
Apelação Cível Nº 5006903-75.2019.4.04.7202/SC
RELATORA: Juíza Federal ANA RAQUEL PINTO DE LIMA
RELATÓRIO
Trata-se de apelação interposta por S. I. F. M. e INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS contra sentença proferida nos autos do Procedimento Comum nº 50069037520194047202, a qual julgou procedente, em parte, o pedido da autora de concessão de benefício assistencial, nos seguintes termos:
Ante o exposto, DEFIRO, com fundamento no art. 300 do CPC, a tutela provisória, a fim de determinar que o INSS, no prazo regimental, a contar de sua intimação em relação a esta sentença, cumpra obrigação de fazer, consistente em imediata implantação do benefício de amparo social (NB 88/701.731.516-3) e JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE o pedido para, nos termos do art. 487, I, do CPC, condenar o INSS a:
(a) conceder à parte autora o benefício assistencial, a partir da citação (17/02/2020), no valor de um salário mínimo mensal e DIP em 10/2020;
(b) pagar à parte autora as parcelas vencidas, segundo a renda mensal inicial apurada, desde a citação (17/02/2020) até a implantação do benefício, descontadas eventuais parcelas inacumuláveis (benefício previdenciário por incapacidade, seguro desemprego ou auxílio emergencial), observados os critérios de juros e correção monetária estabelecidos nesta sentença.
Em suas razões, a parte autora argumenta, em síntese, que a sentença deve ser anulada, pois o magistrado teria utilizado argumentos não abordados pelas partes para fundamentar a decisão, o que violaria o princípio do contraditório. Aduz ter comprovado a sua condição de miserabilidade desde a DER, em 23/07/2015, razão pela qual deve ser alterada a data de início do benefício (
).Em suas razões, a parte ré argumenta, em síntese, que em pesquisa realizada na base da Receita Federal, constatou-se que o filho Giovane Robson Moreira reside no mesmo endereço que a autora declarou na inicial, sendo que ele possui renda mensal de mais de R$ 3.500,00 (três mil e quinhentos reais). Requer a reforma da sentença para que seja afastado o benefício (
).A parte apelada apresentou contrarrazões (
e ), tendo sido os autos, na sequência, remetidos a este Tribunal.É o relatório.
VOTO
Inicialmente, destaca-se que o presente processo foi redistribuído no âmbito da 11ª Turma em 10-8-2022, por força da Resolução TRF4 nº 208/2022.
A sentença ora recorrida foi redigida nas seguintes linhas (
):Cuida-se de ação previdenciária em que S. I. F. M. objetiva a concessão de benefício de amparo assistencial à pessoa deficiente, indeferido no âmbito administrativo (NB 701.731.516-3, DER em 23/07/2015), por não enquadramento no critério de deficiência.
Deferida a Justiça Gratuita (evento 10).
Regularmente citado, o INSS apresentou contestação defendendo a improcedência por não estarem cumpridos os requisitos para a concessão, uma vez que o filho da autora, residente no mesmo endereço, tem renda de mais de R$ 3.000,00 (evento 35).
Instruído o processo com provas periciais, vieram os autos conclusos.
2. FUNDAMENTAÇÃO
Do Direito
O benefício pleiteado está previsto no art. 203 da Constituição de 1988 e regulamentado pela Lei nº 8.742/93 (LOAS) e foi instituído visando a atender determinada classe de pessoas, idosas ou deficientes, que, em face da sua peculiar condição, não possuam condições para prover a própria subsistência, ou de tê-la provida pela sua família, a teor das disposições contidas no art. 20 da LOAS.
A Lei é clara ao estabelecer que as condições para a concessão do benefício assistencial são cumulativas e não alternativas. Disso decorre a necessidade de a parte autora demonstrar, além da sua idade avançada ou condição de pessoa com impedimento a longo prazo, a ausência de recursos próprios e de sua família para lhe prover a manutenção.
O indeferimento do benefício na esfera administrativa deu-se em razão de o INSS ter concluído que a requerente não preenche o requisito de impedimento de longo prazo (§ 2º do art. 20 da Lei 8.742/93), tendo em juízo contestado o requisito da renda.
A atual redação do § 2º do art. 20 da Lei 8.742/93 estabelece que, para a concessão do benefício buscado, deverá a parte ter "impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas".
A TNU alterou a redação do enunciado de n. 48 de sua Súmula de jurisprudência, nos seguintes termos:
Para fins de concessão do benefício assistencial de prestação continuada, o conceito de pessoa com deficiência, que não se confunde necessariamente com situação de incapacidade laborativa, exige a configuração de impedimento de longo prazo com duração mínima de 2 (dois)anos, a ser aferido no caso concreto, desde o início do impedimento até a data prevista para a sua cessação.
Realizada perícia judicial (evento 30) a perita do Juízo afirmou que a parte autora apresenta cegueira legal devido a sequelas de doença mióptica degenerativa, além de coriorretinite por toxoplasmose. Relatou a perita que a autora possui cegueira total no olho direito e "20/conta dedos 0,5 metro a vultos (0,05 decimal), sem melhora, intratável".
Concluiu a perita que a autora apresenta incapacidade total e permanente, inclusive para alimentar-se, vestir-se, realizar higiene pessoal, ministrar seus medicamentos, intelecção, compreensão, desvio comportamental. Relatou que, de acordo com os documentos médicos, a incapacidade está presente desde o ano de 2015.
Anotou que, pelo exame realizado, a autora, além das patologias oftalmológicas, possui doenças de ordem mental.
Os documentos médicos apresentados, aliados à perícia judicial levam à conclusão de incapacidade permanente e total desde 2015, o que é suficiente para considerar preenchido o requisito de impedimento de longo prazo. Assim, preenchido o requisito previsto no § 2º do art. 20 da Lei 8.742/93.
Ciente da decisão do Supremo Tribunal Federal que considerou inconstitucional a previsão constante no § 3º do art. 20 da Lei 8.742/93, tenho que este requisito (miserabilidade) também está preenchido.
O laudo do evento 60 indica que a família da parte autora é composta de duas pessoas (ela e o marido). O marido desenvolve atividade como pintor de imóveis e relata não ter renda fixa, constando no laudo que "faz bicos e não quiz informar quanto ganha mensalmente" sendo "Durante a entrevista, percebido que o esposo da autora ganha em torno de 1 (um) salário mínimo por mês". A renda da família advém do trabalho do marido.
O casal reside em casa própria, construída em alvenaria, com cinco cômodos e guarnecido com móveis necessários ao uso diário. Os medicamentos utilizados pela parte autora são na maioria fornecidos pelo SUS.
Consta no laudo social que "os vizinhos não quiseram passar nenhuma informação. Disseram não saber informar sobre a situação econômica da autora. No posto de saúde do bairro, técnica de enfermagem, que não quiz se identificar, relata que a autora faz um ano de que não vai até o posto. Não sabe relatar sobre a situação atual de saúde e econômica da Sra Solange". Relatou também a assistente social que "os filhos residem próximos da autora, contudo, não tem condições financeiras de auxiliar os pais". Além disso, pontuou que a residência carece de higiene.
Anexo ao laudo social encontra-se fotografia de motocicletas, as quais a autora relata serem de vizinhos.
Os elementos de prova produzidos neste processo indicam que a parte autora reúne os requisitos necessários à concessão do benefício.
Contudo, em se tratando de benefício requerido na via administrativa ainda em 2015, não há como concluir que tais requisitos estivessem presentes na DER, até porque, naquele momento a composição do grupo familiar era diversa da atual.
A par disso, os documentos juntados pelo INSS em contestação comprovam que os dois filhos da autora exercem atividade laborativa desde 2012 e 2015 (OUT2 e 3, evento 35), fato que não pode ser desconsiderado, haja vista que em 2015 a parte autora declarou ter um filho na mesma residência, o que denota que a renda da família não vinha exclusivamente do trabalho do marido.
Anoto, ainda, que não obstante a parte autora tenha declarado que as motocicletas que se encontravam em sua garagem são dos vizinhos, estranhamente estes sequer se dispuseram a prestar qualquer informação sobre a família, o que gera dúvidas se efetivamente referidos veículos não pertencem a membros da família.
Diante desse contexto, tenho que a concessão do benefício a contar da citação é medida que se coaduna com a prova produzida, até porque, não obstante tratar-se de DER de 2015, a parte autora só ajuizou a ação quatro anos depois.
Assim, é procedente o pedido para concessão do benefício de amparo social (NB 88/701.731.516-3), a contar da citação, em 17/02/2020, nos termos da fundamentação.
Da tutela provisória
O art. 300, caput, do CPC prevê que a tutela de urgência será concedida 'quando houver elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo.'
Os fundamentos desta sentença demonstram que o pedido deduzido pela parte autora é procedente, restando presente a plausibilidade necessária ao deferimento da antecipação pretendida.
O perigo na demora é inerente ao benefício por incapacidade, pois está a parte autora impedida de desempenhar suas atividades habituais.
Presentes os requisitos ensejadores ao deferimento da tutela, deverá o INSS tomar as medidas necessárias para a concessão do benefício.
Da correção monetária e dos juros de mora
O Supremo Tribunal Federal, no julgamento das ADIs 4357 e 4425, reconheceu a inconstitucionalidade, por arrastamento, do art.1º-F da Lei nº 9.494/1997, nos seguintes aspectos: a) por determinar a aplicação para correção monetária de índice que não reflete a desvalorização real da moeda (TR); b) no que diz respeito aos juros de mora, pela violação ao princípio da isonomia no caso de créditos de origem tributária, na medida em que determina a aplicação de índice diverso daquele utilizado em favor da Fazenda Pública (STF, Plenário, Rel. p/o Acórdão Min. Luiz Fux, j. em 14/03/2013, DJe de 26/09/2014).
Posteriormente, em 25/03/2015, o Supremo Tribunal Federal, no julgamento de Questão de Ordem nas ADIs 4.357 e 4.425, modulou os efeitos dessa decisão, para conferir eficácia prospectiva, a contar dessa data, mantendo a aplicação da TR em relação aos precatórios expedidos ou pagos até aquele momento.
Diante das dúvidas surgidas sobre o alcance da modulação, especialmente quanto à correção monetária no período anterior à expedição dos respectivos precatórios, o Supremo Tribunal Federal voltou a tratar do tema no Recurso Extraordinário nº 870.947, no qual reconhecida repercussão geral (Tema nº 810).
Conforme decisão proferida em 20/09/2017 e publicada em 20/11/2017, o STF definiu as seguintes teses:
“Ao final, por maioria, vencido o Ministro Marco Aurélio, fixou as seguintes teses, nos termos do voto do Relator: 1) O art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, com a redação dada pela Lei nº 11.960/09, na parte em que disciplina os juros moratórios aplicáveis a condenações da Fazenda Pública, é inconstitucional ao incidir sobre débitos oriundos de relação jurídico-tributária, aos quais devem ser aplicados os mesmos juros de mora pelos quais a Fazenda Pública remunera seu crédito tributário, em respeito ao princípio constitucional da isonomia (CRFB, art. 5º, caput); quanto às condenações oriundas de relação jurídica não-tributária, a fixação dos juros moratórios segundo o índice de remuneração da caderneta de poupança é constitucional, permanecendo hígido, nesta extensão, o disposto no art. 1º-F da Lei nº 9.494/97 com a redação dada pela Lei nº 11.960/09; e 2) O art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, com a redação dada pela Lei nº 11.960/09, na parte em que disciplina a atualização monetária das condenações impostas à Fazenda Pública segundo a remuneração oficial da caderneta de poupança, revela-se inconstitucional ao impor restrição desproporcional ao direito de propriedade (CRFB, art. 5º, XXII), uma vez que não se qualifica como medida adequada a capturar a variação de preços da economia, sendo inidônea a promover os fins a que se destina. [...]”.
Todos os embargos de declaração interpostos foram julgados em 03/10/2019 e rejeitados por maioria, resultando na não modulação dos efeitos da decisão anterior e na cessação do efeito suspensivo deferido na decisão publicada em 25/09/2018.
Após o julgado do STF de 20/09/2017, o STJ, no dia 22/02/2018, ao analisar e julgar o REsp 1.495.146 (em regime de repetitivo, Tema 905), definiu como correta a utilização do INPC como índice de correção monetária, para as ações previdenciárias ([...] 3.2 Condenações judiciais de natureza previdenciária. As condenações impostas à Fazenda Pública de natureza previdenciária sujeitam-se à incidência do INPC, para fins de correção monetária, no que se refere ao período posterior à vigência da Lei 11.430/2006, que incluiu o art. 41-A na Lei 8.213/91. Quanto aos juros de mora, incidem segundo a remuneração oficial da caderneta de poupança (art.1º-F da Lei 9.494/97, com redação dada pela Lei n. 11.960/2009).
Por outro lado, no mesmo julgado o STJ definiu que nas ações de natureza administrativa (o que inclui as condenações do INSS ao pagamento de benefício assistencial) “sujeitam-se aos seguintes encargos: (a) até dezembro/2002: juros de mora de 0,5% ao mês; correção monetária de acordo com os índices previstos no Manual de Cálculos da Justiça Federal, com destaque para a incidência do IPCA-E a partir de janeiro/2001; (b) no período posterior à vigência do CC/2002 e anterior à vigência da Lei 11.960/2009: juros de mora correspondentes à taxa Selic, vedada a cumulação com qualquer outro índice; (c) período posterior à vigência da Lei 11.960/2009: juros de mora segundo o índice de remuneração da caderneta de poupança; correção monetária com base no IPCA-E”.
Registre-se que no julgado do STF (Tema 810) o processo origem tratava de ação concessiva de benefício assistencial, sendo na ocasião aplicado, ao caso concreto, o IPCA-E.
Diante das decisões proferidas pelo STF e pelo STJ, quando a concessão for de benefício previdenciário, devem incidir, para fins de atualização monetária, os critérios da Lei 6.899/81, com correção monetária a partir do momento em que eram devidas as parcelas exequendas (utilização concomitante das Súmulas 43 e 148 do STJ - STJ, RESP 34.239, Rel. Min. Vicente Leal), segundo os seguintes índices, de acordo com a data das respectivas vigências: ORTN (até março/86); OTN (até janeiro de 89); BTN (até fevereiro de 1991); INPC (até janeiro/93); IRSM (até fevereiro/94); variação da URV (até junho/94); IPC-r (até junho/95); INPC (até abril/96), e, desde maio de 1996, utiliza-se o IGP-DI (até 01/2004); INPC (a partir de então, inclusive no que se refere às condenações a partir da vigência da Lei 11.430/2006), desde a data em que a parcela deveria ter sido paga, e juros de mora de 6% ao ano, a partir da citação, até 08/2012, a partir de quando os juros devem observar a Lei nº 12.703/12 (remuneração da poupança).
E, quando a concessão for de benefício assistencial, a partir de 02/2004 utiliza-se o IPCA-E, mantendo-se os demais critérios acima referidos.
3. DISPOSITIVO
Ante o exposto, DEFIRO, com fundamento no art. 300 do CPC, a tutela provisória, a fim de determinar que o INSS, no prazo regimental, a contar de sua intimação em relação a esta sentença, cumpra obrigação de fazer, consistente em imediata implantação do benefício de amparo social (NB 88/701.731.516-3) e JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE o pedido para, nos termos do art. 487, I, do CPC, condenar o INSS a:
(a) conceder à parte autora o benefício assistencial, a partir da citação (17/02/2020), no valor de um salário mínimo mensal e DIP em 10/2020;
(b) pagar à parte autora as parcelas vencidas, segundo a renda mensal inicial apurada, desde a citação (17/02/2020) até a implantação do benefício, descontadas eventuais parcelas inacumuláveis (benefício previdenciário por incapacidade, seguro desemprego ou auxílio emergencial), observados os critérios de juros e correção monetária estabelecidos nesta sentença.
Determino a imediata implantação do benefício, nos termos da fundamentação.
Considerando a sucumbência recíproca e com base no art. 86, caput, do CPC, fixo os honorários sucumbenciais em 10% sobre o valor da condenação, na proporção de 50% em favor do procurador de cada parte.
Na mesma proporção, condeno a parte autora ao pagamento das custas processuais. O INSS está isento do pagamento de custas (art. 4°, I, Lei nº. 9.289/96).
A exigibilidade do pagamento dos honorários sucumbenciais e das custas processuais a cargo da parte autora fica suspensa diante da concessão do benefício da justiça gratuita (evento 10).
Trata-se de sentença ilíquida, o que, a teor da Súmula nº 490 do STJ, exigiria submetê-la à remessa necessária. Porém tal entendimento foi consolidado sob a vigência do CPC/73, quando estavam sujeitas ao duplo grau de jurisdição todas as condenações que excedessem 60 salários mínimos. O novo Código de Processo Civil elevou tal limite para 1.000 salários mínimos em relação à União e as respectivas autarquias e fundações de direito público (art. 496, §3º, I). Mesmo não se dispondo de elementos para determinar o exato montante da condenação é possível desde já afirmar que não excederá o montante fixado no referido dispositivo legal. Nesse contexto, e inclusive a fim de evitar eventual trabalho desnecessário e maior congestionamento do Tribunal, tenho como incabível no presente caso a remessa necessária.
Caso interposta apelação, intime-se o apelado para apresentar contrarrazões no prazo de 15 (quinze) dias. No caso de apelação adesiva, intime-se o apelante para apresentar contrarrazões. Após, remetam-se os autos ao Tribunal Regional Federal da 4ª Região, independentemente de juízo de admissibilidade (CPC, art. 1.010, §§ 1º a 3º).
Sentença publicada e registrada eletronicamente. Intimem-se.
Preenchidos os pressupostos de admissibilidade recursal, conheço do recurso interposto e passo à análise do apelo.
I - Preliminares
Defende a parte autora a nulidade da sentença por suposta violação ao princípio do contraditório. Defende que em nenhum momento alegou que seu filho fazia parte do núcleo familiar em 2015.
O trecho da sentença em discussão é o seguinte:
Contudo, em se tratando de benefício requerido na via administrativa ainda em 2015, não há como concluir que tais requisitos estivessem presentes na DER, até porque, naquele momento a composição do grupo familiar era diversa da atual.
A par disso, os documentos juntados pelo INSS em contestação comprovam que os dois filhos da autora exercem atividade laborativa desde 2012 e 2015 (OUT2 e 3, evento 35), fato que não pode ser desconsiderado, haja vista que em 2015 a parte autora declarou ter um filho na mesma residência, o que denota que a renda da família não vinha exclusivamente do trabalho do marido.
Em que pese a argumentação da autora, não há que se falar em nulidade da sentença.
Destaco que, junto com a documentação da inicial, a autora apresentou relatório de julgamento do seu pedido administrativo (benefício n. 701.731.516-3), no qual consta a menção de que, na época (2015), a parte teria declarado a composição do núcleo familiar com três pessoas (
).Ao lado disso, em sua contestação o INSS levantou a discussão envolvendo o endereço declarado pelo filho Giovane Robson Moreira e sua renda mensal (
).Logo, rejeito a preliminar.
II - Mérito
Inicialmente, cumpre registrar que o benefício assistencial está previsto no artigo 203, inciso V, da Constituição Federal e é regulamentado pelo artigo 20 da Lei nº 8.742/93, com a redação dada pelas Leis nos 12.435, de 06-7-2011, e 12.470, de 31-8-2011. Eis o teor dos referidos dispositivos:
Art. 203. A assistência social será prestada a quem dela necessitar, independentemente de contribuição à seguridade social, e tem por objetivos:
(...)
V - a garantia de um salário mínimo de benefício mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, conforme dispuser a lei.
Art. 20. O benefício de prestação continuada é a garantia de um salário-mínimo mensal à pessoa com deficiência e ao idoso com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família.
§ 1o Para os efeitos do disposto no caput, a família é composta pelo requerente, o cônjuge ou companheiro, os pais e, na ausência de um deles, a madrasta ou o padrasto, os irmãos solteiros, os filhos e enteados solteiros e os menores tutelados, desde que vivam sob o mesmo teto.
§ 2o Para efeito de concessão do benefício de prestação continuada, considera-se pessoa com deficiência aquela que tem impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas. (Redação dada pela Lei nº 13.146, de 2015)
§ 3º Considera-se incapaz de prover a manutenção da pessoa com deficiência ou idosa a família cuja renda mensal per capita seja: (Redação dada pela Lei nº 13.982, de 2020)
I - igual ou inferior a 1/4 (um quarto) do salário-mínimo, até 31 de dezembro de 2020; (Incluído pela Lei nº 13.982, de 2020)
§ 4o O benefício de que trata este artigo não pode ser acumulado pelo beneficiário com qualquer outro no âmbito da seguridade social ou de outro regime, salvo os da assistência médica e da pensão especial de natureza indenizatória.
§ 5o A condição de acolhimento em instituições de longa permanência não prejudica o direito do idoso ou da pessoa com deficiência ao benefício de prestação continuada.
§ 6º A concessão do benefício ficará sujeita à avaliação da deficiência e do grau de impedimento de que trata o § 2o, composta por avaliação médica e avaliação social realizadas por médicos peritos e por assistentes sociais do Instituto Nacional de Seguro Social - INSS.
§ 7o Na hipótese de não existirem serviços no município de residência do beneficiário, fica assegurado, na forma prevista em regulamento, o seu encaminhamento ao município mais próximo que contar com tal estrutura.
§ 8o A renda familiar mensal a que se refere o § 3o deverá ser declarada pelo requerente ou seu representante legal, sujeitando-se aos demais procedimentos previstos no regulamento para o deferimento do pedido.
§ 9o Os rendimentos decorrentes de estágio supervisionado e de aprendizagem não serão computados para os fins de cálculo da renda familiar per capita a que se refere o § 3o deste artigo.
§ 10. Considera-se impedimento de longo prazo, para os fins do § 2o deste artigo, aquele que produza efeitos pelo prazo mínimo de 2 (dois) anos.
§ 11. Para concessão do benefício de que trata o caput deste artigo, poderão ser utilizados outros elementos probatórios da condição de miserabilidade do grupo familiar e da situação de vulnerabilidade, conforme regulamento. (Incluído pela Lei nº 13.146, de 2015)
§ 12. São requisitos para a concessão, a manutenção e a revisão do benefício as inscrições no Cadastro de Pessoas Físicas (CPF) e no Cadastro Único para Programas Sociais do Governo Federal - Cadastro Único, conforme previsto em regulamento. (Incluído pela Lei nº 13.846, de 2019)
§ 14. O benefício de prestação continuada ou o benefício previdenciário no valor de até 1 (um) salário-mínimo concedido a idoso acima de 65 (sessenta e cinco) anos de idade ou pessoa com deficiência não será computado, para fins de concessão do benefício de prestação continuada a outro idoso ou pessoa com deficiência da mesma família, no cálculo da renda a que se refere o § 3º deste artigo. (Incluído pela Lei nº 13.982, de 2020)
§ 15. O benefício de prestação continuada será devido a mais de um membro da mesma família enquanto atendidos os requisitos exigidos nesta Lei. (Incluído pela Lei nº 13.982, de 2020)
Assim, tem-se que o direito ao benefício assistencial pressupõe o preenchimento dos seguintes requisitos:
1.1. Etário ou Condição de Deficiência
(a) idoso (assim considerado aquele com 65 anos ou mais, a partir de 1º de janeiro de 2004, data da entrada em vigor do Estatuto do Idoso), que comprove não possuir meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família. O requisito é objetivo, ou seja, comprovado o atributo etário, a análise do requisito incapacitante é desnecessária, bastando apenas verificar a situação de vulnerabilidade socioeconômica a que submetido o idoso ou
(b) condição de deficiente (incapacidade para o trabalho e para a vida independente, conforme redação original do artigo 20, da LOAS, e, após as alterações da Lei nº 12.470, de 31-10-2011, tratar-se de pessoa com impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas);
Saliente-se que a incapacidade para a vida independente a que se refere a Lei 8.742/93, na redação original, deve ser interpretada de forma a garantir o benefício assistencial a uma maior gama possível de pessoas com deficiência, consoante pacífica jurisprudência do STJ (v.g. STJ, 5ª Turma, RESP 360.202/AL, Rel. Min. Gilson Dipp, DJU de 01-07-2002) e desta Corte (v.g. AC n. 2002.71.04.000395-5/RS, 6ª Turma, Rel. Des. Federal João Batista Pinto Silveira, DJU de 19-04-2006).
Desse modo, a incapacidade para a vida independente:
a) não exige que a pessoa possua uma vida vegetativa ou seja incapaz de se locomover; b) não significa incapacidade para as atividades básicas do ser humano, tais como alimentar-se, fazer a higiene pessoal e vestir-se sozinho; c) não impõe a incapacidade de se expressar ou se comunicar; e d) não pressupõe dependência total de terceiros.
1.2. Situação de risco social
O art. 20, § 3º, da Lei 8.742/1993, em sua redação original, estabelecia que se considerava hipossuficiente a pessoa com deficiência ou idoso cuja família possuísse renda per capita inferior a ¼ do salário mínimo.
O Supremo Tribunal Federal, ao analisar os recursos extraordinários 567.985 e 580.963, ambos submetidos à repercussão geral, reconheceu a inconstitucionalidade do art. 20, § 3º da Lei 8.742/1993, assim como do art. 34, parágrafo único, da Lei 10.741/2003 - Estatuto do Idoso.
No primeiro caso, o STF identificou a ocorrência de um processo de inconstitucionalização decorrente de notórias mudanças fáticas (políticas, econômicas e sociais) e jurídicas (sucessivas modificações legislativas dos patamares econômicos utilizados como critérios de concessão de outros benefícios assistenciais por parte do Estado brasileiro), assentando, assim, que o critério econômico presente na LOAS não pode ser tomado como absoluto, cabendo a análise da situação de necessidade à luz das circunstâncias fáticas.
É dizer, o critério objetivo de ¼ do salário mínimo per capita - que orientou a análise dos benefícios assistenciais por vários anos - é mantido, sem excluir, contudo, a análise subjetiva, caso a caso, dos aspectos socioeconômicos que cercam a subsistência da parte autora e de sua família.
No que tange ao art. 34, parágrafo único, do Estatuto do Idoso, o qual estabelece que o benefício assistencial já concedido a qualquer idoso membro da família "não será computado para os fins do cálculo da renda familiar per capita a que se refere a LOAS", entendeu a Suprema Corte a existência de violação ao princípio da isonomia.
Isso porque, o dispositivo legal aludido abriu exceção apenas para o recebimento de dois benefícios assistenciais por idosos maiores de 65 anos, discriminando os portadores de deficiência e os idosos titulares de benefício previdenciário mínimo.
Assim, numa interpretação extensiva do referido artigo, eventual percepção de benefício previdenciário de valor mínimo por membro da família idoso (maior de 65 anos) ou inválido/deficiente deve, também, ser desconsiderado para fins de apuração da renda familiar.
Cito recentes precedentes a respeito da conclusão acerca da situação de risco social pelo magistrado verificada mediante a análise do estudo social apresentado e dos demais elementos de prova coligidos, in verbis (destaquei):
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. PESSOA IDOSA. AUSÊNCIA DE INTIMAÇÃO ANTERIOR À PERÍCIA SOCIAL. NÃO COMPROVAÇÃO DE PREJUÍZO. CERCEAMENTO DA DEFESA PELA NÃO PRODUÇÃO DE PROVA TESTEMUNHAL. INOCORRÊNCIA. REQUISITO SOCIOECONÔMICO. NÃO COMPROVAÇÃO MISERABILIDADE.
1. O benefício assistencial, previsto no art. 203, inciso V, da Constituição Federal, e 2.regulamentado pela Lei 8.742/1993, é devido ao idoso (idade superior a 65 anos) e à pessoa com deficiência que não têm condições de prover o próprio sustento ou de tê-lo provido pela própria família.
2. Não há nulidade processual em face da não intimação prévia dos procuradores da autora acerca da data e hora da perícia socioeconômica, visto que não demonstrado prejuízo na produção da prova. Assim como, não há cerceamento da defesa pela não determinação de prova testemunhal, pois cabe ao magistrado determinar as provas necessárias ao feito.
3. Quanto ao requisito socioeconômico para concessão do amparo assistencial, o critério objetivo de ¼ do salário mínimo per capita - que orientou a análise dos benefícios assistenciais por vários anos - é mantido, sem excluir contudo, a análise subjetiva, caso a caso, dos aspectos socioeconômicos que cercam a subsistência da parte autora e de sua família.
4. A conclusão acerca da situação de risco social, para fins de percepção de benefício assistencial, compete apenas ao magistrado, mediante a análise do estudo social apresentado e dos demais elementos de prova coligidos. Situação de vulnerabilidade social não comprovada no caso concreto. (TRF4, AC 5004301-91.2021.4.04.9999, 11ª Turma, Rel. Des. Federal ELIANA PAGGIARIN MARINHO, DJe 07-12-2022).
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. PESSOA IDOSA. REQUISITO SOCIOECONÔMICO. MISERABILIDADE. NÃO COMPROVAÇÃO. 1. O benefício assistencial, previsto no art. 203, inciso V, da Constituição Federal, e regulamentado pela Lei 8.742/1993, é devido ao idoso (idade superior a 65 anos) e à pessoa com deficiência que não têm condições de prover o próprio sustento ou de tê-lo provido pela própria família. 2. Quanto ao requisito socioeconômico para concessão do amparo assistencial, o critério objetivo de ¼ do salário mínimo per capita - que orientou a análise dos benefícios assistenciais por vários anos - é mantido, sem excluir contudo, a análise subjetiva, caso a caso, dos aspectos socioeconômicos que cercam a subsistência da parte autora e de sua família. 3. A conclusão acerca da situação de risco social, para fins de percepção de benefício assistencial, compete apenas ao magistrado, mediante a análise das provas coletadas. Situação de vulnerabilidade social não comprovada no caso concreto. (TRF4, AC 5004652-35.2019.4.04.9999, DÉCIMA PRIMEIRA TURMA, Relator MARCOS ROBERTO ARAUJO DOS SANTOS, juntado aos autos em 17-5-2023)
Feitas essas consideração preliminares, passo à análise da situação específica dos autos.
Cinge-se a controvérsia à comprovação da condição de miserabilidade da autora e ao termo inicial do benefício fixado na sentença.
Para avaliar a condição social da requerente, realizou-se perícia com assistente social, em 23-7-2020, na qual foi constatado que o núcleo familiar era composto pela autora e seu marido, e que o sustento da família dependia de trabalhos esporádicos que o marido conseguia realizar (
).Destaco os seguintes trechos da conclusão da assistente responsável pelo laudo:
Os filhos residem próximos da autora contudo, não têm condições financeiras de auxiliar os pais.
Foi percebido ainda que o local onde residem dificulta a habitabilidade por estar inacabado, possui pouca condição térmica, nem tampouco condições de higiene.
Através do estudo social realizado, foi percebido que a renda da família não é suficiente para suprir suas necessidades basicas, dar autônomia financeira a autora, já que depende exclusivamente do esposo, participar de espaços de promocão social e de lazer e fortalecer vínculos comunitários.
As imagens da residência da postulante não deixam dúvidas da condição de vulnerabilidade social em que vivem (
).Ainda, com relação ao argumento do INSS de que um dos filhos da autora residia com o casal à época do estudo social, a questão foi esclarecida pela assistente social, que constatou que, no momento da avaliação, os filhos residiam em diferentes endereços, próximos aos genitores.
Relativamente à retroação do termo inicial do benefício à primeira DER, em 23/07/2015, é bem verdade que, naquela ocasião, a autora declarou que residia com outros dois familiares. Além do marido, coabitava também com seu filho, de nome João Paulo Moreira, nascido em 15/09/1997, portanto, com 17 anos de idade à época. É o que se extrai do
.Da análise do CNIS (
) de João Paulo, é possível verificar que, em julho de 2015 (na DER, portanto), se encontrava desempregado, bem como que, naquele ano, trabalhou por 6 (seis) meses, como remunerações bem próximas ao salário mínimo, que era de R$ 788,00. Por outro lado, esteve empregado em 2016 por 4 (quatro) meses; em 2017, por 1 (um) mês e em 2018, por um mês, até que no mês de novembro desse último ano empregou-se por um período maior.Considero, nessas condições, que a renda desse filho, que, ao que a prova indica, era o único residente com os pais, não é suficiente para descaracterizar a situação de vulnerabilidade da genitora, constatada pela assistente social.
Para fins de concessão do ampraro tratado nesses autos, a renda dos demais filhos não deve ser computada, nos termos expressos do art. 20, § 1º, da Lei nº 8.742/93:
Art. 20. O benefício de prestação continuada é a garantia de um salário-mínimo mensal à pessoa com deficiência e ao idoso com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família. (Redação dada pela Lei nº 12.435, de 2011) (Vide Lei nº 13.985, de 2020)
§ 1o Para os efeitos do disposto no caput, a família é composta pelo requerente, o cônjuge ou companheiro, os pais e, na ausência de um deles, a madrasta ou o padrasto, os irmãos solteiros, os filhos e enteados solteiros e os menores tutelados, desde que vivam sob o mesmo teto.
Por outro lado, quanto à constatação de deficiência naquela primeira DER, a perícia judicial realizada nestes autos, em fevereiro de 2020, atestou que a autora está acometida Miopia Degenerativa congênita e Toxoplamose Adquirida em ambos os olhos, com quadro incapacitante, há, aproximadamente, quatro anos. Com base em atestado médico, conclui que, em 21/08/2015, já apresentava, no mínimo, visão monocular (
).Refere, ainda, como pontos relevantes da anamnese clínica:
Paciente, além de portadora de cegueira legal, na minha opinião como médica (mesmo não sendo psiquiatra e sim especialista em oftalmologia), ao meu exame clínico, me chamou atenção que paciente deve ser portadora de algum distúrbio psiquiátrico concomitante. Então, como também necessita fazer uso de medicação de uso contínuo, como para tratamento de Hipertensão Arterial Sistêmica, entre outros medicamentos, necessita de acompanhante para tal feito.
Chamo atenção, no ponto, que a visão monocular, ou, no caso da autora, cegueira do olho esquerdo (
), é reputada como, ao menos, deficiência leve por essa Corte (TRF4, AC 5011066-38.2018.4.04.7201, DÉCIMA PRIMEIRA TURMA, Relatora ERIKA GIOVANINI REUPKE, juntado aos autos em 21/02/2024; AC 5002230-76.2023.4.04.7112, SEXTA TURMA, Relator RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA, juntado aos autos em 15/08/2024).Considerando (i) as condições pessoais da requerente, que sofre com outras doenças além daquelas relacionadas à visão, (ii) sua indiscutível visão monocular desde 08/2015, (iii) a proximidade do termo inicial do estado incapacitante estabelecido na perícia ao primeiro requerimento administrativo, bem como (iv) seu histórico de solicitações de benefícios por incapacidade desde o ano de 2010, concluo que, em 21/08/2015, a postulante já se encontrava em condições de deficiência, nos termos legais.
Logo, merece acolhimento o recurso da autora (e consequentemente, desprovimento ao do INSS), para reformar parcialmente a sentença para considerar devido o benefício a contar da DER, em 23/07/2015, observada a prescrição quinquenal.
III - Honorários Advocatícios
Desprovida a apelação do INSS e provida, em parte, a apelação da autora, e observadas as regras do artigo 85, §§2º, 3º e 11, do CPC, bem como eventual gratuidade de justiça, a verba honorária fica majorada em 1% (um por cento), totalizando 11% (onze por cento), mantida a respectiva base de cálculo, conforme balizas traçadas pelo STJ (EDcl no AgInt no REsp 1573573). Esclareço que, nos termos da jurisprudência daquela Corte, "não é exigível a comprovação de trabalho adicional do advogado do recorrido no grau recursal, tratando-se apenas de critério de quantificação da verba" (STJ, AgInt nos EDcl no REsp 1.357.561/MG, Terceira Turma, Relator Ministro Marco Aurélio Bellizze, DJe 19-4-2017).
IV - Conclusões
1. Presentes os elementos que comprovem a alegada vulnerabilidade social e deficiência da parte autora, correta a sentença ao reconhecer o direito ao benefício.
2. Estabelecimento de seu termo inicial na primeira DER.
V - Prequestionamento
Em face do disposto nas Súmulas 282 e 356 do Supremo Tribunal Federal e 98 do Superior Tribunal de Justiça, e a fim de viabilizar o acesso às instâncias superiores, explicito que a presente decisão não contraria nem nega vigência às disposições legais/constitucionais prequestionadas pelas partes.
VI - Dispositivo
Ante o exposto, voto por negar provimento ao recurso do INSS e dar parcial provimento ao recurso da autora, nos termos da fundamentação.
Documento eletrônico assinado por ANA RAQUEL PINTO DE LIMA, Juíza Federal Convocada, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40004623935v30 e do código CRC 8ba30d80.Informações adicionais da assinatura:
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Apelação Cível Nº 5006903-75.2019.4.04.7202/SC
RELATORA: Juíza Federal ANA RAQUEL PINTO DE LIMA
VOTO DIVERGENTE
Pela Desembargadora Federal Eliana Paggiarin Marinho:
Trata-se de apelações interpostas contra sentença que julgou procedente em parte o pedido, concedendo benefício assistencial à autora a partir de 17/02/2020 (
e ).A e. Relatora nega provimento ao recurso do INSS e dá parcial provimento à apelação da autora, para conceder o benefício a partir da DER, em 23/07/2015.
Peço vênia para divergir.
Consta da sentença (
):Realizada perícia judicial (evento 30) a perita do Juízo afirmou que a parte autora apresenta cegueira legal devido a sequelas de doença mióptica degenerativa, além de coriorretinite por toxoplasmose. Relatou a perita que a autora possui cegueira total no olho direito e "20/conta dedos 0,5 metro a vultos (0,05 decimal), sem melhora, intratável".
Concluiu a perita que a autora apresenta incapacidade total e permanente, inclusive para alimentar-se, vestir-se, realizar higiene pessoal, ministrar seus medicamentos, intelecção, compreensão, desvio comportamental. Relatou que, de acordo com os documentos médicos, a incapacidade está presente desde o ano de 2015.
Anotou que, pelo exame realizado, a autora, além das patologias oftalmológicas, possui doenças de ordem mental.
Os documentos médicos apresentados, aliados à perícia judicial levam à conclusão de incapacidade permanente e total desde 2015, o que é suficiente para considerar preenchido o requisito de impedimento de longo prazo. Assim, preenchido o requisito previsto no § 2º do art. 20 da Lei 8.742/93.
Ciente da decisão do Supremo Tribunal Federal que considerou inconstitucional a previsão constante no § 3º do art. 20 da Lei 8.742/93, tenho que este requisito (miserabilidade) também está preenchido.
O laudo do evento 60 indica que a família da parte autora é composta de duas pessoas (ela e o marido). O marido desenvolve atividade como pintor de imóveis e relata não ter renda fixa, constando no laudo que "faz bicos e não quiz informar quanto ganha mensalmente" sendo "Durante a entrevista, percebido que o esposo da autora ganha em torno de 1 (um) salário mínimo por mês". A renda da família advém do trabalho do marido.
O casal reside em casa própria, construída em alvenaria, com cinco cômodos e guarnecido com móveis necessários ao uso diário. Os medicamentos utilizados pela parte autora são na maioria fornecidos pelo SUS.
Consta no laudo social que "os vizinhos não quiseram passar nenhuma informação. Disseram não saber informar sobre a situação econômica da autora. No posto de saúde do bairro, técnica de enfermagem, que não quiz se identificar, relata que a autora faz um ano de que não vai até o posto. Não sabe relatar sobre a situação atual de saúde e econômica da Sra Solange". Relatou também a assistente social que "os filhos residem próximos da autora, contudo, não tem condições financeiras de auxiliar os pais". Além disso, pontuou que a residência carece de higiene.
Anexo ao laudo social encontra-se fotografia de motocicletas, as quais a autora relata serem de vizinhos.
Os elementos de prova produzidos neste processo indicam que a parte autora reúne os requisitos necessários à concessão do benefício.
Contudo, em se tratando de benefício requerido na via administrativa ainda em 2015, não há como concluir que tais requisitos estivessem presentes na DER, até porque, naquele momento a composição do grupo familiar era diversa da atual.
A par disso, os documentos juntados pelo INSS em contestação comprovam que os dois filhos da autora exercem atividade laborativa desde 2012 e 2015 (OUT2 e 3, evento 35), fato que não pode ser desconsiderado, haja vista que em 2015 a parte autora declarou ter um filho na mesma residência, o que denota que a renda da família não vinha exclusivamente do trabalho do marido.
Anoto, ainda, que não obstante a parte autora tenha declarado que as motocicletas que se encontravam em sua garagem são dos vizinhos, estranhamente estes sequer se dispuseram a prestar qualquer informação sobre a família, o que gera dúvidas se efetivamente referidos veículos não pertencem a membros da família.
Diante desse contexto, tenho que a concessão do benefício a contar da citação é medida que se coaduna com a prova produzida, até porque, não obstante tratar-se de DER de 2015, a parte autora só ajuizou a ação quatro anos depois.
Assim, é procedente o pedido para concessão do benefício de amparo social (NB 88/701.731.516-3), a contar da citação, em 17/02/2020, nos termos da fundamentação.
Não há razões para a reforma da decisão.
A perícia judicial realizada em 17/02/2020 constatou cegueira legal decorrente de sequelas de doença miópica degenerativa e corriorretinite por toxoplasmose, gerando impedimentos de longo prazo a partir de 2015 (
).Não obstante, há nos autos atestado médico emitido em 21/08/2015, informando cegueira monocular e visão normal com correção (20/20) no olho contralateral (
). Os documentos médicos somente informam piora da visão no olho esquerdo a partir de 2018 ( , , ).Além disso, a situação de vulnerabilidade social somente foi constatada a partir da laudo socioeconômico (visita social realizada em 23/04/2020), ante a comprovação de que o núcelo familiar passou a ser composto apenas pela autora e pelo esposo (
), cuja renda decorre de trabalho informal.No entanto, a autora informou residir com o esposo e o filho na época do requerimento administrativo, em 2015 (
). Assim, houve alteração do núcleo familiar, não sendo possível afirmar situação de risco social à época.Neste contexto, deve ser mantida a sentença por seus próprios e jurídicos fundamentos.
Correção Monetária e Juros
A atualização monetária das parcelas vencidas deve observar o INPC no que se refere ao período compreendido entre 11/08/2006 e 08/12/2021, conforme deliberação do STJ no julgamento do Tema 905 (REsp 1.495.146 - MG, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, DE 02/03/2018), inalterado após a conclusão do julgamento, pelo Plenário do STF, de todos os EDs opostos ao RE 870.947 (Tema 810 da repercussão geral), pois rejeitada a modulação dos efeitos da decisão de mérito.
Quanto aos juros de mora, entre 29/06/2009 e 08/12/2021, haverá a incidência, uma única vez, até o efetivo pagamento, do índice oficial aplicado à caderneta de poupança, por força da Lei 11.960/2009, que alterou o art. 1º-F da Lei 9.494/97, conforme decidido pelo Pretório Excelso no RE 870.947 (Tema STF 810).
A partir de 09/12/2021, para fins de atualização monetária e juros de mora, impõe-se a observância do art. 3º da Emenda Constitucional 113/2021, segundo o qual, "nas discussões e nas condenações que envolvam a Fazenda Pública, independentemente de sua natureza e para fins de atualização monetária, de remuneração do capital e de compensação da mora, inclusive do precatório, haverá a incidência, uma única vez, até o efetivo pagamento, do índice da taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia (SELIC), acumulado mensalmente".
Honorários Recursais
Desprovido integralmente o recurso da autora, majoro a verba honorária fixada na sentença para 12%, mantida a suspensão por conta da justiça gratuita deferida.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por negar provimento aos recursos.
Documento eletrônico assinado por ELIANA PAGGIARIN MARINHO, Desembargadora Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40004671342v8 e do código CRC 71f9f644.Informações adicionais da assinatura:
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Apelação Cível Nº 5006903-75.2019.4.04.7202/SC
RELATORA: Juíza Federal ANA RAQUEL PINTO DE LIMA
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL À PESSOA COM DEFICIÊNCIA. IMPEDIMENTOS DE LONGO PRAZO. CRITÉRIO SOCIOECONÔMICO. RISCO SOCIAL.
1. O benefício assistencial, previsto no art. 203, V, da Constituição Federal, e regulamentado pela Lei 8.742/1993, é devido ao idoso maior de 65 anos e à pessoa com deficiência que não têm condições de prover o próprio sustento ou de tê-lo provido pela própria família, de acordo com critérios previstos no art. 20 da lei referida.
2. A avaliação atinente à incapacidade da pessoa com deficiência deve ser feita considerando mais do que as condições médico-biológicas do requerente. O requisito da deficiência e o socioeconômico não devem ser considerados separadamente, mas tratados como aspectos integrantes e correlacionados de um mesmo pressuposto para a concessão do benefício de prestação continuada.
3. Hipótese em que o conjunto probatório denota que não havia risco social quando do requerimento administrativo, em decorrência da renda do filho que integrava o grupo familiar à época, não sendo possível a concessão do benefício a partir da DER.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 11ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por maioria, vencidos a relatora e o Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ, negar provimento aos recursos, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Florianópolis, 26 de setembro de 2024.
Documento eletrônico assinado por ELIANA PAGGIARIN MARINHO, Relatora do Acórdão, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40004738569v4 e do código CRC 84f99fbd.Informações adicionais da assinatura:
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 21/08/2024 A 28/08/2024
Apelação Cível Nº 5006903-75.2019.4.04.7202/SC
RELATORA: Juíza Federal ANA RAQUEL PINTO DE LIMA
PRESIDENTE: Desembargadora Federal ANA CRISTINA FERRO BLASI
PROCURADOR(A): ANDREA FALCÃO DE MORAES
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 21/08/2024, às 00:00, a 28/08/2024, às 16:00, na sequência 94, disponibilizada no DE de 12/08/2024.
Certifico que a 11ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
APÓS O VOTO DA JUÍZA FEDERAL ANA RAQUEL PINTO DE LIMA NO SENTIDO DE NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO DO INSS E DAR PARCIAL PROVIMENTO AO RECURSO DA AUTORA, NOS TERMOS DA FUNDAMENTAÇÃO, E A DIVERGÊNCIA INAUGURADA PELA DESEMBARGADORA FEDERAL ELIANA PAGGIARIN MARINHO NO SENTIDO DE NEGAR PROVIMENTO AOS RECURSOS, NO QUE FOI ACOMPANHADA PELA DESEMBARGADORA FEDERAL ANA CRISTINA FERRO BLASI, O JULGAMENTO FOI SOBRESTADO NOS TERMOS DO ART. 942 DO CPC/2015.
Votante: Juíza Federal ANA RAQUEL PINTO DE LIMA
Votante: Desembargadora Federal ANA CRISTINA FERRO BLASI
Votante: Desembargadora Federal ELIANA PAGGIARIN MARINHO
LIGIA FUHRMANN GONCALVES DE OLIVEIRA
Secretária
MANIFESTAÇÕES DOS MAGISTRADOS VOTANTES
Divergência - GAB. 112 (Des. Federal ELIANA PAGGIARIN MARINHO) - Desembargadora Federal ELIANA PAGGIARIN MARINHO.
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Identificações de pessoas físicas foram ocultadas

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 18/09/2024 A 26/09/2024
Apelação Cível Nº 5006903-75.2019.4.04.7202/SC
RELATORA: Juíza Federal ANA RAQUEL PINTO DE LIMA
PRESIDENTE: Desembargadora Federal ANA CRISTINA FERRO BLASI
PROCURADOR(A): DANIELE CARDOSO ESCOBAR
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 18/09/2024, às 00:00, a 26/09/2024, às 16:00, na sequência 312, disponibilizada no DE de 09/09/2024.
Certifico que a 11ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
PROSSEGUINDO NO JULGAMENTO, APÓS O VOTO DO DESEMBARGADOR FEDERAL PAULO AFONSO BRUM VAZ ACOMPANHANDO A RELATORA E O VOTO DA JUÍZA FEDERAL FLÁVIA DA SILVA XAVIER ACOMPANHANDO A DIVERGÊNCIA, A 11ª TURMA DECIDIU, POR MAIORIA, VENCIDOS A RELATORA E O DESEMBARGADOR FEDERAL PAULO AFONSO BRUM VAZ, NEGAR PROVIMENTO AOS RECURSOS, NOS TERMOS DO VOTO DA DESEMBARGADORA FEDERAL ELIANA PAGGIARIN MARINHO QUE LAVRARÁ O ACÓRDÃO.
RELATORA DO ACÓRDÃO: Desembargadora Federal ELIANA PAGGIARIN MARINHO
Votante: Juíza Federal FLÁVIA DA SILVA XAVIER
Votante: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
LIGIA FUHRMANN GONCALVES DE OLIVEIRA
Secretária
Conferência de autenticidade emitida em 12/12/2024 18:53:19.
Identificações de pessoas físicas foram ocultadas