vê do item 4 da ementa, somente a partir do Decreto n. 4.882/2003 é que se tornou exigível, no LTCAT e no Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), a referência ao critério Nível de Exposição Normalizado - NEN (também chamado de média ponderada) em nível superior à pressão sonora de 85 dB, a fim de permitir que a atividade seja computada como especial.

O item 5 determina que para os períodos de tempo de serviço especial anteriores à edição do referido Decreto, que alterou o Regulamento da Previdência Social, não há que se requerer a demonstração do NEN, visto que a comprovação do tempo de serviço especial deve observar o regramento legal em vigor por ocasião do desempenho das atividades.

O item 6 estabelece que descabe aferir a especialidade do labor mediante adoção do cálculo pela média aritmética simples dos diferentes níveis de pressão sonora, pois esse critério não leva em consideração o tempo de exposição ao agente nocivo durante a jornada de trabalho.

A orientação contida do item 7 em conjunto com a parte final do item 8 dispõe que, na ausência de indicação do NEN no PPP, ou no LTCAT, deve ser utilizado o critério do pico de ruído, e que caberá ao Juízo determinar a realização de perícia técnica para aferir a a habitualidade e a permanência da exposição do trabalhador àquele nível de pressão sonora insalubre. Nesta hipótese, entende-se que a perícia será necessária se o PPP ou Laudo não indicarem a habitualidade e a permanência do segurado em trabalho com exposição a picos de ruído nocivo.

Aferição do ruído pelos critérios da Fundacentro (NHO 01) ou NR-15.

A aplicação da NR nº 15 do MTB para além do campo do Direito do Trabalho, alcançando as causas previdenciárias, ocorreu a partir da Medida Provisória nº 1.729, publicada em 03.12.1998 e convertida na Lei nº 9.732, quando a redação do artigo 58, § 1º, da Lei nº 8.213/91 passou a incluir a expressão "nos termos da legislação trabalhista":

A relação dos agentes nocivos químicos, físicos e biológicos ou associação de agentes prejudiciais à saúde ou à integridade física considerados para fins de concessão da aposentadoria especial de que trata o artigo anterior será definida pelo Poder Executivo. § 1º A comprovação da efetiva exposição do segurado aos agentes nocivos será feita mediante formulário, na forma estabelecida pelo Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, emitido pela empresa ou seu preposto, com base em laudo técnico de condições ambientais do trabalho expedido por médico do trabalho ou engenheiro de segurança do trabalho nos termos da legislação trabalhista).

É a partir daquele marco temporal (03.12.1998) que as disposições trabalhistas concernentes à caracterização de atividades ou operações insalubres (NR-15) - com os respectivos conceitos de "limites de tolerância", "concentração", "natureza" e "tempo de exposição ao agente" passam a influir na caracterização da natureza de uma dada atividade (se especial ou comum).

Assim, ampliaram-se as possibilidades de reconhecimento da atividade especial, com fundamento nas normas regulamentadoras da legislação trabalhista, que passaram a servir de fundamento para o enquadramento de agentes não descritos nos Decretos nºs 2.172/97 e 3.048/99, (v.g., frio, umidade, radiações não ionizantes, eletricidade, periculosidade etc.). De fato, o Decreto nº 4.882/03, ao alterar a redação do art. 68 do Regulamento da Previdência Social, expressamente previu, no seu § 11, que "As avaliações ambientais deverão considerar a classificação dos agentes nocivos e os limites de tolerância estabelecidos pela legislação trabalhista."

No âmbito administrativo, a Instrução Normativa/INSS nº 77/2015, ao regulamentar a matéria, estabelece que:

Art. 278. Para fins da análise de caracterização da atividade exercida em condições especiais por exposição à agente nocivo, consideram- se:

I - nocividade: situação combinada ou não de substâncias, energias e demais fatores de riscos reconhecidos, presentes no ambiente de trabalho, capazes de trazer ou ocasionar danos à saúde ou à integridade física do trabalhador; e

II - permanência: trabalho não ocasional nem intermitente no qual a exposição do empregado, do trabalhador avulso ou do contribuinte individual cooperado ao agente nocivo seja indissociável da produção do bem ou da prestação do serviço, em decorrência da subordinação jurídica a qual se submete.

§ 1º Para a apuração do disposto no inciso I do caput, há que se considerar se a avaliação de riscos e do agente nocivo é:

(...)

II - quantitativo, sendo a nocividade considerada pela ultrapassagem dos limites de tolerância ou doses, dispostos nos Anexos 1, 2, 3, 5, 8, 11 e 12 da NR-15 do MTE, por meio da mensuração da intensidade ou da concentração consideradas no tempo efetivo da exposição no ambiente de trabalho.

Especificamente com relação ao ruído, o imbróglio decorre da previsão contida no art. 280 da IN/INSS nº 77, assim redigido:

Art. 280. A exposição ocupacional a ruído dará ensejo a caracterização de atividade exercida em condições especiais quando os níveis de pressão sonora estiverem acima de oitenta dB (A), noventa dB (A) ou 85 (oitenta e cinco) dB (A), conforme o caso, observado o seguinte:

I - até 5 de março de 1997, véspera da publicação do Decreto nº 2.172/97, de 5 de março de 1997, será efetuado o enquadramento quando a exposição for superior a oitenta dB (A), devendo ser informados os valores medidos;

II - de 6 de março de 1997, data da publicação do Decreto nº 2.172/97, de 5 de março de 1997, até 10 de outubro de 2001, véspera da publicação da Instrução Normativa, INSS/DC nº 57, de 10 de outubro de 2001, será efetuado o enquadramento quando a exposição for superior a noventa dB (A), devendo ser informados os valores medidos;

III - de 11 de outubro de 2001, data da publicação da Instrução Normativa, INSS/DC nº 57, de 10 de outubro de 2001, véspera da publicação do Decreto nº 4.882, de 18 de novembro de 2003, será efetuado o enquadramento quando a exposição for superior a noventa dB (A), devendo ser anexado o histograma ou memória de cálculos; e

IV - a partir de 01 de janeiro de 2004, será efetuado o enquadramento quando o Nível de Exposição Normalizado - NEN se situar acima de 85 (oitenta e cinco) dB (A) ou for ultrapassada a dose unitária, conforme NHO 1 da FUNDACENTRO, sendo facultado à empresa a sua utilização a partir de 19 de novembro de 2003, data da publicação do Decreto nº 4.882, de 2003, aplicando:

a) os limites de tolerância definidos no Quadro do Anexo I da NR-15 do MTE; e

b) as metodologias e os procedimentos definidos nas NHO-01 da FUNDACENTRO.

O Decreto nº 8.123/2013, por sua vez, ao acrescentar à redação do art. 68 do Decreto nº 3.048/99 o § 12, de igual modo, ressaltou que, "Nas avaliações ambientais deverão ser considerados, além do disposto no Anexo IV, a metodologia e os procedimentos de avaliação estabelecidos pela Fundação Jorge Duprat Figueiredo de Segurança e Medicina do Trabalho - FUNDACENTRO."

A interpretação conjugada destes preceitos induz à conclusão de que devem ser observados os limites de tolerância definidos no Quadro do Anexo I da NR-15 do MTE e as metodologias e os procedimentos definidos na NHO-01 da FUNDACENTRO. Todavia, a leitura da nota inserta à fl. 21 da NHO-01 revela seu caráter de norma recomendatória, e não obrigatória, à medida que não está vinculada aos critérios legais traçados pelas normas trabalhistas:

Com efeito, a metodologia da NR nº 15 não pode ser afastada por ato administrativo normativo, sob pena de ferir o princípio da legalidade, destacando que as Normas de Higiene Ocupacional da Fundacentro não têm valor normativo.

Nesse sentido:

PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. TEMPO DE ATIVIDADE RURAL. SEGURADO ESPECIAL. TEMPO ESPECIAL. RUÍDO. PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS. (...) 3. As metodologias e procedimentos definidos pela NHO-01 da FUNDACENTRO para apuração da exposição ao agente nocivo ruído, de observância determinada pelo art. 280 da IN/INSS nº 77, possuem natureza recomendatória, e não obrigatória, à medida que não estão vinculadas aos critérios legais traçadas pelas normas trabalhistas. 4. Comprovada a especialidade da atividade desempenhada nos períodos pugnados, tem a parte autora direito ao benefício pleiteado. (TRF4, AC 5007475-90.2017.4.04.7205, TRS/SC, Relator Des. Federal Paulo Afonso Brum Vaz, 13.12.2019)

PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. ATIVIDADE ESPECIAL. CONSECTÁRIOS. 1. Para fins de verificação do agente nocivo ruído, quando a média ponderada constar do processo, é ela que deve ser usada para fins de verificação do enquadramento da atividade como especial. No entanto, quando não houver indicação da metodologia, ou for utilizada metodologia diversa daquela da FUNDACENTRO, o enquadramento deve ser analisado de acordo com a aferição do ruído que for apresentada no processo. Precedentes deste Tribunal. (...) (TRF4 5018487-09.2014.4.04.7108, 5ª T., Relatora Juíza Federal Gisele Lemke, 18/12/2019)

Não obstante, cumpre destacar que é da empresa, e não do segurado, a responsabilidade pela observância da metodologia recomendada pela NHO-01 para aferição do ruído e que é dever do INSS, por sua ação fiscalizatória, determinar a adequação do formulário PPP às normas de regência (art. 225 do Decreto nº 3.048/99 e art. 125-A da Lei nº 8.213/91).

Outrossim, em face da superveniência da definição do Tema 1083 pelo Superior Tribunal de Justiça, os critérios a serem utilizados são aqueles determinados no referido Tema.

II.3 - Radiações Ionizantes

A aplicação da NR-15 para além do campo do Direito do Trabalho, alcançando as causas previdenciárias, ocorreu a partir da Medida Provisória nº 1.729, publicada em 3.12.1998 e convertida na Lei nº 9.732, quando a redação do artigo 58, § 1º, da Lei nº 8.213/1991 passou a incluir a expressão 'nos termos da legislação trabalhista'. ("A relação dos agentes nocivos químicos, físicos e biológicos ou associação de agentes prejudiciais à saúde ou à integridade física considerados para fins de concessão da aposentadoria especial de que trata o artigo anterior será definida pelo Poder Executivo. § 1º A comprovação da efetiva exposição do segurado aos agentes nocivos será feita mediante formulário, na forma estabelecida pelo Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, emitido pela empresa ou seu preposto, com base em laudo técnico de condições ambientais do trabalho expedido por médico do trabalho ou engenheiro de segurança do trabalho nos termos da legislação trabalhista").

A partir deste marco temporal (3.12.1998) as disposições trabalhistas concernentes à caracterização de atividades ou operações insalubres (NR-15) - com os respectivos conceitos de 'limites de tolerância', 'concentração', 'natureza' e 'tempo de exposição ao agente' passam a influir na caracterização da natureza da atividade (se especial ou comum).

Conforme o Anexo nº 5 da NR nº 15 do MTE, "Nas atividades ou operações onde trabalhadores possam ser expostos a radiações ionizantes, os limites de tolerância (...) são os constantes da Norma CNEN-NE-3.01: 'Diretrizes Básicas de Radioproteção', de julho de 1988, aprovada, em caráter experimental, pela Resolução CNEN nº 12/88, ou daquela que venha a substituí-la."

Portanto, a partir de 03.12.1998, para o enquadramento da atividade como nociva é necessário demonstrar exposição do trabalhador à radiação ionizante.

Outrossim, o uso de EPI eficaz não é suficiente para descaracterizar o reconhecimento da insalubridade da atividade exercida com exposição à radiação ionizante, consoante decidido por este Tribunal no voto complementar do Relator, proferido no julgamento dos Embargos de Declaração no IRDR 5054341-77.2016.4.04.0000:

Ao analisar os embargos de declaração do IBDP, no ponto em que se sustenta OMISSÃO sobre o 'Segundo Passo' - situações que dispensam a produção da eficácia da prova do EPI - no sentido de que elas seriam meramente exemplificativas, inicialmente manifestei que as situações seriam TAXATIVAS - 'roteiro resumido'. Ou seja, todas as demais situações (envolvendo outros agentes nocivos) deveriam ser solvidas na eventual pericia judicial, de observância obrigatória pelo juiz singular.

O ilustre Desembargador Federal Paulo Afonso Brum Vaz apresentou voto divergente, sustentando - em resumo - que as situações deveriam ser elencadas de forma meramente ilustrativa, ou seja, de forma aberta, possibilitando que o juiz - no caso concreto - admitisse uma nova exceção (e, por conseqüência, não realizasse a perícia judicial). Ainda, citou outros agentes nocivos contra os quais - conforme doutrina científica - o uso de EPIs seria ineficaz.

Na mesma sessão, o ilustre Desembargador Federal João Batista Pinto Silveira manifestou-se, oralmente, sobre o ponto, salientando que o rol deveria ser taxativo, no sentido de que - ressalvadas as exceções que este Tribunal considerasse como válidas - o juiz singular deveria realizar a perícia, de forma obrigatória, sem nenhuma possibilidade de análise de mérito (criar nova exceção).

Diante da extrema importância do tema, resolvi apresentar este voto complementar.

Parece-me que a observação do ilustre Desembargador Federal João Batista Pinto Silveira é extremamente válida. De fato, o rol das exceções deve ser taxativo. Todavia, isso não significa que deva ser imutável! Pelo contrário, consoante a evolução científica e a conseqüente evolução jurisprudencial, é dever de este Regional rever o rol taxativo. Ressalto: o órgão competente para tal revisão é TRF da 4ª Região. Não se pode delegar tal decidir ao juiz singular (de forma indireta, quando se classifica o elenco como meramente ilustrativo).

Assim, por terem sido aceitas de forma unânime, proponho que sejam incluídas algumas exceções apontadas pelo ilustre Desembargador Federal Paulo Afonso Brum Vaz (voto divergente - embargos de declaração, quais sejam: calor, radiações ionizantes e trabalhos em condições hiperbáricas) no rol taxativo previsto no IRDR Tema 15, com possibilidade de revisão futura, por este Colegiado, das situações pré-listadas, através da instauração de novo IRDR.

De fato, além da doutrina apontada pelo eminente Desembargador, saliento que a jurisprudência deste Regional abona as conclusões sobre a especialidade gerada pelos agentes nocivos elencados, senão vejamos (a título de exemplo - grifos meus):

(...)

b) radiações ionizantes:

(...)

Ademais, a alegação a respeito da necessária medição da intensidade/concentração da radiação ionizante, deve ser afastada.

O Anexo nº 5 da Norma Regulamentadora nº 15 trata da matéria, definindo que os limites de tolerância dos trabalhadores expostos a radiações ionizantes são os constantes da Norma CNEN-NE-3.0.

A Norma CNEN-NE-3.01, referente a diretrizes básicas de proteção radiológica, da Comissão Nacional de Energia Nuclear, estabelece limites de doses anuais máximos de exposição anual para indivíduo ocupacionalmente exposto (e não mínimos, de tolerância), conforme se vê do item 5.4.2.1:

"5.4.2.1. A exposição normal dos indivíduos deve ser restringida de tal modo que nem a dose efetiva nem a dose equivalente nos órgãos ou tecidos de interesse, causadas pela possível combinação de exposições originadas por práticas autorizadas, excedam o limite de dose especificado na tabela a seguir, salvo em circunstâncias especiais, autorizadas pela CNEN...."

Além disso, a Norma Regulamentadora nº 32, de segurança e saúde no trabalho em serviços de saúde, orienta os trabalhadores, quanto às radiações ionizantes, à permanência no menor tempo possível para a realização de procedimentos, bem como estar sob monitoração individual de dose de radiação ionizante (item 32.4.3, alíneas a e e).

Outrossim, cuidando-se de agente nocivo cancerígeno para humanos, a simples exposição ao agente (qualitativa) dá ensejo ao reconhecimento da atividade especial, qualquer que seja o nível de concentração no ambiente de trabalho do segurado, desde que comprovada a sua exposição pessoal durante a jornada de trabalho.

Nesse sentido:

PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. REQUISITOS. ATIVIDADE ESPECIAL. TÉCNICO EM RADIOLOGIA. RADIAÇÕES IONIZANTES. RAIO X. AGENTES CANCERÍGENOS. INEFICÁCIA DO EPI. HABITUALIDADE E PERMANÊNCIA. TUTELA ESPECÍFICA. 1. A exposição do técnico de radiologia a radiações ionizantes enseja o reconhecimento de tempo especial, nos termos do código 2.0.3, alínea e, do anexo IV do Decreto 3.048/1999. 2. As radiações ionizantes integram a Lista Nacional de Agentes Cancerígenos para Humanos, publicada através da Portaria Interministerial MTE/MS/MPS nº 9, de 07/10/2014, constando no Grupo 1 da referida lista, que elenca os agentes confirmados como carcinogênicos para humanos. 3. Tratando de agente nocivo reconhecidamente cancerígeno e que consta no Anexo IV do Decreto nº 3.048/99, a sua mera presença no ambiente de trabalho basta à comprovação da exposição efetiva do trabalhador, sendo suficiente a avaliação qualitativa e irrelevante, para fins de contagem especial, a utilização de equipamentos de proteção individual. (...) . (TRF4, AC 5007524-15.2018.4.04.7200, TRS/SC, Relator Des. Federal Celso Kipper, 24/05/2022)

PREVIDENCIÁRIO. CONCESSÃO DE APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. ATIVIDADE ESPECIAL. TÉCNICO EM DENSITOMETRIA ÓSSEA. RADIAÇÃO IONIZANTE. AGENTE CANCERÍGENO. ANÁLISE QUALITATIVA. USO DE EPI. INEFICÁCIA PRESUMIDA. 1. Com relação ao reconhecimento das atividades exercidas como especiais, cumpre ressaltar que o tempo de serviço é disciplinado pela lei em vigor à época em que efetivamente exercido, passando a integrar, como direito adquirido, o patrimônio jurídico do trabalhador. Desse modo, uma vez prestado o serviço sob a égide de legislação que o ampara, o segurado adquire o direito à contagem como tal, bem como à comprovação das condições de trabalho na forma então exigida, não se aplicando retroativamente uma lei nova que venha a estabelecer restrições à admissão do tempo de serviço especial. 2. As radiações ionizantes integram a Lista Nacional de Agentes Cancerígenos para Humanos, publicada através da Portaria Interministerial MTE/MS/MPS nº 9, de 07/10/2014, constando no Grupo 1 da referida lista, que elenca os agentes confirmados como carcinogênicos para humanos. 3. Tratando-se de agente nocivo reconhecidamente cancerígeno e que consta no Anexo IV do Decreto nº 3.048/99, a sua mera presença no ambiente de trabalho basta à comprovação da exposição efetiva do trabalhador, sendo suficiente a avaliação qualitativa. 4. A utilização de EPI, por sua vez, não afasta a especialidade do labor, pois é presumida a sua ineficácia em relação a agentes cancerígenos. (TRF4, AC 5021719-23.2018.4.04.7000, TRS/PR, Relatora Des. Federal Cláudia Cristina Cristofani, 29/06/2022)

II.4 - Caso concreto

O INSS impugna o reconhecimento da especialidade do período de 05/04/1992 a 04/05/2017.

Período(s)05/04/1992 a 04/05/2017
EmpresaB.O. Paper Brasil Indústria de Papéis Ltda (Inpacel - Ind. de Papel Arapoti S/A)
Função/setor/atividades

05/04/92 a 10/05/93 (Tec. instrumentista II)

11/05/93 a 04/11/94 (Tec. instrumentista PL/Turno)

05/11/94 a 31/03/96 (Tec. instrumentista/SR Turno)

01/04/96 a 31/12/98 (Tec. instrumentista sênior)

01/01/99 a 01/11/00 (Tec. instrumentista sênior)

02/11/00 a 31/10/01 (Tec. instrumentação sênior)

01/11/01 a 31/10/07 (Tec. instrumentação SR)

01/11/07 a 31/12/09 (Tec. instrumentação SR/Turno)

01/01/10 a 04/05/17 (Tec. em instrumentação)

Agente nocivoRuído e radiação ionizante
Enquadramento legalArt. 57 da Lei nº 8.213/91
ProvasPPP (evento 13, PPP2)
Laudos (evento 13, LAUDO5)
Laudos periciais (evento 6, LAUDO9, evento 32, LAUDO2 e evento 47, LAUDO47)

O formulário profissiográfico informa o seguinte:

O juízo sentenciante reconheceu a especialidade com base nos seguintes fundamentos:

Acerca do ruído o PPP traz as seguintes aferições:

a) 05/04/92 a 31/12/02: 79,7 dB.

b) 01/01/03 a 31/12/06: 88,7 dB.

c) 01/01/07 a 31/12/07: 88,7 dB.

d) 01/01/08 a 12/01/14: 88,7 dB.

e) 13/01/14 a 04/05/17: 90,2 dB

No campo das observações consta que o PPP foi preenchido com base nos seguintes documentos: LTCAT de 1996 e PPRA de 2003, 2005, 2006, 2007, 2008/2009, 2009/2010, 2011, 2012, 2014, 2015, 2016 e 2017/2018.
Laudo de 1996 confirma a dosimetria de 79,7 dB para a função de instrumentista, com menção à dose de 45,4 para jornada de oito horas (evento 13, LAUDO5, p. 3).
Laudos de 2003 e 2006, para a função de instrumentação SR, confirmam a exposição a ruído contínuo de 88,7 dB (evento 13, LAUDO5, p. 6 e 12).
Laudos de 2007, 2008, 2009/2010, 2011, para a função de tec. instrumentação (Sr), confirmam a dosimetria de ruído de 88,7 dB (Leq), com espécie de exposição contínua (evento 13, LAUDO5, p. 15, 18, 21 e 24).
Laudos de 2012/2013, para a função de técnico de instrumentação, confirma a exposição permanente a ruído de 88,7 dB (evento 13, LAUDO5, p. 27).
Laudo de 13/01/2014, para a função de técnico em instrumentação, confirma a exposição permanente a ruído de 90,2 dB (evento 13, LAUDO5, p. 30).
Laudos de 2015, 2016 e 2017, confirmam a exposição a ruído de 90,2 dB, com menção ao NEN de 92,2 e à dose de 2,07 (evento 13, LAUDO5, p. 40, 48 e 56).
Os ruídos não superam os limites de tolerância de 80 e 90 dB vigentes entre 05/04/1992 e 18/11/2003, mas superam o limite de tolerância de 85 dB a partir de 19/11/2003.
Para o período de 05/04/1992 a 18/11/2003, resta analisar a sujeição a outros agentes agressivos.
O PPP informa exposição a radiação ionizante desde 05/04/1992.

As radiações ionizantes são consideradas nocivas pela legislação previdenciária nos código 1.1.4 do Quadro Anexo ao Decreto nº 53.381/64, código 1.1.3 do Quadro Anexo I ao Decreto nº 83.080/79, e código 2.0.3, alínea "e", do anexo IV aos Decretos 2.172/97 e 3.048/1999.

Tratando da relação entre concentração de agentes nocivos e insalubridade, cumpre registrar que a partir da vigência da MP 1.729/1998, convertida na Lei 9.732/1998, a qual alterou o § 1º, do art. 57, Lei 8.213/1991, as disposições trabalhistas concernentes à caracterização de atividade ou operações insalubres (NR-15), tais como os conceitos de "limites de tolerância", "concentração", "natureza", "uso de equipamentos de proteção individual" e "tempo de exposição ao agente", passaram a influir na caracterização da natureza de uma atividade, se especial ou comum (IUJEF 0000844-24.2010.404.7251, Turma Regional de Uniformização da 4ª Região, Relator p/ Acórdão José Antônio Savaris, D.E. 29/09/2011).

A NR 15, Anexo 5, do MTE prevê que, nas atividades ou operações onde trabalhadores possam ser expostos a radiações ionizantes, os limites de tolerância, os princípios, as obrigações e controles básicos para a proteção do homem e do seu meio ambiente contra possíveis efeitos indevidos causados pela radiação, são os constantes da Norma CNEN-NE-3.01: "Diretrizes Básicas de Radioproteção", aprovada pela Resolução CNEN n.º 12/88, ou daquela que venha a substituí-la.

A Comissão Nacional de Energia Nuclear - CNEN, por meio do CNEN-NN-3.01 - Diretrizes Básicas de Proteção Radiológica, aborda, no item 5.4.2.1, o limite de dose individual.

Aqueles que trabalham expostos à radiação ionizante são denominados IOE (indivíduo ocupacionalmente exposto - indivíduo sujeito à exposição ocupacional). A exposição ocupacional consiste na exposição normal ou potencial de um indivíduo em decorrência de seu trabalho ou treinamento em práticas autorizadas ou intervenções, excluindo-se a radiação natural do local.

Para o IOE, a referida norma prevê limite de tolerância de 20 mSv por ano (período de janeiro a dezembro).

Instada a se manifestar em um primeiro momento sobre a exposição a fontes radioativas, a empresa declarou que o autor permanece exposto de forma eventual às fontes radioativas quando realiza manutenção, calibração e aferição dos equipamentos de medição e monitoração radiométricas pertencentes à instalação (evento 13, CARTINTIM4, p. 1).

Intimada novamente para informar a frequência com que ocorria a exposição a fontes radioativas, declarou a empregadora que o bloqueio do sistema de medidor nuclear de densidade e nível (Césio 137) se dava duas vezes por mês, com duração de trinta minutos, enquanto a limpeza da cabeça de frame - medidor nuclear de gramatura (Promécio 147), era diariamente acionado uma ou duas vezes ao dia, com duração de cinco minutos (evento 41, RESPOSTA3, p. 1-2).


Dos laudos que foram juntados, os de 2008, 2009/2010, 2011, 2012/2013, 2014, 2015, 2016 e 2017 retratam a exposição a radiação ionizante, informando os três primeiros e o quinto ser ela intermitente, o quarto que é eventual, e os três últimos que é habitual e intermitente, sendo que nenhum deles apresentou as doses a que o funcionário estaria submetido.

Três laudos periciais feitos para funcionários diversos que exerceram a mesma função do autor, juntados no decorrer do processo, também não avaliaram a intensidade da exposição, a despeito de tratar da condição de periculosidade.


Não se pode olvidar, contudo, que as radiações ionizantes integram a Lista Nacional de Agentes Cancerígenos para Humanos, publicada através da Portaria Interministerial MTE/MS/MPS nº 9, de 07/10/2014, constando no Grupo 1 da referida lista, que elenca os agentes confirmados como carcinogênicos para humanos.

Acerca da questão, atente-se que com a edição do Decreto nº 8.123/2013, o art. 68, § 4º, do Decreto nº 3.048-99, passou a vigorar com a seguinte redação:

Art. 68. A relação dos agentes nocivos químicos, físicos, biológicos ou associação de agentes prejudiciais à saúde ou à integridade física, considerados para fins de concessão de aposentadoria especial, consta do Anexo IV.§

(...)

4o A presença no ambiente de trabalho, com possibilidade de exposição a ser apurada na forma dos §§ 2o e 3o, de agentes nocivos reconhecidamente cancerígenos em humanos, listados pelo Ministério do Trabalho e Emprego, será suficiente para a comprovação de efetiva exposição do trabalhador. (grifou-se)

Destarte, tratando de agente nocivo reconhecidamente cancerígeno e que consta no Anexo IV do Decreto nº 3.048-99, a sua mera presença no ambiente de trabalho basta à comprovação da exposição efetiva do trabalhador, sendo suficiente a avaliação qualitativa (qualquer que seja portanto o nível de concentração no ambiente de trabalho do segurado) e irrelevante, para fins de contagem especial, a utilização de EPI eficaz.

Frise-se que não se sustenta a tese de que a contagem de atividade especial pelo agente cancerígeno deve ocorrer apenas a partir da publicação da Portaria Interministerial MTE/MS/MPS nº 09, publicada em 08/10/2014, pois o agente sempre foi cancerígeno, ainda que tenha sido reconhecido administrativamente como tal apenas em data recente. O efeito nocivo do agente sempre existiu, o que autoriza o reconhecimento da atividade especial antes mesmo da Portaria mencionada.

Portanto, exposta a parte autora a radiações ionizantes diariamente no exercício do seu labor, deve ser reconhecida a especialidade do período em que trabalhou como técnico instrumentista (instrumentação).

Não fosse isso, cumpre ainda observar que as atividades do autor foram consideradas perigosas pelos três laudos periciais referidos, constando do anexo da NR 16, pelo exercício habitual de atividades de manutenção e calibração de equipamentos dotados de fontes radioativas seladas.

Especificamente no que tange à possibilidade da periculosidade ser elemento ensejador da concessão da aposentadoria antecipada, verifica-se que algumas profissões já eram relacionadas nos Decretos 53.831/1964 e 83.080/1979 como especiais.

Referidos regulamentos estavam em consonância com a Lei de regência vigente àquela época, a Lei Orgânica da Previdência Social, que contemplava expressamente a periculosidade como elemento motivador da concessão de aposentadoria especial.

Em relação às atividades previstas em regulamento, permitia-se reconhecer a especialidade pelo enquadramento profissional de categoria, com presunção absoluta de nocividade até o advento da Lei 9.032/1995. Isso porque, a partir dessa lei, passou-se a exigir do segurado, além da previsão legal da atividade, a demonstração da efetiva submissão a agentes nocivos químicos, físicos e biológicos, de forma habitual e permanente durante sua jornada de trabalho.

Em suma, exatamente a partir do início da vigência Lei 9.032/1995, que trouxe profundas alterações para o reconhecimento do exercício de atividade prejudicial à saúde, a especialidade por periculosidade foi colocada sob dúvida, em razão da ausência de previsão legislativa.

Sem embargo, a jurisprudência tem admitido a caracterização da especialidade pela periculosidade, até mesmo depois do advento da Lei 9.032/1995. O fundamento utilizado é o de que a legislação reguladora do exercício de atividade especial não seria exaustiva na definição das hipóteses ensejadoras da contagem diferenciada de tempo de contribuição, a qual também estaria a abranger as atividades perigosas.

Nesse sentido, há precedente da Turma Nacional de Uniformização de Jurisprudência, fundamentado em 2 (dois) outros acórdãos do Superior Tribunal de Justiça, em que o Juiz Federal Bruno Leonardo Câmara Carrá, relator no julgamento do pedido de uniformização de lei federal autuado sob o número 5001238-34.2012.4.04.7102, com decisão publicada no Diário Oficial da União em 26.09.2014, sustentou que:

(...)

Ao que tudo leva a crer, o Superior Tribunal de Justiça teve como firme, foi que a nova redação dada pela Lei nº 9.032/95 ao art. 57 da Lei de Benefícios da Previdência Social não limitou a considerar como tempo de serviço especial apenas aqueles que fossem previsto em Lei ou Regulamento da previdência e sim todos aqueles resultantes da ação efetiva de "agentes nocivos, químicos, físicos, biológicos ou associação de agentes prejudiciais à saúde ou a integridade física"(...)

muito mais importante para fins de aplicação das nóveis disposições da Lei nº 9.528/97 é saber se um agente nocivo/prejudicial (qualificação que, por sinal, pode muito bem ser interpretada como aglutinadora de formas de periculosidade) é capaz de deteriorar/expor a saúde/integridade física do trabalhador. É a prova disso que transforma o tempo de comum para especial na lógica da novel legislação. Por isso, não é de se estranhar que o STJ continue a falar em periculosidade mesmo após a edição do Decreto nº 2.171/97. E, segundo penso, está certo mesmo em falar, pois, como dito, os agentes nocivos/prejudiciais à saúde/integridade física podem muito bem aludir a certas formas de perigo. A exposição à eletricidade, não sendo enquadrada propriamente como atividade insalubre, termina comprometendo sobretudo a integridade física do trabalhador que passa a conviver com níveis exagerados de cautela, risco, stress, etc. Logo, insisto, não é a apriorística qualificação doutrinária que determinará a possibilidade ou não apreensão de uma atividade como especial e sim a efetiva demonstração deletéria considerada em numerus apertus pela legislação em vigor.

(...)

Por essas razoes, conheço e dou provimento ao Pedido de Uniformização de Interpretação de Lei Federal para reformar o Acórdão recorrido e restabelecer a sentença de 1.º Grau, que reconheceu como especial o período trabalhado pelo recorrente, exposto de forma habitual e permanente ao agente nocivo nas atividades com energia elétrica.

Igualmente, a orientação da Turma Regional de Uniformização da 4ª Região:

INCIDENTE DE UNIFORMIZAÇÃO. PREVIDENCIÁRIO. TEMPO ESPECIAL. ELETRICIDADE. ATIVIDADE EXERCIDA APÓS 05.03.1997, DATA DE EDIÇÃO DO DECRETO 2.172/97. POSSIBILIDADE DE RECONHECIMENTO. SÚMULA 198 DO EXTINTO TFR. PERICULOSIDADE. MANUTENÇÃO DO CRITÉRIO PARA A CONCESSÃO DE APOSENTADORIA ESPECIAL, EM FACE DA PROTEÇÃO CONSTITUCIONAL À INTEGRIDADE FÍSICA DO TRABALHADOR. 1. A atividade na qual haja a efetiva exposição ao agente nocivo eletricidade em tensões elevadas pode ser reconhecida como especial mesmo após 05.03.1997. 2. Mesmo não constando mais das relações de agentes nocivos, desde a edição do Decreto 2.172/97, a eletricidade em altas tensões pode ensejar o reconhecimento de especialidade e a concessão de aposentadoria especial ou a conversão de tempo especial em comum, em face do disposto na Lei 7.369/85 ou mediante aplicação da súmula 198 do extinto TFR.3. Nem a Constituição Federal nem a lei previdenciária vedam a aposentadoria especial por periculosidade, porquanto ambas referem proteção do trabalhador contra agentes nocivos à integridade física. 4. Recurso conhecido e desprovido. Alteração de uniformização. (IUJEF 0003372-14.2008.404.7053, Turma Regional de Uniformização da 4ª Região, Relatora Luísa Hickel Gamba, D.E. 29/08/2011, grifou-se)

Destarte, na esteira do entendimento jurisprudencial, pertinente o reconhecimento do exercício de atividade perigosa como especial, mesmo após o advento da Lei 9.032/1995 ou do Decreto 2.172/1997.

Sobre a definição de atividades perigosas, "não há diferença entre o direito do trabalho e o previdenciário" (1ª Turma Recursal do Paraná, processo 2007.70.50.015951-5, julgado em 23/03/2010).

Para a legislação trabalhista as atividades de "produção, utilização, processamento, transporte, guarda, estocagem, e manuseio de materiais radioativos, selados e não selados, de estado físico e forma química quaisquer, naturais ou artificiais" são perigosas.

Assim, também porque são perigosas as atividades desenvolvidas pela parte autora, de acordo com os critérios estabelecidos na NR 16, deve ser reconhecida a especialidade das funções exercidas entre 05/04/1992 a 04/05/2017.

Para uma análise anterior à Portaria GM 518/2003, importa dizer que a atividade encontra enquadramento também nos decretos regulamentares.

Importa destacar que a utilização de EPI não afasta a nocividade à saúde, porque não se trata de possibilidade de perda gradual da saúde do trabalhador, em que o EPI eficaz tem o condão de neutralizar os efeitos dos agentes nocivos, mas sim da possibilidade da ocorrência de acidente fatal, não afastada pelo uso de EPI.

Em suma, ainda que se afastasse a especialidade por não ter sido superado o limite de tolerância de 20 mSv por ano - tese esta não acolhida nesta sentença - , é o caso de reconhecer a especialidade em razão da periculosidade ou simplesmente por exposição à radiação ionizante, reconhecidamente cancerígena.

Tem-se, portanto, como cabível o reconhecimento da especialidade, por desenvolver atividade perigosa ou por exposição a radiação ionizante, no período de 05/04/1992 a 04/05/2017 e, ainda, por exposição a ruído, no período de 19/11/2003 a 04/05/2017.

Irresignado, o INSS sustenta que a periculosidade não pode ser enquadrada como agente caracterizador de especialidade, que não é possível o enquadramento por radiação não ionizante a partir de 06/03/1997, que o PPP não informa níveis de exposição e que não foi utilizada a metodologia NEN para a aferição de ruído.

Pois bem.

Conforme explicitado no item II.3 desta decisão, possível que haja o reconhecimento da especialidade por exposição a radiações ionizantes, eis que prevista na NR-16, cuja aplicação na seara previdenciária é autorizada pelo art. 58, § 1º, da Lei nº 8.213/1991.

Também nos termos já tratados, tratando-se de agente cancerígeno para humanos, a simples exposição (qualitativa) dá ensejo ao reconhecimento da atividade especial, qualquer que seja o nível de concentração no ambiente de trabalho do segurado, desde que comprovada a sua exposição pessoal durante a jornada de trabalho.

No caso, resta comprovada a exposição conforme consta no PPP.

Em relação ao ruído, o recurso deve ser igualmente desprovido.

Na aferição do agente ruído, deve-se aceitar também a metodologia prevista na NR-15 e não somente a da NHO-01, quando aquela indica exposição acima dos limites legais, pois, comparativamente, a NHO-01 é mais benéfica ao trabalhador.

A propósito:

PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. APOSENTADORIA ESPECIAL. TEMPO DE SERVIÇO ESPECIAL. RUÍDO. LIMITES DE TOLERÂNCIA. METODOLOGIA DE AVALIAÇÃO. AGENTES QUÍMICOS. ANÁLISE QUANTITATIVA. CONCESSÃO. 1. O reconhecimento da especialidade obedece à disciplina legal vigente à época em que a atividade foi exercida, passando a integrar, como direito adquirido, o patrimônio jurídico do trabalhador, de modo que, uma vez prestado o serviço sob a vigência de certa legislação, o segurado adquire o direito à contagem na forma estabelecida, bem como à comprovação das condições de trabalho como então exigido, não se aplicando retroativamente lei nova que venha a estabelecer restrições à admissão do tempo de serviço especial. 2. Quanto ao agente físico ruído, tem-se por especial a atividade exercida com exposição a ruídos superiores a 80 decibéis até 05/03/1997, sendo que, após tal marco, o nível de ruído considerado prejudicial à saúde é aquele superior a 90 decibéis, havendo a redução de tal intensidade somente em 18/11/2013, quando o limite de tolerância passou a corresponder a 85 decibéis (AgRg. no REsp. 1367806, Relator Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, vu 28/5/2013). 3. Na aferição do agente ruído, deve-se aceitar também a metodologia prevista na NR-15 e não somente a da NHO-01, quando aquela indica exposição acime dos limites legais, pois, comparativamente, a NHO-01 é mais benéfica ao trabalhador. 4. Para os agentes arrolados no Anexo 11 da NR-15, a avaliação da nocividade à saúde pressupõe aferição do limite de tolerância, ou seja, a forma de avaliação dos agentes nocivos, nesse caso, deve seguir critério quantitativo. O tolueno e o xileno, porém, também são absorvido por via cutânea, exigindo a presença de EPI eficaz para descaracterizar a nocividade. 5. Para que se possa presumir a neutralização do agente agressivo, são necessárias provas concretas da qualidade técnica do equipamento, descrição de seu funcionamento e efetiva medição do quantum que os artefatos podem elidir - ou se realmente podem neutralizar - a exposição insalutífera, sendo que, consoante a tese fixada no Tema IRDR15/TRF4: A mera juntada do PPP referindo a eficácia do EPI não elide o direito do interessado em produzir prova em sentido contrário. 6. Comprovada a exposição do segurado a agentes nocivos, na forma exigida pela legislação previdenciária aplicável à espécie, possível reconhecer-se a especialidade da atividade laboral exercida e, consequentemente, a concessão da aposentadoria por tempo de contribuição. (TRF4, AC 5020317-91.2019.4.04.9999, Décima Primeira Turma, Relator Ana Cristina Ferro Blasi, juntado aos autos em 20-3-2023 - grifei)

Ademais, o nível de ruído foi aferido pela técnica da dosimetria, de modo que é resultado de exposições habituais e permanentes, que já projeta a média ponderada para uma jornada de 08 horas diárias de labor.

Negado provimento ao recurso do INSS.

III - Tutela Específica

Nas ações previdenciárias deve-se, em regra, determinar a imediata implantação do benefício concedido, valendo-se da tutela específica da obrigação de fazer prevista no artigo 461 do Código de Processo Civil de 1973 (TRF4, QOAC 2002.71.00.050349-7, Rel. p/Ac. Des. Federal Celso Kipper, 3ª S., j. 09.08.2007), e nos artigos 497, 536 e parágrafos e 537, do Código de Processo Civil de 2015, independentemente de requerimento expresso por parte do segurado ou beneficiário, considerando-se também a ausência de efeito suspensivo a eventuais recursos cabíveis em face do presente acórdão.

Assim, é determinado ao INSS (obrigação de fazer) que implante à parte autora, via CEAB (Central Especializada de Análise de Benefício), o benefício abaixo descrito, no prazo máximo de 20 (vinte) dias para cumprimento:

TABELA PARA CUMPRIMENTO PELA CEAB
CUMPRIMENTOImplantar Benefício
NB
ESPÉCIEAposentadoria Especial
DIB04/05/2017
DIPPrimeiro dia do mês da decisão que determinou a implantação/restabelecimento do benefício
DCB
RMIA apurar
OBSERVAÇÕES

Na hipótese de a parte autora já estar em gozo de benefício previdenciário inacumulável, o INSS deverá implantar o benefício deferido judicialmente apenas se o valor de sua renda mensal atual for superior ao daquele.

Faculta-se à parte beneficiária manifestar eventual desinteresse quanto ao cumprimento desta determinação.

V - Conclusões

1. Recurso da parte autora não conhecido, por ausência de interesse recursal.

2. Negado provimento ao recurso do INSS.

3. Desprovida a apelação do INSS, e observadas as regras do artigo 85, §§2º, 3º e 11, do CPC, elevo em 1% (um por cento) o percentual estabelecido pela sentença para fins de estipulação da verba honorária, devida ao procurador da parte que se viu vencedora na demanda, mantida a respectiva base de cálculo, conforme balizas traçadas pelo STJ (EDcl no AgInt no REsp 1573573).

4. Determinada a implantação do benefício no prazo de 20 dias.

VI - Prequestionamento

Em face do disposto nas Súmulas 282 e 356 do Supremo Tribunal Federal e 98 do Superior Tribunal de Justiça, e a fim de viabilizar o acesso às instâncias superiores, explicito que a presente decisão não contraria nem nega vigência às disposições legais/constitucionais prequestionadas pelas partes.

VII - Dispositivo

Ante o exposto, voto por negar provimento ao recurso, nos termos da fundamentação.



Documento eletrônico assinado por ANA RAQUEL PINTO DE LIMA, Juíza Federal Convocada, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40004694285v8 e do código CRC c28e32f7.Informações adicionais da assinatura:
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Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5000011-36.2018.4.04.7025/PR

RELATORA: Juíza Federal ANA RAQUEL PINTO DE LIMA

EMENTA

PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA ESPECIAl. interesse recursal. mérito. Atividade especial. agentes nocivos. reconhecimento. conversão. recurso da parte autora não conhecido. recurso do inss conhecido e desprovido.

1. Ausente interesse recursal, ainda que por agente nocivo diverso, o pedido de reconhecimento da especialidade dos período de 05/04/1992 a 04/05/2017, eis que já reconhecido na sentença. Recurso da parte autora não conhecido.

2. A lei em vigor quando da prestação dos serviços define a configuração do tempo como especial ou comum, o qual passa a integrar o patrimônio jurídico do trabalhador, como direito adquirido.

3. Até 28.4.1995 é admissível o reconhecimento da especialidade do trabalho por categoria profissional; a partir de 29.4.1995 é necessária a demonstração da efetiva exposição, de forma não ocasional nem intermitente, a agentes prejudiciais à saúde, por qualquer meio de prova; a contar de 06.5.1997 a comprovação deve ser feita por formulário-padrão embasado em laudo técnico ou por perícia técnica.

4. Considera-se como especial a atividade em que o segurado esteve exposto a ruídos superiores a 80 decibéis até a data de 5.3.1997, por conta do enquadramento previsto nos Decretos 53.831/64 e 83.080/79. Com a edição do Decreto 2.172/97, o limite passou a ser 90 decibéis, sendo reduzido para 85 decibéis, a contar de 19.11.2003, consoante previsto no Decreto 4.882/2003. O Supremo Tribunal Federal, no julgamento do ARE 664.335, fixou o entendimento de que: 1) o direito à aposentadoria especial pressupõe a efetiva exposição do trabalhador a agente nocivo à sua saúde, de modo que, se o EPI for realmente capaz de neutralizar a nocividade não haverá respaldo constitucional à aposentadoria especial; 2) na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador, no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), no sentido da eficácia do Equipamento de Proteção Individual (EPI), não descaracteriza o tempo de serviço especial para aposentadoria.

5. Na aferição do agente ruído, deve-se aceitar também a metodologia prevista na NR-15 e não somente a da NHO-01, quando aquela indica exposição acima dos limites legais, pois, comparativamente, a NHO-01 é mais benéfica ao trabalhador. Ademais, o nível de ruído foi aferido pela técnica da dosimetria, de modo que é resultado de exposições habituais e permanentes, que já projeta a média ponderada para uma jornada de 08 horas diárias de labor.

6. A partir de 03.12.1998 as disposições trabalhistas concernentes à caracterização de atividades ou operações insalubres (NR-15) - com os respectivos conceitos de 'limites de tolerância', 'concentração', 'natureza' e 'tempo de exposição ao agente' passam a influir na caracterização da natureza da atividade (se especial ou comum). Conforme o Anexo nº 5 da NR nº 15 do MTE, "Nas atividades ou operações onde trabalhadores possam ser expostos a radiações ionizantes, os limites de tolerância (...) são os constantes da Norma CNEN-NE-3.01." A Norma CNEN-NE-3.01, referente a diretrizes básicas de proteção radiológica, da Comissão Nacional de Energia Nuclear, estabelece limites de doses anuais máximos de exposição anual para indivíduo ocupacionalmente exposto (e não mínimos, de tolerância). A Norma Regulamentadora nº 32, de segurança e saúde no trabalho em serviços de saúde, orienta os trabalhadores, quanto às radiações ionizantes, à permanência no menor tempo possível para a realização de procedimentos, bem como estar sob monitoração individual de dose de radiação ionizante. Cuidando-se de agente nocivo cancerígeno para humanos, a prova da exposição ao agente (qualitativa) dá ensejo ao reconhecimento da atividade especial, qualquer que seja o nível de concentração no ambiente de trabalho do segurado.

7. Desprovida a apelação do INSS, e observadas as regras do artigo 85, §§2º, 3º e 11, do CPC, elevo em 1% (um por cento) o percentual estabelecido pela sentença para fins de estipulação da verba honorária, devida ao procurador da parte que se viu vencedora na demanda, mantida a respectiva base de cálculo, conforme balizas traçadas pelo STJ (EDcl no AgInt no REsp 1573573).

8. Determinada a imediata implantação do benefício, valendo-se da tutela específica da obrigação de fazer prevista no artigo 461 do Código de Processo Civil de 1973, bem como nos artigos 497, 536 e parágrafos e 537, do Código de Processo Civil de 2015, independentemente de requerimento expresso por parte do segurado ou beneficiário.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 11ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, negar provimento ao recurso, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Florianópolis, 23 de outubro de 2024.



Documento eletrônico assinado por ANA RAQUEL PINTO DE LIMA, Juíza Federal Convocada, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40004694286v4 e do código CRC d7e10d59.Informações adicionais da assinatura:
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Data e Hora: 24/10/2024, às 17:38:30


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Poder Judiciário
Tribunal Regional Federal da 4ª Região

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 16/10/2024 A 23/10/2024

Apelação Cível Nº 5000011-36.2018.4.04.7025/PR

RELATORA: Juíza Federal ANA RAQUEL PINTO DE LIMA

PRESIDENTE: Desembargadora Federal ANA CRISTINA FERRO BLASI

PROCURADOR(A): MAURICIO GOTARDO GERUM

Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 16/10/2024, às 00:00, a 23/10/2024, às 16:00, na sequência 13, disponibilizada no DE de 07/10/2024.

Certifico que a 11ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:

A 11ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO.

RELATORA DO ACÓRDÃO: Juíza Federal ANA RAQUEL PINTO DE LIMA

Votante: Juíza Federal ANA RAQUEL PINTO DE LIMA

Votante: Desembargadora Federal ANA CRISTINA FERRO BLASI

Votante: Desembargadora Federal ELIANA PAGGIARIN MARINHO

LIGIA FUHRMANN GONCALVES DE OLIVEIRA

Secretária



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