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Apelação Cível Nº 5006260-63.2022.4.04.9999/PR
RELATOR: Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO
APELANTE: MARIA DE FATIMA DA SILVA SANTOS
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RELATÓRIO
Trata-se de ação em que a parte autora objetiva a concessão de aposentadoria rural por idade, alegando ter exercido atividade rural em regime de economia familiar e na condição de boia-fria.
Sentenciando, em 18/11/2021, o MM. Juiz julgou extinto o processo, sem resolução do mérito, quanto à aposentadoria por idade rural, nos termos do art. 485, IV, do CPC, e julgou parcialmente procedente o pedido da parte autora quanto à averbação dos períodos rurais de 17/06/1976 a 25/07/1987 e de 26/07/1987 a 30/09/1994. Ainda, em razão da sucumbência recíproca e conforme arts. 82, §2º e 85, §§2º e 3º, I, do CPC, condenou as partes ao pagamento de 50% das despesas processuais cada, bem como ao pagamento de honorários advocatícios, fixados em 5% do valor da causa atualizado pelo IPCA-E para cada.
Irresignada, apela a parte autora, sustentando que apresentou início de prova material suficiente para comprovar o exercício da atividade rural, a qual foi complementada pela autodeclaração. Assim, requer a total procedência da demanda. Alternativamente, postula a contagem dos períodos reconhecidos em sentença para a carência, com a consequente concessão do benefício de aposentadoria por idade rural desde a DER (17/06/2019).
Sem contrarrazões, vieram os autos a esta Corte.
É o relatório.
VOTO
CONSIDERAÇÕES GERAIS
A concessão de aposentadoria por idade, no caso do trabalhador rural qualificado como segurado especial (art. 11, VII, da Lei nº 8.213/91), deve observar os seguintes requisitos: (a) idade mínima (60 anos para homens e 55 anos para mulheres); e (b) exercício de atividade rural por tempo igual ao número de meses correspondentes à carência exigida, ainda que de forma descontínua, independentemente do recolhimento de contribuições (art. 48, §§ 1º e 2º, 25, II, 26, III, e 39, I, da Lei nº 8.213/91).
Quanto à carência, o art. 143 da Lei nº 8.213/91, estabeleceu regra de transição para os trabalhadores rurais que passaram a ser enquadrados como segurados obrigatórios, na forma do art. 11, I, "a", IV ou VII, assegurando "aposentadoria por idade, no valor de um salário mínimo, durante quinze anos, contados a partir da data de vigência desta Lei, desde que comprove o exercício de atividade rural, ainda que descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, em número de meses idêntico à carência no referido benefício".
Já o art. 142 da Lei de Benefícios previu tabela específica de prazos diferenciados de carência, conforme o ano de implementação das condições para a aposentadoria por idade, por tempo de serviço e especial, "para o segurado inscrito na Previdência Social Urbana até 24 de julho de 1991, bem como para o trabalhador e o empregador rural cobertos pela Previdência Social Rural".
Na aplicação da tabela do art. 142, o termo inicial para o cômputo do tempo de atividade rural é o ano em que o segurado completou a idade mínima, desde que já disponha de tempo suficiente para o deferimento do pedido, sendo irrelevante que o requerimento tenha sido efetuado em anos posteriores, ou que na data do requerimento o segurado não esteja mais trabalhando, em homenagem ao princípio do direito adquirido (art. 5º, XXXVI, da CF/88 e art. 102, §1º, da Lei nº 8.213/91).
Na hipótese de insuficiência de tempo de exercício de atividade rural ao completar a idade mínima, a verificação do tempo equivalente à carência não poderá mais ser feita com base no ano em que atingida a idade mínima, mas a partir de sua implementação progressiva, nos anos subsequentes à satisfação do requisito etário, de acordo com a tabela do art. 142 da Lei de Benefícios.
Outrossim, nos casos em que o requerimento administrativo e o implemento da idade mínima tenham ocorrido antes de 31/08/1994, data da publicação da Medida Provisória nº 598, por meio da qual foi alterada a redação original do referido art. 143 (posteriormente convertida na Lei nº 9.063/95), o segurado deve comprovar o exercício de atividade rural, por um período de 5 anos (60 meses) anterior ao requerimento administrativo, não se aplicando a tabela do art. 142 da Lei nº 8.213/91.
A disposição contida no art. 143 da Lei nº 8.213/91, no sentido de que o exercício da atividade rural deve ser comprovado no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, deve ser interpretada em favor do segurado. Ou seja, tal regra atende àquelas situações em que ao segurado é mais fácil ou conveniente a comprovação do exercício do labor rural no período imediatamente anterior ao requerimento administrativo, mas sua aplicação deve ser relativizada em função do disposto no art. 102, §1º, da Lei de Benefícios e, principalmente, em atenção ao princípio do direito adquirido.
Em qualquer dos casos, o benefício de aposentadoria por idade rural será devido a partir da data do requerimento administrativo; ou, inexistente este, da data do ajuizamento da ação, conforme modulação contida no julgamento do RE 631.240.
Registre-se que o tempo de serviço rural deve ser demonstrado mediante a apresentação de início de prova material, complementada por prova testemunhal idônea, quando necessária ao preenchimento de lacunas - não sendo esta admitida, exclusivamente, nos termos do art. 55, §3º, da Lei nº 8.213/91, bem como da Súmula nº 149 do STJ e do REsp nº 1.321.493/PR, Rel. Ministro Herman Benjamin, 1ª Seção, j. 10/10/2012, DJe 19/12/2012 (recurso representativo da controvérsia).
Ainda, quanto à questão da prova, cabe ressaltar os seguintes aspectos: (a) o rol de documentos constantes no art. 106 da Lei de Benefícios, os quais seriam aptos à comprovação do exercício da atividade rural, é apenas exemplificativo; (b) não se exige prova documental plena da atividade rural em relação a todos os anos integrantes do período correspondente à carência, sendo suficientes documentos que, juntamente com a prova oral, possibilitem juízo conclusivo quanto ao período de labor rural exercido (AREsp 327.119/PB, j. em 02/06/2015, DJe 18/06/2015); (c) certidões da vida civil são hábeis a constituir início probatório da atividade rural da parte autora (REsp n.º 1.321.493-PR, DJe em 19-12-2012, submetido à sistemática dos recursos repetitivos); (d) É possível reconhecer o tempo de serviço rural anterior ao documento mais antigo apresentado, desde que amparado em convincente prova testemunhal colhida sob o contraditório (Súmula 577/STJ (DJe 27/06/2016); e (e) a prova material juntada aos autos possui eficácia probatória tanto para o período anterior quanto para o período posterior à data do documento, desde que corroborado por prova testemunhal (AgRg no AREsp 320558/MT, j. em 21/03/2017, DJe 30/03/2017); e (f) é admitido, como início de prova material, nos termos da Súmula 73 deste Tribunal, documentos de terceiros, membros do grupo parental.
CASO CONCRETO
No presente caso, observo que a parte autora preencheu o requisito etário em 17/06/2019 e formulou o requerimento administrativo em 17/06/2019. Dessa forma, deve comprovar o exercício de atividade rural no período de 180 meses imediatamente anteriores ao implemento da idade mínima ou anteriores ao requerimento administrativo, o que lhe for mais favorável.
Para fazer prova do exercício de atividade rural, a parte autora instruiu o processo com, dentre outros, os seguintes documentos:
- Certidão de Nascimento da irmã da autora, Ledoanda de Fátima da Silva, na qual consta a ocupação dos genitores da autora, Benedito Nabor da Silva e Carmela de Carvalho da Silva, como "lavradores", constando registro em 1966;
- Registro geral do imóvel de matrícula nº 1.155, no qual consta que o genitor da autora adquiriu, junto de familiares, uma área de terreno de cultura, denominada Sítio São Pedro, com área de aproximadamente 10 alqueires, em 1974;
- Certidão de Nascimento do irmão da autora, Denerivaldo Camargo da Silva, na qual consta a ocupação do genitor da autora como "lavrador", constando registro em 1983;
- Certidão de Casamento da irmã da autora, Francisca Benedita da Silva, na qual consta a ocupação do genitor da autora como agricultor, constando registro em 1983;
- Certidão de Casamento da autora, na qual consta a ocupação de seu cônjuge, Acacio Batista dos Santos, como "lavrador", constando registro em 1987;
- Certidão de Nascimento da filha da autora, Joelma da Silva Santos, na qual consta a ocupação do cônjuge da autora como "lavrador", constando registro em 1988;
- Carteira de Trabalho e Previdência Social da autora, na qual constam vínculos como trabalhadora agrícola em 2001 e 2002 e de serviços gerais em estabelecimentos de agropecuária e propriedades rurais em 1994, 1997, 1999, 2000, 2005, 2006 a 2009 e 2010 a 2011;
- Declaração da Secretaria Municipal da Educação e Cultura da Prefeitura Municipal de Tomazina, na qual consta que a irmã da autora, Francisca Benedita da Silva, estudou em escola rural no período de 1973 a 1975, datada de 2019;
- Declaração da Secretaria Municipal da Educação e Cultura da Prefeitura Municipal de Tomazina, na qual consta que a irmã da autora, Ledoanda de Fátima da Silva, estudou em escola rural no período de 1975 a 1976, datada de 2019;
- Declaração da Secretaria Municipal da Educação e Cultura da Prefeitura Municipal de Tomazina, na qual consta que a autora estudou em escola rural no período de 1973 a 1976, datada de 2019;
- Declaração da Secretaria Municipal da Educação e Cultura da Prefeitura Municipal de Tomazina, na qual consta que o irmão da autora, Denerivaldo Camargo da Silva, estudou em escola rural no período de 1991 a 1994, datada de 2019;
- Certidão emitida pelo Registro de Imóveis, Comarca de Tomazina - PR, na qual consta que o genitor da autora adquiriu parte de imóvel rural em 1974, datada de 2019.
Por ocasião da audiência de instrução, foram ouvidas duas testemunhas, Antônio de Oliveira e José Jorge de Lima, as quais confirmaram o exercício de atividades rurais pela parte demandante.
Compulsando os autos, verifica-se que a parte autora, em seu depoimento pessoal, informou que não trabalha mais, pois "arrebentou" o menisco quando trabalhou para Helena Maria Pereira. Conforme o CNIS da autora (seq. 12.2), compreende-se que a autora trabalhou para a referida proprietária no período compreendido entre 2006 e 2011.
Desse modo, tem-se que a requerente deixou as lides campesinas em 2011, em decorrência de problemas de saúde. Assim, destaca-se que a autora não exerceu atividade rural, seja em regime de economia familiar ou na condição de boia-fria, durante 8 (nove) anos do período de carência para a concessão do benefício, que, no caso dos autos, se dá entre 2004 e 2019.
Em que pese ser admitida a descontinuidade do serviço rural, em face da situação peculiar desses trabalhadores, na hipótese trata-se de um longo período de tempo em que esteve afastado das lides campesinas, o qual abrange quase a totalidade do período de carência legalmente exigido.
Nessa esteira, segue o entendimento desta Corte:
APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR/BOIA-FRIA. RECONHECIMENTO DE TEMPO. DESCONTINUIDADE DO LABOR RURAL. REQUISITOS NÃO CUMPRIDOS. 1. A comprovação do exercício de atividade rural pode ser efetuada mediante início de prova material, complementada por prova testemunhal idônea.
2. Embora tenha havido o preenchimento do requisito etário, a parte autora esteve afastada das lides rurais por extenso período dentro do prazo de carência.
3. A locução "descontinuidade" (art. 48, § 2º, da Lei nº 8.213/91) não pode abarcar as situações em que o segurado para com a atividade rural por muito tempo.
4. Não comprovada a carência suficiente à concessão da aposentadoria pleiteada, é indevido o benefício (TRF-4 - AC: 50090332820154049999 5009033-28.2015.404.9999, de aposentadoria por idade rural. Relator: Relatora, Data de Julgamento: 18/11/2015, SEXTA TURMA, Data de Publicação: D.E. 18/12/2015)" grifei.
Por sua vez, mister salientar que não é possível a contagem dos períodos reconhecidos em sentença para a carência, uma vez que a parte autora deve comprovar o exercício de atividade rural no período de 180 meses imediatamente anteriores ao implemento da idade mínima ou ao requerimento administrativo.
Assim, não restando comprovada a condição de segurada especial pela parte autora, deve ser mantida a sentença em seus exatos termos.
HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS
Incide, no caso, a sistemática de fixação de honorários advocatícios prevista no art. 85 do CPC, porquanto a sentença foi proferida após 18/03/2016 (data da vigência do CPC definida pelo Pleno do STJ em 02/04/2016).
Aplica-se, portanto, em razão da atuação do advogado da Autarquia em sede de apelação, o comando do §11 do referido artigo, que determina a majoração dos honorários fixados anteriormente, pelo trabalho adicional realizado em grau recursal, observando, conforme o caso, o disposto nos §§ 2º a 6º e os limites estabelecidos nos §§ 2º e 3º do art. 85.
Negado provimento à apelação da autora e dada a sucumbência recíproca, majoro a verba honorária, elevando-a em 50% sobre o valor fixado na sentença, considerando as variáveis dos incisos I a IV do § 2º do artigo 85 do CPC, cuja exigibilidade fica suspensa, uma vez que concedida a gratuidade da justiça.
PREQUESTIONAMENTO
Restam prequestionados, para fins de acesso às instâncias recursais superiores, os dispositivos legais e constitucionais elencados pelas partes.
CONCLUSÃO
Apelação improvida e honorários majorados.
DISPOSITIVO
Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação.
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Apelação Cível Nº 5006260-63.2022.4.04.9999/PR
RELATOR: Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO
APELANTE: MARIA DE FATIMA DA SILVA SANTOS
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA RURAL POR IDADE. REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. boia-fria. DESCONTINUIDADE DO LABOR RURAL. REQUISITOS LEGAIS. NÃO COMPROVADOS. honorários advocatícios.
1. Improcede o pedido de aposentadoria rural por idade quando não atendidos os requisitos previstos nos artigos 11, VII, 48, §1°, e 142, da Lei n° 8.213/1991.
2. A locução "descontinuidade" (art. 48, § 2º, da Lei nº 8.213/91) não pode abarcar as situações em que o segurado para com a atividade rural por muito tempo. Precedente.
3. Verba honorária majorada em razão do comando inserto no § 2º do art. 85 do CPC/2015, cuja exigibilidade fica suspensa na forma do art. 98, §3º, do CPC.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 10ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, negar provimento à apelação, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Curitiba, 13 de setembro de 2022.
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 05/09/2022 A 13/09/2022
Apelação Cível Nº 5006260-63.2022.4.04.9999/PR
RELATOR: Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO
PRESIDENTE: Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO
PROCURADOR(A): MAURICIO GOTARDO GERUM
APELANTE: MARIA DE FATIMA DA SILVA SANTOS
ADVOGADO: GEMERSON JUNIOR DA SILVA (OAB PR043976)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 05/09/2022, às 00:00, a 13/09/2022, às 16:00, na sequência 92, disponibilizada no DE de 25/08/2022.
Certifico que a 10ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 10ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO
Votante: Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO
Votante: Juíza Federal FLÁVIA DA SILVA XAVIER
Votante: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA
SUZANA ROESSING
Secretária
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